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    O objeto e a experincia material

    Marcus Dohmann

    O artigo enfoca os objetos como companheiros nas experincias da vida cotidiana,

    conectando os mundos emocionais ao espao mental dos indivduos, mediante

    suas funes e simbolismos, caracterizando-os como verdadeiros predicados da

    cultura.

    Cultura material, objeto, espao, consumo.

    A R T I G O S M A R C U S D O H M A N N

    Have nothing in your houses which you do

    not know to be useful or believe to be

    beautiful.

    William Morris. The beauty of life, 1880

    A alma das coisas

    gua, comida e abrigo. Essas, em tese, deve-riam resumir as necessidades bsicas do ho-mem. Das rudimentares coberturas corpo-rais, dos adereos feitos com restos de ossose, eventualmente, das pinturas corporais e dos

    registros rupestres, tivemos que migrar atra-vs dos mais severos climas e tipos de terre-nos em nossa caminhada pela evoluo ma-

    terial. As necessidades de subsistncia e dedeslocamento apresentaram os desafios ne-cessrios que motivaram o ser humano naconstante busca de novas ideias na esfera damaterialidade, para sua sobrevivncia.

    Forma e contedo compuseram os fatoresque, juntos, podem responder a muitas ques-

    tes sobre a natureza dos objetos, sejam

    naturais ou fabricados pelo homem. Enten-dendo que o fundamento principal entre ohomem e o meio dado pela tcnica, pode-se afirmar que as tcnicas so um conjuntode meios instrumentais e sociais com os quaiso homem constri sua vida atravs dos sis-

    temas de objetos. O objeto traduz em suamaterialidade a inteno do ato preexistente

    que lhe deu origem, e sua forma produtode uma performance imaginada at mesmoantes de sua prpria configurao fsica.

    No princpio, tudo eram coisas, enquantoatualmente tudo tende ao objeto. O meionatural era utilizado pelo homem sem gran-des interferncias ou transformaes. Tc-nicas e trabalho humano gozavam de comu-nho com as ddivas da natureza, emrelacionamento intenso e sem qualquer me-diao. Hoje, no entanto, a prpria natureza

    transforma-se em objeto, quando o homemse utiliza de suas ddivas com finalidadessociais, atribuindo-lhes valor, como no casodos mais recentes movimentos ecolgicos.

    Consolida-se, ento, de forma vital, a pre-sena do objeto na existncia humana. Dosrsticos vasilhames organizao pessoaldefinitiva do indivduo conectado ao ciber-espao nas grandes urbes atuais, estamoscercados por uma materialidade sem fim.Objetificados.1Literalmente coisificados.

    Camisas, calas, calados, relgios, talheres,copos, pratos, cadeiras, mesas, armrios, pa-pis, canetas, computadores, agendas, tele-visores, carros, barcos, avies, casas, edi-fc ios. A lista interminvel.

    Objetos, coisas, troos e tralhas. Todos es-to repletos de sentidos e significados, e at

    Marcus Dohmann

    Objetos, coisas, troos e

    tralhas...Fonte: Fotos do autor e de arquivos

    royalty free.

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    ressignificaes por aqueles que lhes atribu-em valores e simbolismos, frutos das expe-rincias intersubjetivas e interativas dos indi-vduos, entre si e com o resto do mundo.

    Em meio s vrias dimenses que o objetoencerra, encontramos um eco dagestualidade humana, de forma mais flagran-te em sua dimenso tico-esttica. Criar,desenvolver, construir e operar formam umconjunto de aes pertinentes aos mais va-riados objetos, em distintos lugares. O obje-to reflete simbolismo que envolve universosmentais, em atribuies de sentidos carac-terizados por fluxos imagticos de diferen-tes graus de subjetividade, desde simplesexperincias de estar no mundo at a auracriada pelo prprio artefato, em sua condi-o de cone, na tarefa de comunicar expe-rincias culturais.

    O fluxo de sentidos e imagens que os obje-tos veiculam atravs dos canais de comuni-cao capaz de despertar aspectos singu-lares das reminiscncias dos indivduos, re-cordaes de vivncias passadas que alter-nam tenses entre esquecimentos e lem-branas, a partir do contato da materialidadedo objeto com os sentidos e sensaes pos-sveis que ele encerra.

    Objetos ou coisas sempre remetem a lem-branas de pessoas ou lugares, desde umafotografia at um simples adereo corporal.Os objetos nos conectam com o mundo.Mostram-se companheiros emocionais e in-telectuais que sustentam memrias, relacio-namentos; alm de provocar constantemen-te novas ideias.

    Dessa forma pode-se dizer que existe, semdvida, uma alma nas coisas, remetendo apaisagens subjetivas em que encontramos ossujeitos [re]situados pelos objetos, median-te os aspectos memoriais que as coisas en-cerram enquanto expresso da materialidadeda cultura de determinado grupo social, em

    razo do fortalecimento de suas razes e seusvnculos com o espao em que se situam.

    O objeto , portanto, prova documental queimprime suas marcas nos indivduos, crian-do interna e externamente um processo di-nmico, comunicativo e intercultural.

    Uma presena constante

    Etimologicamente, objeto, do latim objectume do alemo Gegenstand, Objektou Ding,significa atirar contra, o que est do ladooposto, fora de ns. O elemento que resis-

    te ao sujeito.Henri Focillon defende a ideia de que ascoisas seriam ddivas da natureza, enquantoos objetos resultam do trabalho humano,pois pelo fato de a natureza ser objetiva, eno prospectiva, as coisas no podem terpropsito nem projeto. A constituio ma-

    terial, de fato, caracteriza a realidade do ob-jetoper se. Se tomado isoladamente, teriaum valor apenas como coisa, porm assu-me um valor como dado social, determina-do por sua existncia relacional.

    Abraham Moles, em Teoria dos objetos, afir-ma que o objeto configura-se como um ele-mento do mundo exterior, fabricado pelohomem, podendo ser assumido ou manipu-lado. O autor entende que os objetos exer-cem, prioritariamente, propriedades comomobilidade e independncia, explicando queuma faca de slex torna-se um objeto, en-quanto o slex em sua forma natural no o.2 Essa definio no compactuada porBaudrillard, para quem o objeto passa a ser

    traduzido por extenso inventrio de artefa-

    tos e coisas que o homem utiliza em sua vidacotidiana. Os objetos, ressalta Baudrillard,transcendem a fenomenologia da vida coti-diana, estendendo-se aos conceitos de sm-bolo e signo.3

    Barthes,4insatisfeito com as definies en-contradas, parte de dois conceitos diferen-

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    tes para melhor compreender o objeto, di-vidido em duas conotaes distintas, uma decarter existencial, externa ao indivduo e,por sua vez, direcionada ao subjetivismo; eoutra, tecnolgica, segundo a qual o objetose define como o que fabricado, como ele-mento de consumo, direcionado ao social.

    parte da discusso, Henri Lefebvre afirmaque o objeto no bom nem ruim, sendosua principal caracterstica a relatividade.5Ohomem agrega simbologias aos objetos, o que,de acordo com Moles, se trata de fato cotidi-ano, e estarmos rodeados de objetos, lem-bra, simples constatao. Imaginamos, cria-mos, desenvolvemos e construmos objetos,e essa tem sido a maneira como moldamos eparticipamos do processo civilizatrio.

    Na verdade no h nada mais banal do queo objeto em si. Como afirma Sahlins,6ne-nhum objeto, nenhuma coisa ou tem mo-vimento na sociedade humana, exceto pelasignificao que os homens lhe atribuem.O objeto tem presena garantida em todosos lugares, assumindo diversas configuraes,nas mais variadas funcionalidades, do dese-

    jvel ao intil.

    Argan7afirma que todo objeto efeito deuma causa e, de acordo com Baudrillard,todas as sociedades humanas sempre orga-nizaram seu cotidiano atravs da produoe do uso dos objetos, obrigando o homema estabelecer sempre novas categorias designificados para classificar os objetos con-forme suas necessidades. Nesse sentido, elespodem ser objetos domsticos, pblicos,modernos, barrocos, folclricos, exticos,religiosos, masculinos, femininos, em infin-

    dvel taxonomia.Cores, materiais e designajudam a configurarestilos e modelos, aos quais atribumos umasrie de significaes que, paralelamente, nosajudam a estabelecer uma noo de tempo.Como lembra Baudrillard, no se trata, cla-ro, do tempo real, porm, atravs dos signos,

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    Do slex ao chip

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    sugere indcios culturais que ajudam a situ-los no tempo. Dessa forma teremos umatipologia que classifica os objetos como anti-gos, modernos ou contemporneos. Essa cro-nologia refere-se ao tempo atual, no qual nossituamos, pois qualquer inverso nesse senti-do se poder dar de forma repentina; o que contemporneo hoje poder transformar-se em antigo ou obsoleto, em breveretornando contemporaneidade (voltar moda). Kant8j escrevia que os objetos mu-dam e criam diferentes geografias em dife-rentes pocas, dando o entendimento de que

    o objeto pode variar de significao ao longodo tempo, estabelecendo novas relaes, in-dependente de suas propores originais.

    Os objetos j no possuem morfologia pa-dronizada, sendo apresentados, representa-dos ou imaginados de forma distinta em cadalugar, ganhando muitas vezes significados di-ferentes,9de acordo com a imaginao e aodos sujeitos. Aos objetos so atribudos va-lores simblicos que se relacionam com oscontextos nos quais esto inseridos, seja foraou dentro do espao estritamente orienta-do pelo senso comum ou mesmo pelas con-venes sociais. Um objeto pode superar suafuno prtica, comunicando informaes,como afirma Barthes, pois h sempre umsentido que transborda de seu uso.10

    De acordo com Ernest Dichter, os objetosque nos cercam no tm apenas aspectosutilitrios, porm, mais do que isso, atuamcomo espelhos que refletem nossas pr-prias imagens. As coisas com que convive-mos no dia a dia influenciam diretamente

    nosso comportamento social.

    11

    Em termosde importncia, podemos afirmar que osbens materiais sofreram aumento sem pre-cedentes no contexto da existncia huma-na. Nunca tivemos tantos objetos como te-mos agora. Nossas casas esto repletas deobjetos, dos quais nos vemos cada vez maisdependentes. Atualmente os objetos, de di-

    ferentes maneiras, determinam como deve-mos andar, comer, sentar, olhar uns aos ou-

    tros e, sobretudo, nos relacionar.12

    Espao, complexidades e inter-relaes

    O espao impe aos objetos uma lgica quemuitas vezes passa a ser redefinida apesarde suas vocaes originais. Todo espaoconsiste em um conjunto de objetos e suasinter-relaes, que, em suas constantes trans-formaes, materializam novas funes na

    tessitura social.

    Sistemas de objetos e sistemas de aesconformam o espao de forma indissocivele solidria. Atualmente temos um espaoformado por sistema de objetos cada vezmais artificial, permeado por sistema de aesigualmente artificial, devido total interaoentre ambos. De um lado vemos os objetoscomo condicionantes da maneira como sedo as aes e, de outro lado, o sistema deaes como motor do desenvolvimento denovos objetos ou mesmo da transformaode objetos preexistentes.13A poltica e a

    prtica de competitividade levam a esse en-velhecimento precoce do inventrio de ob-jetos tcnicos que nos cercam. Dessa formao espao estabelece sua dinmica, com baseem constante renovao.

    Segundo Giles Simondon,14quanto mais osobjetos se aproximam da natureza, maisimperfeitos so, e, ao contrrio, quanto mais

    tecnicizados, mais perfeitos sero. Enquantoprodutos da cincia e da tecnologia, os ob-

    jetos tcnicos aspiram, atravs de sua preci-so funcional, perfeio maior do que a da

    prpria natureza, constituindo, de modonico, as bases materiais para o empreendi-mento de aes mais representativas denosso perodo atual.

    Os objetos permitem as mais diversas clas-sificaes, dependendo dos aspectos que sedeseja avaliar.15 Pode-se estabelecer uma

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    primeira classificao a partir das condiesfuncionais e estruturais de um objeto. Se-gundo Moles, os objetos possuem dois n-veis de complexidade, um funcional, ligadoao repertrio de funes combinadas parao uso (dimenso estatstica do uso), e outroestrutural, entendido como informao, uti-lizado para comunicar-se com outros obje-

    tos. Complexidade estrutural e complexida-de funcional so, portanto, as dimensesessenciais da materialidade no mundo, defi-nidas pelo ser humano para os objetos, per-mitindo, dessa forma, traar um mapa do

    mundo dos objetos.16

    A determinao funcional poder implicardiversas outras classificaes, dependendodos aspectos que devam ser realados. Ob-

    jetos naturais, tcnicos, de arte e de design17

    so apenas parte integrante de um estudodemogrfico maior dos objetos, empreen-dido para o reconhecimento de uma verda-deira ecologia de objetos.18

    Todo objeto possui lgica prpria, advindade sua unidade. Sua eficincia pode ser au-

    mentada ou diminuda se alterarmos par-tes de sua estrutura ou funcionalidade. Mil-ton Santos chama a ateno pa ra ainseparabilidade do continente e do con-

    tedo, quando assevera que a separaodestri a unidade de um e de outro.19

    Baudrillard lembra que os objetos atuaismantm carter de interdependncia muitoforte, no funcionando isoladamente. Trata-se de um todo cujas partes s so viveisquando em conjunto, como descreve Hegel20

    uma coisa tem propriedades, e essas es-

    to principalmente nas relaes com as ou-tras coisas.

    O tempo dos objetos

    As tcnicas contam a histria dos objetosna trajetria do homem atravs dos tem-pos, datando a materialidade artificial

    construda pelo homem em seus mais di-versos segmentos, da produo comuni-cao, da sociabilidade subjetividade. Se-gundo Leroi-Gourhan, o capitalismo vai con-tribuir para a acelerao do processo queleva internacionalizao das tcnicas, emsua globalizao, no mais como tendnciaa ser seguida, mas como fato.21

    A inovao tecnolgica influencia fortementeos objetos tcnicos que empreendem cons-tantes renovaes e perdem meteoricamenteseu valor. Barthes22ressalta que os objetos

    cuja morte anunciada desde o nascimentoformam um sistema de moda em que a re-novao passa a ser totalmente intencional.Moles lembra que o uso dos objetos cotidia-nos uma memria datada e inscrita na du-rao cultural em que vivemos.

    O objeto um entrave na estrada da

    evoluo cultural. O novo sedimenta-

    se na cultura, e o objeto impe-se ao

    exame crtico pelo seu descalabro cul-

    tural, fenmeno linear, mas apresentan-

    do aceleraes que so a marca da

    emergncia de novos estmulos.23

    Entre papis simblicos e funcionais, cabeestudar os objetos como sistemas e nocomo simples agrupamentos ou colees,pois sua utilidade, seja no presente, passadoou futuro, advm de seu uso combinadopelos grupos humanos que os criaram e her-daram das geraes anteriores. Apesar de aideia de tempo ser inseparvel da ideia dosobjetos e de seu valor, cabe lembrar que setorna muito difcil discutir a idade social deum objeto, visto que o envelhecimento moraldepende de um jogo de fatores que no revelado com antecedncia, pois a conexoexistente entre os objetos conferida peloseventos, materiais ou no.24

    Outra noo importante que podemos as-sociar ao tempo est focada no tamanho do

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    objeto, pois comum sermos induzidos aavaliar seu grau de complexidade relacionan-do-o diretamente a essa varivel. Apesar daconvivncia e das aes colaborativas entreas dimenses da miniaturizao e dogigantismo nos objetos, podemos atualmenteobservar acirrado investimento naatomizao das tecnologias para produode sistemas de objetos invisveis a olho nu.

    Todo e qualquer perodo histrico contacom um conjunto correspondente de tcni-cas e tecnologias que o caracterizam, bem

    como um sistema correspondente de obje-tos como resposta. Moles afirma que o pa-pel do objeto duplamente mediador, pois,alm de se colocar entre o homem e a socie-dade, necessrio considerar tambm suasituao material. Por sua vez, Baudrillardcomplementa que no basta definir os obje-tos em sistemas, pois a descrio de um sis-tema de objetos depender da descrio deum sistema de prticas, caracterizando in-terferncia contnua entre as duas partes.

    Conforme explica Baudrillard, os objetos im-

    pem seu frentico ritmo e sua incessantesucesso ao homem atravs da multiplicidadedos vetores materiais, fazendo com que in-te rf ir am cons tant emente no espao,redefinindo sua configurao, estrutura, fisi-ologia, aparncia e, sobretudo, suas relaes.Da pequena variedade, da comunho e daanterior submisso aos artefatos, o sistemados objetos evoluiu, apoderando-se do nos-so cotidiano, em interao prtica sem qual-quer profundidade. A ideia de alienao, pro-posta por Marx, impe-se, na atualidade, de

    forma gradativamente mais forte, devido passividade com que aceitamos e consumi-mos os objetos tcnicos atuais.25

    Hoje assistimos criao de objetos com fun-es cada vez mais determinadas, compro-metendo eficcias com intencionalidades ab-solutamente cientficas, obedientes a uma l-

    gica muitas vezes estranha ao ser humano, arespeito da qual, diante da extrema funciona-lidade cujos fins muitas vezes nos escapam,Maffesoli exclamou: os objetos no mais nosobedecem. Trata-se de intencionalidademercantil, ao mesmo tempo, dotada de ge-nerosas doses de simbolismo26

    comum considerar objetos teis, estticos,necessrios ou mesmo simplesmente indul-gentes. Vivemos um tempo em que pensa-mos os objetos como companheiros paranossas emoes ou como provocadores de

    um pensamento. A noo de objeto evocativotraz tona esses dois tipos de abordagem,ressaltando a condio inseparvel do pensa-mento e da sensao em relao s coisas(objetos) materiais. Pensamos com os obje-

    tos que amamos e amamos os objetos sobreos quais pensamos. Nos tempos atuais, a so-ciedade humana experimenta total imersono culto aos objetos, que se renovam e mul-

    tiplicam aos milhares configurando nosso en-torno e influenciando profundamente nossasrelaes sociais.

    Entre coisas, troos e tralhas, o objeto atualconfirma seu papel como uma extenso dohomem, traduzido em objetividade externaao ser, convertendo e consolidando-se comoo instrumento material de sua existncia e,em paralelo, sinalizando outro mundopermeado pelo sentido, no qual desperta osigno, sempre transformado no espetculode uma funo.

    Marcus Dohmann docente do PPGAV/EBA/UFRJ e

    coordenador do Laboratrio do Ncleo Grfico do De-partamento de Comunicao Visual.

    Notas

    1 A objetificao faz com que um esquema conceitual setorne real, transformando o que era abstrato em ele-mento concreto. o processo que d materialidade sideias, tornando-as objetivas, concretas, tangveis.

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    2 Moles, Abraham. Teoria dos objetos. Rio de Janeiro: Tem-

    po Brasileiro, 1981: 27-28.

    3 O objeto tem autonomia de existncia, devido a sua di-menso material, mas no consegue imputar uma auto-nomia de significao, que provm das diferentes rela-es que mantm com os mais diversos eventos.

    4 Barthes, Roland. A aventura semiolgica. So Paulo: MartinsFontes, 2001.

    5 Berger, A. Arthur. What Objects Mean: An Introduction toMaterial Culture.Nova York: Left coast press, 2009: 69.

    6 Sahlins, Marshall. Cultura e razo prtica. Rio de Janeiro:Zahar, 2003: 170.

    7 Argan, Giulio C. Projeto e destino. So Paulo: Ed. tica,

    2000: 17.8 Apud Santos, op.cit.: 96.

    9 Segundo Barthes (2001:215), o objeto dito polissmico ofe-rece-se facilmente a vrias leituras no apenas de umleitor para outro como tambm pelo mesmo.

    10 Roland Barthes (2001:210) esclarece que a funo deum objeto torna-se sempre, pelo menos, o prprio sig-no dessa funo: nunca h objetos, em nossa sociedade,sem uma espcie de suplemento de funo.

    11 Ernest Dichter in Berger, 2009: 14.

    12 Sudjic, Deyan. The Language of Things: Understanding theWorld of Desirable Objects. New York: W.W. Norton& Company, 2009: 7-49.

    13 Os objetos preexistentes veem-se envelhecidos pela apa-rio dos objetos tecnicamente mais avanados, dota-dos de qualidade operacional superior.

    14 Apud Santos, op.cit.

    15 Baudrillard (Baudrillard, Jean. O sistema dos objetos. So

    Paulo: Perspectiva, 2002:10) afirma que existiriam qua-se tantos critrios de classificao quanto objetos: se-gundo a funcionalidade, tamanho, forma, matria, dura-bilidade, etc.

    16 Moles, op. cit.: 29.

    17 Bense apud Santos, op. cit.

    18 Santos, 2008, op. cit.: 69-70.

    19 A forma e o contedo existem separadamente apenascomo verdades parciais, abstraes que s reencon-

    tram seu valor quando vistas em conjunto (Ledrut apudSantos, Milton. A natureza do espao. So Paulo: Edusp,2008: 100).

    20 Apud Santos, 2008.21 A tendncia e o fato so as duas faces (uma abstrata,

    outra concreta) do mesmo fenmeno de determinismoevolutivo (Leroi-Gourhan, A. Evoluo e tcnicas. I Ohomem e a matria. Lisboa: Edies 70, 1984: 25).

    22 Apud Santos, 2008.

    23 Moles, op. cit.: 103.

    24 Santos, op. cit.: 158.

    25 Santos, op. cit.: 214.

    26 De acordo com Moles, objetos e necessidades esto in-terligados a partir de uma dialtica de estmulos e res-postas a estes estmulos, envolvidos, de um lado, por

    uma complexidade de necessidades e, de outro, poruma complexidade de sortimento, constituintes da di-menso do Homo Faber(in Moles, A. et al. (org.). Civi-lizao industrial e cultura de massas. Petrpolis: Vozes,1973: 17).