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LETRAS LIBRAS | 1
LNGUA PORTUGUESA E
LIBRAS TEORIAS E PRTICAS
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA
reitor RMULO SOARES POLARI
vice-reitora MARIA YARA CAMPOS MATOS
pr-reitor de graduao VALDIR BARBOSA BEZERRA Coordenador do UFPBVIRTUAL
LUCDIO DOS ANJOS FORMIGA CABRAL Diretora do CCHLA
MARIA APARECIDA RAMOS Chefe do Departamento de Letras Clssicas Vernculas
MNICA NBREGA Diretor da Editora Universitria
JOS LUIZ DA SILVA
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS LIBRAS VIRTUAL coordenadora
EVANGELINA MARIA BRITO DE FARIA vice-coordenadora
MARIANNE CARVALHO BEZERRA CAVALCANTE
L755
UFPB/BC
Lngua portuguesa e LIBRAS: teorias e prtica 1 / Evangelina Maria Brito de Faria, Marianne Carvalho Bezerra Cavalcante, Organizadoras. Joo Pessoa: Editora Universitria da UFPB, 2010.
195p.: Il. ISBN: 978-85-7745-489-1 1. Lngua portuguesa lingusticas internacional. 2.
Educao de surdos. 3. LIBRAS. 4. Literatura introduo. 5. Educao a distncia. I. Faria, Evangelina Maria Brito de. II. Cavalcante, Marianne Carvalho Bezerra.
CDU : 806.9+801
Os artigos e suas revises so de responsabilidade dos autores.
Direitos desta edio reservados : EDITORA UNIVERSITRIA/UFPB Caixa Postal 5081 Cidade Universitria Joo Pessoa Paraba Brasil CEP: 58.051 970 - www.editora.ufpb.br Impresso no Brasil Printed in Brazil Foi feito depsito legal
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LNGUA PORTUGUESA E
LIBRAS TEORIAS E PRTICAS
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Evangelina Maria Brito de Faria Marianne Carvalho Bezerra Cavalcante
Organizadoras
Editora da UFPB Joo Pessoa
2010
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Copyright by CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS/LIBRAS VIRTUAL, 2010
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS LIBRAS VIRTUAL coordenadora
EVANGELINA MARIA BRITO DE FARIA vice-coordenadora
MARIANNE CARVALHO BEZERRA CAVALCANTE
Capa ABRAO BAHIA LIMA
Projeto grfico e edio DAVID FERNANDES
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APRESENTAO ...................................................................................................................... 7 FONTICA E FONOLOGIA ................................................................................................................ 11 INTRODUO ......................................................................................................................................... 11 FONTICA ................................................................................................................................................ 13 FONOLOGIA ............................................................................................................................................. 20 TEORIAS LITERRIAS ...................................................................................................................... 49 GNERO PICO ...................................................................................................................................... 50 GNERO DRAMTICO ......................................................................................................................... 54 GNERO LRICO ..................................................................................................................................... 58 MISTURA DOS GNEROS ................................................................................................................... 61 FORMA ....................................................................................................................................................... 65 METODOLOGIA DO TRABALHO CIENTFICO ...................................................................... 75 A PRODUO TEXTUAL ..................................................................................................................... 76 O TEXTO CIENTFICO.......................................................................................................................... 79 LEITURA PREPARATRIA PRA ESCRITA DO TEXTO ........................................................... 82 A PESQUISA CIENTFICA ................................................................................................................... 87 PROJETO DE PESQUISA E ARTIGO CIENTFICO ...................................................................... 90 FUNDAMENTOS SCIO-HISTRICOS DA EDUCAO .................................................... 95 AS DIFERENAS PEDAGGICAS E O TRATAMENTO DA DIVERSIDADE ...................... 96 MODELOS PEDAGGICOS E TRATAMENTO DA DIVERSIDADE ....................................... 97 PEDAGOGICAS DISCIPLINARES ..................................................................................................... 98 PEDAGOGICAS CORRETIVAS ........................................................................................................ 101 CULTURA, ESTUDOS CULTURAIS E EDUCAO .................................................................. 103 MECANISMOS DISCIPLINARES E A FORMAO ESCOLAR DO SURDO ..................... 106 A RESISTNCIA DOS SURDOS ...................................................................................................... 109 A LNGUA DE SINAIS E A ESCOLA DE SURDOS ..................................................................... 110 TEORIAS LINGUSTICAS ............................................................................................................... 115 CONCEITOS FUNDAMENTAIS ...................................................................................................... 116 ESTUDOS LINGUSTICOS ................................................................................................................ 120 SUASSURE: PENSAMENTO DICOTMICO ............................................................................... 123 SUASSURE: PRINCPIO DA ARBITRARIEDADE .................................................................... 127 CRCULO LINGUSTICO DE PRAGA ............................................................................................ 135
SUMRIO
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SOCIOLINGUSTICA .......................................................................................................................... 140 ESTUDOS LINGUSTICOS SOBRE O TEXTO ............................................................................ 144 LINGUSTICA FUNCIONALISTA ................................................................................................... 147 LIBRAS I ................................................................................................................................................ 153 O CREBRO E A LNGUA DE SINAIS .......................................................................................... 154 PROCESSOS COGNITIVOS E LINGUSTICOS ........................................................................... 165 TPICOS DE LINGUSTICAS .......................................................................................................... 174
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Evangelina Faria e Marianne Cavalcante
Caro (a) aluno(a)
Neste segundo semestre do Curso de Letras/LIBRAS Virtual, sero ministradas as disciplinas: Libras
I, Teorias Lingusticas, Fontica e Fonologia, Teorias Literrias, Fundamentos Scio-Histricos da Educao
e Metodologia do Trabalho Cientfico.
Em, Libras I, vocs sero introduzidos propriamente na estrutura da Lngua de sinais. Estudaro a
relao entre crebro e a lngua de sinais, observando os processos cognitivos e lingusticos implicados na
construo dessa lngua. Aps essa viso macro, tero oportunidade de apreender como se do os diversos
nveis fonolgicos, morfolgicos e sintticos na lngua de sinais. De posse dessa base, voc poder avanar
com eficincia numa compreenso mais profunda da estrutura dessa lngua e penetrar nos textos com
maior proficincia.
Em Teorias Lingsticas, aprofundam-se aspectos tericos das correntes formalistas e
funcionalistas. Sero abordadas questes tericas desta importante cincia que a Lingustica. Importante
queles que trabalham ou pesquisam sobre as cincias humanas e indispensvel para os que lidam e
estudam a lngua, seja ela qual for, inclusive a Libras. De acordo com a corrente formalista, voc conhecer
concepes que implicam o reconhecimento de que a lngua uma estrutura, ou sistema e que papel do
estudioso da lngua compreender a organizao e o funcionamento dos seus elementos constitutivos. J
nas correntes funcionalista, ganham relevo as relaes entre a lngua como um todo e as diversas
modalidades de interao social, destacando a importncia do contexto social na compreenso da natureza
das lnguas.
Em Fontica e Fonologia, voc vai penetrar no estudo dos modelos sonoros encontrados na
linguagem humana, no interessante? Veja que, apesar da imensa diversidade que se verifica na nossa
fala, todos os falantes de uma lngua percebem que algumas expresses so idnticas e outras so
diferentes e justamente a fonologia que vai explicar o porqu. Vai perceber tambm como a fonologia da
LIBRAS possui caractersticas prprias.
Em Teorias Literrias, voc vai se deliciar com o texto literrio.
Em Fundamentos Scio-Histricos da Educao, voc encontrar subsdios para entender a ligao
entre Educao, Histria e Sociologia. Perceber a Educao como um acontecimento histrico
APRESENTAO
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intrinsecamente ligado s relaes sociais. A disciplina est tambm organizada em unidades. Na primeira,
h a discusso sobre o problema dos fundamentos e a origem da sociedade como objeto de estudo. Na
segunda, ser abordada a Educao enquanto fenmeno social. E, na terceira, a escola ser objeto de
discusso com os currculos em cena. Em todo o percurso, esto os pressupostos bsicos de sustentao da
Educao como fundamento para a cidadania.
Finalmente em Metodologia do Trabalho Cientfico, voc vai dar incio a uma longa caminhada de
produo de textos necessrios a sua vida acadmica. O contedo encontra-se distribudo em trs
mdulos. O primeiro explicita o que significa cincia e expe os diferentes mtodos existentes na pesquisa
cientfica. O segundo aborda diretamente a pesquisa cientfica com detalhamento de suas partes
constitutivas. O terceiro procura inserir os alunos na vida prtica acadmica de produo dos diversos
trabalhos cientficos, j com um direcionamento para a construo da Monografia final de curso.
Esperamos que voc encontre, ao longo deste semestre, oportunidades de enriquecimento de
prticas e reflexes sobre a lngua, a literatura e a educao. Tal enriquecimento passa pelos caminhos da
pesquisa indicados neste livro, pelas discusses com os professores no Moodle, pelas trocas com os tutores
e com os colegas mas, sobretudo, pela articulao de todo esse processo com sua experincia como
estudante, como profissional e como cidado.
Queremos concluir lembrando a importncia de aproveitar bem cada momento.
As coordenadoras
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FONTICA E FONOLOGIA
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ANA CARLA ESTELLITA VOGELEY1WAGNER TEOBALDO LOPES DE ANDRADE
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A fontica e a fonologia, ento, fazem parte dos estudos lingsticos, cujo objeto de estudo a
estrutura e o funcionamento das lnguas. Enquanto a sintaxe e a semntica, por exemplo, se ocupam de
unidades maiores, como a frase e o sentido, a fontica e a fonologia se ocupam de unidades menores os
sons. A Figura 1 situa esses estudos macro e microlinguisticos de forma mais esquemtica:
INTRODUO
A linguagem composta por alguns aspectos gramaticais, como a fontica (estudo da produo e
percepo dos sons da fala), a fonologia (estudo das unidades mnimas da lngua), a morfologia (estudo da
composio das palavras), a sintaxe (estudo da frase), a semntica e a pragmtica (estudo do sentido). ,
portanto, necessria a observao da relao interativa existente entre esses elementos. Na tentativa de
no se desconsiderar essa relao, esse captulo mantm o foco sobre os nveis fontico e fonolgico.
Figura 1 A fontica, a fonologia e os estudos lingsticos.
1 Fonoaudiloga. Doutoranda em Lingustica pela UFPB. Professora Assistente do Departamento de Fonoaudiologia da UFPB. 2 Fonoaudilogo. Doutorando em Lingustica pela UFPB. Professor Assistente do Departamento de Fonoaudiologia da UFPB.
FONTICA E FONOLOGIA
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Antes de entrarmos numa discusso mais formal sobre os objetos de estudo da fontica e
fonologia, vale questionar por que estudar esses aspectos. Existem vrios interesses nessas reas, como o
ensino de L1 (lngua materna) e de L2 (lngua estrangeira), sobre a aquisio fonolgica, as atividades
clnicas, como as da Fonoaudiologia (sem esses conhecimentos, as terapias seriam muito demoradas e sem
grandes resultados), o desenvolvimento da escrita (que tem relao com a fonologia), os conhecimentos
dialetais, as anlises histricas acerca da mudana sonora, as tecnologias de reconhecimento de fala, como
as utilizadas em softwares e em tecnologias de telefonia, alm da percia.
Esclarecidas as aplicabilidades dessas cincias, importante destacar o que cada um delas estuda.
Embora a fontica e a fonologia estudem os sons da fala, existem algumas diferenas sobre a forma como
cada uma os observa. A fontica se ocupa das propriedades (fsicas) dos sons da fala, em termos de
percepo e produo. Assim, observa o plano concreto, fsico e motor da fala. Identifica, descreve e
classifica os sons articulados. Tem como unidade mnima o [fone].
A fonologia trata os sons num plano mais abstrato, no nvel da subjacncia (inconscientes,
mentais), ou seja, a competncia linguistica no uso dos sons. Se ocupa da organizao dos sistemas de sons
das lnguas atravs da representao e formalizao de modelos/processos sonoros. D conta do
conhecimento (implcito) que os falantes tm das unidades mnimas sonoras da sua prpria lngua e explica
o funcionamento dos sistemas de sons das lnguas. Tem como unidade mnima o /fonema/. As diferenas
entre a fontica e a fonologia esto esquematizadas na Figura 2.
Figura 2 Diferenas entre a fontica e fonologia.
Tipicamente, a fontica e a fonologia so entendidas como separadas, como est esquematizado
na Figura 2. Isso porque seus objetos de estudos so distintos. Por outro lado, so duas reas
interdependentes, pois no se conseguiria fazer um estudo fonolgico sem uma descrio fontica, nem de
muito serveria uma descrio fontica, sem fins de anlise fonolgica.
Lngua Explicativa Valor distintivo FONEMAS Competncia Particular/ especfica
Fala Descritiva Fisiolgico FONES Performance / desempenho Geral
Fontica vs. Fonologia
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1. FONTICA
Como j foi dito, a fontica se ocupa em descrever os sons da FALA, considerando como esses sons
so produzidos e percebidos. Assim, a fontica abrange trs domnios:
Fontica articulatria descreve e classifica os sons da fala a partir de como so produzidos;
Fontica acstica o estudo das propriedades fsicas dos sons e do percurso que as ondas trilham;
Fontica auditiva como os sons so captados pelo aparelho auditivo e interpretados pelo crebro
humano.
Esses trs domnios da fontica funcionam concomitantemente, ou seja, ao mesmo tempo em que
produzimos um som, somos capazes de perceber e interpretar essa informao sonora. Vamos nos deter
agora s propriedades articulatrias dos sons. Como os sons da fala so produzidos?
Os sons da fala resultam da ao de determinados rgos sobre a corrente de ar que vem dos
pulmes. Para produo dos sons, trs condies se fazem necessrias:
i. A corrente de ar;
ii. Um obstculo encontrado por essa corrente de ar;
iii. Uma caixa de ressonncia.
Essas condies so criadas pelos rgos da fala, que compem o nosso aparelho fonador, como na
Figura 3.
Figura 3 O aparelho fonador.
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O aparelho fonador constitudo das seguintes partes:
a) Sistema respiratrio: formado pelos pulmes, brnquios e traquia rgos respiratrios que
fornecem a corrente de ar, matria prima da fonao;
b) Sistema fonatrio: composto pela laringe, onde se localizam as cordas vocais, que produzem a
energia sonora utilizada na fala;
c) Sistema articulatrio: cavidades localizadas acima da laringe (faringe, boca e fossas nasais),
que funcionam como caixas de ressonncia, sendo que a cavidade bucal pode variar
profundamente de forma e de volume, graas aos movimentos dos rgos ativos, sobretudo
da lngua.
Mas como funciona esse aparelho fonador? O ar expelido dos pulmes, atravs dos brnquios,
passa pela traquia e chega laringe, onde, ao atravessar a glote, costuma encontrar o primeiro obstculo
sua passagem. A glote a abertura entre duas pregas musculares das paredes superiores da laringe,
conhecidas como cordas ou pregas vocais. O fluxo de ar pode encontr-la fechada ou aberta. Caso as
pregas vocais estejam fechadas, o ar fora a passagem atravs das cordas vocais retesadas, fazendo-as
vibrar e produzir o som musical caracterstico das articulaes sonoras. No segundo caso, quando as cordas
vocais esto relaxadas, o ar escapa sem vibraes larngeas. As articulaes produzidas denominam-se
surdas. A distino entre sonora e surda pode ser claramente percebida na pronncia de [f] e [v], como em
faca e vaca.
Durante a respirao, as pregas vogais ficam abertas. Durante a fonao, que depende da
expirao, ficam fechadas e, com a fora da passagem do ar com elas fechadas, provoca vibrao e produz
os sons vozeados ou sonoros, como o [v]. Como mostra a Figura 4:
Figura 4 Pregas vocais durante a respirao ( esquerda) e durante a fala ( direita).
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Essa uma questo crucial, na classificao dos sons - qual o estado da glote? Assim, dizemos que
os sons sonoros ou vozeados so aqueles produzidos com vibrao de pregas vocais, uma vez que, durante
a produo de um som vozeado, os msculos da glote se aproximam e, devido passagem de corrente de
ar e da ao dos msculos, ocorre a vibrao. Enquanto que os sons surdos ou desvozeados so produzidos
sem vibrao, ou seja, os msculos da glote encontram-se totalmente separados, de maneira que o ar
passa livremente. Essa diferena apresenta-se entre [v] e [f] (como em vaca e faca), [b] e [p] (como em
bingo e pingo) e [z] e [s] (como em zelo e selo), por exemplo. As vogais, as lquidas (como [l]) e as nasais
(como [m]) sempre so vozeadas, porque sempre provocam vibrao de pregas vocais. Desta forma, os
sons [v], [b] e [z] so sonoros porque so resultado de vibrao de pregas vocais.
Alm disso, outra distino ocorre entre os sons orais e nasais. Os sons orais, como [a] (como em
gua) e [b] (como em bola), ocorrem pela sada do fluxo areo pela boca, quando a vula est levantada,
impedindo a sada do ar pelo nariz (fossas nasais). Enquanto que os sons nasais, como [] (como em ano) e
[m] (como em mola), so resultados da passagem pelo nariz, quando a vula est abaixada, assim, difere-se
o [b] (de bola) do [m] (de mola), como na fala de uma pessoa com congesto nasal, como no resfriado.
Ento, a posio do vu palatino outro critrio de classificao dos sons, j que atravs dele observamos
a oposio entre um segmento nasal e um segmento oral.
Para a classificao dos sons em termos de articulao da fala, uma das questes que devemos
levantar qual o modo de sada do ar? Surge a a primeira distino bsica entre os sons, aquela que diz
respeito s consoantes e s vogais:
Consoante movimento de fechar e abrir, com um mximo articulatrio;
Vogal movimento de abrir e fechar, com um mnimo articulatrio, sem esforos.
Com base nisso, depois, a distino se d entre a classe das consoantes. Para facilitar a
compreenso do assunto, sero apenas destacadas as consoantes do Portugus Brasileiro (PB), em seis
categorias:
1. Completa ocluso sons oclusivos que saem como uma exploso, de uma s vez: [p, b] (como
em pato e bato); [t, d] (como em tia e dia); [k, g] (como em calo e galo).
2. Com ocluso parcial sons fricativos, emitidos enquanto h ar nos pulmes, como na produo
de fffffffffffffff. [f, v]; [s,z]; [, ]; [h, ].
3. Com passagem at pelo nariz: provoca sons nasais ([m, n, ], como em macaco, navio e
galinha).
4. Com ocluso evoluindo para soltura do ar: provoca sons africados [,], como o tSia e dZia
do dialeto carioca.
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5. Aps a batida da lngua no palato, como o tepe [] (de barata) e retroflexo [] (de alguns
dialetos, como do interior de Minas Gerais, porta), que produzido com a lngua enrolando
para trs.
6. Com passagem de ar pelas laterais da lngua: [l, , ]
E quais so os articuladores envolvidos na produo? Ou seja, qual o ponto de articulao? Os
articuladores ativos e passivos determinam essa classificao. Os articuladores ativos so aqueles que mais
se movimentam em direo aos rgos estacionrios. Vejamos agora os articuladores que participam da
produo dos sons, na Figura 5:
Figura 5 Articuladores ativos e passivos
Como se observou, o articulador ativo nos sons bilabiais, ou seja, aqueles que so produzidos com
os dois lbios, o lbio inferior, que se movimenta mais em relao ao lbio superior, como no som [b] de
bola. Nos sons labiodentais, como [f] de faca, o lbio inferior ativo, pois se movimenta em direo aos
dentes superiores, que so os articuladores passivos.
Assim, os sons so classificados quanto ao modo e quanto ao ponto de articulao:
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a) Quanto ao modo de articulao:
Oclusivas p, t, k, b, d, g
Fricativas f, s, , v, z, , h, ,
Africadas - ,
Lquidas , l, , ,, (
Nasais m, n,
b) Quanto ao ponto de articulao:
Bilabiais p, b, m, ,
Labiodentais f, v
Alveolares t, d, n, s, z, l, ,&
Alveolopalatais - ,
Palatais - ,,,
Velares k, g, h
Glotal X
Para unificar essas possibilidades de produo dos sons, de modo que os sons pudessem ser
transcritos em qualquer lngua, foi criado o Alfabeto Fontico Internacional (IPA), pela Associao
internacional de Fontica, em Paris (1886). Esse sistema funciona como uma notao padro para a
transcrio fontica. Ele permite que qualquer falante conhecedor de seus cdigos ou smbolos consigam
realizar os sons de qualquer lngua.
Seguem, na Figura 6, as representaes das consoantes possveis de serem articuladas com o
aparelho fonador humano, classificados pelo IPA:
Figura 6 As consoantes no Alfabeto Internacional de Fontica.
Bilabial Labiodental Dental Alveolar Ps-
alveolar
Retoflex
a
Palatal Velar Uvular Faringal Glotal
Plosiva
Nasal
Vibrante
Tepe
Fricativa
Frivativa
Aproximante
Lateral Aproximante
Exerccio 1. Marque os segmentos consonantais que tenham a propriedade articulatria listada esquerda (h 3 em cada): a. vozeado b. desvozeado c. nasal l d. oclusivo e. fricativo f. lateral g. bilabial h. alveolar i. velar
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As vogais recebem uma classificao diferenciada. Usamos como parmetros articulatrios, a altura
e a posio horizontal da lngua e o arredondamento dos lbios. A Figura 7 mostra esse movimento da
lngua, em relao altura:
Figura 7 Altura das vogais.
Dessa forma, quanto altura, as vogais podem ser classificadas como altas, mdias e baixas.
Altas: a lngua atinge maior altura no portugus, temos as vogais [i] e [u].
Mdias: a lngua se mantm nem alta, nem em repouso o que ocorrer nas vogais mdias altas
[e] e [o] do portugus, como nas palavras mesmo e bolo, e nas vogais mdias baixas [] e [], como nas
palavras f e n.
Baixa: a lngua se mantm em posio de repouso no portugus temos a vogal baixa [a], como
de baleia.
Exerccio 2. Classifique os segmentos quanto ao modo, ao ponto de articulao e ao vozeamento: [p] [m] [r] [h] [b] [g] [f] [l] [s] [t]
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Quanto ao movimento horizontal, as vogais podem ser classificadas como anterior, posterior e
central. A vogal [i] a mais anterior, as mdias [e], [] tambm so anteriores, a vogal [u] a mais
posterior, as mdias [o] e [] tambm so posteriores e a vogal [a] situa-se numa posio central.
Essa classificao articulatria permite a disposio das vogais em um sistema triangular em cujo
vrtice mais baixo encontra-se a vogal baixa /a/ e, nos vrtices mais altos, as vogais altas /i/ e /u/, como
pode ser observado no Quadro 1:
Quadro 1 Vogais quanto ao ponto de articulao e altura da lngua.
Quanto ao arredondamento, no portugus, essa caracterstica no distintiva, redundante, pois
toda vogal posterior arredondada, como as vogais [u], [o] e [], ao contrrio do francs.
Todas essas informaes quanto s classificaes dos sons sero importantes para a realizao das
transcries fonticas. Para fazer a transcrio, lanamos mo desses smbolos do IPA. importante que
voc treine transcrever algumas palavras baseadas na sua produo de fala, prestando bem ateno na
fisiologia dos sons.
Tente pronunciar a vogal [y] do francs, falando [i], com boca de [u]. Voc estar conseguindo pronunciar uma vogal anterior arredondada, que no temos na LP (lngua portuguesa).
Exerccio 3. Tente transcrever foneticamente essas palavras: Amor: _____________ Eltrica: _____________ Parede: ____________ Japo: ______________ Zebra: _____________ Moeda: _____________
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2. FONOLOGIA
A Fonologia (do Grego phonos = voz/som e logos = palavra/estudo) o ramo da Lingstica que se
ocupa do sistema sonoro de uma lngua. Esta uma rea muito relacionada com a Fontica, mas as duas
tm focos de estudo diferentes. Isso porque a lngua e a fala no ocorrem separadas, a lngua ao mesmo
tempo o instrumento e o produto da fala.
Ento, para descrever a fonologia de uma lngua, preciso considerar o aspecto fontico. Enquanto
a fontica descreve, a fonologia explica, procura valores distintivos. Enquanto a Fontica estuda a natureza
fsica da produo e da percepo dos sons da fala (chamados de fones), a Fonologia preocupa-se com a
maneira como eles se organizam dentro de uma lngua, classificando-os em unidades capazes de distinguir
significados, chamadas fonemas. Alm disso, a Fonologia estuda outros elementos distintivos da lngua,
como a estrutura silbica, o acento e a entonao.
necessrio, tambm, fazer uma distino entre os termos fonmico e fonolgico. O primeiro
era utilizado nas primeiras investigaes ainda eminentemente estruturalistas. O ltimo utilizado para os
modelos ps-estruturalistas de anlise do componente fonolgico.
A fonologia , portanto, a parte da gramtica que estuda os sons que compem a lngua. Tem como
objeto de estudo o Fonema, que a unidade sonora de uma lngua, isto , a menor unidade de som de uma
palavra, servindo como elemento distintivo. Veremos, agora, a classificao desses fonemas, no PB.
Cada lngua dispe de um nmero de unidades fnicas. A funo desses fonemas determinar
diferena de significado de uma palavra em relao a outra, como nas palavras [kasa], do verbo caar, e
[kaza], lugar onde se mora. Essa distino foi possvel pelo contraste entre as duas consoantes [s] e [z],
que, nesse caso, por serem distintivas, podem, com certeza, ser chamadas de fonemas.
IMPORTANTEFonemas no so letras! fundamental que se diferencie o fonema, uma unidade sonora, de letra, uma representao grfica dos fonemas da fala. Os fonemas no correspondem necessariamente s letras do alfabeto, havendo a possibilidade de um fonema ser representado por mais de uma letra, ou mesmo uma letra representar mais de um fonema. Ex.: cachorro (letras ch = 1 fonema /S/) e txi (letra x = 2 fonemas /ks/).
http://dicionario.babylon.com/Lingu%C3%ADstica#%21%219G2CGKRAUEhttp://dicionario.babylon.com/Fon%C3%A9tica#%21%219G2CGKRAUEhttp://dicionario.babylon.com/fone#%21%219G2CGKRAUEhttp://dicionario.babylon.com/Fonema#%21%219G2CGKRAUE
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O objetivo da fonologia , portanto, estabelecer os sistemas fonolgicos das lnguas, ou seja, o
conjunto de elementos abstratos relacionados entre si que o falante usa para discriminar e delimitar as
unidades significativas de sua lngua. Ento, quais os tipos de fonemas? Quais os sistemas de uma lngua?
Sistema voclico do portugus
Pelo aspecto fsico, o som produzido por uma corrente de ar que no encontra obstculos na
cavidade bucal sua passagem. No aspecto fonolgico, constitui a base da slaba na lngua portuguesa, isto
, cada vogal corresponde somente a uma slaba. Assim, na palavra cadeira, temos trs slabas (ca-dei-ra),
porque temos trs vogais ( o i, neste caso, uma semi-vogal ou glide).
Quanto ao sistema voclico do PB, Cmara Jr. (1970) classifica as vogais da lngua portuguesa
quanto articulao, em termos de altura da lngua, em vogal baixa (a), vogais mdias de primeiro grau
(, ), vogais mdias de segundo grau (e, o) e vogais altas (i, u). Essa classificao articulatria permite a
disposio das vogais em um sistema triangular, como pode ser observado no Quadro 1, visto
anteriormente, em cujo vrtice mais baixo encontra-se a vogal baixa /a/ e, nos vrtices mais altos, as vogais
altas /i/ e /u/.
Alm desse aspecto, leva-se em considerao o movimento da lngua em relao s pores
anterior e posterior da cavidade bucal. Sendo assim, a vogal mais posterior a /u/, que,
conseqentemente, a mais arredondada. J a vogal mais anterior e menos arredondada a vogal /i/. A
vogal /a/ fica em uma posio central, enquanto que as mdias ficam em uma posio intermediria, tanto
em termos de altura, quanto em relao anterioridade, o que leva a pensar que, por isso, tambm, so
alvos comuns de processos e regras fonolgicas.
Essa classificao, que apresenta sete vogais, na lngua portuguesa, ocorre para a posio tnica,
conforme Cmara Jr. (1970). No contexto de slaba tnica, no portugus brasileiro, pode-se encontrar
oposies entre os sons voclicos /a/, //, /i/, // e /u/, como nos vocbulos s[a]co, s[e]co, s[]co, s[o]co,
s[]co, s[u]co.
Na posio pretnica, ou seja, no contexto que antecede a slaba tnica, o sistema voclico do
portugus tambm sofre reduo de sete para cinco vogais, havendo, portanto, um processo de neutralizao
em slabas tonas, entre vogais mdias, conservando-se as de segundo grau, como na Figura 8.
Figura 8 Quadro de vogais em posio pretnica.
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Vale ressaltar, ainda, que as vogais mdias, em posio pretnica, alm de sofrerem reduo por
neutralizao, sofrem processos de harmonia voclica, nos quais as vogais mdias pretnicas assumem
traos de segmentos vizinhos, ou seja, assimilam a altura da vogal alta da slaba seguinte, como ocorre em
pepino > pipinu, coruja > curuja (BISOL, 1981).
No Brasil, o quadro das pretnicas no fixo quando se trata das vogais mdias, pois, a depender
da regio geogrfica em que essas vogais vo ser observadas, a neutralizao pode se dar em direo s
mdias abertas, como acontece na regio Nordeste, por exemplo.
Em posio de slabas tonas finais, ocorre uma neutralizao entre as mdias e as altas, restando, no
sistema triangular das vogais do portugus, apenas trs vogais, como em tir[u], tir[i], tir[a], como mostra a Figura 9:
Figura 9 Quadro de vogais postnicas finais.
Por neutralizao, ento, um sistema que apresenta sete vogais em posio tnica (a, e, , i, o, ,
u) se reduz a cinco vogais em posio pretnica (a, e, i, o, u), quatro vogais em posio postnica no final
(a, e, i, u) e a trs vogais em posio final de palavra (a, i, u).
Sistema consonantal do portugus
Pelo aspecto fsico, o som produzido por uma corrente de ar que encontra algum obstculo nessa
passagem. Fonologicamente falando, as consoantes sempre formam slaba com vogais, sem as vogais, as
consoantes so simples rudos. Ento, pelo critrio fonolgico, veremos que a consoante no aparece, no
portugus, como ncleo silbico.
O quadro de consoantes no portugus do Brasil depende da sua posio na slaba. Em posio
inicial, existem dezoito consoantes. Em posio intervoclica, ou entre vogais, podemos ter dezenove
consoantes. Em posio final, ou ps-voclica, o quadro apresenta uma diversidade de opinies. No
entanto, Cmara Jr. (1970) defende que as consoantes em final de slaba aparecem como uma variante
posicional, podendo o /L/, por exemplo, em muitas regies, de acordo com os variados registros, pode ser
emitido como semivogal posterior /w/, fato que no traz oposio significativa em portugus, desfazendo-
se a homonmia no contexto frasal: mal e mau; vil e viu.
Essa variao do quadro de consoantes importante para o entendimento de diversos pontos do
nosso sistema fonolgico.
LETRAS LIBRAS | 23
Semivogal ou Glide
o som produzido como vogal, pronunciado de maneira menos intensa, no constituindo slaba
isoladamente, devendo sempre estar acompanhado por uma vogal.
A fonologia, ento, postula quatro premissas bsicas:
1) os sons tendem a ser modificados pelo ambiente em que se encontram;
2) os sistemas sonoros tendem a ser foneticamente simtricos;
3) os sons tendem a flutuar ou variar;
4) seqncias caractersticas de sons exercem presso estrutural (ex.: c[o]ruja ~c[u]ruja).
Como j foi dito, o objeto de estudo da fonologia a organizao mental dos sons da lngua, e no
da fala, como a fontica. Colocamos aqui a noo de fonema como unidade contrastiva, como em (1):
(1) zelo / selo
pato / gato
Assim, a noo de contraste define unidades categoricamente distintas, com base em
critrios de forma e significado. Ou seja, se eu mudo determinado som numa palavra e essa palavra
muda de sentido, isso significa dizer que esse som um fonema, isto , tem valor contrastivo. o
caso de faca e vaca. Se mudamos o primeiro som para o segundo, h mudana de significado,
implica oposio, como a seguir:
[faka] [vaka]
toda lngua possui um nmero restrito de sons. A funo desses sons fazer diferenciao de significados. Quando um som capaz de fazer distines, podemos cham-lo de fonema e os fonemas se combinam de acordo com regras fonolgicas, que variam em cada lngua.
concluindo
LETRAS LIBRAS| 24
Essa anlise contrastiva, em termos de oposio, feita atravs de pares mnimos. Isso quer dizer
que quando duas palavras se diferenciam pela troca de um nico som, e isso gera mudana de significado
estamos diante do que chamamos de pareamento mnimo.
Se essa troca de som no acarretar mudanas de significado, estamos diante de um caso de
variao ou alofonia. Assim, podemos detectar fonemas ou constatar variao, como o caso de [tia] e
[tia]. Nos dois casos, temos dois sons diferentes e um mesmo significado (a palavra continua significando
a irm do pai ou da me). Esse um caso de variao.
Ento, ao serem definidos os fonemas de uma lngua, a partir de uma anlise fonolgica, tambm
so definidos os alofones dessa lngua. Os fonemas so definidos a partir dos pares mnimos e os alofones
so determinados a partir da distribuio complementar.
Alofones so as possveis diferentes realizaes do mesmo fonema, ou seja, as diferentes
realizacoes fonticas de um mesmo fonema. E como que se sabe que o mesmo fonema? Sempre que
for possvel, necessrio extrair uma regra que d conta dos vrios contextos. Isso ocorre atravs da
distribuio complementar ou da variao livre:
- Distribuio complementar (ou variantes contextuais) os alofones dependem da posio do
fonema na palavra necessrio determinar uma regra que descreva o contexto de um fone
ou de outro.
Ex.: tia tia (depende de contexto interno /i/)
- Variantes livres variantes dialetais no h qualquer regra que determine o seu uso (o seu
uso generalizado).
Ex.: vezgu x vegu
Para serem extradas as regras fonolgicas, imprescindvel identificar o ambiente ou contexto
onde a variao sonora ocorre. No caso de tia tia, possvel ser explicada a partir da regra de
palatalizao de alveolar [t] diante da vogal alta anterior [i], como na Figura 10, a seguir:
Figura 10 Regra de palatizao das oclusivas alveolares.
LETRAS LIBRAS | 25
Nesse caso, a consoante /t/, [+anterior], est diante de uma vogal [+alta] e, tambm, [+anterior],
que provoca uma assimilao entre os dois segmentos. No entanto, possvel, embora raro, acontecer esse
processo quando a consoante /t/ est diante da vogal [u], [+alta] e [+posterior]. Esse caso mais difcil de
ocorrer, porque um segmento anterior ser assimilado por outro posterior, mas, apesar de raras, podem
ocorrer, em algumas regies, como as formas em (2):
(2) oito, doido > [] . []
Surge, aqui, outro conceito da fonologia que merece ser destacado o de classes naturais. Nesse
caso, tanto o /t/, como o /d/ constituem uma classe natural, visto que apenas o trao de vozeamento ou
sonoridade os distingue, sendo ento a matriz fonolgica dos dois segmentos quase idntica, se no fosse o
trao distintivo de [-vozeado], para o /t/, e [+vozeado] para o /d/.
De acordo com Hyman (1975), dois segmentos constituem uma classe natural quando sofrem
regras fonolgicas juntos, como o caso da palatizao apresentado, quando um segmento convertido no
outro atravs de regra fonolgica e quando funcionam juntos nos ambientes de regras fonolgicas. Isso
justifica porque um conjunto de restries que operam em um determinado grupo. Por exemplo, se /t/ e
/d/ sofrem a mesma regra (de palatalizao) juntos, significa que pertencem mesma classe natural.
Algumas subcategorias, ento, emergem como resultado de vrias suspeitas, inspees e analogias.
O resultado final um conjunto de restries que operam em um determinado grupo, como ocorre, em
fonologia, quando os processos aplicam-se a todos os elementos que pertencem a uma mesma classe
natural. As regras fonolgicas so aplicadas s classes naturais de segmentos, especificadas atravs dos
traos distintivos. Como exemplo, pode ser citado o fenmeno da palatizao descrito anteriormente, no
qual os segmentos /t/ e /d/ tornam-se [] e [] antes da vogal alta [i].
justamente atravs da combinao de cada um desses sons, chamados fonemas, que so criadas
todas as palavras usadas na nossa lngua. Cada palavra, portanto, formada por um conjunto de vrios
fonemas. A simples troca de um dos fonemas de uma palavra ir transform-la em outra, de significado
completamente diferente. Isso ocorre, por exemplo, com as palavras camelo e cabelo. Assim, com poucos
fonemas, possvel criar milhares de palavras.
A organizao da cadeia sonora da fala orientada, portanto, por certos princpios, que agrupam
segmentos consonantais e voclicos em cadeia e determinam a organizao das seqncias sonoras
possveis de uma determinada lngua. Falantes possuem uma intuio sobre as seqncias sonoras
permitidas e proibidas em sua lngua. Por exemplo, mesmo sem sabermos o significado da palavra sali,
sabemos que a cadeia de segmentos possvel, em termos de distribuio e combinao. Dessa forma,
interpretamos como uma palavra possvel no portugus. Diferente de uma palavra como spali, por
exemplo.
LETRAS LIBRAS| 26
A fonologia de uma lngua, ento, estabelecida pelas restries combinatrias. Ou seja, cada
lngua tem sua possibilidade de combinao. Na lngua portuguesa, por exemplo, no possvel a slaba do
tipo spa. Sabemos isso atravs desses parmetros de combinaes:
1. Em posio intervoclica (entre vogais) 19 segmentos
2. Em posio absoluta, incio de slaba no incio da palavra 16 segmentos (, e R, no se
aplicam, com exceo de lhama, por exemplo)
3. Em grupo consonantal, existem tambm restries: fruta, prato, planta, ...
* C1 plosiva ou fricativa
* C2 [l] ou [r]
Existem algumas excees, como em: Vl Vladimir (emprstimos), Tl atlas (derivados do latim),
Vr vridu (interna palavra possvel livro).
4. Em final de slaba (coda) s quatro possibilidades fonolgicas so possveis. Claro que
ortograficamente recebem vrias letras, mas fonologicamente so assim representadas:
/S/ - /paSta/
/R/- /toRto/
/L/ - /boLsa/
/N/- /kaNto/
Portanto, as lnguas variam quanto aos seus inventrios fonticos e quanto organizao da
estrutura silbica.
Quanto s possibilidades de consoantes em final de slaba (posio de coda silbica), existem
algumas restries segmentais impostas, na lngua portuguesa. Para entendermos melhor essa distribuio
das consoantes ps-voclicas, necessrio introduzir as noes de neutralizao e de arquifonemas.
Certos segmentos que apresentam contrastes fonmicos podem apresentar perda de contrastes
em algum ambiente fonolgico especfico. o caso clssico das vogais mdias em posio pretnica, ou
seja, na slaba que antecede a slaba tnica. Ento, se em posio tnica, [] e [] so unidades
contrastivas ou fonemas, como nas palavras f e n, em posio pretnica, perdem contrastes
implicando uma reduo no sistema de vogais, uma vez que passam a ser permitidas apenas cinco vogais
/a, i, u, e, o/. Assim, em posio pretnica, h perda de contrastes, como em m[o]rango e m[]rango. Isso
Imagine que voc sorteou as seguintes
letras: R, B, A, F, O, L , C, I, D
Quantas palavras podem ser
LETRAS LIBRAS | 27
quer dizer que no importa se eu diga uma forma ou outra, estarei falando da mesma fruta. Esse fenmeno
um processo fonolgico chamado de neutralizao.
De acordo com Battisti e Vieira (2005), a neutralizao ocorre quando h a perda de um trao
distintivo, reduzindo dois fonemas a uma s unidade sonora. No caso da neutralizao voclica, o trao
distintivo perdido na posio pretnica. Em outras palavras, no h mais uma diviso entre /e/ e // e
entre /e/ e //, enquanto duas unidades fonolgicas distintas, visto que, em posio pretnica, no h
oposies entre esses fonemas.
Junto noo de neutralizao, est a idia de arquifonema, uma vez que justamente esse
fonema que permite essa possibilidade de neutralizao. No exemplo acima, as vogais mdias /e/ e /o/
podem ser consideradas arquifonemas, uma vez que neutralizam duas formas.
Os arquifonemas do PB, alm das vogais mdias, so justamente aqueles referentes s
possibilidades de consoantes finais, em termos de fonologia: /S/, /R/, /L/ e /N/. Para demonstrar os
alofones relacionados ao arquifonema, segue o exemplo em (3):
3) Arquifonema /R/ - sofre alofonia, manifestando-se, foneticamente, como:
[] ['gafu], [ba'ata]
[h] ['gahfu], ['hatu]
[] ['gafu]
[] ['gafU], [se'veja]
[] ['pta], ['pka]
O mesmo ocorre em relao ao arquifonema /S/ e suas possveis variaes ou alofones, como
mostra o exemplo em (4):
(4)
LETRAS LIBRAS| 28
Com relao ao arquifonema /N/, a manifestao fontica mais comum a nasalizao da vogal
que o antecede, como no caso da palavra canto, que fonologicamente a representamos com o
arquifonema /kaNto/, mas foneticamente, ocorre a nasalizao da vogal [ktu], embora fosse possvel
haver uma produo do tipo [ kntu], ou at mesmo [kantu].
Por isso, Cagliari (2002) destaca que necessrio prestar ateno, ao proceder uma anlise
fonolgica, para no confundir dados de diferentes sistemas lingsticos. Um mesmo falante no diz coisas
contraditrias. Porm, se compararmos dois falantes de dialetos diferentes, podemos chegar a regras
contraditrias, que afirmam e negam uma mesma coisa, ao mesmo tempo. Por outro lado, sempre
possvel buscar regras mais abrangentes que envolvem vrios dialetos, numa tentativa de caracterizar a
lngua como um todo. Mas nem sempre isto possvel.
Atreladas discusso sobre a slaba, no portugus brasileiro, ainda existem os segmentos que nem
so vogais, nem consoantes, so as glides [w e j], que sempre ocorrem nos ditongos, como em [paj]. Por
que no so vogais nem consoantes?
As vogais do PB caracterizam-se, fonologicamente, por ocuparem a posio de ncleo silbico,
necessariamente. No permitido, na LP, haver uma consoante ocupando o ncleo, como ocorre no ingls,
como no caso da palavra /botl/ (bottle). S essa restrio de natureza fonolgica j estabelece uma
diferenciao, em termos de sistema, entre vogais e consoantes.
Exerccio 4: Transcreva fontica e fonologicamente os dados: (lembre-se que a transcrio fontica ocorre entre colchetes [] e a fonolgica, entre barras //) a. conde [ ] / / b. manto [ ] / / c. tinta [ ] / / d. anjo [ ] / /
Exerccio 5: Para entender melhor como usamos as glides, transcreva foneticamente as palavras:
a. seqela b. quadrado c. tranqilo d. quase e. aquarela f. mingua
LETRAS LIBRAS | 29
A LP constitui um sistema de reputa ideal para a aplicao do critrio distribucional, uma vez que
suas consoantes no exercem funo silbica, pois o ncleo da slaba sempre uma vogal. Isso quer dizer
que, na lngua portuguesa, o conceito de vogal, fonologicamente, coincide com o de silbico. As glides ou
semi-vogais no podem ocupar o ncleo da slaba, ento, no podem ser consideradas vogais. Ao mesmo
tempo, no so consideradas consoantes pelas caractersticas fonticas, em relao produo
articulatria, visto que a semi-vogal [W] tem pronncia equivalente vogal alta posterior [u] e a semi-vogal
[j] tem pronncia equivalente vogal alta anterior [i].
Assim, as glides, presentes nos ditongos, como em [paj] e [paw], so consideradas segmentos no
consonantais e no-voclicos, pela posio que ocupa na slaba a posio que uma consoante pode
ocupar (CVC / CVG), como ser descrito a seguir). Dessa forma, esto relacionadas ao estudo da slaba.
2.1 O estudo da slaba
Fonlogos mais atuais, apesar de defenderem posies tericas diferenciadas, so unnimes em
conceder um espao privilegiado para a slaba destacando-a como unidade lingisticamente significante,
que deve ter o seu lugar na teoria fonolgica.
Quando se observa o conjunto de palavras das lnguas, possvel perceber que elas seguem
determinados princpios organizacionais, que no so os mesmos para todas as lnguas, como j foi dito
anteriormente.
Tome-se como exemplo a seqncia /s1/, que no portugus no forma slaba, mas que no ingls
perfeitamente vivel, ex: /sleiv/ - "escravo". De um modo geral, as lnguas so regidas por regras
fonotticas que permitem ou no determinados arranjos ou seqncias sonoras em uma slaba. Logo,
compreender as restries que operam em dada lngua, permite compreender a organizao no s da
slaba, mas tambm das palavras.
Uma silaba () pode ser representada por dois ramos, como em (5) e (6). O primeiro, chamado
onset contm at duas consoantes. O segundo, chamado rima, pode ser preenchido por vogais e
consoantes, cujo nmero e seqncia sero dados por especificidades da prpria lngua.
(5)
(6)
LETRAS LIBRAS| 30
A slaba, como mostra a Figura 11, composta por um ncleo, necessariamente, constitudo por
uma vogal. E pode ser composta por onset ou ataque e pela coda:
Figura 11 Constituintes silbicos do PB.
Como descrito anteriormente, os elementos que constituem a slaba variam de lngua para lngua.
Qualquer teoria fonolgica que adote a slaba como base, deve ser capaz de reconhecer as seqncias de
consoantes e vogais caractersticas de cada lngua e compar-las, a fim de perceber quais as semelhanas e
diferenas da estruturas silbicas entre lnguas distintas. Observe as possibilidades de slabas da lngua
portuguesa (LP) no Quadro 2:
Quadro 2 Possibilidades de slabas nas lnguas inglesa, espanhola e portuguesa.
Observa-se, portanto, que existe um princpio que governa a formao da slaba nas lnguas, - o
princpio de sonoridade das slabas. Podemos usar um esquema proposto por Spencer (1996), chamado de
"grid de sonoridade", que nos possibilita a visualizao dos segmentos que compem as slabas. Observe o
princpio em (7). O = obstruinte, L = lquida, V = vogal, N = nasal, G = glide.
LETRAS LIBRAS | 31
(7)
A constituio das slabas obedece, ento, a uma escala de sonoridade e ao molde silbico de cada
lngua. As lnguas possuem restries, capazes de selecionar quais os elementos e a seqncia que eles
podem ocupar numa slaba. Essas limitaes so chamadas de filtros.
Seguindo os princpios de organizao de uma slaba e o Princpio de Sonoridade, possvel fazer
silabao das palavras nas lnguas, exatamente como aquele exerccio de separar as slabas que se faz na
escola. O processo, contudo, no to simples. Observem os exemplos de palavras e suas respectivas
divises silbicas em (8):
(8)
Tijolo ti.jo.lo
Porta por.ta
Noite noi.te
Rubro ru.bro
Atlas a.tlas
Considerando que o estudo da slaba s foi possvel depois de muitas discusses e muitas
mudanas de perspectiva no estudo da fonologia, a partir das crticas aos modelos que viam os segmentos
isoladamente e do surgimento das abordagens que consideravam a posio do segmento na slaba, os
constituintes da slaba, a prosdia, dentre outros aspectos importantes que passaram a ser observados
com base nos novos modelos.
Para entender como nossa fonologia se estrutura e funciona, observando essas questes histricas
e teorias, importante fazermos uma breve retrospectiva desses modelos que acomodam os fatos
fonticos e os fenmenos fonolgicos.
2.2 As teorias fonolgicas
De acordo com Bisol (1981), a tentativa de estabelecer a relao entre os nveis fontico e
fonolgico, isto , a relao entre a produo fontica e o nvel subjacente ou abstrato da fonologia e com
LETRAS LIBRAS| 32
o objetivo de descrever e analisar como as diversas lnguas do mundo estruturam seus sons, surgiram
diferentes modelos ou teorias fonolgicas.
De acordo com Bonilha (2000, p.12), dos fonemas aos traos distintivos, das regras s restries,
inquestionvel a evoluo que a Fonologia tem apresentado ao longo do tempo. inegvel, portanto, o
fato de que, ao explicarem o funcionamento da fonologia dos sistemas lingsticos, as teorias fonolgicas
tm ajudado a elucidar o processo de aquisio fonolgica.
Veremos agora que os modelos se dividem em dois grandes grupos:
1. Modelos lineares: que consideram a fala como uma combinao linear de segmentos ou
conjunto de traos distintivos. Na perspectiva da fonologia linear ou segmental, os fonemas so
considerados um conjunto de traos no estruturados ou feixe de traos.
2. Modelos no-lineares assumem que os traos so dispostos hierarquicamente em diferentes
camadas (tiers). Podem estender-se alm ou aqum de um segmento, ligar-se a mais de uma
unidade, funcionar isoladamente ou em conjuntos solidrios.
A Teoria Gerativa Clssica, conhecida como Teoria dos Traos Distintivos, representa o modelo
linear. Para essa teoria, a representao da seqncia de segmentos que formam uma palavra feita por
uma seqncia linear de matrizes de traos, sem qualquer hierarquia entre os traos que a constituem.
Os traos distintivos so considerados propriedades mnimas, de natureza acstica ou articulatria.
Dessa forma, os segmentos so classificados a partir de uma srie de traos primitivos, geralmente binrios
- [+presente] ou [-ausente]. Esse sistema de traos serve de entrada para engendrar as regras fonolgicas
que se aplicam a classes naturais de sons, como mostra a Tabela 1.
Tabela 1 Distribuio de traos distintivos de alguns segmentos (CHOMSKY; HALLE, 1968).
LETRAS LIBRAS | 33
Para esse modelo, no importa saber quais elementos fazem parte do sistema fonolgico de uma
lngua, mas, sim, como se gera uma determinada sequncia fnica, como esto organizados os segmentos
fonolgicos e qual a representao das operaes que subjazem produo de um dado som ou sequncia
fnica.
Veja em (9) a representao de [n] atravs do feixe de traos:
(9)
As matrizes de traos um dispositivo que facilita as transcries. A matriz fontica agrupa todos
os traos distintivos existentes, enquanto que a matriz fonolgica agrupa apenas os traos distintivos que
diferenciam os segmentos. Na representao fontica, todos os traos devem ser especificados para um
determinado segmento. J na representao fonolgica, omitem-se os traos redundantes, irrelevantes
para a distino do segmento.
Assim, temos os traos de classe principal:
Silbico: segmentos [+silbicos] so aqueles que constituem ncleo silbico, ou seja, no portugus,
as vogais. Todos os outros segmentos so [silbicos]. Esta caracterstica substitui o trao voclico e
permite agrupar consoantes e glides em um grupo oposto ao das vogais.
Consonantal: segmentos [+consonantal] so aqueles com obstruo do trato vocal, como as
consoantes plosivas, fricativas, africadas, nasais e lquidas. Apenas as vogais e as glides so [-consonantal].
Soante: vogais, lquidas, glides e nasais so [+soante]. Este trao definido por uma passagem de
ar relativamente livre atravs da boca ou do nariz. Essa caracterstica permite agrupar juntas vogais,
lquidas, glides e nasais que sempre compartilham o trao [+vozeado], diferentemente de obstruintes, que
podem ser [+vozeadas] ou [vozeadas].
Depois dessa distino bsica entre os segmentos, na matriz, vem os traos de cavidade:
LETRAS LIBRAS| 34
Coronal: sons produzidos com a lmina da lngua levantada em relao posio neutra da
lngua. Assim, os sons [+coronais] so os dentais, alveolares, palato-alveolares e palatais.
Anterior: sons produzidos com uma obstruo localizada na frente da regio alveo-palatal da
boca. Tem o trao [+anterior] os sons labiais, dentais e alveolares, alm das vogais anteriores
[i], [] e [e].
Posterior: sons produzidos pela retrao do corpo da lngua da posio neutra. Os sons que
tem o trao [+posterior] so os velares, glotais e as vogais posteriores [u], [] e [o].
Alto: sons produzidos pelo levantamento do corpo da lngua acima do nvel ocupado pela
posio neutra. So [+alto] os sons palatais, palato-alveolares e vogais altas [i] e [u].
Baixo: sons produzidos pelo abaixamento do corpo da lngua abaixo do nvel ocupado na
posio neutra. So [+baixo] os segmentos glotais e a vogal baixa [a].
Arredondado: sons produzidos com o estreitamento do orifcio dos lbios. No portugus, esse
trao redundante, no sentido de que todas as vogais posteriores so [+arredondada], como
as vogais [u], [] e [o].
Alm desses, ainda temos os traos de aberturas secundrias:
Nasal: so os sons produzidos com abaixamento do vu palatino, permitindo o escape do fluxo
de ar pelo nariz. So [+nasal] as consoantes nasais, como o [m] e o [n] e as vogais nasais, como
[], por exemplo.
Lateral: so os sons produzidos com a elevao da lmina da lngua e o abaixamento do centro
da lngua, permitindo o escape do ar por um lado ou por ambos os lados. Nos sons no-
laterais, a passagem do ar no aberta. A consoante [+ lateral] do portugus a [l], e a [-
lateral] a vibrante [r].
Por fim temos os traos de modo de articulao e traos da fonte:
Contnuo: sons contnuos so aqueles cujo estreitamento no ocorre a ponto de bloquear a
passagem do ar, como as fricativas, diferente dos sons no-contnuos, cuja obstruo total,
como as consoantes plosivas. Assim, so [+ contnuos]: as vogais, as glides, as lquidas e as
fricativas.
Metstase retardada: ocorre nos sons onde a soltura do ar inicialmente bloqueada e depois
liberada com turbulncia. Esse trao mais usado pra distinguir as plosivas das africadas [t] e
[tS], como em tia e tSia.
LETRAS LIBRAS | 35
Tenso ATR3
Com base nesses traos, montamos a matriz de trao de cada segmento e observamos como cada
som produzido. Alm disso, esse modelo serviu para entendermos os sons como pertencentes a classes
naturais, que como perceber uma relao de parentesco entre eles. Ou seja, se o som [t] e [d] tem
matrizes de traos muito semelhantes, como apenas um trao distintivo, podemos dizer que so sons
homorgnicos, pertencentes mesma classe natural a classe das plosivas coronais. Isso pode ser
observado a partir das matrizes em (10):
: antes chamado como tenso ou no tenso, o trao ATR serve para distinguir as
vogais mdias altas [e] e [o] das mdias baixas [] e []. Assim, so [+ATR] as vogais mdias
altas [e] e [o] e [-ATR] as vogais mdias baixas [] e [].
Vozeado ou sonoro: presena vs. ausncia de vibrao de pregas vocais. So [+voz.] os sons
com vibrao, como o [b] e [v].
(10)
Como se observam no exemplo (10), os segmentos [t] e [d] pertencem mesma classe natural,
porque alm de serem semelhantes e terem apenas um trao distintivo, sofrem os processos fonolgicos
juntos, como a regra de palatalizao que ocorre antes de [i], como em tSia e dZia, se a regra afeta um dos
segmentos, deve afetar o outro.
3 ATR (Advanced Tongue Root) o trao voclico referente ao avano ou recuo da raiz da lngua e que, geralmente, est diretamente relacionado com o levantamento do corpo da lngua, visto que esses movimentos da lngua so concomitantes.
Exerccio 6: D a matriz de traos que caracteriza os seguintes sons:
[] [ ] [] []
Exerccio 7: Elimine o segmento que no pertence classe natural e identifique os traos que caracterizam essa classe: a. f, v, s, d, z b. p, t, k, g, f c z s t d b
LETRAS LIBRAS| 36
Esse modelo trouxe grandes contribuies, pois, a partir do modelo linear, proposto por Chomsky e
Halle (1968), na obra Sound Pattern of English (SPE), as anlises fonolgicas passaram a utilizar, como
unidade mnima, os traos distintivos. Assim, passou a ser defendida a idia de que a criana adquire
oposies e contrastes, e no sons individuais. Todas as crianas, por exemplo, adquirem os contrastes que
diferenciam as consoantes oclusivas das nasais (papai/mame) antes dos contrastes que diferenciam as
fricativas e as lquidas.
As anlises por traos, baseadas no modelo linear, permitiram determinar as vrias etapas do
processo de aquisio, agrupar os segmentos em classes naturais e verificar que os segmentos que integram
uma mesma classe apresentam um funcionamento muito semelhante.
No entanto, com o tempo, parecia no ser suficiente por conta do fato de que as matrizes de traos
eram incomunicveis entre si. Assim, as matrizes no garantem uma explicao sobre o funcionamento de
alguns processos fonolgicos. Foram, ento, desenvolvidos os modelos no-lineares, a partir de estudos
como a Fonologia Mtrica; Fonologia Lexical; Fonologia da Slaba; Fonologia Prosdica e Fonologia Auto-
segmental, que deu base para a Geometria dos Traos.
Goldsmith (1976) desenvolveu esse modelo acreditando na existncia de nveis ou camadas, ligados
atravs de linhas de associao. Nesse modelo, os segmentos so representados de modo multidimensional,
pela estrutura de rvore e os traos esto dispostos em ns hierarquicamente ordenados, formando camadas
(tiers) como se mostra na Figura 9:
A (n de raiz)
B
C
D ( B, C, D, E ns estruturais)
E
a b
c
d
e
f
g (valores de traos)
Figura 12 Estrutura do segmento (CLEMENTS; HUME, 1995, p. 249)
LETRAS LIBRAS | 37
Os traos so ligados aos ns de classe por linhas de associao. Alm disso, existe uma relao de
dependncia entre os traos, isto , o trao do n imediatamente superior domina o n inferior, e a
mudana no n de classe superior implica mudana no n inferior.
As premissas bsicas desta teoria so:
a) A fala produzida usando-se vrios articuladores que funcionam independentemente, por
estarem em tiers separados.
b) Regras fonolgicas devem operar uma nica vez, ou seja, somente conjuntos de traos que
formam constituintes funcionam juntos em regras fonolgicas.
c) A organizao dos traos universalmente determinada.
Foi baseada na Teoria dos traos que surgiu outra teoria fonolgica, a Teoria da Fonologia Natural,
que estuda os processos fonolgicos. Isso porque estudos na fonologia clnica observaram que algumas
crianas modificavam os sons modificando os traos, substituindo os sons ou omitindo/ apagando.
Stampe (1973) foi o pioneiro no estudo dos processos fonolgicos. Para ele, o processo fonolgico
uma operao mental para substituir classes de sons que o individuo no capaz de produzir, por uma
opo de classe idntica, no entanto, desprovida da propriedade que a torna de difcil realizao. As
palavras com encontros consonantais, por exemplo, so de maior dificuldade no estgio inicial do
desenvolvimento da linguagem oral, como na palavra fruta.
Apesar de a substituio fonolgica ser uma operao mental, ela motivada pelas caractersticas
fsicas da fala como neurofisiolgicas, morfolgicas, mecnicas, temporais e acsticas.
Esses processos de simplificao so naturais porque derivam das necessidades e dificuldades de
articulao e de percepo do ser humano. Alm de naturais, so inatos e universais, pois so limitaes
com as quais as crianas nascem e vo superando medida em que vo convivendo com a lngua.
Dentre os processos mais comuns, na aquisio fonolgica normal, podem ser citados os de
estruturao silbica e os de substituio (HERNANDORENA, 1990; YAVAS; HERNANDORENA; LAMPRECHT,
1991; LAMPRECHT, 2004).
LETRAS LIBRAS| 38
No nvel segmental, os processos de substituio mais freqentes so:
Dessonorizao de obstruintes abre []
Plosivisao Suco []
Anteriorizao queijo []
Posteriorizao sapato []
Semivocalizao de lquidas cenoura []
Substituio de lquida no-lateral
por lateral buraco []
No realizao do segmento em onset simples sabonete []
Reduo do encontro consonantal blusa []
Apagamento de slabas tonas bicicleta []
Apagamento da fricativa final nibus []
Apagamento de lquida final carne []
Reduplicao gelia []
Apagamento de lquida
intervoclica borboleta []
Apagamento de lquida inicial roda []
Mettese verde []
No realizao da slaba dormindo [)]
Epntese brabo []
Exerccio 8: O enunciado O vov comeu churrasco, farofa e salada realizado por uma criana da seguinte maneira: [u bobo komeu kuxaku paropa i talada]; caracterizando um processo fonolgico de: (A) frontalizao de velares; (B) simplificao de lquidas; (C) ensurdecimento; (D) dentalizao; (E) plosivao.
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Como j foi dito antes, os modelos tericos da Fonologia podem ser baseados em regras e
baseados em restries. At agora, falamos sobre os modelos baseados em regras. Existe tambm um
modelo baseado em restries, que um modelo muito recente. Estamos falando da Teoria da Otimidade
(OT), proposta por Prince e Smolensky (1993).
Por ser um modelo muito terico, ser apenas citado, mas no ser aprofundado. O que vale a
pena ser dito, e que muitos estudos na rea da Fonologia tem adotado esse modelo nas analises.
Enfim, no campo da Fonologia, muitos tm sido os modelos propostos desde a Fonologia Gerativa
Clssica, at os dias de hoje, com a Teoria da Otimidade e, embora as teorias visem descrio e anlise
das lnguas em seu funcionamento real, nas comunidades que as utilizam, os pesquisadores sempre
questionam sua pertinncia para a explicao de fatos relativos aos domnios da aquisio da linguagem,
dos desvios lingsticos e da mudana histrica.
2.3 A Fonologia da Lngua de Sinais
A lngua de sinais (LS) uma lngua natural, uma forma legtima de expresso e comunicao das
comunidades surdas (VALIANTE, 2009), com estrutura lingstica complexa, que dispe de todos os nveis
lingsticos necessrios, como fonologia, morfossintaxe, semntica e pragmtica.
Neste momento, ser focada apenas a estrutura fonolgica da lngua brasileira de sinais, apesar da
grande escassez de estudos na rea da LIBRAS sob o ponto de vista fonolgico. Dentre estes estudos, pode-
se mencionar Quadros e Karnopp (2004), Karnopp (1999; 2008) e Rabelo (2006).
Segundo Karnopp (1999), os articuladores primrios das lnguas de sinais so as mos, que se
movimentam no espao em frente ao corpo e articulam sinais em determinadas locaes neste espao. Nas
lnguas de sinais, um sinal pode ser articulado com uma ou duas mos e tanto com a mo direita quanto
com a mo esquerda, o que no se configura em uma mudana distintiva. Sinais articulados com uma mo
so produzidos pela mo dominante (em geral, a direita para destros e a esquerda para canhotos). A
LIBRAS, assim como as outras lnguas de sinais, basicamente produzida pelas mos, embora movimentos
do corpo e da face tambm desempenhem funes.
Para analisar a formao dos sinais, Stokoe (1960) props a decomposio da Lngua Americana de
Sinais (American Sign Language ASL) em trs aspectos ou parmetros simultneos: o formato (ou
configurao) de mos, a localizao (ou locao) no espao e a sua movimentao que, analisados
isoladamente, no carregam qualquer significado. Battison (1978) acrescenta um quarto parmetro: a
orientao da mo. preciso lembrar que a mudana de apenas um dos parmetros provoca diferena no
significado do sinal.
LETRAS LIBRAS| 40
Figura 13 Os parmetros fonolgicos da LIBRAS (FERREIRA-BRITO, 1990, p. 23).
Figura 14 Pares mnimos na LIBRAS (FERREIRA-BRITO, 1990, p. 23).
LETRAS LIBRAS | 41
A configurao das mos se refere ao fato de que para cada sinal feito, uma ou as duas mos
podem assumir uma forma especfica. Pode ocorrer apenas uma mo configurada, uma mo configurada
sobre a outra que lhe serve de apoio e a configurao espelhada das duas mos. Pesquisas de Ferreira-Brito
e Langevin (1995) mostram que a LIBRAS possui 46 configuraes de mo.
Figura 15 As 46 configuraes de mo da LIBRAS (FERREIRA-BRITO; LANGEVIN, 1995).
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A localizao no espao o local onde a mo j configurada posicionada. A mo pode tocar,
bater ou ser posicionada em um ponto inicial da qual deslizar para outro ponto do corpo. Pode, ainda, ser
posicionada em um espao neutro frente ou ao lado do corpo, seja na direita, esquerda em cima, no meio
ou em baixo. Assim, o sinal pode ser localizado na regio superior (cabea ou pescoo), mdia (tronco) ou
inferior (da cintura ao meio da coxa), onde sero articulados.
Figura 16 Espao de realizao dos sinais (FERREIRA-BRITO, 1990, p. 3)
Quadro 3 Pontos de articulao (FERREIRA-BRITO; LANGEVIN, 1995) C cabea T topo da cabea R rosto S parte superior do rosto I parte inferior do rosto p orelha o olhos N nariz B boca d bochechas Q queixo A zona abaixo do queixo
T tronco P pescoo O ombro B busto E estmago C cintura B braos S brao I antebrao C cotovelo P pulso
M mo P palma C costas das mos L1 lado do indicador L2 lado do dedo mnimo D dedos Dp ponta dos dedos Dd ns dos dedos (juno dedos-mo) Dj ns dos dedos (primeira junta dos dedos) D1 dedo mnimo D2 anular D3 dedo mdio D4 indicador D5 polegar V interstcio entre os dedos V1 interstcio entre o polegar e o indicador V2 interstcio entre o indicador e o mdio V3 interstcio entre o mdio e o anular V4 interstcio entre o anular e o mnimo
EN espao neutro
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O parmetro de movimento se refere ao movimento especfico que realizado para expressar o
significado do sinal, podendo ser o bater, o deslizar, o apertar, o girar etc. De acordo com Klima e Bellugi
(1979 apud FERREIRA-BRITO, 1995), este um parmetro que envolve os movimentos internos da mo, os
movimentos do pulso, os movimentos direcionais no espao e conjuntos de movimento de um mesmo
sinal.
As categorias em que se pode descrever o parmetro movimento na LIBRAS esto dispostas no
Quadro 2 (FERREIRA-BRITO, 1995).
Quadro 4 Categorias do parmetro movimento na LIBRAS (FERREIRA-BRITO, 1995)
Tipo de movimento
Contorno ou forma geomtrica: retilneo, helicoidal, circular, semi-circular,
sinuoso, angular, pontual;
Interao: alternado, de aproximao, de separao, de insero, cruzado;
Contato: de ligao, de agarrar, de deslizamento, de toque, de esfregar, de
riscar, de escovar ou de pincelar.
Torcedura de pulso: rotao, com refreamento;
Dobramento de pulso: para cima, para baixo;
Interno das mos: abertura, fechamento, curvamento e dobramento
(simultneo/gradativo)
Direcionalidade do
movimento
Direcional
Unidirecional: para cima, para baixo, para esquerda, para
direita, para dentro, para fora, para o centro, para lateral
inferior esquerda, para lateral inferior direita, para lateral
superior esquerda, para lateral superior direita, para um
ponto referencial especfico
Bidirecional: para cima e baixo, para esquerda e direita,
para dentro e fora, para laterais opostas.
No-direcional
Frequncia Simples
Repetido
J a orientao est relacionada direo da palma da mo durante um sinal: voltada para cima,
para baixo, para o corpo, para a frente, para a esquerda ou para a direita.
Esses quatro parmetros so considerados as unidades mnimas das lnguas de sinais e qualquer
mudana em um deles pode levar a uma modificao do significado do sinal.
LETRAS LIBRAS| 44
Embora a lngua de sinais seja produzida basicamente pelas mos, movimentos do corpo e da face
tambm desempenham funes. As expresses faciais e corporais so, portanto, consideradas o quinto
parmetro da fonologia das lnguas de sinais.
Estas expresses se referem aos movimentos da face, dos olhos, da cabea ou do tronco e esto
relacionadas s diferenciaes entre itens lexicais e marcaes sintticas, como marcao de sentenas
interrogativas (como sim-no e interrogativas QU-), oraes relativas, topicalizaes, concordncia e foco
(QUADROS; KARNOPP, 2004).
Referncias Bibliogrficas
BATTISON, R. Lexical borrowing in American Sign Language. Silver Springs: Linstok, 1978. BATTISTI, E.; VIEIRA, M.J.B. O sistema voclico do portugus. In: BISOL, L. (org.), Introduo a estudos de fonologia do portugus brasileiro. Porto Alegra: EDIPUCRS, 2005. BISOL, L. Harmonizao Voclica. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ. Dissertao de mestrado, 1981. CAGLIARI, L.C. Anlise fonolgica: introduo teoria e prtica com especial destaque para o modelo fonmico. Campinas: Mercado de Letras, 2002. CMARA JR, J. M. Estrutura da Lngua Portuguesa. Petrpolis: Vozes, 1970. CHOMSKY, N.; HALLE, M. The sound pattern of english. New York: Harper & Row, 1968. FERREIRA-BRITO, L. O discurso ideolgico das filosofias educacionais para surdos e sua lngua dos sinais. Revista GELES. n. 4, v. 4, p. 22-44, 1990. FERREIRA-BRITO, L. Por uma gramtica de lngua de sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1995. GOLDSMITH, J. A (ed). Phonological theory: the essential readings. Oxford: Blackwell Publishers, 1999. HYMAN, L. M. Phonology: theory and analysis. New York: Holt, Rinehart & Winston, 1975. KARNOPP, L.B. Aquisio fonolgica na Lngua Brasileira de Sinais: estudo longitudinal de uma criana surda. 1999. 274 f. Tese (Doutorado em Lingstica e Letras) Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1999. KARNOPP, L.B. Sign phonology acquisition in Brazilian Sign Language. In: QUADROS, R.M. (Org.) 9th Theoretical Issues in Sign Language Research TISLR9. Petrpolis: Arara Azul, 2008. p. 209-23. LAMPRECHT, R.R. Aquisio fonolgica do portugus: perfil de desenvolvimento e subsdios de terapia. Porto Alegre: Artmed, 2004. PRINCE, A.; SMOLENSKY, P. Optimality theory: constraint interaction and generative grammar. Report n. RuCCS-TR-2. New Brunswick: Rutgers University Center for Cognitive Science, 1993.
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QUADROS, R.M.; KARNOPP, L.B. Lngua de sinais brasileira: estudos lingsticos. Porto Alegre: Artmed, 2004. RABELO, A.S. Libras: aspectos lingsticos e usos na terapia fonoaudiolgica bilnge. Estudos, Goinia, v. 33, n. 5/6, p. 369-84, maio/jun. 2006. STAMPE, D. A dissertation on natural phonology. 1973. Tese de Doutorado em Letras) Chicago University, 1973. STOKOE, W.C. et al. A dictionary of American Sign Language on linguistic principles. Washington: Gallaudet College Press, 1960. VALIANTE, J.B.G. Lngua Brasileira de Sinais: reflexes sobre a sua oficializao como instrumento de incluso dos surdos. 2009. 97 f. Dissertao (Mestrado em Lingstica) Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009. YAVAS, M.; HERNANDORENA, C.L.M.; LAMPRECHT, R.R. Avaliao fonolgica da criana. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1991.
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TEORIAS LITERRIAS
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Caro (a) aluno (a),
A partir de agora, voc vai cursar a disciplina Teorias Literrias. Para compreender o texto literrio,
consideraremos algumas abordagens tericas. Voc deve ser receptivo teoria. atravs da teoria que o
homem procura explicar algum fenmeno. Portanto, atravs da teoria da literatura que o homem procura
explicar os textos literrios. Mas, antes de vermos algumas abordagens tericas que procuram explicar a
literatura, vamos pensar. Voc sabe dizer o que Literatura?
Literatura uma palavra de muitos significados. A palavra Literatura pode ser usada para designar
um conjunto de obras literrias de um pas (ex.: a literatura alem...) ou de uma poca (ex.: na literatura
modernista, o fluxo da conscincia...), a bibliografia referente a um assunto (aps consultar a literatura que
versava sobre botnica...).
Na acepo que nos interessa mais, devemos entender literatura como o resultado do ofcio de
quem trabalha a palavra de forma artstica. O texto literrio uma manifestao artstica. Essa
manifestao artstica fruto da inventividade, criatividade, observao, fantasia.
em decorrncia dessa manifestao artstica, desse conhecimento, que o homem passou a
teorizar sobre a literatura.
Desde a antiguidade o homem teoriza sobre o texto literrio. H uma teoria que procura classificar
os textos literrios em gneros.
A palavra gnero significa origem, classe, espcie, gerao. As obras Literrias so classificadas em
gneros, os gneros literrios. Os gneros literrios so trs: gnero pico, gnero dramtico, gnero lrico.
Cada gnero literrio tem suas caractersticas.
PESQUISE:Para ampliar seus conhecimentos sobre os
significados da palavra literatura, consulte AGUIAR E SILVA, Vitor Manuel de. Teoria da Literatura. So
Paulo: Martins fontes, 1976. Disponvel em: http://www.ufrgs.br/proin/versao_1/aguiar/index.html. Consulte tambm o verbete Literatura em um
dicionrio e/ou um site de busca/pesquisa.
TEORIAS LITERRIAS
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UNIDADE 1
GNERO PICO
O gnero pico tambm chamado de gnero narrativo caracteriza-se por um conjunto de
categorias. Essas categorias so:
- O narrador quem conta a histria;
- Personagens So aqueles
(Woman Reading 1875 Pierre Auguste Renoir)
/pessoas que vivenciam a ao;
- Tempo a durao da histria;
- Espao o lugar onde os personagens desenvolvem a ao;
- Enredo o conjunto dos fatos que compem a histria.
O que diferencia o gnero pico/narrativo dos demais gneros o narrador.
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Na pintura v-se uma mulher lendo um livro. O livro apresenta uma histria. Esta histria contada
por algum. O narrador quem conta uma histria.
Ateno: O narrador responsvel pelos valores transmitidos ao longo do enredo. Mas, o narrador
no o escritor. O narrador no pode ser confundido com quem escreve um texto literrio
Vamos ler um fragmento do conto Cabelos compridos do escritor Monteiro Lobato:
O conto fala de uma moa. Essa moa se chama Das Dores. Ela a personagem do conto. Quem
fala sobre Das Dores o narrador. O narrador no participa da histria. Mas, d opinies sobre Das Dores.
Na teoria Literria classifica-se o narrador que no participa da histria de heterodiegtico.
Reflita: O narrador diz que Das Dores uma pessoa sem muita inteligncia. Ser que ele precisaria
citar Schopenhauer para dizer isso? Schopenhauer um filsofo. Voc sabe o que faz um filsofo? Voc
conhece Schopenhauer?
Agora vamos ler um fragmento do romance O triste fim de Policarpo Quaresma do escritor Lima
Barreto:
- Coitada da Das Dores, to boazinha...
Das Dores isso, s isso - boazinha. No possui outra qualidade. feia, desengraada, inelegante, magrrima, no tem seios nem cadeiras nem nenhuma rotundidade posterior; pobre de bens e de esprito; filha daquele Joaquim da Venda, ilhu de burrice ebrnea - isto dura como o marfim. Moa que no tem por onde se lhe pegue fica sendo apenas isto - boazinha.
- Coitada da Das Dores, to boazinha...
S tem uma coisa a mais que as outras - cabelo. A fita da sua trana toca-lhe a barra da saia. Em compensao, suas idias medem-se por fraes de milmetro, to curtinhas so. Cabelos compridos, idias curtas - j o dizia Schopenhauer.
Como lhe parecia ilgico com ele mesmo estar ali metido naquele estreito calabouo? Pois ele, o Quaresma plcido, o Quaresma de to profundos pensamentos patriticos, merecia aquele triste fim? (...)
No estava ali h muitas horas. Fora preso pela manh, logo ao erguer-se da cama; e, pelo clculo aproximado do tempo, pois estava sem relgio e mesmo se o tivesse no poderia consult-lo fraca luz da masmorra, imaginava podiam ser onze horas
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O romance tem muitos personagens. O personagem central Policarpo Quaresma. A histria gira
em torno dele. Ele o protagonista. O narrador fala sobre o protagonista, o que acontece com ele, sobre
seus pensamentos e etc. O narrador no participa dessa histria. O narrador heterodiegtico.
Leiamos outro fragmento. Desta vez do romance So Bernardo do escritor Graciliano Ramos.
O romance So Bernardo fala da vida de Paulo Honrio. Paulo Honrio um personagem. Ele o
protagonista. Ele quem narra sobre sua vida. Paulo Honrio tambm o narrador. O narrador, que
Paulo Honrio, participa da histria. Na teoria literria, classifica-se o narrador que participa da histria e
protagonista de narrador autodiegtico. Se o narrador uma personagem, mas no o protagonista a
teoria literria o classifica como narrador homodiegtico.
Resumo da lio:
O gnero pico tambm chamado de gnero narrativo.
O gnero pico caracteriza-se por um conjunto de categorias.
A categoria que distingue o gnero pico dos demais gneros a categoria do narrador.
O narrador quem conta uma histria.
O narrador pode ser classificado como heterodiegtico ou homodiegtico ou autodiegtico.
Antes de iniciar este livro, imaginei constru-lo pela diviso do trabalho.
Dirigi-me a alguns amigos, e quase todos consentiram de boa vontade em contribuir para o desenvolvimento das letras nacionais (...)
Estive uma semana bastante animado, em conferncia com os principais colaboradores, e j via os volumes expostos, um milheiro vendido (...)
Abandonei a empresa, mas um dia deste (...) iniciei a composio de repente, valendo-me dos meus prprios recursos e sem indagar se isto me traz qualquer vantagem, direta ou indireta (...)
Aqui sentado mesa da sala de jantar, fumando cachimbo bebendo caf, suspendo s vezes o trabalho moroso, olho a folhagem das laranjeiras que a noite enegrece, digo a mim mesmo que esta pena um objeto pesado. No estou acostumado a pensar.
Comeo declarando que me chamo Paulo Honrio, peso oitenta e nove quilos e completei cinqenta anos pelo So Pedro. A idade, o peso, as sobrancelhas cerradas e grisalhas, este rosto vermelho e cabeludo tm-me rendido muita considerao. Quando me faltavam estas qualidades, a considerao era menor.
LETRAS LIBRAS | 53
REFLITAVoc j sabe o que o protagonista. O protagonista o personagem principal. Voc tambm j sabe o que o narrador. O narrador quem conta a histria. Agora releia com calma e ateno o fragmento do conto Cabelos Compridos do escritor Monteiro Lobato. Das Dores uma protagonista? Por qu? Das Dores quem narra a histria? Discuta com os seus colegas.
O Projeto Nupill disponibiliza na internet a ntegra do romance O triste fim de Policarpo Quaresma. Caro aluno surdo e ouvinte, acesse o link a seguir e procure ler esta, que uma obra representativa da literatura brasileira: http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/quaresma.html. H tambm uma adaptao flmica deste romance. Voc pode assisti-lo noyou tube e, assim, complementar o seu entendimento acerca do enredo.
Agora sua vez
PESQUISAR:O texto de Lima Barreto aborda um perodo importante da
histria do Brasil. O romance O triste fim de Policarpo Quaresma uma crtica a esse perodo histrico brasileiro.
Procure na internet informaes a esse respeito e amplie o seu conhecimento.
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UNIDADE 2
GNERO DRAMTICO
O gnero dramtico feito para ser representado no teatro. Os personagens agem. Os
personagens so responsveis pelo desenvolvimento da ao. Por isso, o texto dramtico no precisa de
um narrador para contar a histria. A base do texto dramtico o dilogo. No texto dramtico os
personagens dialogam entre si e desenvolvem a ao.
Vamos ler um trecho da pea O pagador de promessas de Dias Gomes.
Z
(Olhando a igreja). essa. S pode ser essa.
Rosa para tambm, junto dos degraus, cansada, enfastiada e deixando j entrever uma revolta que se avoluma.
Rosa
E agora? Est fechada.
Z
cedo ainda. Vamos esperar que abra.
Rosa
Esperar? Aqui?
Z
No tem outro jeito.
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Rosa
(Olha com uma raiva e vai sentar-se num dos degraus. Tira o sapato). Estou com cada bolha dagua no p que d medo.
Z
Eu tambm (Num ricto de dor, despe uma das mangas do palet.). Acho que meus ombros esto em carne viva.
Bem feito. Voc no quis botar almofadinhas, como eu disse.
Z
(Convicto) No era direito. Quando eu fiz a promessa. No falei em almofadinhas.
Rosa
Ento: se voc no falou, podia ter botado; a santa no ia dizer nada.
Z
No era direito. Eu prometi trazer a cruz nas costas, como Jesus. E Jesus no usou almofadinhas.
Este fragmento que voc acabou de ler um dilogo entre Z-do-Burro e sua esposa, Rosa. Eles
so personagens. O dilogo entre Z-do-Burro e Rosa no precisa ser apresentado por um narrador. O que
diferencia o gnero dramtico dos demais gneros a ao associada predominncia quase que absoluta
de dilogos.
Outra caracterstica do gnero dramtico o conflito. O conflito a oposio entre foras. Essas
foras/vontades acreditam na legitimidade de suas aes. O gnero dramtico se desenvolve a partir do
choque entre duas vontades, gerando o conflito dramtico.
No caso da pea O Pagador de Promessas, a vontade de Z-do-Burro de cumprir sua promessa. A
promessa a de colocar uma cruz no altar da igreja de Santa Brbara. A promessa foi feita em um terreiro
de Candombl. Para o padre da igreja de Santa Brbara, a promessa de Z-do-Burro no legitima porque
no foi feita de acordo com o ritual catlico. O padre representa o ponto de vista da igreja catlica.
Percebe-se um conflito: Z-do-Burro quer colocar a cruz dentro da igreja e o padre no quer deixar.
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Z
(Em desespero.) Mas, padre, eu prometi levar a cruz at o altar-mor! Preciso cumprir a minha promessa!
Padre
Fizesse-a ento numa igreja. Ou em qualquer parte, menos num antro de feitiaria.
Z
Eu j expliquei...
Padre
No se pode servir a dois senhores, a Deus e ao Diabo!
Z
Padre...
Padre
Um ritual pago, que comeou num terreiro de candombl, no pode terminar na nave de uma igreja!
Z
Mas, padre, a igreja...
Padre
A igreja a casa de Deus. Candombl o culto do Diabo!
Z
Padre, eu no andei sessenta lguas para voltar daqui. O senhor no pode impedir a minha entrada. A igreja no sua, de Deus!
Padre
Vai desrespeitar a minha autoridade?
Z
Padre, entre o senhor e Santa Brbara, eu fico com Santa Brbara.
Padre
(Para o Sacristo.) Fecha a porta. Quem quiser assistir missa que entre pela porta da sacristia. L no d para passar essa cruz. (Entra na igreja.)
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Resumo da lio:
O gnero dramtico feito para ser encenado no teatro.
O gnero dramtico fundamenta-se na ao direta dos personagens, no precisando de um
narrador para contar a histria.
Os dilogos entre os personagens tambm so um fundamento do gnero dramtico.
A predominncia quase que absoluta de dilogos um trao distintivo do gnero dramtico em
relao aos demais gneros.
Outra caracterstica do gnero dramtico o conflito.
Por conflito deve-se entender a oposio entre foras/vontades que acreditam na legitimidade
de suas aes.
Muitas obras literrias dos gneros pico e dramtico viraram filme. Pesquise na internet e descubra informaes sobre quais textos literrios foram adaptados para o cinema. Afinal, os filmes que so a