Revista de Psicopedagogia - Edicao_82

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CONSELHO EDITORIAL INTERNACIONAL Alicia Fernández - Argentina Carmen Pastorino - Uruguai César Coll - Espanha Isabel Solé - Espanha Maria Cristina Rojas - Argentina Neva Milicic - Chile Vitor da Fonseca - Portugal CONSELHO EDITORIAL NACIONAL Ana Lisete Rodrigues SP Anete Busin Fernandes SP Beatriz Scoz SP Débora Silva de Castro Pereira BA Denise da Cruz Gouveia SP Edith Rubinstein SP Elcie Salzano Masini SP Eloísa Quadros Fagali SP Evelise Maria L. Portilho PR Gláucia Maria de Menezes Ferreira CE Heloisa Beatriz Alice Rubman RJ Leda M. Codeço Barone SP Margarida Azevedo Dupas SP Maria Auxiliadora de Azevedo Rabello BA Maria Cecília Castro Gasparian SP CONSELHO EXECUTIVO Maria Irene Maluf SP Quézia Bombonatto SP Cristina Valdoros Quilici SP EDITORA Maria Irene Maluf SP Maria Célia Malta Campos SP Maria Cristina Natel SP Maria Lúcia de Almeida Melo SP Maria Silvia Bacila Winkeler PR Marisa Irene Siqueira Castanho SP Mônica H. Mendes SP Nádia Bossa SP Neide de Aquino Noffs SP Nívea M.de Carvalho Fabrício SP Regina Rosa dos Santos Leal MG Rosa M. Junqueira Scicchitano PR Sônia Maria Colli de Souza SP Telma Pantano SP Vânia Carvalho Bueno de Souza SP CONSULTORES AD HOC Ana Maria Maaz Acosta Alvarez Jaime Zorzi Lino de Macedo Lívia Elkis Luiza Helena Ribeiro do Valle Pedro Primo Bombonato Saul Cypel Sylvia Maria Ciasca

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Conselho editorial internaCional

Alicia Fernández - ArgentinaCarmen Pastorino - UruguaiCésar Coll - EspanhaIsabel Solé - EspanhaMaria Cristina Rojas - ArgentinaNeva Milicic - ChileVitor da Fonseca - Portugal

Conselho editorial naCional

Ana Lisete Rodrigues SPAnete Busin Fernandes SPBeatriz Scoz SPDébora Silva de Castro Pereira BADenise da Cruz Gouveia SPEdith Rubinstein SPElcie Salzano Masini SPEloísa Quadros Fagali SPEvelise Maria L. Portilho PRGláucia Maria de Menezes Ferreira CEHeloisa Beatriz Alice Rubman RJLeda M. Codeço Barone SPMargarida Azevedo Dupas SPMaria Auxiliadora de Azevedo Rabello BAMaria Cecília Castro Gasparian SP

Conselho exeCutivoMaria Irene Maluf SPQuézia Bombonatto SPCristina Valdoros Quilici SP

editora

Maria Irene Maluf SP

Maria Célia Malta Campos SPMaria Cristina Natel SPMaria Lúcia de Almeida Melo SPMaria Silvia Bacila Winkeler PRMarisa Irene Siqueira Castanho SPMônica H. Mendes SPNádia Bossa SPNeide de Aquino Noffs SPNívea M.de Carvalho Fabrício SPRegina Rosa dos Santos Leal MGRosa M. Junqueira Scicchitano PRSônia Maria Colli de Souza SPTelma Pantano SPVânia Carvalho Bueno de Souza SP

Consultores ad hoc

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PSICOPEDAGOGIA – Órgão oficial de divulgação da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp é indexada nos seguintes órgãos:

1) LILACS - Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde - BIREME

2) Clase - Citas Latinoamericanas en Cien-cias Sociales y Humanidades. Universidad Nacional Autónoma de Mexico

3) Edubase - Faculdade de Educação, UNI-CAMP

4) Bibliografia Brasileira de Educação - BBE CIBEC / INEP / MEC

5) Latindex - Sistema Regional de Informa-ción en Línea para Revistas Científicas de América Latina, El Caribe, España y Portugal

6) Catálogo Coletivo Nacional – Instituto Brasileiro em Ciência e Tecnologia – IBICT

Psicopedagogia: Revista da Associação Brasileira de Psicopedagogia /Associação Brasileira de Psicopedagogia. - Vol. 10, nº 21 (1991). SãoPaulo: ABPp, 1991-

Quadrimestral

ISSN 0103-8486

C o n t i n u a ç ã o , a p a r t i r d e 1 9 9 1 , v o l . 1 0 , n º 2 1 d e B o l e t i m d aAssociação Brasileira de Psicopedagogia.

1. Psicopedagogia. I. Associação Brasileira de Psicopedagogia.

CDD 370.15

7) INDEX PSI – Periódicos – Conselho Federal de Psicologia

8) DBFCC – Descrição Bibliográfica Fundação Carlos Chagas

Editora Responsável: Maria Irene Maluf

Jornalista Responsável: Rose Batista – 28.268

Revisão e Assessoria Editorial:Rosângela Monteiro

Editoração Eletrônica: Sollo Comunicação

Impressão: Sollo Press

Tiragem: 3.000 exemplares

O conteúdo dos artigos aqui publicados é de inteira responsabilidade de seus autores, não expressando, necessariamente, o pensamento do corpo editorial.É expressamente proibida qualquer modali-dade de reprodução desta revista, seja total ou parcial, sob penas da lei.

Associação Brasileirade Psicopedagogia

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Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 São Paulo - SP - Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567

diretoria da assoCiaçãoBrasileira de PsiCoPedagogia2008/2010

Conselheiras eleitas (2008/2010)Carla Labaki SPCleomar Landim de Oliveira SPCristina Vandoros Quilici SPEdnalva de Azevedo Silva RNEloisa Quadros Fagali SPEvelise Maria Labatut Portilho PRGaleára Matos de França Silva CEHeloisa Beatriz Alice Rubman RJJanaina Carla R. dos Santos GOJozelia de Abreu Testagrossa BALuciana Barros de Almeida Silva GOMaria Auxiliadora de A. Rabello BAMaria Cristina Natel SP

Maria Helena Bartholo RJMaria José Weyne M. de Castro CEMarisa Irene Siqueira Castanho SPMarli Lourdes da Silva Campos DFMiriam do P.S.F. Vidigal Fonseca MGNadia Aparecida Bossa SPNeusa Kern Hickel RSQuézia Bombonatto SPRosa Maria J. Scicchitano PRSilvia Amaral de Mello Pinto SPSonia Maria Colli de Souza SPYara Prates SP

diretoria exeCutivaPresidenteQuézia [email protected] Valdoros [email protected] Cecília Castro [email protected]ária AdministrativaMaria Teresa Messeder [email protected] CientíficaNádia Aparecida [email protected]

Diretora Científica AdjuntaMárcia Simõ[email protected] CulturalYara Marlene [email protected]ções PúblicasTelma [email protected]ções Públicas AdjuntaEdimara de [email protected]

Conselheiras vitalíCiasBeatriz Judith Lima Scoz SPEdith Rubinstein SPLeda Maria Codeço Barone SPMaria Cecília Castro Gasparian SPMaria Célia Malta Campos SP

Maria Irene Maluf SPMônica H. Mendes SPNeide de Aquino Noffs SPNívea Maria de Carvalho Fabrício SP

assessorias regionaisAssessora Regional Bahia Maria Angélica Moreira [email protected] Regional Ceará Maria José Weyne Melo de [email protected]

Assessora Regional Paraná Rosa Maria [email protected]

assessoriasAssessora de Divulgações CientíficasMaria Irene [email protected]

Assessora de Reconhecimento e Cursos Neide Aquino [email protected]

Associação Brasileirade Psicopedagogia

Editorial / Editorial ...................................................................................................................................................... 1

artigos origiNais / origiNal artiClEs

• Desenvolvimento sociomoral no contexto escolar: uma experiência com crianças do ciclo I - ensino fundamental

Sociomoral development in the school context: an experience with children from the first cycle - elementary school

Terezinha Ferreira da Silva Colombo; Carmen Lúcia Dias ...............................................................3

• Aspectos da avaliação neurológica em escolares disléxicos

Aspects of the neurological assessment in dislexic schoolchildren Maria Imaculada Merlin de Carvalho; Vanda Maria Gimenes Gonçalves; Carlos Eduardo de

Barros; Cíntia Alves Salgado; Simone Aparecida Capellini; Sylvia Maria Ciasca ........................15

• Interrelação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal

Interrelationship between phonological processing and reading comprehension in the 2nd to 4th grade of elementary school: a longitudinal study

Renata Mousinho; Jane Correa ........................................................................................................27

• Conhecimento das regras de correspondência grafo-fonêmicas por escolares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldades de aprendizagem

Knowledge of grafo-phonemic rules by students from 1st to 4th grades with and without learning difficulties

Natália Fusco; Simone Aparecida Capellini ....................................................................................36

• Dislexia e processamento sintático

Dyslexia and the syntactic processing Luciana Mendes; Marcus Maia; Gastão Coelho Gomes ................................................................47

• A memória de curto prazo do universitário e a prática de jogos: um estudo comparativo The university student short-term memory and the practice of games: a comparative study Oldemar Nunes; Vera Barros de Oliveira.........................................................................................59

rElato dE EXPEriÊNCia/EXPEriENCE rEPort

• Alunos com dificuldades na escrita: produção de sentidos subjetivos na oficina de palavras

Students with difficulties in writing: production of subjective sense of words in the workshop Beatriz Judith Lima Scoz; Deborah Regina Motta R. Lucchini ......................................................68

sumário

artigos EsPECiais / sPECial artiClEs

• A intervenção psicopedagógica institucional na formação reflexiva de educadores sociais

The institutional psychopedagogic intervention in the reflexive formation of social educators Sarah Cazella; Rinaldo Molina .........................................................................................................78

• Mediação escolar e inclusão: revisão, dicas e reflexões

Teacher assistant and inclusive education: review, tips and reflections Renata Mousinho; Evelin Schmid; Fernanda Mesquita; Juliana Pereira; Luciana Mendes;

Renata Sholl; Vanessa Nóbrega ........................................................................................................92

artigos dE rEVisÃo / rEViEw artiClEs

• Transtorno do desenvolvimento da coordenação: revisão de literatura sobre os instrumentos de avaliação

Developmental coordination disorder: literature review about assessment tools Cintia Sicchieri Toniolo; Simone Aparecida Capellini ..................................................................109

• Aspectos da relação cérebro-comportamento: histórico e considerações neuropsicológicas

Relationship between brain and behaviour: historical and neuropsychological considerations Sônia das Dores Rodrigues; Sylvia Maria Ciasca .........................................................................117

MoNograFia/MoNograPH

• A Psicopedagogia e o atendimento pedagógico hospitalar

Psychopedagogy and service educational hospital Michelle Cristina Carioca de Lima; Maria Cristina Natel ...........................................................127

rEsENHa / rEViEw

• A escrita ortográfica na escola e na clínica: teoria, avaliação e tratamento Writing in school ond clinical settings: theory, assessment ond treatment

Maria Célia Malta Campos; Rosa Maria Junqueira Scicchitano ................................................140

1º ENCoNtro dE aPErFEiÇoaMENto ProFissioNal E CiENtÍFiCo aBPP ....................................................153

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ABPP 30 Anos

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Em momentos como este, de comemorações e festividades, em que importantes eventos levam a público o desenvolvimento e os novos caminhos conquistados pela Psicopedagogia e pelas áreas que lhe são

afins, a produção científica se torna ainda mais representativa dessa época de grande e efervescente crescimento.

Impossível negar o mundo hiperativo do século XXI, das ciências que cumprem os mais fantásticos sonhos e prognósticos que se faziam do futuro, com seus aspectos positivos e negativos, mas, de toda forma, surpreendentemente transformadores da realidade e promotores de novos e cuidadosos olhares de quem trabalha com o cérebro e a mente humana.

”Ensinantes” e “Aprendentes” são seres em mudança e seu encontro se faz e fará cada vez mais a partir daquilo que distingue o humano das demais criaturas: a capacidade de gerar novos conhecimentos.

Nessas ocasiões marcantes, em que unir saberes e dissolver fronteiras delimitantes faz-se indispensável, trazemos a edição 82 da revista Psicopedagogia, com temas variados, mas absolutamente interligados pela atualidade de seus conteúdos.

Apresentamos inicialmente seis artigos originais, nos quais os autores apresentam suas mais recentes pesquisas. Abre esta edição, o trabalho de Terezinha Ferreira da Silva Colombo e Carmen Lúcia Dias, a respeito do “Desenvolvimento sociomoral no contexto escolar: uma experiência com crianças do ciclo I - ensino fundamental”, seguido pela pesquisa “Aspectos da avaliação neurológica em escolares disléxicos” (Maria Imaculada Merlin de Carvalho; Vanda Maria Gimenes Gonçalves; Carlos Eduardo de Barros; Cíntia Alves Salgado; Simone Aparecida Capellini; Sylvia Maria Ciasca). Complementando, temos o prazer de publicar o artigo “Interrelação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal”, de Renata Mousinho e Jane Correa, seguido pelo artigo de Natália Fusco e Simone Aparecida Capellini “Conhecimento das regras de correspondência grafo-fonêmicas por escolares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldades de aprendizagem”.

“Dislexia e processamento sintático” (Luciana Mendes; Marcus Maia e Gastão Coelho Gomes) acrescenta mais um estudo de importância à primeira parte

EDITORIAL

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Maria Irene Maluf Editora

desta edição, que se fecha com o trabalho de Oldemar Nunes e Vera Barros de Oliveira “A memória de curto prazo do universitário e a prática de jogos: um estudo comparativo”, que constitui uma pesquisa sobre um campo ainda pouco visitado por nós.

Um relato de experiência, sempre bem vindo à nossa revista pelo interesse que desperta nos leitores, está aqui representado com o trabalho de Beatriz Judith Lima Scoz e Deborah Regina Motta R. Lucchini “Alunos com dificuldades na escrita: produção de sentidos subjetivos na oficina de palavras”.

Em seguida, trazemos dois artigos especiais: “A intervenção psicopedagógica institucional na formação reflexiva de educadores sociais” (Sarah Cazella e Rinaldo Molina) e “Mediação escolar e inclusão: revisão, dicas e reflexões” (Renata Mousinho; Evelin Schmid; Fernanda Mesquita; Juliana Pereira; Luciana Mendes; Renata Sholl; Vanessa Nóbrega), de relevante atualidade.

Existe um particular interesse em artigos de revisão, por nortearem os leitores dentro do estudo de determinados temas e suas peculiaridades. “Transtorno do desenvolvimento da coordenação: revisão de literatura sobre os instrumentos de avaliação” (Cintia Sicchieri Toniolo e Simone Aparecida Capellini) e “Aspectos da relação cérebro-comportamento: histórico e considerações neuropsicológicas” (Sônia das Dores Rodrigues e Sylvia Maria Ciasca) são dois excelentes exemplos. É de Michelle Cristina Carioca de Lima e Maria Cristina Natel, o artigo ”A Psicopedagogia e o Atendimento Pedagógico Hospitalar” e que junto à resenha do livro de Sônia Moojen “A escrita ortográfica na escola e na clínica: teoria, avaliação e tratamento”, escrito a quatro mãos por Maria Célia Malta Campos e Rosa Maria Junqueira Scicchitano, nos dá uma especial forma de encerrar esta edição, pelos laços ricos e profundos que Sônia Moojen, Rosa Maria Junqueira Scicchitano, Maria Célia Malta Campos e Maria Cristina Natel têm com a história da ABPp nestes seus 30 anos .

Parabéns, vida longa e útil à ABPp e a todos e todas que, com seu empenho, trouxeram até 2010 esta Associação e a psicopedagogia brasileira e as tornaram nacional e internacionalmente reconhecidas e valorizadas.

Um abraço,

EDITORIAL

Desenvolvimento sociomoral no contexto escolar

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – O presente estudo tem como objetivo descrever situações vivenciadas no contexto escolar, tendo como foco principal a análise do pensamento e do desenvolvimento moral de um grupo de crianças, frente aos dilemas reais emergidos desta convivência. A fim de possibilitar esta análise, foram propostas ao grupo (por meio de assembleias) discussões e reflexões acerca das hipóteses sugeridas pelo grupo para cada dilema. A obra “O Juízo Moral na Criança”, de Jean Piaget, foi o alicerce no qual nos pautamos teoricamente na condução do trabalho. As crianças do grupo analisado têm entre sete e oito anos e pertencem a uma classe de 1ª série de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental (E.M.E.F.), situada na periferia da cidade de Marília, SP. Como instrumento de coleta de dados (dilemas) e análise do grupo, utilizamos a Entrevista Clínica Piagetiana, descrita por Juan Delval. Os dilemas reais experienciados são, em primeiro plano, estímulos para os sujeitos, pois suscitam um conflito entre diferentes tipos de normas, expondo a forma de pensamento frente a eles. Os dilemas selecionados para este estudo abarcam temas referentes à Cooperação, Agressão física e verbal e Constituição e cumprimento de regras. As respostas dadas pelos sujeitos durante as assembleias foram agrupadas em categorias e a análise permitiu conhecer, por meio de suas explicações, o seu pensamento e as propriedades que atribui à realidade. A participação das crianças na busca de resolução dos conflitos promoveu estímulos para o avanço em direção à autonomia moral do grupo.

UNITERMOS: Desenvolvimento moral. Comportamento social. Autonomia pessoal. Ética.

Desenvolvimento sociomoral no contexto escolar: uma experiência com crianças Do

ciclo i - ensino funDamental

Terezinha Ferreira da Silva Colombo; Carmen Lúcia Dias

Terezinha Ferreira da Silva Colombo – Pedagoga,

psicopedagoga e mestre em Educação pela UNESP;

coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental

II; docente do curso Superior em Pedagogia do IESG

“Instituto de Ensino Superior de Garça”, SP.

Carmen Lúcia Dias – Psicóloga, doutora em Educação

pela UNESP; membro do Grupo de Estudo e Pesquisa

em Epistemologia Genética e Educação (GEPEGE) -

UNESP, Marília, SP; docente e coordenadora de projetos

da Fundação para o Desenvolvimento do Ensino,

Pesquisa e Extensão – FUNDEPE – UNESP, Marília, SP;

docente do Curso de Pós-Graduação em Educação da

Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE).

Correspondência

Carmen Lúcia Dias

Rua Guanás, 70 - apto 151

Bairrro Montolar - Marília, SP - CEP- 17502-560

Tel 14 - 3454 2830

e-mail : [email protected]

colombo tfs & Dias cl

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INTRODUÇÃOO propósito deste trabalho é descrever si-

tuações vivenciadas no contexto escolar, por crianças de sete e oito anos, tendo como foco principal a análise do pensamento e do desen-volvimento moral deste grupo. As situações analisadas envolvem dilemas reais emergidos da convivência entre professor/aluno e aluno/aluno, ambos pertencentes a uma escola situada na periferia da cidade de Marília, SP. A fim de possibilitar a análise, de acordo com Arguís1, foi proposto ao grupo, por meio de assembleias de classe, discussões e reflexões acerca das hipóteses sugeridas pelo grupo como medida de resolução para cada dilema. O exercício do pensar em diversos âmbitos e possibilidades promove avanços morais determinados pela mediação do pesquisador em propor resoluções que provoquem conflitos cognitivos. Puig2 afir-ma que, à medida que os conflitos decorrentes das proposições oferecidas são resolvidos, o pensamento moral evolui em direção à autono-mia e à cooperação no ambiente escolar.

A preocupação da sociedade contemporâ-nea, e em especial dos educadores, perpetua-se no delineamento das relações sociais ad-vindas de situações de violência, intolerância, falta de limites, compreensão e respeito mútuo. Esses aspectos foram discutidos pela Comis-são Internacional da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), apresentados por Delors3, sobre a Educação para século XXI, onde foram des-tacados quatro pontos fundamentais: a busca pelo conhecimento, como aprendê-lo, aplicá-lo e as relações humanas. Piaget4, em seu livro “O Juízo Moral na Criança”, apresenta um estudo reflexivo sobre a moralidade humana e, por meio da conclusão de suas pesquisas empíricas, abre um campo de compreensão das relações morais, como o papel social do adulto e da criança. Conceitos como respeito mútuo e unilateral, cooperação, autonomia e heteronomia são descritos como causalidade de relações sociais estabelecidas nos diversos ambientes, dentre eles o da escola.

A (in)disciplina na escola é um assunto pes-quisado por vários autores5-7, por ter se tornado objeto de preocupação de professores e de demais membros ligados à instituição escolar (diretores, coordenadores pedagógicos, supervisores de ensino, entre outros). “As crianças e adolescentes mostram-se pouco acostumados a vivenciar e a respeitar os limites que visam assegurar a sobre-vivência de si e a do grupo no qual estão inseri-dos”7. A indisciplina é, em parte, produzida pelas relações interpessoais e esta poderá ser superada se promover um trabalho amplo relacionado aos aspectos sociais. Um dos pontos relevantes que se procura responder neste trabalho é: de que forma promover a interação do aluno com o outro; com o conhecimento e com a realidade, compreendendo seu nível de desenvolvimento moral e, ao mesmo tempo, propiciando-lhe situações para que este avance a estágios morais mais avançados? “Tra-balhando a formação moral dos alunos investindo na qualidade das relações sociais, organizando o convívio escolar de forma que seja a expressão da justiça e da dignidade”7.

Três aspectos importantes devem ser res-saltados neste contexto: o primeiro, ligado à transversalidade do tema moralidade, citado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)8, devendo ser abordado de forma intrínseca em todo o processo de escolarização; o segundo refere-se à importância de se desenvolver as atividades escolares em grupo, balizando-se nos conceitos de que, à medida que o trabalho suscita a iniciativa da criança, este se torna cole-tivo e a cooperação é exercida como importante componente na formação moral. Finalizando, o terceiro aspecto relaciona-se especificamente ao exercício de formação moral do self-govern-ment9, onde as crianças terão a possibilidade de aprender pela experiência o que é obediência à regra, a adesão ao grupo social e a responsa-bilidade individual.

Os sujeitos estudados nesta pesquisa têm entre 7 e 8 anos de idade e os objetivos do presente estudo perpassam pela resolução de dilemas reais surgidos no contexto escolar. Os dilemas são pautas das assembleias1, onde

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todos os alunos opinam, tendo em vista a esco-lha da melhor resolução para cada conflito. A escolha tomada como certa ou como a melhor, não significa que todos tenham tido a mesma opinião. Por meio do método clínico10 de Piaget, pode-se interpretar o caminho do pensamento moral percorrido por cada criança, sendo esses agrupados em categorias.

Piaget apresenta dois processos distintos em relação à gênese do juízo moral infantil. De um lado está a coação moral adulta, que colabora com a efetivação do egocentrismo, resultando uma noção puramente realista da regra e, por outro lado, a cooperação, que leva à descentra-ção e a uma compreensão interiorizada da regra. Sobre a relação de cooperação, Piaget4 estudou o desenvolvimento da noção de justiça, sendo esta advinda da cooperação e reciprocidade. A noção de justiça na criança se desenvolve mediante a prática do respeito mútuo e da solidariedade. Ligadas a essa noção estão dois tipos de sanções: a expiatória e a por reciproci-dade4. A primeira são ações que devem punir o indivíduo de forma a reconduzi-lo ao caminho da obediência, sendo o castigo proporcional à falta cometida, e a segunda sanção ligada à cooperação e às regras de igualdade. Contra-riamente às sanções expiatórias, as sanções por reciprocidade estabelecem uma relação de conteúdo e de natureza entre a falta e a punição.

Estudos realizados por vários autores11-14 cor-roboram a importância do ambiente sociomoral cooperativo na escola como sendo agente favo-recedor do desenvolvimento moral autônomo na criança. Esses autores desenvolveram em seus trabalhos um estudo profundo da obra de Piaget, interessados em compreender os dois grupos de fenômenos relativos à consciência e à prática das regras, descritos no jogo de bolinhas de gude. Esses estudos permitiram a explicação do processo de construção da capacidade de conhecer e julgar; ao exercício da cooperação, como também à passagem do respeito unila-teral e místico para o respeito mútuo e reci-procidade. Nesta linha de pesquisa, os autores puderam descrever o processo complexo sobre

a passagem do sujeito heterônomo (que tem a consciência do dever) para o sujeito autônomo (que desenvolveu a consciência moral), e as evidências sobre a interferência recíproca no desenvolvimento cognitivo e sociomoral do indivíduo. Foi possível, ainda, comprovar que as relações interpessoais, pautadas no respeito unilateral e coercitivo, impedem ou retardam o avanço em direção à autonomia moral e aquelas pautadas no respeito mútuo favorecem o desen-volvimento da autonomia moral.

As contribuições dessas pesquisas vêm alicerçar o presente estudo, na medida em que estas investigam os ambientes escolares e apontam um caminho na direção da educação, disposta a promover e a valorizar as relações entre as pessoas. Também, é claro, apresentam-se realidades opostas e vivenciadas no contexto escolar brasileiro, onde o enfoque maior da relação professor/aluno é o da passividade e submissão deste segundo, prevalecendo uma espécie de hierarquia e poder, conquistados por meio da coação. O trabalho de educação moral1,2,5,15 na instituição escolar, deturpado e perdido com o tempo, ganha novos direcio-namentos, permeados pela possibilidade de desenvolver no ser humano a capacidade de se relacionar e promover no outro um crescimento moral.

MÉTODO O trabalho com crianças e os procedimentos do método clínico de PiagetAs crianças, sujeitos desta pesquisa, perten-

cem a uma classe social de baixa renda econô-mica, que frequentam uma escola Municipal de Ensino Fundamental. Esta escola situa-se na periferia da cidade de Marília, SP, que atende cerca de quatorze bairros diferentes da zona sul. A pesquisa teve início no ano letivo de 2002, encerrando-se em dezembro do mesmo ano. O grupo estudado perfazia um total de 37 crianças, sendo 19 meninos e 18 meninas. A coleta de ma-teriais foi realizada por meio de registros diários feitos com a ajuda de gravador, de caderno-diário e de um(a) secretário(a), geralmente um aluno

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com facilidade na escrita. Este se manifestava ou era convidado para a função, onde anotava os assuntos principais e as decisões tomadas durante as assembleias1. A partir das investigações e dos relatórios diários, observou-se um rico material oriundo da convivência do grupo-classe, disposto na forma de dilemas2. No processo de condução da pesquisa, utilizou-se o método clínico10 piage-tiano, necessário para compreender as ações do sujeito, promover intervenções e interpretar seus significados. Uma característica básica do método clínico é a “intervenção sistemática do experi-mentador como reação às ações ou respostas do sujeito, e é sempre guiada pela tentativa de desco-brir o significado de suas ações ou explicações”10. Os procedimentos adotados que nortearam essa pesquisa de abordagem qualitativa perpassam pelo planejamento de ações que os sujeitos (pes-quisados) terão que desempenhar. Assim, essas ações ocorrerão de acordo com a proposta que se tem e que será apresentada ao sujeito.

O trabalho específico proposto nesta pes-quisa desenvolveu-se a partir da observação da dinâmica e participação dos alunos num ambiente democrático e cooperativo de sala de aula, porém, as situações e os impasses emergidos deste contexto eram merecedores de reflexão. Os impasses foram apresentados na forma de dilemas, como já foi descrito ante-riormente, tendo em vista que a apresentação e a experimentação dos dilemas reais são, em primeiro plano, estímulos para os sujeitos, pois estes geralmente suscitam um conflito entre tipos diferentes de normas, possibilitando um interrogatório acerca do mesmo. Essa estratégia abarca respostas variadas que apontam formas de pensamentos, expostas no momento da bus-ca de resoluções desses conflitos. As letras abre-viadas abaixo se referem aos nomes dos sujeitos (crianças). Os dilemas que serão descritos neste trabalho possuem os seguintes temas: 1. Pode ou não emprestar materiais dos colegas?2. Organização e funcionamento da regra;3. Conflito devido ao não cumprimento de uma

regra do jogo de figurinhas;4. Meu amigo xingou minha mãe, e agora?

5. P. não cumpre as regras da sala. O que fazer?6. M. quer ir ao banheiro, ela pode sair sem

pedir permissão à professora? 7. J. A. não cumpriu a regra, pois esta lhe pas-

sou despercebida. Ele deve ser punido?Os dilemas abordados foram categorizados

segundo critérios utilizados por Piaget4 e sis-tematizados por Delval10, ou seja, mediante as respostas apresentadas, levar-se-ão em conta as respostas diferenciadas. Por fim, o trabalho de análise dos dados obtidos pelo método clínico deve-se iniciar pela análise qualitativa, dando sentido às informações e descobrindo tendên-cias e explicações gerais de todo o material coletado.

RESULTADOSNo método clínico, de acordo com Piaget10-17,

há diferentes tipos de respostas que devem ser conhecidas e levadas em conta. São elas: as res-postas espontâneas; respostas desencadeadas; respostas sugeridas; as fabuladas e as respostas não-importistas.

As respostas espontâneas são as que pos-suem um valor imprescindível na entrevista, ou seja, no momento das assembleias, por meio de perguntas bem elaboradas a criança conseguirá por em evidência suas crenças a respeito da realidade que está a sua volta. As respostas desencadeadas derivam de respostas da criança quando são questionadas sobre algo no qual nunca pensaram, porém, representam, não obstante, o seu pensamento. Essas respostas são aquelas desencadeadas no curso da entrevista, sendo as crenças que estão de acordo com o con-junto de concepções da criança, com seu nível de desenvolvimento, com sua capacidade de reflexão, com os modelos de mundo que tem em mente. As respostas sugeridas, a fabulação e o não importismo são respostas dadas pela criança que devem ser descartadas no mo-mento da análise dos resultados. Isto ocorre porque, nestes casos, as respostas podem ter sido induzidas; podem representar a imagina-ção da criança ou mesmo terem sido inventadas no momento da entrevista. Assim sendo, na

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apresentação dos resultados, as respostas que se encaixavam nestas situações foram descartadas.

Os dilemas já descritos representam as perguntas básicas que se chegou a cada as-sembleia, sendo a primeira: Pode-se ou não emprestar materiais dos colegas?

Para o entendimento do leitor, vale ressaltar que esse dilema é decorrente de uma situação comum de sala de aula: como conduzir e orga-nizar o ambiente cooperativo na sala de aula, possibilitando a troca de materiais entre os alunos, sem causar o que os professores costu-mam chamar de “tumulto” prejudicial ao bom andamento das aulas? Alunos que levantam da carteira a todo instante, sem nenhum critério e combinados. Outro fator importante comum e recorrente em escolas públicas e de periferia é o fato dos pais proibirem o empréstimo de materiais pelos seus filhos, isto é devido à difi-culdade de comprá-los e da facilidade com que as crianças perdem lápis, borracha, apontador, etc. Exemplos:

W – Ah, eu não empresto porque minha mãe não deixa.

B – Um dia eu emprestei minha borracha e não me devolveram mais...

Neste dilema, chegou-se à conclusão que os materiais poderiam ser emprestados, desde que fossem devolvidos com responsabilidade, porém outra questão decorreu da primeira: Como fazer este movimento em sala de aula de forma organizada?

Os alunos vivenciaram esta experiência de forma espontânea e realmente estava tudo muito confuso, com alunos em pé e outros cor-rendo pela sala. Nova assembleia foi composta e outros argumentos foram levantados:

J – [...] Mas tá muita bagunça. Tem gente que quer as coisas toda hora.

K – Tem que melhorar tá ruim assim, tem muita gente em pé.

Frente às opiniões perceberam-se diferentes níveis de entendimento em relação ao questiona-mento apresentado pela professora: Estamos cum-prindo a regra de forma organizada? Os sujeitos G, B, A e M, por exemplo, acham satisfatório o

movimento desorganizado como estava, ou seja, para essas crianças, essa forma de convivência estava adequada. A riqueza do trabalho com as assembleias permite, de acordo com Puig15, tra-balhar capacidades como: colocar-se no lugar dos outros companheiros e imaginar como devem se sentir; expressar as próprias opiniões de maneira respeitosa e compará-las com as dos colegas; entender quais situações são problemáticas, comprometer-se com sua melhora; argumentar com lógica para defender uma posição pessoal.

Na sequência, algumas propostas foram feitas para organizar o fluxo de crianças que circulavam pela sala:

B – Levantar um de cada vez na fileira. Um vai e quando ele voltar, o outro vai.

K – Só que tem que olhar quando já tiver gente em pé.

De acordo com o dilema real 3: Conflito devido ao não cumprimento de uma regra do jogo de figurinhas, teve como consequência a agressão física. M havia trazido figurinhas para “bater” com os colegas na hora do recreio. Em determinado momento do jogo, aparece T, que perde para M e não quer entregar-lhe a figurinha perdida. A agressão física foi a forma encontrada por M para punir T e recuperar seu merecido prêmio. Exemplo:

M – As figurinhas eram minhas, eu que virei. Ele não quis entregar, eu pedi uma vez e ele não deu então eu tomei na força.

O fato foi levado para a discussão em assem-bleia com a seguinte indagação: Como resolver uma situação em que houve agressão física devido ao não cumprimento de uma regra do jogo de figurinhas? Nas respostas dos sujeitos ficaram evidentes as noções de certo e erra-do do ponto de vista individual, frente ao ato agressivo de M. Para as crianças T, L, F, R e B, a atitude de M foi errada e ele deveria devolver as figurinhas a T como forma de ressarci-lo. Já H, E e N mostraram-se favoráveis à atitude de M. Exemplo:

H – A regra do jogo é assim, virou, ganhou. M ganhou e era dele, mas T na quis dar, então...

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E – Éh, ele não quis dar...N – [...] O jogo é assim, A figurinha é de

quem vira.O conflito pairava sobre duas questões: 1) O

ato cometido e a devolução das figurinhas para o perdedor como forma de punir o agressor; e 2) A regra é clara, as figurinhas são daquele que as vira. Em decorrência M não aceitava devol-ver as figurinhas, pois ele as havia ganhado no jogo. Do ponto de vista da primeira questão, M deveria ser punido quando a diretora da escola contasse para sua mãe o que acontecera na escola, e a outra punição seria ficar sem as figu-rinhas ganhas no jogo. Já a respeito da segunda questão, havia um sentimento de não aceitação à quebra da regra do jogo. G e R sugerem um novo jogo, e essa proposta parece provocar certo equilíbrio no grupo:

G – Joga tudo de novo e quem ganhar dessa vez, fica com as figurinhas.

O conflito foi resolvido com o pedido de desculpas entre as crianças e com o novo jogo.

No dilema 4, Meu amigo xingou minha mãe e agora?, é com certa frequência que esses em-bates acontecem nas escolas e pelas ações deles decorrentes fica claro que a agressão física, para as crianças, é a única forma de reparar o dano moral sofrido. Exemplo:

L – [...] ele xingou minha mãe!E – Não xinguei não!A situação bastante delicada causada pelo

impasse entre a afirmação de L e a negação de E tinha de concreto um ato físico agressivo em consequência a um ato agressivo verbal, negado pelo acusado. No dilema real de sala de aula, a pauta principal da assembleia foi: E xingou a mãe de L, ele deveria ou não ter batido em E? As crianças V, H, S mostraram-se favoráveis à atitude de L.

V – Eu acho que deveria, porque se xingar a minha mãe, eu bato também.

H – Deveria. Ninguém gosta que se xinga a mãe.

Várias crianças manifestaram-se contrárias ao ato de L, mas apontaram a necessidade da aplicação de um “castigo”. Exemplo:

J – Se não puder bater, tem que dar um cas-tigo muito grande para ele.

J.A – Quando xingo meu irmão, minha mãe me bate ou me põe de castigo no quar-to. Eu acho que ele deve ter um castigo e não falar mais isso aqui na escola.

F – Eu concordo com o castigo.Analisando as respostas de todos os alunos

da classe, encontramos diversidade na forma de pensamento. Um primeiro grupo em suas respostas espontâneas caracterizou o que Piaget chama de sanção expiatória e a justiça retributiva4. Já, no segundo grupo, as respostas espontâneas das crianças expressaram uma forma de pensamento real, pautado na premis-sa que diante de uma falta, há a necessidade de uma punição, ficando, porém, descartada a agressão física.

O grupo foi questionado a respeito do tipo de castigo a que se referiam. Diversas sugestões foram dadas, desde ficar sem comer até deixar de fazer algo que ele gostava muito: jogar bola no recreio. Esta última foi aceita por todos e isso indicou a quebra do elo de solidariedade, significando o rompimento de um acordo ou regra de um grupo que foi estabelecido em comum. Contudo, E também havia realizado uma agressão verbal e, de acordo com o gru-po, ambos ficariam proibidos de participarem do time de futebol composto pelos meninos da turma. Esse tipo de sanção por reciprocidade4, de acordo com Piaget, deixa claro pelo grupo a reprovação pelas infrações cometidas.

No dilema 5, P não cumpre as regras da sala, o que fazer?, fica retratada a queixa mais comum entre os educadores: “Este(a) aluno(a) não cumpre as regras combinadas”. Analisan-do o dilema surgido, as queixas e sugestões apresentadas nas assembleias, percebe-se que o pensamento de algumas crianças pauta-se na necessidade de se constituir as regras e experienciá-las. As sugestões de resolução per-passam desde sanções expiatórias até àquelas por reciprocidade, como: copiar atividades no caderno; fazer tarefas extras; ajudar um colega de sala. A professora relembrou as regras com-

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binadas, pois a intenção neste momento era de promover no grupo uma reflexão voltada a desenvolver o espírito de solidariedade interna9, ou seja, P deveria participar das atividades de forma a lhe despertar o real sentido em cola-borar, como um membro ativo e participativo. Exemplo:

F – [...] A hora que ele termina de fazer o trabalho dele, ele pode ajudar a N a fazer o dela, porque ela sempre demora para terminar.

P neste dilema pode experienciar a reciproci-dade e manteve um compromisso ativo em seu meio, ao se propor ajudar uma colega da classe com os seus afazeres.

No dilema 6, apresenta-se “M quer ir ao banheiro. Ele pode sair sem pedir permissão à professora?” Neste dilema, a professora ques-tionou acerca da possibilidade dos alunos se autogovernarem, ou seja, caso achassem possí-vel, poderiam controlar suas saídas ao banheiro. Num primeiro momento, houve a surpresa dos alunos:

F – [...] é a professora que manda nisso. B – Nossa, se não pedir vai virar a maior

bagunça.De fato, é perceptível a necessidade dessas

vivências para a criança. Houve insegurança das crianças frente à possibilidade desta nova regra. Exemplo: [...] Como vai ser, a gente pode sair da classe?

L – É mesmo hein, como vai ser? Eu não sei.Questionados sobre as normas que pudes-

sem regular esta nova atuação, os alunos não apresentaram propostas e a professora levantou algumas possibilidades: 1) A regra é observar para que não se tenha duas crianças fora da sala; 2) Os horários de saídas para beber água e ir ao banheiro devem ser distantes do horário do intervalo e o relógio pode nos ajudar nesse con-trole. Analisando o contexto desta assembléia, percebeu-se que o novo acordo demoraria certo tempo de experiência para que houvesse maior compreensão, por parte dos alunos, a respeito da responsabilidade que agora passariam a exercer. A nova regra foi estabelecida: Não é

necessário pedir permissão à professora para beber água ou ir ao banheiro.

O êxito desta nova regra foi sendo percebido aos poucos e surgiu o primeiro conflito, apre-sentado no dilema 7: J.A. não cumpriu a regra, pois esta passou-lhe despercebida. Ele deve ser punido? O acordo estabelecido na assembleia anterior era de que se observasse atentamente a sala antes de sair, pois dever-se-ia evitar dois alunos fora da sala. J.A. saiu sem perceber que uma criança já estava fora. C, N e B acreditam que ele deve ser punido. Exemplo:

C – Ele deve ficar sem sair da sala.N – Ele podia ter perguntado antes de sair.

Mas ele não sabia se precisava pergun-tar, porque ele não viu.

B – Ele deve ser punido.J.A. – Eu não vi que saiu gente da classe. As

crianças A, N, P e R deram opiniões contrárias: A – Não, porque ele não viu.

N – Eu também acho.Profª – De que tipo de castigo está dizendo

que J.A. mereceria? R. disse que um castigo seria J.A. ficar sem ir ao banheiro ou brincar no recreio. Num primeiro momento, a resposta de R apresentou uma característica de recipro-cidade simples, mas, a seguir, complementou com uma sanção expiatória, sem vínculo algum com a falta cometida. A professora continuou argumentando, fazendo-os refletir sobre a intenção de se cometer a falta. Vários ajustes foram necessários e um deles foi encontrar uma solução que indicasse se havia alguém fora da sala. E, dentre as sugestões feitas pelos alunos, optou-se por sinalizarmos com uma plaquinha de papel laminado verde, quando não tivesse ninguém fora da sala e vermelha, quando tives-se saído alguém. Esse controle seria feito pelas próprias crianças.

DISCUSSÃOAs crianças frente aos dilemas de sala de aulaCom o objetivo de nortear a análise, colo-

camos, em primeiro lugar, um quadro resumo dos dilemas, os temas decorrentes destes, como

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também, os subtemas extraídos das discussões. Destacamos, neste momento, que os dados da pesquisa se encontram aqui expostos, sob a for-ma de dilemas e as letras abreviadas referem-se aos nomes dos sujeitos (crianças) – Quadro 1.

Em conformidade com os objetivos propostos neste artigo, não foram expostos os pensamen-tos verbalizados pelo grupo estudado, mas as análises corroboram o estudo teórico aqui apre-sentado, como a importância de se experienciar conflitos reais, que indistintamente atuaram sobre os integrantes do grupo. A forma utilizada permitiu que se desvelasse a noção da reali-dade do grupo, que, frente a frente ao conflito moral, buscou soluções de modo a superá-lo e

a caminhar em direção à autonomia moral. A prática das assembleias, para se discutir as mais diversas situações desencadeadas no contexto escolar, desenvolve, de acordo com Puig15, ha-bilidades psicomorais no educando, conteúdos esses implícitos nessa atuação, que convergem para o relato de seu pensamento, à reflexão mo-ral e, posteriormente, a mudanças de atitudes. Frente a esta abordagem, partimos do princípio que a criança possui sua própria natureza, e que, do nosso ponto de vista, essa natureza é o próprio pensamento moral sobre o mundo que a cerca, mesmo sendo este menos adequado que o pensamento moral adulto.

Analisaremos o pensamento moral expresso

Quadro 1 – Resumo dos temas e subtemas resultantes das entrevistas.Dilemas Tema Subtemas

Dilema 1: pode-se ou não empres-tar materiais dos colegas?

Cooperação Conceito (Crenças)EmpréstimoDevolução

Acordo

Dilema 2: organização e funciona-mento da regra

Combinados

Dilema 3: conflito devido ao não cumprimento de uma regra do

jogo de figurinhas

Agressão física e verbal Regras do jogoNoções de certo ou errado

Sanções (castigos)

Dilema 4: meu amigo xingou minha mãe, e agora?

Justiça retributivaJustiça distributiva

Quebra do elo de solidariedade

Dilema 5: P. não cumpre as regras da sala, o que fazer?

Constituição e cumprimento de regras

Sanção expiatóriaSanção por reciprocidade

Dilema 6: M. quer ir ao banheiro. Ela pode sair sem pedir permissão

à professora?

Crenças desencadeadas

Dilema 7: J.A. não cumpriu a regra, pois esta lhe passou desper-

cebida. Ele deve ser punido?

Moral HeterônomaA Professora é quem determina

Tem que obedecerNova regraDeve punir

Merece uma chanceFonte: dados obtidos pelos autores

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no momento das assembleias de sala de aula. Iniciemos pelo agrupamento intitulado dilemas da cooperação, o qual abarca dois subtemas, sendo o primeiro, Pode-se ou não emprestar materiais dos colegas? e o segundo, Organi-zação e funcionamento da regra combinada. A primeira situação, decorrente da dinâmica natural de sala de aula, fomenta desenvolver a capacidade de relação entre as pessoas, isto é, estabelecer em quais princípios se pautará a convivência. A segunda situação, a forma mais justa e organizada de como essa pode se tornar útil no sentido de potencializar um espaço or-ganizado de trabalho, facilitador do ensino e da aprendizagem. Este aspecto inicial reflete num primeiro dilema moral: a heteronomia, carac-terística da faixa etária das crianças, reforçada pela crença familiar (a de não emprestar nada a ninguém), choca-se, neste contexto social, com a possibilidade de inversão desta individualida-de. O pensamento moral do grupo é permeado por ideias que refletem, em diferentes graus, as concepções espontâneas acerca do dilema exposto. Aí está a importância dessa diversidade para o exercício da prática da cooperação. Num segundo aspecto, a prática da cooperação para o grupo desvela o pensamento deste, a respeito do que seja um ambiente organizado ou não. O educador disposto a desprender-se de uma concepção tradicional de disciplina dará aten-ção às declarações do grupo em suas diversas concepções de organização do ambiente es-colar, para depois exercer, segundo Puig15, a capacidade de colocar-se no lugar dos outros companheiros, comparar opiniões e defender também seu próprio ponto de vista.

No tema relacionado à agressão física e verbal, agregam-se os dilemas: Conflito devido ao não cumprimento de uma regra do jogo de figurinhas e, Meu amigo xingou minha mãe, e agora? No exemplo referente ao primeiro conflito, constatamos a existência de uma so-ciedade de crianças, com regras, que visam unificar o jogo, sendo estas pertencentes ao jogo social, pois, quem no momento de “bater” as figurinhas, conseguir virá-las, as ganha.

Consideremos que o respeito à regra do jogo de figurinhas advém inicialmente de uma tradição transmitida pelos mais velhos, exposta de ma-neira clara nas falas de várias crianças, “O jogo é assim!”, isso quer dizer, que não se pode fazer diferente. A problemática percebida neste fato expõe, também, pensamentos que divergem em relação à obrigatoriedade transcendental da regra. Isto fica claro na oscilação apresentada por alguns integrantes do grupo, Você tem um monte de figurinhas, deixa essas para ele, e mesmo porque, a forma como se deu, a princí-pio, o desfecho do conflito colocou em dúvida a própria obrigatoriedade do cumprimento da regra do jogo. O desfecho acima citado refere-se à agressão física como forma de perpetuar o que fora um legado dos mais velhos. Na visão do grupo, a atitude agressiva de M. permitiu um olhar reflexivo para o dilema, pois o pensamento da noção de certo e errado veio à tona. Desta forma, o sentimento de equidade que permeia a noção de justiça nas crianças maiores surgiu na resolução deste conflito como uma das soluções possíveis para o impasse. Referindo-nos agora ao segundo dilema, em que houve também a agressão física, em decorrência a uma ofensa verbal, a noção de justiça retributiva4 compôs o primeiro pensamento mencionado: se uma criança ofendeu alguém, que a outra considera profundamente importante e sagrada para ela, merece um castigo tão ruim quanto foi o grau da ofensa. Segundo Piaget4, em relação ao desenvolvimento da justiça na criança, há uma fase que se estende até mais ou menos sete-oito anos, durante a qual a justiça fica sob autoridade do adulto. Nas opiniões do grupo, isso fica claro para alguns, mas por outros há a aprovação do castigo aplicado pela própria criança como merecimento do seu ato. Neste caso, ao ser questionado sobre a sanção a ser aplicada, o grupo oscilou entre a sanção expiatória e a por reciprocidade, mas a necessidade de se castigar ficou clara, principalmente com o objetivo de que não haja reincidências na falta. O impulso de se fazer justiça com as próprias mãos, dentre outros fatores, deriva da não compreensão do

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exercício do diálogo. O que se buscou neste impasse foi mediar uma discussão, em que o ato cometido por ambos mereceu reprovação do grupo, chegando-se, após várias reflexões, à quebra do elo de solidariedade.

O tema “Constituição e cumprimento de regras” abrange os dilemas: P. não cumpre as regras da sala, o que fazer? – M. quer ir ao banheiro. Ela pode sair sem pedir permissão à professora? – J.A. não cumpriu a regra, pois esta lhe passou despercebida. Ele deve ser punido? Se observarmos com cautela as concepções que estão implícitas neste tema, estaremos levantando grande reflexão acerca do que se propõe, enquanto contrato e prática pedagógi-ca, que indicaria um equilíbrio entre a “situação simétrica e assimétrica”15 que ocorre na escola.

Pensaremos primeiramente na seguinte concepção: A constituição de regras pelo grupo supõe-se estabelecer, a priori, um ambiente participativo, constituído por valores proce-dimentais e atitudinais, como o diálogo e a autorregulação. A concretização desses valores refere-se à prática de representatividade do aluno nas decisões do grupo-classe e, posterior-mente, na escola como um todo. Desta mesma concepção, derivam-se algumas implicações, como o favorecimento de um momento em que a palavra é exercida como meio de ação coope-rativa e de tomada de consciência; um espaço que se define pela participação e interação entre os membros do grupo; a oportunidade de estudantes e educador elencarem temas de trabalho que visam desenvolver habilidades e potencialidades dos alunos; e sem a pretensão de fechar as possibilidades, finalizo ressaltando o comprometimento coletivo, o sentimento de responsabilidade diante dos companheiros do grupo, melhorando a compreensão mútua.

Retomemos agora a análise dos dilemas, descritos no parágrafo anterior. O que se refere ao não cumprimento das regras da sala é algo bastante natural quando se relaciona com a consciência e internalização de um combinado. A não aceitação deste, por P., é um reflexo da fase de heteronomia em que se encontra. Es-

clarecendo, a ação realizada por P. expõe uma espécie de transgressão à regra social, feita em acordo mútuo pelo grupo. Esta conduta nos leva a duas reflexões: a primeira é a dificuldade de P. em relacionar-se com as propostas do grupo, pois suas atitudes egocêntricas chocam-se com as apresentadas. A segunda reflexão é a hipóte-se de reverter sua característica egocêntrica, por meio do envolvimento em práticas cooperativas, que o farão libertar-se desta.

Desta forma, o contrato mútuo estabelecido no grupo e exposto na assembleia cobrou-lhe atitudes e sua resposta foi negar afazeres suge-ridos expiatoriamente por membros do grupo (fazer mais lições, copiar devagar, etc), mas de acato à sanção por reciprocidade (ajudar uma aluna com dificuldade de aprendizagem). Desta experiência, obteve-se um exercício de autoregulação e descentração, sendo favorável à proposta de constituição de um ambiente cooperativo.

O dilema sugerido pela professora, ofere-cendo a possibilidade ao aluno de controlar autonomamente suas saídas de sala de aula (ir ao banheiro, beber água, etc), evidenciou pensamentos morais importantes, como: a admiração do grupo, frente à possibilidade de autogovernar-se; o sentimento de respeito ou desrespeito na posição de “igualdade” de decisão com a professora e o medo de supe-ração da responsabilidade heterônoma15. Para esta análise, serão expostos separadamente os pensamentos verbalizados nas assembleias, contudo, esses estão intimamente ligados e podem ser engendrados por dois sentimentos maiores: medo e respeito.

No tocante a esses sentimentos, a pesquisa realizada por Scarin16 aborda-os com crianças da Educação Infantil. A autora pauta-se na afir-mação de Bovet apud Piaget4 sobre a procedên-cia do respeito, que, segundo ele, “constitui-se a partir do amor e do temor despertados pelo indivíduo respeitado no indivíduo respeitador”4.

Deste prisma, visualiza-se a adequação de antigos conflitos, já superados, com o surgimen-to de outros, propiciando avanços nos estágios

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morais, como vimos na resolução e concretiza-ção do dilema moral apresentado. Finalizando, o conflito emergido no último dilema, “J.A. não cumpriu a regra, pois esta lhe passou des-percebida Ele deve ser punido?”, é decorrente do anterior, ou seja, o não cumprimento de um pormenor combinado pelo grupo para a exe-cução da nova regra expôs que o exercício de autorregulação implica adquirir a capacidade de autoconhecimento e de fortalecimento para se dirigir voluntariamente, capacidade esta que será adquirida por meio da inserção do indiví-duo em situações em que o desequilíbrio moral o faça estabelecer relações com o conhecimento anterior que possui e assim construir, gradati-vamente, sua personalidade moral.

CONCLUSÃOOs principais resultados apontaram como

favorável o exercício reflexivo, propiciado pe-los dilemas reais de sala de aula, como meio de avançar moralmente. E este permitiu boa interação no grupo, tendo o respeito mútuo como direcionamento das ações. Outro ponto a ressaltar ao término da pesquisa refere-se à ação educativa exercida, que vai além da transmissão de conteúdos curriculares, ou seja, que promove também a formação moral de seus alunos.

A contribuição deixada por este trabalho servirá de apoio aos educadores, que buscam estreitar a compreensão na prática das relações que emergem do contexto escolar e, ainda, fazer delas, uma alia-da na construção de sujeitos morais autônomos.

SUMMARYSociomoral development in the school context: an experience with

children from the first cycle - elementary school

The at present paper is aimed describing situations experienced in the school context, giving special attention to the thought and moral development analysis of a group of children faced with real dilemmas that arise from this sociability. In order to make such analysis possible, discussions and reflections on the hypotheses, suggested by the group for each dilemma, were proposed to the group by means of meetings. Jean Piaget’s work, “The children moral judgment”, was the theoretical base for the research conduction. The children in the analyzed group are seven/eight years old and they go into the first grade of a Municipal School of Fundamental teaching (E.M.E.F.) on the outskirts of Marília – SP. The work “Piagetian Clinical interview”, described by Juan Delval, was used as an instrument for data collection (dilemmas) and group analysis. The real existing dilemmas are, first of all, motivations for the subjects because they give rise to a conflict among the different types of rules. The dilemmas selected for the present study approach topics related to cooperation, physical and verbal aggression, constitution and obeying of rules. The answers given by the subjects during the meetings were grouped into categories and, by means of the analysis, it was possible to know about their thoughts and the characteristics they attribute to the reality. The participation of the children, trying to solve conflicts, increased the motivation to the group moral autonomy.

KEY WORDS: Moral development. Social behavior. Personal autonomy. Ethics.

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Trabalho realizado na Universidade Estadual Paulista

“Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Marília, SP.

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13. Araújo UF. O ambiente escolar e o desen-volvimento do juízo moral infantil. In: Ma-cedo L, org. Cinco estudos de educação moral. São Paulo:Casa do Psicólogo;1993.

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Artigo recebido: 2/12/2009

Aceito: 3/2/2010

AvAliAção neurológicA em disléxicos

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Objetivo: O objetivo desse estudo foi propor semiologia neurológica detalhada em escolares portadores de dislexia do desenvolvimento, comparados ao grupo sem dificuldade escolar. Método: O Grupo Disléxico foi constituído por 12 escolares, sendo apenas 1 do sexo feminino. Foram excluídos os alunos com dificuldade escolar, retardo mental, deficiência visual e auditiva. Pareados por sexo e idade com o Grupo Controle, recrutados em classes regulares, com leitura adequada para a série escolar. Utilizados Exame Neurológico Tradicional, Exame Neurológico Evolutivo e Quick Neurological Screening Test II (QNST II). Resultados: A pontuação total do QNST II identificou corretamente o Grupo Disléxico, com média de pontuação total significativamente maior. Alguns subtestes discriminaram os grupos, com média de pontuação significativamente maior no Grupo Disléxico nos subtestes: habilidade manual, reconhecimento e produção de figuras, reprodução de formas na palma da mão, padrões sonoros, movimentos manuais reversos, rápidos e repetitivos; extensão de braços e pernas; ficar em uma só perna; irregularidades comportamentais.

UNITERMOS: Transtornos de aprendizagem. Manifestações neurológicas. Dislexia.

Aspectos dA AvAliAção neurológicA em escolAres disléxicos

Maria Imaculada Merlin de Carvalho, Cíntia Alves

Salgado – Curso de Pós-graduação em Ciências Médicas,

FCM/Universidade Estadual de Campinas.

Vanda Maria Gimenes Gonçalves – Departamento

de Neurologia e Centro de Investigação em Pediatria

(CIPED), FCM/Universidade Estadual de Campinas.

Carlos Eduardo de Barros – Laboratório de Psicologia

Genética, FE/Universidade Estadual de Campinas.

Simone Aparecida Capellini – Departamento

d e F o n o a u d i o l o g i a , F F C / U n i v e r s i d a d e

Estadual Paulista, Marília, SP.

Sylvia Maria Ciasca – Departamento de Neurologia,

FCM/Universidade Estadual de Campinas.

Correspondência

Maria Imaculada Merlin de Carvalho

Departamento de Neurologia/Faculdade de Ciências

Médicas

CP: 6111; Universidade Estadual de Campinas -

Campinas, São Paulo, SP - CEP 13083-970

E-mail: [email protected]

Maria Imaculada Merlin de Carvalho; Vanda Maria Gimenes Gonçalves; Carlos Eduardo de Barros; Cíntia Alves Salgado; Simone Aparecida Capellini; Sylvia Maria Ciasca

cArvAlho mim et Al.

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INTRODUÇÃOAo acompanhar os resultados das avaliações

de desempenho dos escolares de nosso país, veiculados pela mídia, constata-se a denúncia de uma educação de baixa qualidade, apesar dos esforços no sentido da melhoria. Respostas conclusivas para o lamentável “diagnóstico” atual estão longe de serem encontradas, devido à complexidade dos problemas educacionais, sendo impossível destacar um único fator ge-rador. Este panorama geral tem influência na atuação de profissionais ligados ao ensino.

É comum que crianças com dificuldades para aprender sejam encaminhadas para es-pecialistas, dentre eles o neurologista, prova-velmente pela crença implícita, e até mesmo explícita, de que a não aprendizagem seja decorrente de “problemas na cabeça” que im-pedem e interferem em sua aquisição normal.

A família e a escola, ao solicitarem res-postas para o não aprender, esperam que exames e medicamentos possam de alguma forma explicar e solucionar as dificuldades de aprendizagem. No entanto, os problemas são multifatoriais e multicausais, que necessitam de abordagem e de visão mais ampla, que considere os sintomas como rede de relações envolvendo vários protagonistas, destacando-se o papel da escola como o principal, visto que é nela que as soluções devem ser buscadas, sem desconsiderar o auxílio de profissionais de áreas afins.

Dentre os problemas de aprendizagem, a dislexia é um transtorno específico da apren-dizagem da leitura, com prevalência de 5-10% das crianças em idade escolar1, mas tal índice está na dependência da escolha e da rigidez de critérios avaliativos, podendo variar de um país a outro.

A definição de dislexia é controvertida, mas a análise da literatura demonstra pontos con-vergentes, como: dificuldade de leitura apesar da capacidade intelectual adequada, boa opor-tunidade sociocultural, instrução convencional, motivação e acuidade sensorial2-6, na ausência de distúrbio emocional significativo7.

Snowling e Stackhouse8 enfatizaram a definição de discrepância, que consiste numa correlação entre a capacidade intelectual e de-sempenho na população normal. Nas crianças disléxicas, a discrepância estaria no desempe-nho baixo em leitura comparado à capacidade intelectual adequada. Tal proposta é aceita com reserva.

Por fim, encontra-se menção de que a dis-lexia é um distúrbio de origem neurobiológica e constitucional4, com relevante incidência familial9.

Um número considerável de características compõe os sintomas da dislexia. A mais citada e aceita é o déficit fonológico, evidenciado em inúmeras pesquisas com crianças duran-te o desenvolvimento da leitura6,10-13. Outras características são distúrbios de memória, memória para sequência, orientação direita-esquerda, orientação temporal, imagem corporal, escrita e soletração, distúrbio topo-gráfico, distúrbio do padrão motor, sensorial e perceptivo7,14,15.

A hipótese de problemas neurobiológicos como causa da dislexia, foco de investigação do presente estudo, data de mais de um século, quando o neurologista francês Dejerine, em 1891 (citado por Lyon4), sugeriu que a porção posterior do hemisfério esquerdo era funda-mental para a leitura. A partir daí até os tempos atuais, os estudos tentando correlacionar a função da leitura com regiões cerebrais aumen-taram consideravelmente e, mais recentemen-te, a inestimável contribuição dos exames de imagem, principalmente os funcionais.

Carboni-Román et al.16, utilizando exames de neuroimagem, destacaram a participação da região perisilviana dominante e identificaram três circuitos envolvidos na leitura: o dorsal correspondendo à região têmporo-parietal, o ventral, à região têmporo-occipital, e o tempo-ral-basal, à frontal-inferior.

Galaburda et al.17 foram os pioneiros a des-crever anormalidades corticais em sujeitos com dislexia e, para tanto, utilizaram amostras do cérebro post mortem. Posteriormente, estudos

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de neuroimagem realizados com grupos disléxicos e leitores normais evidenciaram diferenças significativas nas regiões cerebrais. Lyon4 ressaltou que os exames de imagem fun-cionais do cérebro trazem muitas informações e estas parecem ser convergentes entre os pesquisadores. Além disso, são técnicas não invasivas, sendo indicadas para o estudo de pessoas, em especial crianças. Etchepareborda et al.18, em revisão sobre as técnicas de avalia-ção de neuroimagem funcional, não invasivas, dos transtornos do desenvolvimento incluindo a dislexia, correlacionaram topograficamente as funções pesquisadas (atenção, percepção, imaginação, linguagem, memória de trabalho, recuperação semântica, memória episódica e sua recuperação, priming e memória de pro-cedimento) e os processos cerebrais básicos envolvidos em cada modelo.

No entanto, em nosso país, com recur-sos tecnológicos limitados, apenas pequena parcela das crianças teria condições de se submeter a tais exames. Mesmo com a possi-bilidade de realizar esses exames, permanece a questão: isso ajudaria o professor e a criança na relação ensinar-aprender? Não há respos-tas neste momento, mas a semiologia médica continua sendo uma área para atuação do neurologista.

No ano de 1975, o neuropediatra Antônio Branco Lefèvre e sua equipe lançaram um livro sobre “disfunção cerebral mínima” (DCM), um marco para a neuropediatria. Lefèvre e Miguel19 mencionaram o interesse de neuropediatras pela DCM por ser este o motivo mais frequen-te que levava uma criança aos consultórios. Ao traçar o percurso histórico deste conceito ressaltaram que as tentativas de correlação anátomo-clínica não conseguiram esclarecer pontos duvidosos; atribuíram ao fato dos neu-ropediatras estarem acostumados ao estudo das grandes encefalopatias e serem carentes de sub-sídios semiológicos que possibilitassem o exame objetivo de crianças portadoras de “distúrbios menores”, levando a discordâncias entre o rigor (grifo nosso) da caracterização pedagógica e

psicológica das crianças portadoras de DCM e a ambiguidade neurológica.

Diante das adversidades vivenciadas pelos neuropediatras, foram realizadas pesquisas uti-lizando duas técnicas diferentes de avaliação neurológica13,20,21, que possibilitou encontrar indicadores mais precisos para a avaliação e diagnóstico de crianças que apresentaram determinadas queixas, sendo uma das mais frequentes a queixa escolar.

No entanto, Gonçalves e Carvalho22 assi-nalam que a ausência de sinais neurológicos não implica na integridade do cérebro, da mesma forma que a presença desses sinais não permite estabelecer relação causal com o comportamento manifestado. Entretanto, os comportamentos são fruto de organização cerebral e a avaliação neurológica capacita o examinador a avaliar parte da integridade do cérebro.

Mais recentemente, Carvalho e Gonçalves23 reafirmaram a pertinência do exame neuroló-gico, para identificar alteração no desenvolvi-mento da motricidade, das sensibilidades, do sistema nervoso periférico, com destaque às funções corticais gnósticas e práxicas. Além disso, observaram “sinais menores” em crian-ças com dificuldades escolares, caracterizados por disfunção nas áreas de coordenação moto-ra, função sensorial integrativa e organização de tarefas complexas, na ausência de alteração neurológica focal.

Nos dias atuais, a avaliação realizada por um único profissional é limitada. As atuações buscam a interdisciplinaridade ao estudar o ser humano, mais especificamente a criança em desenvolvimento; não existe um único sa-ber, mas sim saberes que são co-dependentes e inter-relacionados. Neste sentido, o exame neurológico não tem a função de “patologizar o aprender”, mas ser uma avaliação auxiliar e de fundamental importância para a compreen-são das queixas escolares num contexto mais abrangente de avaliação e diagnóstico.

Frente a essas considerações, a questão levantada nesse estudo foi de que a semiologia

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neurológica detalhada poderia identificar sinais neurológicos não detectados pelo Exame Neurológico Tradicional. A hipótese que norteou a investigação foi de que as crianças disléxicas podem demonstrar diferentes alte-rações neurológicas, de acordo com as técnicas semiológicas utilizadas. Se verdadeira, cons-tituiria em mais um recurso na compreensão desta queixa escolar específica.

Assim, o presente estudo teve como objetivo propor uma semiologia neurológica detalhada em um grupo de escolares portadores de dis-lexia do desenvolvimento, comparados a um grupo sem dificuldade escolar.

MÉTODOParticipantesForam avaliados 24 escolares, de ambos os

gêneros, sendo 2 do sexo feminino e 22 do sexo masculino, compondo dois grupos: Grupo Dislé-xico e Grupo Controle. Após aprovação do Comi-tê de Ética em Pesquisa da Instituição (Parecer nº 310/2003), os pais ou responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

O Grupo Disléxico foi constituído por 12 alunos, 1 do sexo feminino e 11 do sexo mas-culino, cursando de 2º a 5º anos do Ensino Fundamental I, em escola pública estadual da cidade de Campinas, São Paulo, com diagnós-tico de dislexia do desenvolvimento. Foram excluídos os que apresentaram dificuldade escolar, retardo mental, deficiência visual e auditiva, síndrome genética.

O Grupo Controle foi pareado por sexo e idade, tendo as mesmas características do Gru-po Disléxico, exceto no que se refere ao ano escolar e à história de reprovação. Cursavam entre 2º e 7º anos do Ensino Fundamental I e II, sem reprovação escolar e sem queixas de dificuldades de aprendizagem.

InstrumentosForam utilizados o Exame Neurológico Tra-

dicional (ENT)24, o Exame Neurológico Evolu-tivo (ENE)25 e o Quick Neurological Screening Test II (QNST II)26.

ProcedimentoEstudo de corte transversal de caso-con-

trole. O Grupo Disléxico foi encaminhado ao Ambulatório de Neuro-Dificuldades de Aprendizagem, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universi-dade Estadual de Campinas – FCM/UNICAMP, com queixa de dificuldades de aprendizagem. Após avaliação neurológica, neuropsicológica, fonoaudiológica e psicogenética, tiveram o diagnóstico de dislexia do desenvolvimento confirmado. A grande maioria participava de um programa de remediação fonológica27.

A seleção dos escolares sem dificuldades ou distúrbios de aprendizagem foi realizada por professores de duas escolas públicas es-taduais, a partir de indicações transformadas em listas de pré-seleção, sendo incluídos no Grupo Controle, os alunos que pareavam com o Grupo Disléxico por gênero e idade.

O ENT, segundo a técnica de exame da Clí-nica Neurológica da Universidade de São Pau-lo24, avaliou crânio, fala, força muscular, tono muscular, reflexos profundos e superficiais, equilíbrio estático e dinâmico, coordenação apendicular, coordenação tronco-membros, sensibilidade, nervos cranianos, sinais menín-geos e medidas do crânio proposta por Diament e Rodrigues28. A fala foi examinada sem qual-quer formalidade, durante o tempo em que o escolar era observado.

As respostas foram consideradas como tendo padrão neurológico normal, quando não ocorreu anormalidade na execução das provas, e alterado, quando em qualquer das provas ocorreu anormalidade de resposta.

O ENE25, padronizado para o pré-escolar e escolar brasileiro, consistiu de provas especí-ficas para as idades entre 3 e 7 anos. Avaliou os setores de fala, lateralidade da mão, olho e pé, equilíbrio estático, equilíbrio dinâmico, coordenação apendicular, coordenação tronco-membros, persistência motora, sensibilidade e gnosia, tono muscular, reflexos profundos. É um exame indicado para verificação de respostas esperadas para as idades correspondentes e,

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assim, é possível detectar atraso ou distúrbios na maturação e funções corticais superiores, fundamentados em Luria.

O ENE foi aplicado nos escolares deste estudo, todos com idade superior a 7 anos, para detectar atrasos em uma ou mais funções examinadas. As respostas foram classificadas como padrão normal, quando o escolar realizou as provas máximas em todos os setores do ENE, e padrão alterado, quando houve atraso de mais de um ano em pelo menos um dos setores.

O QNST II26 é um instrumento de triagem desenhado para avaliar áreas de integração neurológica relacionadas com a aprendizagem. Oferece um modelo rápido e acurado de detec-tar “sinais neurológicos menores”, comumente associados às dificuldades de aprendizagem. Consiste de 15 tarefas breves, adaptadas de exames neurológicos infantis padronizados, escalas de desenvolvimento e testes neurop-sicológicos. Por meio dessas tarefas pode-se observar: maturidade e desenvolvimento mo-tor, habilidade de controlar movimentos dos músculos axiais e apendiculares, planejamento motor e sequenciação, sentido de velocidade e ritmo, organização espacial, habilidade per-ceptual auditiva e visual, equilíbrio e função vestibular, distúrbios de atenção.

Os subtestes que compõem o QNST II são: habilidade manual; reconhecimento e produ-ção de figuras; reconhecimento de formas na palma da mão; seguimento visual; padrões sonoros; prova índex-nariz; oposição dedos-polegar; estimulação simultânea dupla da mão e bochecha; movimentos manuais reversos, rápidos e repetitivos; extensão de braços e pernas; marcha tandem; ficar em uma só perna; saltar; discriminação direita-esquerda; irregu-laridades comportamentais.

A pontuação geral foi obtida tabulando os escores dos 15 subtestes: pontuação 1 quando representava influência ambiental, do desenvol-vimento ou fatores emocionais, denotando etio-logia não-neurológica, ou 3 quando associado a grave dificuldade de aprendizagem, podendo estar relacionado à disfunção neurológica.

A pontuação final foi categorizada como indi-cativa de discrepância grave (DG) da faixa de normalidade da função, discrepância moderada (DM), ou na faixa normal (NL) da função.

Os resultados foram organizados no banco de dados do Statistical Package for Social Scien-ces (SPSS, versão 13.0). A análise descritiva com apresentação de tabelas de frequências foi realizada para variáveis categóricas e medidas de posição e dispersão para variáveis contínuas. Para comparação de medidas contínuas entre os 2 grupos, utilizou-se o teste de Wilcoxon para amostras relacionadas e para verificar a con-cordância entre os três testes utilizou-se o teste Q de Cochran. O nível de significância foi 5%.

RESULTADOSA idade cronológica variou entre 8 e 13 anos,

com média de 10,79 ± 1,39 anos, no Grupo Con-trole, e de 10,72 ± 1,48 anos, no Grupo Disléxico. Não houve diferença significativa entre a média da idade dos grupos (p-valor=0,221).

A escolaridade do Grupo Controle variou entre 3º e 7º ano do Ensino Fundamental I e II, com média de estudo de 4,17 ± 1,27 anos; no Grupo Disléxico, variou entre 2º e 5º ano do Ensino Fundamental I, com média de estudo de 3,17 ± 0,94 anos, sendo observada diferença significativa entre os grupos (p-valor=0.015), com menor escolaridade no Grupo Disléxico.

O ENT24 foi normal em todos os escolares do Grupo Controle e em 3 do Grupo Disléxico. O perímetro craniano não mostrou diferença

Tabela 1 – Achados ao Exame Neurológico Tradi-cional no Grupo Disléxico.

Exame Neurológico Tradicional

n Escolares

Sem alteração 3 3, 8, 10Uma alteração 5 1, 2, 5, 9, 12Duas alterações 3 4, 6, 11Quatro alterações 1 7Total 12

N=número total de escolares; n=número de escolares altera-dos; Escolares=nº do participante na pesquisa.

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entre os grupos (p-valor= 0,552). As alterações observadas no Grupo Disléxico estão descritas nas Tabelas 1 e 2. A alteração neurológica mais frequente observada em 8 escolares foi a leve hipotonia muscular global ou localizada em membros superiores, como um achado isolado ou associado a outras alterações.

O ENE25 foi normal em todos os escolares do Grupo Controle e alterado em todos do

Tabela 2 – Alterações no Exame Neurológico Tradicional no Grupo Disléxico.

Alterações no ENT n Escolares

Dislalia 1 12

Leve hipotonia de membros superiores 3 1, 5, 9

Leve hipotonia global 1 2

Dislalia e leve hipotonia global 1 4

Leve hipotonia de membros superiores e hiporreflexia profunda 1 6

Dolicocefalia e leve hipotonia de membros superiores 1 11

Dolicocefalia, dislalia, leve hipotonia global, reflexos profundos vivos nos membros inferiores

1 7

Total 9N=número total de escolares disléxicos; n=número de escolares com alterações; ENT=Exame Neurológico Tradicional; Escolares=nº do participante na pesquisa; Dislalia=Dislalia por trocas e supressões de fonemas.

Grupo Disléxico. Desses, 3 escolares apre-sentaram alteração detectada apenas no ENE e 9 apresentaram alterações em ambos os exames.

Considerando os setores do Exame Neuro-lógico Evolutivo, verificou-se que o Equilíbrio Dinâmico não mostrou alterações e o setor de Persistência Motora foi alterado com maior frequência. As alterações detectadas no ENE

Tabela 3 – Setores alterados no Exame Neurológico Evolutivo no Grupo Disléxico.

Setor alterado no ENE n Escolares

Persistência Motora 7 1, 2, 4, 5, 7, 10, 11

Sensibilidade/Gnosia 5 1, 2, 3, 4, 11

Coordenação Apendicular 4 1, 3, 4, 8

Coordenação Tronco-Membros 4 1, 3, 5, 6

Equilíbrio Estático 3 2, 5, 6

Equilíbrio Dinâmico 0 -

Fala 3 4, 7, 12

Tono muscular 8 1, 2, 4, 5, 6, 7, 9, 11

Reflexos profundos 2 6, 7N=número total de escolares disléxicos; n=número de escolares com alterações em cada setor; ENE=Exame Neurológico Evo-lutivo; Escolares=nº do participante na pesquisa.

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Tabela 4 – Alterações no Exame Neurológico Evolutivo no Grupo Disléxico.

Alterações no ENE n Escolares

Dislalia (ENE Provas máximas) 1 12

Leve hipotonia de MS (ENE Provas máximas) 1 9

Coordenação apendicular (ENT normal) 1 8

Persistência motora (ENT normal) 1 10

Leve hipotonia MS, Persistência Motora, Sensibilidade/gnosia 1 11

Dislalia, leve hipotonia global, reflexos vivos em membros inferiores, Persis-tência Motora

1 7

Leve hipotonia de MS, hiporreflexia profunda, Equilíbrio Estático e Coorde-nação Tronco-membros

1 6

Coordenação Apendicular, Coordenação Tronco-membros e Sensibilidade/gnosia (ENT normal)

1 3

Leve hipotonia global, Equilíbrio Estático, Persistência Motora, Sensibilidade/gnosia

1 2

Leve hipotonia de MS, Equilíbrio Estático, Coordenação tronco-membros e persistência motora

1 5

Leve hipotonia de MS, Coordenação Apendicular, Coordenação Tronco-mem-bros, Persistência Motora, Sensibilidade/gnosia

1 1

Dislalia, leve hipotonia global, Coordenação Apendicular, Persistência Moto-ra, Sensibilidade/gnosia

1 4

Total 12

N=número total de escolares disléxicos; n=número de escolares com citadas alterações; Escolares=nº do participante na pesquisa; ENT=Exame Neurológico Tradicional; ENE=Exame Neurológico Evolutivo; Dislalia=dislalia por troca e supressões; MS= membros superiores.

foram heterogêneas, não constituindo um pa-drão ao exame (Tabelas 3 e 4).

O QNST II foi normal em todos os escolares do Grupo Controle e alterado em todos do Grupo Disléxico. Na Tabela 5, observou-se que o QNST II identificou o Grupo Disléxico, com média de pontuação Total significati-vamente maior que o Grupo Controle (p-valor=0,0005).

Alguns subtestes demonstraram média de pontuação significativamente maior no Grupo

Disléxico: habilidade manual, reconhecimento e reprodução de figuras, reprodução de formas na palma da mão, padrões sonoros, movimen-tos manuais reversos rápidos e repetitivos; extensão de braços e pernas; ficar em uma só perna; irregularidades comportamentais.

Comparando os resultados encontrados no Grupo Disléxico, utilizando-se as três técnicas de avaliação neurológica, verificou-se que não houve concordância entre elas (p-valor=0,173, teste Q de Cochran).

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Tabela 5 - Comparação das provas do QNST II entre os Grupos Disléxico e Controle.

Subtestes Grupo Disléxico Pontuação Máxima

Grupo Controlep-valora

Média dp Média dp

Habilidade Manual 1,67 0,65 6 0,25 0,45 0,0010*

Reconhecimento e produ-ção figuras

5,08 2,19 14 1,58 1,31 0,0005*

Reprodução de formas palma mão

2,25 1,48 8 0,92 1,00 0,0273*

Seguimento visual 1,08 2,19 10 0,00 0,00 -

Padrões sonoros 8,08 2,94 15 2,33 1,87 0,0015*

Prova Índex-nariz 1,75 1,29 10 0,92 1,00 0,2129

Oposição dedos-polegar 2,25 1,96 10 1,42 0,67 0,1250

Estimulação duplamão e bochecha

0,33 0,89 7 0,00 0,00 -

Mov. manuais rápid.repetit.rever

2,58 1,83 9 0,25 0,45 0,0039*

Extensão braços e pernas 4,25 3,49 21 1,50 2,02 0,0273*

Marcha tandem 2,58 2,43 14 1,33 0,89 0,1084

Ficar em 1 perna 2,42 0,90 4 1,33 0,65 0,0156*

Saltar 0,67 1,23 6 0,17 0,39 0,3750

Discriminação DE 1,67 0,98 3 1,33 1,07 0,5859

Irregul. Comport. 2,00 1,35 7 0,50 0,80 0,0039*

TOTAL 38,33 11,95 144 13,83 4,57 0,0005*QNST II=Quick neurological Screening Test II; a teste de Wilcoxon para amostras relacionadas; *p< 0,05; dp=desvio-padrão; DE=direita-esquerda.

DISCUSSÃOO Exame Neurológico Tradicional, indicado

para o diagnóstico topográfico de lesão no sis-tema nervoso, deveria ser uma avaliação ampla das funções neurais e, portanto, ser a mais completa possível. Deveria também ser fide-digno no sentido de ser replicável pelo mesmo e por diferentes examinadores e ser baseado em critérios objetivos29. Entretanto, esse é um exame que por sua natureza tem limitações, avaliando apenas parte do comportamento que cai dentro do escopo do exame em si (por exemplo, funções sensoriais e motoras, postura e motricidade, reações e respostas).

O ENT utiliza técnica semiológica voltada para detectar lesões específicas de núcleos, tratos ou nervos. São as anormalidades maiores

(hard signs) ou síndromes neurológicas, que têm valor preditivo de localização30.

Na presente pesquisa, todos os participan-tes do Grupo Controle apresentaram ENT normal. Nos escolares disléxicos, as anorma-lidades observadas foram achados sem valor preditivo de localização e, possivelmente, associados à alteração difusa do sistema nervoso, não consistentes com síndromes neurológicas.

Foi pesquisada a dislalia de evolução, por troca e supressão de fonemas. A dislalia de evolução por troca de fonemas deve ser consi-derada fora do padrão normal desde a idade de três anos. A dislalia de evolução por supressão de fonemas não deve entrar no padrão normal de quatro anos em diante.

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O atraso na aquisição da fala foi observado em 3 dos escolares disléxicos e em nenhum do Grupo Controle. Atraso na aquisição da fala foi observado em crianças com dificuldades escolares31,32 e em deficientes mentais33. Crian-ças sem dificuldade escolar não apresentaram alteração aos 7 anos, não havendo diferença nos resultados quanto ao sexo ou à proveni-ência escolar.

Gonçalves et al.20 avaliaram 124 alunos de classe comum de 1ª série do Ensino Funda-mental utilizando o ENT. Foram encontradas anormalidades de respostas em pelo menos uma das provas em 29,83% das crianças, sendo que 5,6% apresentaram mais que uma anor-malidade. Apenas em um escolar foi detectada síndrome específica de liberação piramidal bilateral em membros inferiores. Os achados mais frequentes foram leve hipotonia (12,09%), tremor leve de extremidades (9,67%), dislalia (5,64%) e macrocefalia (3,22%). Estes achados foram isolados, esporádicos, não sendo possível identificar síndromes neurológicas.

Diferentes autores nacionais têm observado hipotonia muscular numa frequência variando entre 3,5%34 e 22%31. Avaliando crianças com dificuldade escolar, Rotta31 referiu que o único aspecto do ENT que mostrou alteração foi o tono muscular, encontrando 42% de hipotôni-cos no grupo com dificuldade escolar. Embora estes achados tenham sido tão diferentes (22% no grupo sem dificuldade escolar), represen-tando quase o dobro de hipotônicos, não houve diferença estatisticamente significativa, sendo inferido que tal fato não foi suficiente para distinguir os dois grupos.

Utilizando o Exame Neurológico Evolutivo, observou-se que as alterações detectadas no Grupo Disléxico foram variadas, heterogêneas, não constituindo um padrão típico.

Nenhum escolar dos dois grupos apresen-tou qualquer alteração nas provas do setor de Equilíbrio Dinâmico do ENE. Pode-se levantar a hipótese de que as crianças em sua evolução adquirem habilidades motoras mais precoce-mente no setor do equilíbrio dinâmico do que

no do equilíbrio estático. Todas as provas de equilíbrio põem em jogo grupos musculares agonistas e antagonistas que funcionam de maneira harmônica, sendo capazes de corrigir eventuais roturas na sinergia destes grupos musculares.

A Persistência Motora foi o setor com maior frequência de alteração no ENE entre os esco-lares disléxicos. Isto poderia ser explicado por uma imaturidade nos sistemas tanto piramidal como tonigênico e da sinergia muscular, visto que a persistência requerida para a correta execução da prova necessita de sinergia que só é possível quando o tono muscular encontra-se harmonicamente distribuído nos músculos agonistas e antagonistas. Essas provas opor-tunizam a observação das clássicas manobras deficitárias da semiologia neurológica tradicio-nal. Uma boa técnica semiológica deve permitir que seja examinada mais de uma função com uma simples manobra, economizando tempo e cansaço para examinando e examinador.

Capellini et al.13, na avaliação de escola-res disléxicos utilizando o ENE, observaram alterações nos setores de equilíbrio estático, coordenação apendicular, persistência motora, sendo associado a anormalidades nos setores de equilíbrio dinâmico, coordenação tronco-membros e sensibilidade/gnosia. Capellini et al.9 referem alterações ao ENE como critério diagnóstico em situação de avaliação inter-disciplinar.

O QNST II foi normal em todos os escola-res do Grupo Controle e alterado em todos do Grupo Disléxico, identificado com pontuação total significativamente maior que o Grupo Controle. Assim, essa técnica de avaliação, voltada para a identificação de anormalidades de aprendizagem, possibilitou diferenciar os grupos.

Atribuiu-se que as alterações detectadas pelo QNST II caracterizaram-se como sinais menores (soft signs), os quais tanto poderiam ser sinais de imaturidade, isto é, sinais de desenvolvimento como sinais de comprometi-mento difuso do sistema nervoso. O uso desta

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técnica de avaliação neurológica acrescentou recursos no diagnóstico do Grupo Disléxico.

O resultado da pontuação total foi atribuído a alguns subtestes que mostraram média de pontuação significativamente maior no Grupo Disléxico: habilidade manual, reconhecimento e reprodução de figuras, reprodução de formas na palma da mão, padrões sonoros, movimen-tos manuais reversos, rápidos e repetitivos; extensão de braços e pernas; ficarem uma só perna; irregularidades comportamentais.

Concluindo, observou-se que não houve con-cordância utilizando as três técnicas de avaliação neurológica. Cada exame contribuiu dentro de seu escopo, acrescentando conhecimento sobre as manifestações neurológicas no Grupo Disléxico.

Entre as limitações do presente estudo tem-se o tamanho amostral. A continuidade desta pesquisa, através do aumento da casuística

poderá confirmar esses primeiros achados.A semiologia neurológica, tema central do

presente estudo, demonstrou ser um método eficaz de avaliação. Associada a outras técnicas avaliativas multidisciplinares deve constituir método complementar, numa abordagem abrangente do escolar, cada qual com suas características e objetivos a serem atingido.

Entre as vantagens deste estudo, acredita-se que a semiologia neurológica traga impor-tantes implicações educacionais. Uma delas é favorecer a elaboração de programas reme-diativos, ao destacar as habilidades do escolar que estão em processo de desenvolvimento e podem ser estimulados pelo professor no am-biente escolar. Entende-se que a interdiscipli-naridade ocorra justamente nesta possibilidade de interlocução entre o clínico e o institucional com metas e objetivos comuns: o desenvolvi-mento saudável da criança.

SUMMARYAspects of the neurological assessment in dislexic schoolchildren

Objective: The objective was to propose a detailed neurological semiology in schoolchildren that have developmental dyslexia, compared to a group without learning disabilities. Methods: A group of 12 students were identified as Dyslexic Group (1 girl and 11 boys). Those with learning disabilities, mental retardation, visual deficiency and hearing loss were excluded. They were matched on age and sex with the Control Group recruited in regular classroom placement, who were reading at grade level The Traditional Neurological Examination, Evolutive Neurological Examination and Quick Neurological Screening Test II (QNST II) were used. Results: QNST II total scores correctly identified the Dyslexic Group that showed significantly higher scores than the Control Group. Some subtests acted as a discriminator between the groups, with significantly higher scores in the Dyslexic Group in the subtests: Hand Skill, Figure Recognition and Production, Palm Form Recognition, Sound Patterns, Rapidly Reversing Repetitive Hand Movements, Arm and Leg Extension, Stand on One Leg, Behavioral Irregularities

KEY WORDS: Learning disorders. Neurologic manifestations. Dyslexia.

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Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade

de Ciências Médicas da Universidade Estadual de

Campinas – FCM/UNICAMP, Campinas, SP.

Artigo recebido: 28/11/2009

Aceito: 18/3/2010

Processamento fonológico e comPreensão leitora

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Introdução: A relação entre as habilidades linguístico cognitivas do processamento fonológico para a compreensão de textos lidos é examinada ao longo do 2°, 3° e 4° anos do ensino fundamental. Método: Foram entrevistadas individualmente 45 crianças durante 3 anos sequenciais, no início do ano letivo, para a avaliação da compreensão da leitura e cada uma das habilidades fonológicas: consciência fonológica, memória de trabalho e nomeação automatizada. Resultados: Todas as habilidades do processamento fonológico correlacionaram-se significativamente com a compreensão leitora no início do processo de letramento escolar. Nesta fase, a compreensão mostra-se ainda depende do automatismo da leitura, que deve ser precisa, veloz e fluente. Conclusão: A memória de trabalho fonológica, bem como a consciência silábica, correlacionaram-se com a compreensão em todas as séries estudadas, sugerindo a importância das habilidades de processamento fonológico na dinâmica de integração do texto no ato de leitura.

UNITERMOS: Leitura. Compreensão. Desenvolvimento da linguagem.

interrelação entre Processamento fonológico e comPreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo

longitudinal

Renata Mousinho - Fonoaudióloga. Mestre em

Linguística pela Universidade Federal do Rio de

Janeiro (UFRJ). Doutorado em Linguística pela

UFRJ. Professora da Graduação em Fonoaudiologia

da UFRJ.

Jane Correa – Graduada em Psicologia pela

Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Mestre

em Psicologia Cognitiva pela Fundação Getúlio

Vargas (FGV-RJ). Doutorado em Psicologia do

Desenvolvimento pela Universidade de Oxford.

Professora Associada do Instituto de Psicologia

da UFRJ. Coordenadora das Oficinas de Leitura

e Escrita. Bolsista de Produtividade do CNPq e

Cientista de Nosso Estado – FAPERJ.

Correspondência

Renata Mousinho

Av. das Américas, 2678 casa 11 – Barra da Tijuca – Rio

de Janeiro, RJ – CEP 22640-102

E-mail: [email protected]

Renata Mousinho; Jane Correa

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INTRODUÇÃOA leitura é uma habilidade cognitiva com-

plexa para a qual concorre uma variedade de outras habilidades e conhecimentos. Avaliar o desempenho na compreensão leitora exige reconhecer a dinâmica e multidimensiona-lidade dessa constelação crítica de compe-tências, envolvendo a integração tanto de competências das linguagens oral e escrita quanto da própria atividade cognitiva. Nessa constelação de competências e saberes, as habilidades do processamento fonológico, a saber, consciência fonológica, nomeação automatizada rápida e memória de trabalho fonológica, são consideradas muito importan-tes para a leitura, fato que representa quase uma unanimidade em pesquisas da área1-11.

A consciência fonológica responde pela habilidade de análise e segmentação da fala em subunidades e a manipulação intencional das mesmas, podendo-se, também, refletir explicitamente sobre elas12-14. A sensibilidade às subunidades que compõem a palavra falada (rimas, sílabas e fonemas15) está relacionada ao entendimento do princípio alfabético e ao aprendizado da linguagem escrita em dife-rentes ortografias, mesmo que com graus va-riados de regularidade nas correspondências grafofonêmicas16.

A memória de trabalho fonológica é caracteri-zada por ser um sistema de capacidade limitada, encarregada de armazenar brevemente as infor-mações em um código fonológico17,18, de forma a tornar possível o processamento destas informações. Já a nomeação automatizada rápida mede a facilidade e a rapidez de acessar informação fonológica da memória de longo prazo8,10,11,19,20.

Muitos são os estudos que mostram a relevân-cia das habilidades fonológicas para o processo de decodificação21-24. Entretanto, em menor nú-mero, são aqueles que mostram seu impacto na compreensão25. Provavelmente isto ocorre quer pelo maior interesse despertado pela investigação do papel de competências de natureza supras-segmental para a compreensão de textos26, quer

pela maior escolaridade dos leitores que tomaram parte nas pesquisas. É possível que a relação entre as habilidades de processamento fonológico e a compreensão leitora varie em função da escolari-dade e que a interrelação entre essas capacidades mude de acordo com a experiência de leitura da criança. Tendo em vista estas considerações, o presente estudo tem como objetivo examinar a relação entre as habilidades linguístico-cognitivas do processamento fonológico e a compreensão de textos por crianças nos anos iniciais do ensino fundamental.

MéTODOTrata-se de um estudo longitudinal, em que

o mesmo grupo de 45 crianças foi avaliado em três momentos diferentes: no início do 2°, 3° e 4° anos do ensino fundamental, com idades médias de 7 anos e 4 meses, 8 anos 4 meses e 9 anos e 4 meses, respectivamente. As crianças estudavam na mesma escola de referência do ensino federal do Rio de Janeiro desde a alfabetização, portanto com a mesma proposta pedagógica. As avaliações foram realizadas individualmente por meio da leitura de textos narrativos selecionados para cada fase escolar, de acordo com livros pedagógicos. A compreensão leitora foi avaliada a partir das respostas a perguntas sobre o texto lido, feitas oralmente, sem limite de tempo para resposta.

Para a investigação das habilidades de consciência fonológica foram escolhidas as ta-refas desenvolvidas por Cielo27, destacando-se aquelas relacionadas à consciência de palavra na frase, à rima, à consciência silábica (sínte-se, segmentação, identificação, inversão) e à consciência fonêmica (síntese, segmentação, identificação, inversão, manipulação, transpo-sição). Para a avaliação das demais habilidades linguístico-cognitivas foram utilizados os pro-tocolos de memória de trabalho para dígitos - ITPA28 e para repetição de não-palavras29, além da nomeação automatizada rápida2. Esta última dividiu-se, para fins de análise, em dois grupos: figurativo, envolvendo a nomeação de objetos e cores, e alfanumérico, tendo as letras e os números como estímulos.

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A pesquisa está autorizada pelo Comitê de Ética e pesquisa do Instituto de Neurologia Deolindo Couto da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sob o número 003/07, tendo todos os responsáveis assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOSA Compreensão Leitora e a EscolaridadeA percentagem de acerto às perguntas

que se seguiram à leitura do texto foi de 74% no 2º ano, 77% no 3º ano e 91% no 4º ano, indicando que a habilidade de compreensão leitora variou significativamente de acordo com a escolaridade das crianças (F (2,88)

= 8,37; p<0,01). De acordo com o teste de Bonferro-ni, diferenças estatisticamente significativas na proporção média de acertos às perguntas acerca do texto lido foram encontradas entre o 4º ano (Média = 0,91; Desvio-Padrão = 0,03) e o 2º (Média = 0,74; Desvio-Padrão = 0,04) e 3º anos (Média = 0,77; Desvio-Padrão = 0,03). Não foram encontradas diferenças no desem-penho das crianças do 2º e 3º anos na tarefa de compreensão de texto.

Uma vez que as avaliações foram realiza-das no início do ano letivo, estamos de fato examinando o progresso no desenvolvimento conquistado em função das experiências de aprendizagem das crianças no ano escolar anterior. Desta forma, não foram observadas diferenças expressivas no desenvolvimento das habilidades de compreensão de texto entre as crianças que já cursaram o 1º e o 2º ano. Isto ocorre, muito provavelmente, por conta da pouca experiência das crianças com o sistema de escrita e, consequentemente, com a conversão grafofonêmica. Assim, as dificuldades que as crianças ainda possuem na decodificação das palavras no texto e com a velocidade com que lêem impactam a compreensão leitora. O maior conhecimento do sistema de escrita e o consequente de-senvolvimento das habilidades de precisão e velocidade de leitura alcançados ao final do ciclo (3º ano) possibilitaram à criança alcançar,

nesta fase, um grande progresso em sua ha-bilidade de leitura em comparação aos anos anteriores, confirmando estudos anteriores30. Tal interpretação pode ser corroborada quan-do examinamos a relação entre as habilidades de processamento fonológico da criança, de-senvolvidas ao longo dos primeiros anos do ensino fundamental e o seu desempenho em compreensão de texto.

O Processamento Fonológico e a Compre-ensão de TextoA Tabela 1 apresenta as correlações entre

as habilidades de processamento fonológico avaliadas no início do 2º ano e a compreensão leitora examinada, respectivamente, no início dos 2º, 3º e 4º anos. Na Tabela 1, é também apresentado o desempenho das crianças em cada uma das habilidades de processamento fonológico. No caso da nomeação automati-zada rápida, tanto para as tarefas alfanumé-rica e figurativa, o desempenho da criança é apresentado em termos do número médio de minutos necessários para que todos os itens da tarefa fossem nomeados. No caso das outras habilidades de processamento fonológico, apresentamos a proporção mé-dia dos acertos na tarefa. Tal proporção foi calculada dividindo-se o número de acertos pelo total de itens na tarefa. Desta forma, é possível realizar uma comparação direta en-tre as diferentes tarefas apesar da diferença no número de itens de cada uma. Também é possível transformar facilmente os resulta-dos em porcentagem de acertos, facilitando, assim sua interpretação. Por exemplo, de acordo com a Tabela 1, na tarefa de consci-ência silábica a média de acertos foi de 0,85, enquanto que em consciência fonêmica foi de 0,53. Isto significa, em outras palavras, que as crianças acertaram 85% da tarefa de consciência silábica e 53% da avaliação de consciência fonêmica.

Exceto pela avaliação da memória de tra-balho feita pela repetição de dígitos, todas as outras medidas de processamento fonológico

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correlacionaram-se com o desempenho em compreensão leitora no 2º ano, indicando que as crianças que demonstraram maior habili-dade em compreender os textos lidos foram aquelas que:

a) levaram menos tempo para nomear le-tras e números (tarefa alfanumérica) ou objetos e cores (tarefa figurativa);

b) foram mais habilidosas na repetição de não-palavras;

c) mostraram melhor habilidade na identi-ficação de palavras nas frases;

d) apresentaram uma proporção maior de acertos nas tarefas de consciência fonológica para as várias unidades sonoras consideradas – rima, sílaba e fonema.

Percebe-se, ainda, a partir da Tabela 1, que as habilidades de consciência fonológica rela-cionadas à sílaba e ao fonema correlacionam-se significativamente com o desempenho das crianças em compreensão leitora avaliada no 3º ano. Tal resultado indica, portanto, a im-portância que o desenvolvimento inicial da habilidade de análise fonológica da criança tem para a atividade de leitura, mesmo que avaliada em ano escolar subsequente.

A Tabela 1 indica, ainda, que nenhuma das habilidades de processamento fonológico de-senvolvidas no 2º ano correlacionou-se signifi-cativamente com a compreensão leitora no 4º ano. Tal resultado parece indicar que ao final do três primeiros anos do ensino fundamental, a compreensão de texto irá requerer um nível mais complexo de processamento fonológico do que aquele alcançado até o 2º ano.

A Tabela 2, por seu turno, apresenta o resultado da avaliação das habilidades de processamento fonológico ocorrida no início do 3º ano e a compreensão leitora avaliada, respectivamente, nos 3º e 4º anos. No 3º ano, quanto às habilidades de memória de traba-lho, avaliadas pela repetição de não-palavras, e as de consciência silábica e fonêmica, obser-va-se que as crianças com maior capacidade de memória de trabalho com habilidades de análise fonológicas mais desenvolvidas são aquelas com melhor desempenho também em compreensão de texto.

Ainda de acordo com a Tabela 2, nenhu-ma habilidade de processamento fonológico desenvolvida até o 3º ano correlacionou-se significativamente com a compreensão leitora no 4º ano.

Tabela 1 - Correlação, média e desvio padrão das habilidades de processamento cognitivo avaliadas no 2º ano e a compreensão leitora do 2º ao 4º ano.

Compreensão Leitora

2º ano 3º ano 4º ano Média DP

Alfanumérica -0,47** -0,26 0,02 75 17,03

Figurativa -0,60** -0,23 -0,15 129 29,22

Span de dígitos 0,20 0,06 0,25 0,74 0,17

Repetição de não-palavra 0,32* 0,06 -0,08 0,83 0,12

Consciência da palavra na frase 0,43** 0,18 -0,06 0,54 0,27

Rima 0,57** 0,26 0,08 0,90 0,17

Consciência silábica 0,44** 0,31* 0,08 0,85 0,10

Consciência fonêmica 0,43** 0,39** -0,09 0,53 0,25*p <0,05; ** p<0,01

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Pela Tabela 3, observa-se que, no 4º ano, as tarefas de consciência silábica e repetição de não-palavra correlacionaram-se signifi-cativamente com a compreensão leitora. Tal resultado indica uma interação importante entre as habilidades de processamento ex-pressas pela consciência silábica, a memória de trabalho fonológica e a compreensão de texto, possivelmente, em função, por um lado, da importância que a análise fonológica tem para o processamento de padrões silábico-

ortográficos mais complexos que a criança encontra em seus textos nesta fase da esco-laridade. Por outro lado, a complexidade dos textos, expressa pelo aumento no número de palavras e pela maior variedade de gêneros textuais e temática, impõe uma demanda maior da memória de trabalho no processa-mento e integração das diferentes partes do texto no ato da leitura.

Em síntese, nossos resultados apontam para diferenças expressivas na relação entre

Tabela 2 - Correlação, média e desvio padrão das habilidades de processamento cognitivo avaliadas no 3º ano e a compreensão leitora do 3º e 4º anos.

Compreensão Leitora

3º ano 4º ano Média DP

Alfanumérica -0,10 0,03 63 10,68

Figurativa 0,04 -0,22 105 18,50

Span de dígitos 0,17 0,23 0,63 0,18

Repetição de não-palavra 0,39** 0,11 0,89 0,09

Consciência da palavra na frase 0,13 -0,12 0,82 0,03

Rima -0,10 -0,02 0,88 0,23

Consciência silábica 0,44** 0,24 0,92 0,07

Consciência fonêmica 0,36* 0,06 0,58 0,24*p <0,05; ** p<0,01

Tabela 3 - Correlação, média e desvio padrão das habilidades de processamento cognitivo e a compreensão leitora avaliadas no 4º ano.

Compreensão Leitora Média DP

Alfanumérica -0,11 54 10,04

Figurativa -0,17 96 18,66

Span de dígitos 0,28 0,76 0,16

Repetição de não-palavra 0,52** 0,89 0,08

Consciência da palavra na frase -0,10 0,92 0,12

Rima -0,07 1.00 0,01

Consciência silábica 0,44** 0,93 0,13

Consciência fonêmica -0,05 0,74 0,20*p <0,05; ** p<0,01

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as habilidades do processamento fonológico e a compreensão de leitura entre os 2° e o 4° anos do ensino fundamental, como será des-crito nas próximas linhas.

A consciência fonológica correlaciona-se com a compreensão no 2º ano do ensino fundamental em todos os níveis estudados, palavra na frase, rima, consciência silábica e consciência fonêmica. Já no 3º ano, apenas as tarefas de consciência silábica e fonêmica correlacionam-se significativamente com a compreensão de leitura. Por fim, no 4º ano, apenas a consciência silábica mostrou-se muito importante para a compreensão de textos lidos. Neste sentido, é possível que tais resultados expressem a importância indireta da análise fonológica para a compreensão de textos pela influência que exerceria no de-senvolvimento da decodificação. É possível também que haja um impacto da consciência fonológica para a compreensão de leitura para além dos efeitos indiretos mediados pela decodificação da palavra25. Dois fatores essenciais para a compreensão, o vocabulário e a memória de curto prazo, ambos podem ser também determinados pela capacidade fonológica. As relações entre consciência fonológica e compreensão de leitura, medida por teste cloze, foram também reportadas31.

A capacidade de memória de trabalho, por meio do teste de repetição de palavras, mostrou-se nesta pesquisa correlacionada significativamente com a compreensão leitora em todos os anos estudados. À medida que, nos anos iniciais de escolaridade, a criança se torne mais habilidosa no reconhecimento das palavras, a memória de trabalho vai se tornando cada vez mais relevante para a compreensão de textos lidos, particularmente a partir do 3º ano do ensino de leitura18. A memória operacional verbal e o vocabulário são apontados, com frequência, como fatores relevantes para a compreensão de leitura em crianças da 4° série do ensino fundamental32.

A nomeação automatizada rápida correla-cionou-se significativamente com a compre-

ensão de leitora no 2º ano. Porém, o mesmo não aconteceu no 3° e no 4° ano. Supõe-se que a relevância encontrada no 2º ano seja compatível com a tese de que a decodificação automática é condição para a boa compreen-são no início do processo de leitura. Neste caso, o impacto da nomeação automatizada rápida na compreensão poderia ser indireto: ela melhora a decodificação e o automatismo da decodificação o que favoreceria, então, a compreensão leitora. A compreensão de um texto de forma articulada parece depender não só do entendimento princípio alfabético, mas da precisão e velocidade com que a re-lação grafofonêmica é processada, o que con-corre para facilitar a leitura das palavras33-35.

CONSIDERAÇÕES FINAISPropusemos uma análise da relação entre

o processamento fonológico e a compreensão. O processamento fonológico envolve as habi-lidades de consciência fonológica, memória de trabalho fonológica e nomeação automatizada rápida. O interesse pelo estudo longitudinal justificou-se pela hipótese de que interrela-ção entre essas capacidades pode mudar em função da experiência de leitura. Verificou-se uma evolução significativa na evolução da compreensão leitora com o incremento da experiência de leitura. Isso reforça a ideia de que, quanto mais se lê, melhor se lê.

No que diz respeito à correlação entre as habilidades do processamento fonológico e a compreensão de leitura, todas as habilidades do processamento fonológico mostraram-se bastante importantes para o sucesso da com-preensão de textos lidos no início do processo de letramento. Nesta fase, compreender textos é uma ação que ainda depende do automa-tismo da leitura, que deve ser precisa, veloz e fluente. Esta é uma importante informação para ser aplicada tanto na clínica, quanto na educação. Um aluno que lê de modo muito silabado, por exemplo, termina por sobre-carregar a memória de trabalho, cheia de segmentos não-significativos, e simplesmente

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SUMMARYInterrelationship between phonological processing and reading comprehension in the 2nd to 4th grade of elementary school:

a longitudinal study

Introduction: The relationship between language and cognitive skills of phonological processing for reading comprehension is examined in 2nd, 3rd and 4th grades. Methods: Forty five children were interviewed individually during 3 consecutive years at the beginning of the school year, for the assessment of reading comprehension and each of the phonological processing: phonological awareness, working memory and rapid automatized naming. Results: All phonological processing skills correlated significantly with reading comprehension at the beginning of the process of school literacy. At this stage, reading comprehension seems to depends on the automaticity in reading, which needs to be precise, fast and fluent. Conclusion: Working memory and syllabic awareness correlated with reading comprehension in all grades studied, suggesting the importance of phonological processing skills to the dynamic integration of the text during the act of reading.

KEY WORDS: Reading. Comprehension. Language development.

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Neste sentido, observou-se que a memória de trabalho correlacionou-se significativa-mente com a leitura do 2° ao 4° anos. Se no início devemos conservar temporariamente na memória as unidades lidas para signifi-car uma frase, temos que, depois, guardar as frases temporariamente até atribuirmos o

significado ao parágrafo. Na mesma direção,

processamos o significado de todos os pará-

grafos do texto até terminada a leitura de

todo o texto. Neste processo interativo, para

o qual concorrem as habilidades de proces-

samento fonológico, estabelecemos relações

com nosso conhecimento de mundo, realiza-

mos inferências e dialogamos com o texto.

mousinho r & correa J

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Processamento fonológico e comPreensão leitora

Rev. Psicopedagogia 2010; 27(82): 27-35

35

Trabalho realizado no Instituto de Neurologia

Deolindo Couto da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, Rio de Janeiro, RJ.

Artigo recebido: 8/12/2009

Aprovado: 4/3/2010

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Fusco N & capelliNi sa

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36

ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Objetivo: Este estudo teve por objetivos caracterizar e comparar o nível de conhecimento dos escolares de 1ª a 4ª com e sem dificuldades de aprendizagem quanto ao uso das regras de correspondência grafema-fonema do português brasileiro. Método: Participaram deste estudo 120 escolares de escola pública municipal, de 1ª e a 4ª série, de ambos os gêneros, na faixa etária de 7 a 10 anos e 11 meses de idade. Os escolares foram distribuídos por série em 8 grupos, sendo do GI ao GIV composto por escolares sem dificuldades de aprendizagem e do GV ao GVIII composto por escolares com dificuldades de aprendizagem. Foi aplicado o Protocolo de Avaliação de Leitura, composto por 6 subtestes: prova de palavras regulares, prova de palavras irregulares, prova de palavras regulares incorretas com trocas visuais, prova de palavras regulares incorretas com trocas fonológicas, prova de palavras incorretas homófonas e prova de pseudopalavras. Resultados: OOs resultados revelaram que os escolares dos GI, GII, GIII e GIV obtiveram desempenho superior em relação aos GV, GVI, GVII e GVIII nos subtestes de Palavras Incorretas com Troca Fonológica, Palavras Regulares, Pseudopalavras e Palavras Incorretas com Troca Visual e os escolares do GIV obtiveram desempenho superior ao GVIII nas categorias de Palavras incorretas com Troca Fonológica, Palavras Irregulares e Pseudopalavras. Conclusão: OOs resultados evidenciaram que os escolares dos grupos com dificuldades de aprendizagem apresentaram falhas no conhecimento e reconhecimento de regras ortográficas se comparada aos escolares sem dificuldades de aprendizagem.

UNITERMOS: Aprendizagem. Leitura. Avaliação educacional. Escolaridade.

coNhecimeNto das regras de correspoNdêNcia graFo-FoNêmicas por escolares de 1ª a 4ª série com e sem diFiculdades de apreNdizagem

Natália Fusco – Fonoaudióloga pela Faculdade

de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual

Paulista (FFC/UNESP), Marília, SP. Bolsista de

Iniciação Científica da Fundação de Amparo à

Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP.

Simone Aparecida Capellini – Fonoaudióloga. Doutora

e Pós-Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade

de Ciências Médicas da Universidade Estadual de

Campinas (FCM/UNICAMP), Campinas, SP. Docente

do Departamento de Fonoaudiologia e Programa de Pós-

Graduação em Educação da FFC/UNESP, Marília, SP.

Correspondência

Simone Aparecida Capellini

Avenida Hygino Muzzy Filho, 737 – Marília, SP –

CEP 17525-900

E-mail: [email protected]

Natália Fusco; Simone Aparecida Capellini

avaliação de leitura

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INTRODUÇÃOPara a aquisição da leitura em uma língua

cujo sistema de escrita é alfabético, necessita-se entender que as letras correspondem a segmentos sonoros menores, ou seja, é preciso compreender o princípio alfabético da corres-pondência grafofonêmica1,2. A compreensão de que existe relação entre letras e sons da fala é, segundo vários pesquisadores, o modelo ideal de ensino do sistema alfabético3,4. Entretanto, na língua portuguesa existem várias situações nas quais nem sempre existe correspondência única, acarretando confusões quanto à escolha do grafema a ser decodificado ou simbolizado no ato da leitura1,5,6.

Para que haja compreensão do princípio alfabético da correspondência grafo-fonêmica, a criança necessita entender que as letras cor-respondem a segmentos sonoros sem signifi-cados. A linguagem escrita tem, assim, estreita relação com a linguagem falada. Apesar de, para a maioria das crianças, ser relativamente fácil aprender a ler e a escrever, as habilidades linguísticas e cognitivas básicas, necessárias para que aprendizagem possa ocorrer, são nu-merosas e complexas7.

Um dos fatores que exercem influência no desempenho da linguagem escrita é a sua ortografia. As palavras de escrita irregular po-dem produzir mais erros que aquelas de escrita regular e entre estas, melhores desempenhos podem ser observados com palavras de transpa-rência ortográfica do que com as de opacidade. Entretanto, o efeito de regularidade pode ser observado de formas diferentes para a leitura e para a escrita de palavras e pseudopalavras. Na abordagem cognitiva, a leitura e a escrita são atividades complexas compostas por múltiplos processos interdependentes, o desempenho na leitura/escrita de pseudopalavras é usado para inferir o uso da rota fonológica de leitura e es-crita e o desempenho nas palavras irregulares, cuja correspondência entre fonemas e grafemas é ambígua, exigindo conhecimento prévio do estímulo para a precisão da resposta, que é usado para analisar o uso da rota lexical8,9.

As dificuldades de leitura implicam nor-malmente uma falha no reconhecimento, ou a compreensão do material escrito. O reconhe-cimento é o mais básico dos processos, já que o reconhecimento de uma palavra é prévio a sua compreensão10. Todavia, as dificuldades de aprendizagem englobam uma vasta gama de perturbações em um ou mais processos psico-lógicos e linguísticos e se manifesta por atrasos na compreensão ou utilização da leitura, escrita, soletração, cálculo, escuta e pensamento, em crianças que não apresentam deficiências vi-suais, auditivas, motoras, mentais ou alterações evidentes de ordem emocional11,12.

Com base no exposto acima, este estudo teve por objetivo caracterizar e comparar o nível de conhecimento dos escolares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldades de aprendizagem quanto ao uso das regras de correspondência grafema-fonema do português brasileiro.

MÉTODOEste estudo foi aprovado pelo Comitê de

Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – CEP/FFC/UNESP, sob o protocolo número 3643/2008.

Participaram deste estudo 120 escolares, de pública municipal da cidade de Marília-SP. Foram distribuídos 8 grupos de 30 escolares de ambos os gêneros, na faixa etária de 6 anos a 10 anos e 11 meses de idade. Cada um desses grupos corresponde a uma das 4 séries do en-sino fundamental, com a seguinte distribuição: • Grupo I (GI): 18 escolares da 1ª série do

ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 9 (50%) do gênero fe-minino e 9 (50%) do masculino;

• Grupo II (GII): 22 escolares da 2ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 8 (36%) do gênero fe-minino e 14 (64%) do masculino;

• Grupo III (GIII): 20 escolares da 3ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 9 (45%) do gênero feminino e 11 (55%) do masculino;

Fusco N & capelliNi sa

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38

• Grupo IV (GIV): 25 escolares da 4ª série do ensino fundamental, sem dificuldade de aprendizado, sendo 10 (40%) do gênero feminino e 15 (60%) do masculino;

• Grupo V (GV): 12 escolares da 1ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 5 (42%) do gênero fe-minino e 7 (58%) do masculino;

• Grupo VI (GVI): 8 escolares da 2ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 3 (37,5%) do gênero feminino e 5 (62,5%) do masculino;

• Grupo VII (GVII): 10 escolares da 3ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 4 (40%) do gênero feminino e 6 (60%) do masculino;

• Grupo VIII (GVIII): 5 escolares da 4ª série do ensino fundamental, com dificuldade de aprendizado, sendo 1 (20%) do gênero feminino e 4 (80%) do masculino.

Como critério de exclusão, foi considerada a presença de deficiência sensorial, motora ou cognitiva descrita em prontuário escolar e como critério de inclusão foi considerada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclareci-do e ausência de queixa auditiva ou visual e presença de deficiência sensorial, motora ou cognitiva descritas nos prontuários escolares dos participantes deste estudo.

Para a realização deste estudo, foram utili-zados os seguintes procedimentos:• Termo de Consentimento Livre e Esclareci-

do: conforme resolução do Conselho Nacio-nal de Saúde CNS 196/96, anteriormente ao início das avaliações, os pais ou responsáveis pelos escolares selecionados assinaram o Termo de Consentimento autorizando a aplicação dos procedimentos deste estudo;

• Protocolo de Avaliação de Leitura9: baseado nas regras de decodificação do português brasileiro e elaborado a partir de estudo des-crito na literatura3. Este protocolo é composto por 76 palavras regulares, 20 irregulares, 10 pseudopalavras e 68 figuras distribuídas em 6 subtestes: Palavras Regulares, Palavras Ir-

regulares, Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais, Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas e Pseudopalavras. Cada subteste foi composto por figuras e palavras, sendo que as categorias 1 e 2 foram compostas de 2 figuras e 1 palavra e as demais categorias, por 1 figura e 2 palavras. Para a realização da prova, o avaliador mos-

trou ao escolar a folha contendo as ilustrações com as respectivas palavras sob as figuras. As palavras estavam dispostas em itens: 1 e 2. O avaliador mostrou a figura e solicitou ao escolar que a nomeasse. Depois da resposta correta, o avaliador perguntava ao escolar qual era a forma correta de se escrever o nome da figura, se igual à palavra de número 1 ou à palavra de número 2. Em caso de resposta incorreta, o avaliador falava o nome da figura. Foram con-sideradas respostas corretas quando o escolar apontou para a palavra ou quando falou o nú-mero a que a palavra escolhida correspondia.

Este Protocolo foi composto pelos seguintes subtestes:• Pseudopalavras: o escolar teve que identi-

ficar, com base no desenho proposto, quais das palavras não era uma pseudopalavra;

• Palavras Irregulares: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, quais das palavras não era escrita de forma irregular/regular incorreta;

• Palavras Regulares: o escolar teve que iden-tificar, com base na palavra regular escrita, qual das duas figuras de mesma classe se-mântica correspondia à palavra;

• Palavras Regulares Incorretas com Troca Visual: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, quais das pala-vras não apresentavam inversão de letras;

• Palavras Regulares Incorretas com Troca Fo-nológica: o escolar teve que identificar, com base no desenho proposto, a palavra correta que não apresentava substituição fonológica;

• Palavras Homófonas: o escolar teve que iden-tificar, com base no desenho proposto, a pa-lavra correta, cuja grafia difere da fonologia.

avaliação de leitura

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As palavras deste estudo foram selecionadas do banco de palavras elaborado com base em livros didáticos da Língua Portuguesa utilizados pelos professores de escola pública municipal do Município de Marília, SP. As palavras foram selecionadas segundo os princípios psicolin-guísticos de decodificação das regras do sistema alfabético do português do Brasil6: D1 (Regra de correspondência grafofonêmica independente do contexto) e D2 (Regra de correspondência grafofonêmica dependente do contexto).

Os resultados foram analisados por meio do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, com o intuito de verificar possíveis diferenças entre o escore esperado e obtido em cada categoria do protocolo, o Teste de Mann-Whitney, com o intui-to de verificar possíveis diferenças entre as séries dos grupos de escolares deste estudo e o Teste de Kruskal-Wallis, para comparar o desempenho dos cinco grupos concomitantemente e o Teste de Friedman, para verificar possíveis diferenças dos 8 grupos em relação ao tempo de realização de leitura em cada subteste do Protocolo.

Para a análise estatística, foi adotado o nível de significância de 5% (a = 0,050), marcado com asterisco. A análise dos dados foi realizada utilizando o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 13.0.

RESULTADOSComparando-se o desempenho dos escolares

do GI e GV, utilizando-se o Teste de Mann-Whi-tney verificamos que ocorreu diferença estatis-ticamente significante, indicando desempenho superior dos escolares do GI em relação ao GV nos subtestes: Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Regulares, Pseudopalavras e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais (Tabela 1).

Na Tabela 2, encontra-se a comparação do desempenho dos escolares do GII e GVI no Protocolo de Decodificação. Aplicando-se o Teste de Mann-Whitney, observamos que não ocorreu diferença estatisticamente significante, indicando desempenho semelhante entre os GII e GVI nos subtestes do Protocolo, inde-pendente do grupo ter ou não dificuldades de aprendizagem.

A Tabela 3 apresenta a comparação do desempenho dos escolares do GIII e GVII no Protocolo de Decodificação. Aplicando-se o Teste de Mann-Whitney, observamos que não ocorreu diferença estatisticamente significan-te, indicando desempenho semelhante entre os GIII e GVII nos subtestes avaliados, inde-pendente do grupo ter ou não dificuldades de aprendiz agem.

Tabela 1 - Distribuição da média, desvio-padrão e valor de p do desempenho obtido dos escolares da GI e GV.

Variável Grupo N Média Desvio-padrão Valor de p

PFIV

1512

8,206,58

1,931,62

0,017*

PHIV

1512

3,933,75

1,391,96

0,566

PIIV

1512

6,676,00

1,842,04

0,413

PRIV

1512

9,338,08

1,401,78

0,019*

PSIV

1512

9,607,58

0,632,15

0,009*

PVIV

1512

7,736,08

1,492,19

0,042*

Legenda: PF: prova de palavras incorretas com troca fonológica; PH: prova de palavras homófonas incorretas; PI: prova de pala-vras irregulares; PS: prova de pseudopalavras; PR: prova de palavras regulares; PV: prova de palavras incorretas com troca visual.

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Tabela 2 - Distribuição da média, desvio-padrão e valor de p do desempenho obtido dos escolares da GII e GVI.

Variável Grupo N Média Desvio-padrão Valor de p

PFIIVI

228

8,959,38

1,361,06

0,457

PHIIVI

228

4,325,00

1,461,20

0,259

PIIIVI

228

8,148,75

1,610,89

0,479

PRIIVI

228

10,099,50

2,141,07

0,547

PSIIVI

228

9,9110,00

0,290,00

0,385

PVIIVI

228

8,689,38

1,490,92

0,198

Legenda: PF: prova de palavras incorretas com troca fonológica; PH: prova de palavras homófonas incorretas; PI: prova de pala-vras irregulares; PS: prova de pseudopalavras; PR: prova de palavras regulares; PV: prova de palavras incorretas com troca visual.

Tabela 3 - Distribuição da média, desvio-padrão e valor de p do desempenho obtido dos escolares da GIII e GVII.

Variável Grupo N Média Desvio-padrão Valor de p

PFIIIVII

2010

9,308,90

1,381,29

0,170

PHIIIVII

2010

5,505,20

1,321,40

0,619

PIIIIVII

2010

8,508,40

1,471,26

0,700

PRIIIVII

2010

9,809,40

0,411,07

0,404

PSIIIVII

2010

9,709,50

0,920,85

0,329

PVIIIVII

2010

9,008,90

1,381,60

0,962

Legenda: PF: prova de palavras incorretas com troca fonológica; PH: prova de palavras homófonas incorretas; PI: prova de pala-vras irregulares; PS: prova de pseudopalavras; PR: prova de palavras regulares; PV: prova de palavras incorretas com troca visual.

A comparação do desempenho dos escolares do GIV e GVIII no Protocolo de Decodificação está disposta na Tabela 4. Aplicando-se o Teste de Mann-Whitney observamos que ocorreu di-ferença estatisticamente significante, indicando desempenho superior do GIV em relação ao GVIII, nos subtestes Palavras Regulares Incorre-

tas com Trocas Fonológicas, Palavras Irregulares e Pseudopalavras do Protocolo.

O desempenho inferior foi atribuído a dois grupos de escolares com dificuldade de apren-dizagem, são eles GV e GVIII, nos seguintes subtestes: Palavras Regulares Incorretas com Troca Fonológica, Palavras Regulares

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Incorretas Homófonas, Palavras Regulares e Pseudopalavras.

Quando utilizado o Teste de Kruskal-Wallis, para comparar o desempenho dos oito grupos deste estudo quanto ao tempo de realização de leitura em cada subteste do Protocolo, verificamos que ocorreu diferença

Tabela 4 - Distribuição da média, desvio-padrão e valor de p do desempenho obtido dos escolares da GIV e GVIII.

Variável Grupo N Média Desvio-padrão Valor de p

PFIV

VIII255

9,687,40

0,631,82

0,001*

PHIV

VIII255

5,563,80

1,422,17

0,077

PIIV

VIII255

8,687,00

1,601,00

0,022*

PRIV

VIII255

9,767,80

0,603,19

0,130

PSIV

VIII255

9,847,40

0,373,21

0,018*

PVIV

VIII255

9,608,20

0,651,79

0,065

Legenda: PF: prova de palavras incorretas com troca fonológica; PH: prova de palavras homófonas incorretas; PI: prova de pala-vras irregulares; PS: prova de pseudopalavras; PR: prova de palavras regulares; PV: prova de palavras incorretas com troca visual.

Tabela 5 - Distribuição da média, desvio-padrão e valor de p referente ao tempo de realização de leitura dos escolares do GI, GII, GIII, GIV, GV, GVI, GVII e GVIII.

Variável Grupo N Média Desvio-padrão Valor de p

PFt

IIIIIIIVVVIVIIVIII

15222025128

105

86,6058,9542,1534,44148,3357,1344,6059,00

45,1534,488,9514,3881,9511,2914,2327,85

< 0,001*

PHt

IIIIIIIVVVIVIIVIII

15222025128

105

97,6067,1446,2035,60160,5072,1358,1068,80

54,8631,7112,1211,6188,3924,9430,9424,78

< 0,001*

estatisticamente significante para todos os subtestes (Tabela 5).

Para identificarmos qual grupo apresentou menor tempo para realização da leitura dos subtestes do Protocolo foi aplicado o Teste de Mann-Whitney. Os resultados revelaram diferença estatística do grupo GIV, que obteve

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Continuação Tabela 5 - Distribuição da média, desvio-padrão e valor de p referente ao tempo de realização de leitura dos escolares do GI, GII, GIII, GIV, GV, GVI, GVII e GVIII.

Variável Grupo N Média Desvio-padrão Valor de p

PIt

IIIIIIIVVVIVIIVIII

15222025128

105

87,0761,2345,7037,52147,9250,2550,6051,20

36,3530,6810,1010,01119,7611,8816,6018,47

< 0,001*

PRt

IIIIIIIVVVIVIIVIII

15222025128

105

71,6054,9540,8039,72117,5050,7542,5050,60

53,6430,009,2115,5033,048,7613,9417,87

< 0,001*

PSt

IIIIIIIVVVIVIIVIII

15222025128

105

82,9357,6444,6536,08107,8347,0044,0051,40

49,8732,5810,7211,8253,279,7118,2321,58

< 0,001*

PVt

IIIIIIIVVVIVIIVIII

15222025128

105

99,8068,4147,8540,88137,9266,8858,1062,20

43,1528,2511,339,6833,3121,9221,5545,19

< 0,001*

Legenda: PF: prova de palavras incorretas com troca fonológica; PH: prova de palavras homófonas incorretas; PI: prova de pala-vras irregulares; PS: prova de pseudopalavras; PR: prova de palavras regulares; PV: prova de palavras incorretas com troca visual.

as maiores médias nos subtestes, Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas, Palavras Irre-gulares, Pseudopalavras e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais e do GV, que ob-teve as menores médias nos subtestes: Palavras

Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas, Palavras Irre-gulares, Pseudo Palavras e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais (Tabela 6).

Estes resultados indicaram que o aumento da seriação influiu no tempo de realização de

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leitura dos escolares, isto é, quanto maior a seriação escolar, menor o tempo de realização da leitura de palavras regulares, irregulares e homófonas e identificação de palavras in-corretas com troca visual e troca fonológica, tanto para os grupos de escolares com e sem dificuldades.

Tabela 6 - Valor de p referente à comparação do tempo de realização de leitura dos escolares do GI, GII, GIII, GIV, GV, GVI, GVII e GVIII.

Par de GruposVariável

PFt PHt PIt PRt PSt PVt

I x II 0,001* 0,007* 0,004* 0,133 0,014* 0,002*

I x III < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001* 0,001* < 0,00*

I x IV < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001*

I x V 0,005* 0,057 0,118 0,001* 0,057 0,005*

I x VI 0,004* 0,137 0,001* 0,457 0,011* 0,014*

I x VII < 0,001* 0,013* 0,002* 0,020* 0,008* 0,003*

I x VIII 0,238 0,149 0,016* 0,294 0,081 0,040*

II x III 0,032* 0,007* 0,018* 0,048* 0,080 0,005*

II x IV < 0,001* < 0,001* < 0,001* 0,005* < 0,001* < 0,001*

II x V < 0,001* < 0,001* 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001*

II x VI 0,324 0,639 0,360 0,510 0,656 0,888

II x VII 0,207 0,349 0,597 0,193 0,099 0,349

II x VIII 0,755 0,492 0,803 0,925 0,435 0,365

III x IV 0,003* 0,005* 0,024* 0,196 0,003* 0,055

III x V < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001* < 0,001*

III x VI 0,002* 0,003* 0,387 0,005* 0,541 0,015*

III x VII 0,741 0,628 0,428 0,826 0,379 0,301

III x VIII 0,248 0,053 0,496 0,220 0,610 0,708

IV x V < 0,001* < 0,001* < 0,001 < 0,001* < 0,001* < 0,001*

IV x VI 0,001* < 0,001* 0,010 0,003* 0,005* 0,001*

IV x VII 0,028* 0,014* 0,041 0,534 0,249 0,009*

IV x VIII 0,042* 0,006* 0,095 0,062 0,032* 0,265

V x VI < 0,001* 0,006* 0,001* < 0,001* 0,001* < 0,001*

V x VII < 0,001* 0,002* 0,002* < 0,001* < 0,001* < 0,001*

V x VIII 0,006* 0,020* 0,011* 0,002* 0,011* 0,011*

VI x VII 0,050 0,142 0,965 0,142 0,327 0,424

VI x VIII 0,769 0,942 0,942 0,607 0,826 0,420

VII x VIII 0,462 0,425 0,951 0,391 0,297 0,713Legenda: PF: prova de palavras incorretas com troca fonológica; PH: prova de palavras homófonas incorretas; PI: prova de pala-vras irregulares; PS: prova de pseudopalavras; PR: prova de palavras regulares; PV: prova de palavras incorretas com troca visual.

DISCUSSÃO Para os escolares sem dificuldades de apren-

dizagem, o aumento da seriação representou a melhora no reconhecimento de palavras e me-lhora no seu vocabulário visual, o que proporcio-nou a melhora nas habilidades de processamen-to fonológico e ortográfico para a decodificação

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e reconhecimento da palavra durante a leitura, corroborando a literatura especializada4,9,13. Isto porque, os escolares se tornaram mais hábeis em decodificar novas palavras usando a relação letra/som, utilizando esta conversão para ajudá-los a ler pseudopalavras4.

Segundo a literatura14, os resultados da pri-meira série deste estudo podem ser explicados pelo fato da leitura por decodificação grafofonê-mica, no início, ser muito lenta, podendo apre-sentar erros em palavras com irregularidade nas relações entre as letras e os sons. Diversos países de língua alfabética compreenderam rapida-mente que, para evitar dificuldades em leitura e escrita, as crianças deveriam ser ensinadas, de forma explícita e sistemática, a manipular fonemas, pois quanto mais desenvolvida essa habilidade, melhor a compreensão da relação fonema-grafema9,15.

Os escolares das séries intermediárias, ou seja, segunda e terceira séries, seja com pre-sença ou sem dificuldades de aprendizagem, não apresentaram diferença estatisticamente significante quando realizada a comparação intergrupos. Este fato discorda da literatura16, entretanto, isto pode ser justificado pelo fato dos escolares não estarem expostos em sala de aula a situações de contato com as regras ortográficas de forma progressiva ao longo da seriação, pois sabemos que esta exposição depende muito do enfoque à ortografia que o professor em sala de aula oferece às crianças ao longo das seriações.

Os melhores desempenhos foram obtidos pelos escolares do grupo GIV, nos subtestes de leitura de Palavras Regulares Incorretas com Trocas Fonológicas, Palavras Incorretas Homófonas e Palavras Regulares Incorretas com Trocas Visuais. Os escolares do GVIII obtiveram desempenho inferior em relação os escolares com dificuldades de aprendizagem de séries anteriores na maioria dos subtestes do Protocolo, os escolares do GVIII só foram superiores aos escolares do GV. Assim, estes achados evidenciam que uma mesma sala de aula, com escolares com e sem dificuldades de aprendizagem, pode demonstrar a disparidade

que se encontra o domínio das regras ortográfi-cas, uma vez que os escolares com dificuldade de aprendizagem encontram-se, quanto ao desempenho no Protocolo, em nível semelhante a escolares de séries iniciais.

Quanto ao tempo de leitura, este estudo correspondeu com os achados da literatura9, os quais mostraram uma relação indiretamente proporcional à seriação, pois quanto maior a seriação, menor o tempo dedicado pelos esco-lares para a realização da leitura.

O grupo GIV dispendeu o menor tempo em todos os subtestes do protocolo, em contrapar-tida, o grupo GV dispendeu o maior tempo dentre todos. Com relação entre tempo de latência e a escolarização, a partir do aumento da frequência entre o contato do escolar e a pa-lavra escrita, se aprende as regras ortográficas, as representações (fonológicas, ortográficas e de significado), as quais se estabilizam e possi-bilitam uma recuperação cada vez mais rápida e automática da palavra escrita. Por outro lado, ao ler palavras novas ou pouco frequentes, ex-tensas, homófonas e com irregularidades ainda não aprendidas ou em fase de aprendizagem, o escolar terá de utilizar regras de conversão grafema-fonema e ou realizar uma busca no léxico à procura da representação correspon-dente ao input, o que diminui ainda mais o tempo de recuperação17.

CONCLUSÃOO Protocolo de Avaliação de Leitura aplicado

neste estudo permitiu conhecer o perfil dos es-colares de 1ª a 4ª série com e sem dificuldade de aprendizagem quanto às categorias de leitura de palavras avaliadas.

Os achados deste estudo permitem concluir que os escolares sem dificuldade de aprendi-zagem apresentaram desempenho superior no conhecimento e uso das regras ortográficas na leitura, assim como na velocidade de decodifi-cação, o que pode ser justificado pelo aumento da seriação escolar e, consequentemente, o au-mento da frequência do contato com a palavra por meio da maior exposição à leitura de textos.

avaliação de leitura

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Entre os escolares com dificuldade de aprendi-zagem, os pertencentes ao GV e GVIII obtiveram os desempenhos inferiores aos demais grupos nos subtestes do protocolo de leitura referentes à leitu-ra de palavras regulares, irregulares, homófonas, pseudopalavras, com troca visual e troca fonológica.

Os escolares com dificuldade de aprendi-zagem apresentaram maior dificuldade para

leitura de palavras incorretas homófonas, palavras irregulares e palavras incorretas com troca fonológica, enquanto que os es-colares sem dificuldade de aprendizagem apresentaram maior dificuldade para leitura de palavras incorretas homófonas, palavras irregulares e palavras incorretas com troca fonológica.

SUMMARYKnowledge of grafo-phonemic rules by students from 1st to 4th grades

with and without learning difficulties

Objective: This study aimed to characterize and compare the level of knowledge of students from 1st to 4th grade with and without learning disabilities regarding the use of rules of grapheme-phoneme correspondence in Brazilian Portuguese. Methods: A number of 120 students from public school participated in this study, from 1st to 4th grades, both genders, aged 7 to 10 years and 11 months old, divided according to their grades in 8 groups, being GI to GIV composed by students without learning difficulties and GV to GVII composed by students with learning difficulties. The protocol of Reading Assessment was used, consisting of 6 subtests: Regular Word, Irregular Word, Incorrect Regular Words with Visual substitutions, Incorrect Regular Words with Phonological Substitutions, Homophones Incorrect Word and Non Words. Results: The results revealed that the students from GI, GII, GII and GIV achieved superior performance compared to groups GV, GVI, GVII and GVIII in the Words with Incorrect Regular words with phonological substitutions subtest, Regular Word subtest, Non words subtest and Incorrect Regular Words with Visual substitutions subtest, and the students from GIV showed a superior performance in reading subtests in relation to GVII in the subtests of Incorrect Regular words with phonological substitutions subtest, Irregular Word subtest and Non words subtest. Conclusion: The results showed that the school groups with learning difficulties showed gaps in knowledge and recognition of spelling rules when compared to students without learning difficulties.

KEY WORDS: Learning. Reading. Educational measurement. Educational status.

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Trabalho realizado na Faculdade de Filosofia e

Ciências da Universidade Estadual Paulista – FFC/

UNESP, Marília, SP.

Artigo recebido: 10/11/2009

Aprovado: 8/1/2010

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Introdução: A dislexia é um transtorno específico de leitura amplamente estudado em diversas áreas de conhecimento científico, sendo comprovado que disléxicos apresentam déficits fonológicos na leitura. Método: Visando investigar o nível sintático de processamento, realizamos esta pesquisa focando na análise da sensibilidade à aposição sintática e à concordância entre sujeito e verbo em orações relativas apostas a um sintagma nominal complexo em português brasileiro. Contrastamos crianças disléxicas com crianças sem problemas na leitura. Resultados: Os resultados demonstraram que crianças não disléxicas tiveram preferência por aposição local no processamento imediato da sentença (processamento on-line), enquanto que crianças disléxicas não demonstram sensibilidade rápida à localidade da aposição sintática neste tipo de estrutura. Na interpretação da frase (processamento off-line), ambos os grupos, disléxicos e não-disléxicos, preferiram aposição não local. Conclusão: Concluímos que, embora haja diferenciação no processamento on-line entre os grupos, no processamento off-line, onde se dá a interpretação das frases, não há diferença entre os grupos disléxico e não-disléxico. Estes resultados reforçam a existência dos modelos de processamento em dois estágios, nos quais há dois momentos no processamento: um mais reflexo, onde o parser atua; outro reflexivo, de interpretação, influenciado pelos demais níveis linguísticos, semântico e pragmático. Os disléxicos parecem contar apenas com a interpretação final, utilizando pistas semânticas relacionadas à maior saliência perceptual do núcleo do sintagma complexo. Em relação ao contexto escolar dos disléxicos, esta pesquisa reforça a ideia de que os disléxicos não apresentam dificuldade de compreensão do material lido, embora demorem mais tempo para ler.

UNITERMOS: Dislexia. Leitura. Psicolinguística. Fonoaudiologia. Linguística.

Dislexia e processamento sintático

Luciana Mendes – Fonoaudióloga, mestre em

Linguística pela Universidade Federal do Rio de

Janeiro (UFRJ).

Marcus Maia – PhD em Linguística, pela USC –

University of Southern California, EUA.

Gastão Coelho Gomes – Doutor em Engenharia de

Produção pela COPPE-UFRJ.

Correspondência

Luciana Mendes

Rua Coronel Paulo Malta Resende, 35/1204, Barra

da Tijuca, RJ – Cep.: 22631-005

E-mail: [email protected]

Luciana Mendes; Marcus Maia; Gastão Coelho Gomes

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INTRODUÇÃO Os transtornos de leitura são amplamen-

te estudados pela comunidade acadêmica de diversas áreas científicas, exatamente porque intrigam os pesquisadores a respeito do seu funcionamento e como isto pode vir a prejudicar o desempenho dos sujeitos ao longo de sua vida escolar. O presente estudo examina a sensibilidade à aposição sintática e à concordância entre o sujeito e o verbo na compreensão de períodos formados por uma oração adjetiva restritiva aposta a um sintagma nominal complexo, por crianças com o distúrbio específico de leitura, dislexia, comparando-as com crianças não disléxicas. A motivação para este estudo é gerada a partir do fato, já com-provado em diversas pesquisas, de disléxicos possuírem déficit na rota fonológica de leitura, o que pode induzir os erros de concordância no processamento da leitura. Isto ocorreria porque problemas de decodificação da leitura sobre-carregam a memória de trabalho, aumentando o tempo de leitura da sentença e prejudicando o fechamento da sentença1-8. Investigar estas características do processamento da leitura contribui para a compreensão do distúrbio de leitura que ocorre na dislexia, assim como potencialmente auxilia na intervenção deste distúrbio na reabilitação.

O fato de a dislexia apresentar déficits na rota fonológica de leitura faz com que a velo-cidade de decodificação seja lenta e, muitas vezes, ineficiente, resultando em uma produção oral silabada, com trocas de letras, inversões de letras na palavra e etc, o que, consequente-mente, compromete a compreensão do material lido. Isto ocorre com maior gravidade quando o indivíduo lê silenciosamente, exatamente por não se beneficiar do automonitoramento audi-tivo que acontece na leitura em voz alta1,3,4,7-9.

Poucos são os estudos que investigam a análise da leitura de frases por disléxicos. A maioria se detém na leitura de palavras e al-guns outros poucos focalizam a compreensão de textos, utilizando, mais frequentemente, tarefas interpretativas, que não conseguem

avaliar o processamento on-line, que se dá em unidade de tempo de milésimos de segundos. Com o objetivo de investigar, exatamente, o processamento on-line na leitura de frases, de-senvolvemos um experimento psicolinguístico de leitura automonitorada, contrastando dois grupos: um com diagnóstico de dislexia e outro de crianças consideradas boas leitoras. Ambos os grupos pertencem à mesma classe social, mesma faixa etária e mesmo nível escolar. Desta forma, o primeiro grupo configurou o grupo alvo do estudo e o segundo grupo serviu de controle para as análises.

Utilizamos como foco da análise a leitura e a compreensão de períodos contendo orações adjetivas restritivas adjetivas ou relativas, amplamente estudadas em várias línguas pela Psicolinguística, tomando como sujeitos dos experimentos leitores sem distúrbios10,11. Estas construções consistiam de períodos compostos contendo uma oração relativa (OR) aposta a um sintagma nominal (SN) complexo (SN1 de SN2 OR), na qual a ambiguidade de aposição da OR é desfeita pela concordância de número. Esta construção tornou-se conhecida, principalmen-te, pelo trabalho seminal dos linguistas Fernan-do Cuetos e Don Mitchell, em 1988, no qual se questionou a universalidade do processador de frases (parser)12. Desde então, vários pesquisa-dores vêm desenvolvendo estudos experimen-tais, com vistas a estabelecer a preferência no processamento em apor a OR ao constituinte mais próximo ou mais distante na frase10,11,13-18.

MÉTODO

SujeitosUtilizamos dois grupos de crianças, sendo

ambos com 16 crianças cursando a terceira ou quarta séries do Ensino Fundamental de escola particular da cidade do Rio de Janeiro. A faixa etária destas crianças foi entre 9 e 11 anos. O grupo (1), grupo afetado, foi composto de crianças diagnosticadas como portadoras de dislexia e o grupo (2), grupo-controle, formado por crianças sem histórico de problemas de fala/

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linguagem ou alterações de leitura, indicadas pela professora da escola como boas leitoras.

Tarefa experimentalA tarefa foi a leitura automonitorada de fra-

ses. Esta técnica consiste na leitura de frases, que aparecem de forma não cumulativa na tela do computador, “chamadas” à tela pelo próprio leitor que controlava a entrada do segmento da frase na tela, apertando a barra de espaços no teclado do computador. Cada segmento novo de frase substituía o anterior e o último segmento era indicado por um ponto final. Ao final de cada frase, havia uma pergunta interpretativa em que o leitor podia escolher pela aposição local ou não-local da oração relativa. A criança era previamente instruída a apertar o botão identificado como “A” (codificado para corres-ponder à letra S do teclado do computador) ou “B” (codificado para ser a letra L do teclado do computador), para responder à pergunta inter-pretativa. O experimento foi implementado por meio do programa Psyscope, que permite proje-tar e monitorar experimentos psicolinguísticos, controlando tempos de reação em milésimos de segundos. O computador utilizado foi um laptop Apple Macintosh Powerbook G-318..

Desenho ExperimentalO desenho experimental foi do tipo fatorial

2x2x2, pois cada uma das três variáveis inde-pendentes do estudo dividia-se em dois níveis, a saber, Fator 1: Grupo normal/disléxico; Fator 2: Concordância singular/plural; e Fator 3: Apo-sição da OR local/não-local. Neste experimento, projetou-se um desenho no qual as sentenças foram distribuídas em “quadrado latino”, o que quer dizer que cada sujeito foi exposto a todas as condições, mas não a todos os itens de cada condição, que foram comparados entre sujeitos (between subjects). Foram utilizadas as quatro condições de oração relativa aposta a SN complexo, sendo a ambiguidade desfeita pela concordância de número, como já dito anteriormente. Utilizamos 16 frases experi-mentais e 20 frases distratoras. As frases-alvo

(experimentais) eram sempre orações relativas não-ambíguas, apostas a um SN complexo. As frases distratoras não continham orações relati-vas e tinham o objetivo de desviar a atenção do sujeito que está sob experimento, de forma que ele não consiga perceber qual fenômeno seria testado. Todas as frases foram segmentadas em quatro partes, seguidas de pergunta inter-pretativa ao final do quarto segmento, como exemplificado a seguir:

Aposição alta (concordância não-local)Singular – Plural – Singular (SPS)Marcos visitou /o colega dos meninos/ quemora/ na vila.Plural – Singular – Plural (PSP)Marcos visitou/ os colegas do menino/ quemoram/ na vila.

Aposição baixa (concordância local)Plural – Singular – Singular (PSS) Marcos visitou /os colegas do menino/ que mora/ na vila.Singular – Plural – Plural (SPP) Marcos visitou/ o colega dos meninos/ que moram/ na vila.Pergunta: Quem mora na vila? (A) o(s) colega(s) (B) o(s) menino(s)

Medidas on-line vs. medidas off-lineO experimento aqui desenvolvido inclui

duas medidas de análise, uma on-line e outra off-line. A medida on-line faz referência ao processamento imediato da sentença, que foi mensurado em milésimos de segundos duran-te a atividade de leitura pelos sujeitos. Esta metodologia psicolinguística pretende acessar o momento exato do processamento sintático, neste caso, sem que haja interferência de outros fatores reflexivos e pós-sintáticos da linguagem, tais como os níveis semântico e o pragmático. Já a medida off-line envolve uma tarefa reflexiva e interpretativa, abarcando os outros níveis linguísticos (semântico, pragmático), outras operações mentais (funções cognitivas diver-sas) e efeitos pós-sintáticos do processamento.

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Ao contrastar estas medidas, podemos observar como o processamento ocorre em tempo real (on-line) isoladamente e assim verificar se há alguma diferença entre os tempos de leitura e os índices de resposta interpretativa final. Ou seja, se há diferença de comportamento frente a estas duas medidas, e se podemos comprovar o modelo de processamento nesses dois está-gios12,18-20.

Na clínica fonoaudiológica, a maioria das testagens utilizadas para diagnóstico e acompa-nhamento, envolve tarefas quase sempre do tipo off-line, que não conseguem capturar o exato momento do processamento isoladamente das demais funções cognitivas.

Variáveis independentes observadas1. Grupo – crianças disléxicas e não-dislé-

xicas;2. Número do SN com o qual o verbo con-

corda – singular ou plural;3. Aposição local ou não-local da Oração

Relativa.

Variáveis dependentes do estudo1. Tempos de leitura do segmento crítico

(segmento 3), que contém a oração rela-tiva de cada tipo de sentença (resposta on-line);

2. Índices de respostas às perguntas de com-preensão (resposta off-line).

RESULTADOSPara análise dos dados, escolhemos a análise

de variância, na qual utilizamos a ANOVA21, analisando os dados por duplo corte: por sujeitos e por itens, por meio do programa estatístico de domínio público R (www.r-project.org). Há duas análises a serem consideradas, a do estudo on-line (no ato do processamento da leitura) e a do estudo off-line (posterior ao processamento, relacionado à compreensão).

No estudo on-line, a variável dependente consiste nos tempos de leitura do segmento 3 da sentença, exatamente onde está localizada a oração relativa (que mora/que moram, no

exemplo anterior). Os tempos de leitura deste segmento indicam o tempo de processamento on-line do verbo da oração relativa. As diferen-ças relativas entre os tempos de leitura do seg-mento 3, nas quatro condições, são indicadoras de efeitos de facilitação e/ou estranhamento da concordância entre o sujeito (local ou não local) e o verbo (singular ou plural), por parte do leitor. No caso do estudo off-line, verificamos o índice de acertos de cada grupo, disléxico e não dis-léxico em cada condição: localidade e número.

Então, a ANOVA multivariada é composta de três fatores (disléxico/não disléxico; plural/singular; não-local/local). Para visualizar a dis-tribuição dos dados e os fatores relacionados, utilizamos o gráfico boxplot22. Este é um gráfico que representa os cinco números: o mínimo, o máximo, a mediana, o primeiro e terceiro quartis da distribuição dos dados. Estes resumem a dis-tribuição de uma variável, neste caso, o tempo de resposta em cada uma dos fatores indicados no gráfico em cada grupo, disléxico e controle.

Análise dos tempos de leitura do segmento crítico A análise os dados do experimento on-line

em relação ao tempo de leitura do segmento que contém a oração relativa encontra-se na Figura 1.

Pelo fato de haver valores muito diferentes nas cinco categorias observadas na Figura 1, as escalas atribuídas aos subgráficos estão di-ferentes, visando facilitar a leitura dos mesmos. Observa-se certa dispersão dos números no grupo disléxico, o que nos leva a correlacionar com o fato dos sujeitos deste grupo terem apre-sentado maior tempo de leitura deste segmento analisado em relação ao grupo controle.

Na análise da interação entre os fatores, podemos dizer que o fator 1 – ser ou não dislé-xico, é muito robusto em relação às diferenças de tempos de leitura, pois os disléxicos levam significativamente mais tempo para o proces-samento on-line das orações relativas do que os não-disléxicos, sendo F= 19,4 (com 1 e 120 gl), correspondendo a um valor p de 0,0002.

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Figura 1 - Boxplot do tempo relacionado aos fatores usados na ANOVA por sujeitos e por itens nos grupos disléxico e não disléxico.

O fator concordância de número, plural e sin-gular (Fator 2) não apresentou relevância e o fator localidade, local e não-local (Fator 3) apresentou significância somente na análise por sujeito, apresentando F= 27,6 com 1 e 232 gl, sendo p-valor igual a 0,00000, sendo altamente significativo. E também não houve nenhuma in-teração entre os fatores analisados desta forma. Todos os demais resultados de p-valores dos outros testes F foram acima de 10%.

Pelo fato de ter ocorrido essa grande diferen-ça no tempo de processamento entre os grupos se analisados em conjunto, não conseguimos evidenciar como cada grupo se comporta diante das demais variáveis (localidade e número). Observamos, assim, que analisar os grupos em conjunto não foi suficiente para explicar os resultados encontrados, e assumimos que isto pode ter ocorrido pela grande diferença entre os valores em relação ao fator tempo de leitura. Logo, resolvemos separar os resultados de cada

grupo e analisá-los internamente, focando a análise nos dados de cada grupo, para assim verificarmos se há algum destaque entre os fatores de número e localidade.

Se analisarmos o grupo controle, temos a configuração representada na Figura 2.

Neste caso, então, constatamos que as crian-ças não-disléxicas preferem a concordância local, pois este fator foi altamente significativo neste grupo, gerando uma diferença entre as médias de tempo de leitura de 487 milésimos de segundos (F1 (1,60) = 17,11, p < 0,001).

A análise por itens do grupo de não disléxicos confirmou os resultados encontrados na análise por sujeitos. Diante destes dados, observamos que é mantida a preferência por aposição local neste grupo de crianças não disléxicas, no caso do processamento imediato das sentenças. F2 (1,60) = 21.37, p < 0,001. Não houve evidências significativas em relação à condição de número, seja na análise por itens ou por sujeitos.

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Figura 2 - Boxplot do tempo relacionado aos fatores usados na ANOVA por sujeitos e por itens no grupo-controle.

Em relação ao grupo alvo do estudo, obser-vamos que os disléxicos revelam a configuração apresentada na Figura 3.

Já na análise no grupo disléxico, verifica-mos que este não apresentou preferência por quaisquer fatores, seja localidade, ou número, pois os valores foram muito próximos uns dos outros. Logo, crianças disléxicas não apresen-tam sensibilidade nestas condições (localidade e número) em orações relativas apostas a um SN complexo no processamento on-line. Todos estes testes apresentaram p > 0,5.

A análise por itens repetiu esta comprovação: os disléxicos não apresentaram sensibilidade à concordância de orações relativas no processa-mento imediato de frases (todos os p´s valores > 0,5).

Após esta análise do segmento crítico, no qual se encontra a oração relativa e alvo da análise da concordância, faz-se necessário observar como as crianças reagem frente aos

outros segmentos da frase, visto que a reação do segmento crítico, para que tenha valor no processamento, deve ser diferenciado.

Análise do tempo de leitura dos segmentos não críticos De forma a comprovar que realmente houve

significância na análise do segmento crítico da estrutura alvo SN1 de SN2 OR, realizamos a análise dos outros segmentos da frase. A ANO-VA dos segmentos não críticos revelou p-valo-res não significativos, seja para sentenças onde havia relevância para o fator localidade ou para o fator número. Se analisarmos a interação en-tre os fatores, sem levar em consideração cada fator especificamente, também são valores altos e não significativos. Desta forma, reafirmamos o fato de os resultados encontrados no estudo on-line serem altamente relevantes e restritos ao segmento crítico contendo a oração relativa aposta a um SN complexo.

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Figura 3 - Boxplot do tempo relacionado aos fatores usados na ANOVA por sujeitos e por itens no grupo disléxico.

Outro ponto relevante para a análise é o segmento final de frase, sendo neste caso o segmento 4. Normalmente, inclui-se num ex-perimento deste tipo, um segmento final, após o segmento crítico. O objetivo desta inclusão deve-se ao fato do segmento final ser o ponto onde se finaliza a concatenação dos elementos da sentença, logo, onde se inicia a fase de in-terpretação. Se o segmento final for o segmento crítico, confunde-se a leitura deste com a inter-pretação da sentença, ou seja, a interpretação dos dados pode confundir-se com a atuação do parser. Mesmo assim, no segmento posterior ao

crítico poderia acontecer um efeito conhecido como “spillover” ou debordamento do efeito, que consiste numa interferência do aumento no tempo de leitura do segmento crítico “de-bordando” sobre o segmento final. Neste caso, o segmento final poderia, também, ter o seu tempo médio de leitura aumentado15,23-26. De qualquer forma, este efeito não foi encontrado, uma vez que os índices de p-valor de ambos os grupos foram altos no segmento final de frase.

Após analisarmos os dados do experimento on-line, para entendermos se há diferenças entre as respostas reflexas de processamento

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e as respostas reflexivas de compreensão, é importante verificar como as crianças de ambos os grupos respondem ao experimento off-line.

Análise da preferência de aposição na ora-ção relativa No caso da medida interpretativa off-line,

podemos também observar que a análise es-tatística ANOVA por sujeitos e por itens pode revelar que há diferença em relação ao estudo on-line. A Figura 4 apresenta a configuração dos dados da tabela de ANOVA no gráfico boxplot.

Na resposta interpretativa à pergunta de final de frase, percebe-se que não há diferença entre as respostas dos dois grupos, logo, disléxi-cos e grupo controle têm os mesmos índices de acertos na interpretação da oração relativa. Este resultado aponta para o fato que a lentificação dos disléxicos em processar pode ser compen-sada no momento da interpretação.

Observando os outros fatores além da di-ferença entre os grupos, detectamos que há preferência por localidade por ambos os grupos, disléxicos e não disléxicos, sendo que ambos preferem a concordância local. Também houve

preferência em relação à condição de número por ambos os grupos, na qual acertaram mais as frases em que a concordância estava no plural.

O resultado que obtivemos em relação ao fator localidade reitera os achados bibliográficos de sujeitos adultos sem transtornos explicitados em vários outros estudos psicolinguísticos. Nesses es-tudos, que foram realizados tanto em português do Brasil quanto na variante de Portugal, observou-se também preferência rápida por concordância lo-cal10,11,14. O resultados do estudo evidenciado com as crianças disléxicas e sem dislexia aponta para o fato de, seja com ou sem o distúrbio específico de leitura, as crianças leitoras da faixa etária ana-lisada têm o mesmo comportamento interpretativo no final do processamento da leitura. Ou seja, apesar dos disléxicos apresentarem mais do que o dobro do tempo médio de leitura em relação a crianças sem dislexia, conseguem chegar ao mesmo resultado interpretativo. O problema dos disléxicos estaria então relacionado somente ao processamento on-line e imediato da leitura e não relacionado à interpretação da mesma.

O fator número destacado como preferencial em ambos os grupos pode ser justificado pelo

Figura 4 - Boxplot da tarefa off-line, configurando os acertos da pergunta interpretativa, na ANOVA por itens e por sujeitos nos grupos disléxico e não disléxicos.

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fato do plural ser mais marcado linguisticamen-te e fonologicamente. Então, a sensibilidade por esse tipo de concordância justifica-se pela relevância suprassegmental da marcação plural.

DISCUSSÃONossa hipótese inicial era a de que os resulta-

dos apontassem para tempos de leitura maiores para o grupo de disléxicos em relação ao grupo-controle, o que não representaria nenhuma novi-dade, já que muitos estudos da área de dislexia já evidenciaram este aspecto. Nós contávamos também que houvesse alguma diferença nas respostas quanto à preferência na aposição deste tipo de estrutura (SN1 de SN2 OR) entre esses dois grupos. Ou seja, que haveria alguma assimetria entre os grupos a respeito da sensibilidade da localidade de concordância, seja pela medida on-line, ou pela medida off-line, seja pela condição de número ou localidade. Se fosse pela condição de número, poderíamos justificar que haveria influência do efeito cascata no fluxograma da linguagem, logo, uma vez afetado o nível fonoló-gico (comprovadamente afetado na dislexia), os outros níveis linguísticos também seriam afetados (sintático e semântico, principalmente).

Analisando-se os grupos em conjunto, obser-vamos que, pelo fato de disléxicos serem muito lentos na leitura, nenhum outro fator foi mais relevante além da velocidade. Separando-se os grupos, analisamos o comportamento de cada um de forma mais específica, sem haver influência so-mente do fator velocidade de leitura – já sabido ser este o ponto chave afetado em crianças disléxicas. Desta forma, os resultados encontrados em cada análise realizada demonstram que as crianças sem distúrbio específico de leitura tiveram preferência por aposição local no processamento imediato. Já as crianças com distúrbio não apresentaram pre-ferência, ou seja, não parecem ter sensibilidade rápida à localidade da concordância neste tipo de estrutura. Não encontramos evidências que justificassem preferência pela concordância em relação à condição de número (singular e plural) entre sujeito e o verbo em nenhum dos dois gru-pos. Ou seja, a condição de número parece não ser

relevante neste tipo de estrutura, seja para crian-ças com ou sem distúrbio específico de leitura.

Na análise de interpretação final de frase, em ambos os grupos, disléxicos e controle, houve preferência por aposição não local. Logo, embora haja diferenciação no processamento on-line entre os grupos, processamento este mais automático e que utiliza o parsing sintático, no processamento off-line, onde se dá a interpretação das frases, não há diferença entre os grupos (X² (1gl) = 0,8, p < 0,37). Desta forma, encontra-se evidência a favor do modelo de processamento em dois estágios, proposto pelas teorias estruturais da Psicolinguística, como a Teoria do Garden Path (TGP), adaptada para o português por Dillinger, em 1992, como Teoria do Labirinto. Esta metáfora foi utilizada para ilustrar o termo e é justificada pelo fato de ser um modelo estrutural de proces-samento de frases, onde estas são comparadas a um labirinto, com várias bifurcações a serem esco-lhidas como opção de caminho – possibilidades de análise sintática e interpretação. A escolha parece ser sempre pelo caminho mais simples ou mais curto. A ideia principal é a de que os elementos das frases são concatenados e agrupados por com-putação sintática e o analisador - parser - é uma parte integrante dos processos de compreensão e produção da linguagem referindo-se aos pro-cedimentos mentais que determinam a estrutura de uma frase25. A TGP é um modelo estrutural, que caracteriza a compreensão da linguagem como um processo serial e incrementacional que obedece a princípios e regras. Ao ouvir uma fra-se, o mecanismo humano de processamento de frases (Human Sentence Processing Mechanism – HSPM ou Parser) opera restrito pelos limites da memória de trabalho. Em período de tempo limitado a poucos segundos, precisa armazenar os constituintes frasais na memória de curto-prazo e analisá-los em estruturas hierárquicas.

No caso desse estudo aqui descrito, observa-se que há diferenciação entre parsing e inter-pretação, uma vez que, em ambos os grupos analisados, houve diferenças entre as respostas reflexas (medida on-line) e as reflexivas (medida off-line). Em relação ao fator número, encontra-

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mos o resultado que comprova o efeito cascata de influência entre os níveis linguísticos, uma vez que afetado o nível fonológico na leitura dos disléxicos, os demais níveis poderiam ser com-prometidos em decorrência. Neste estudo, houve maiores índices de acertos para ambos os grupos na condição plural. Isto acontece talvez porque esta condição é mais destacada fonologicamente na concordância, sendo saliente sonoramente.

Discutindo a respeito do fato de crianças não-disléxicas apresentarem diferenciação entre o processamento on-line e off-line (encontrado na literatura de processamento na expressão “early and late processing”), os resultados aqui apresen-tados são correspondentes aos já observados em adultos10,11. Este fato comprova que a sensibilida-de à localidade da concordância parece ser um princípio realmente universal. Logo, para o por-tuguês, já em crianças, Late Closure (ou Aposição Local) parece ser uma estratégia geral do parsing.

Em relação ao grupo disléxico, a falta de sensibilidade rápida à aposição sintática e à concordância de número, no processamento mais automático, não interfere na interpretação da sentença, pois esta se encontra preservada.

Estes resultados aduzem evidência a favor dos modelos de processamento em dois estágios, nos quais há dois momentos no processamento, um mais automático, reflexo, onde o parser atua, e outro reflexivo, de interpretação, que sofre influência dos demais níveis linguísticos, semântico e pragmático. Os disléxicos parecem contar apenas com a interpretação final, utili-zando pistas semânticas ou mesmo a saliência conceptual do núcleo do sintagma complexo23.

Refletindo a respeito das contribuições deste estudo, podemos pensar em relação ao fato das avaliações fonoaudiológicas utilizadas na prática clínica. Os resultados encontrados sugerem que os testes e avaliações fonoaudiológicas passem a considerar também o processamento on-line, uma vez que os testes estandardizados utilizados atualmente não captam este processo automático. Em relação ao contexto escolar, esta pesquisa reforça a ideia de que os disléxicos não apresen-tam dificuldade de compreensão do material lido,

precisam só de mais tempo para realização da mesma, e que, se demoram mais tempo para lei-tura, esta pode ser tão eficaz quanto a dos demais leitores. Logo, pensa-se em ser mais complacente em relação ao tempo de tarefas, testes e provas no caso destes indivíduos, como um direito.

Outro fator a ser considerado é observar os demais níveis linguísticos na leitura das crianças disléxicas, visto que o fonológico já é amplamente analisado, o sintático foi discutido aqui juntamen-te com o semântico, pode-se pensar em estudos de nível intermediário de complexidade, como o morfológico ou morfossintático. Assim como ou-tros fatores que podem auxiliar na leitura, como, por exemplo, a influência da prosódia na leitura, experimentos futuros neste sentido podem contri-buir para uma melhor compreensão nesse sentido.

CONCLUSÃO Este estudo confirma que há diferença entre

a leitura de crianças disléxicas e não disléxicas nas fases distintas de processamento da mesma, o processamento reflexo e reflexivo. Em estudo da leitura automonitorada, as crianças disléxicas não apresentam sensibilidade rápida à concor-dância de orações relativas apostas a sintagmas nominais complexos, reagindo da mesma forma se a concordância for local ou não local, marcada pela condição plural ou singular; o que não acon-tece com as crianças sem distúrbio de leitura. Es-tas revelam o mesmo comportamento de adultos analisados em outros estudos psicolinguísticos, que durante o processamento imediato deste tipo de oração preferem a aposição local, obedecendo o princípio de Late Closure descrito nesta área e comprovando a universalidade do processador automático de frases (parser).

Na interpretação final da frase, ambos os grupos de crianças se comportaram da mesma forma, apontando para o fato da existência do distúrbio atrapalhar somente a imediaticidade do processamento, lentificando-o sem compro-meter o entendimento do conteúdo lido. Crian-ças disléxicas e não disléxicas acertaram mais quando havia concordância alta ou não local e quando havia a marcação de plural.

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SUMMARYDyslexia and the syntactic processing

Introduction: Dyslexia is a specific reading disorder widely studied in various areas of scientific knowledge. It has been demonstrated that dyslexics have phonological deficits in reading. Methods: In order to investigate the level of syntactic processing, we conducted this research focusing on the analysis of sensitivity to syntactic attachment and agreement between subject and verb in relative clauses attached to a complex noun phrase in Brazilian Portuguese, contrasting dyslexic children with children without reading problems. Results: The results showed that normal children display a preference for local attachment of the relative clause in the immediate processing of the sentence (online processing), whereas dyslexic children do not show early sensitivity to syntactic attachment in this type of structure. In the interpretation stage of comprehension (off-line processing), both groups, dyslexic and non-dyslexics, displayed a similar preference for the non-local attachment of the relative clause. Conclusion: We concluded that, although there is differentiation in the online processing between the groups, in the off-line processing, there is no significant difference between the groups. These results support the existence of processing models in two stages: an early phase, where the parser works, and a late stage of interpretation. The early phase is purely syntactic whereas the late stage may be influenced by semantic and pragmatic information. Dyslexics seem to rely solely on the final interpretation, using semantic cues related to the head of the noun phrase. In relation to the school context of dyslexics, this research reinforces the idea that dyslexics have no trouble understanding the material read, although they will take more time to read.

KEY WORDS: Dyslexia. Reading. Psycholinguistics. Speech, language and hearing sciences. Linguistics.

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Trabalho realizado no Laboratório de Psicolinguística

Experimental (LAPEX), na Universidade Federal do

Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ.

Artigo recebido: 16/12/2009

Aprovado: 8/3/2010

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Objetivo: Este estudo avalia inicialmente a memória de curto prazo (MCP) de estudantes universitários; verifica, a seguir, a frequência de sua prática de jogos e, finalmente, compara os dois resultados. Parte da hipótese de que a prática de jogos influencia na memória de curto prazo. Método: Utiliza-se do Teste Pictórico de Memória (TEPIC-M), de Rueda e Sisto, e de escala auto-avaliativa de prática de jogos nas modalidades de Jogos de Movimento (JM), de raciocínio (JR) e digitais (JD). Desenvolve-se junto a 100 universitários, de ambos os sexos, em universidade estadual localizada em cidade de pequeno porte, no interior da Bahia. Resultados: Os níveis de MCP encontrados foram muito baixos, com 91% abaixo da média. A prática de jogos verificada, em suas diversas modalidades, também foi baixa, sendo que 74% não praticam JM, 61% não praticam JR e 70% não praticam JD. A comparação entre os resultados do TEPIC-M e a frequência de participação em JM revelou-se positiva, uma vez que os que não praticam JM, JR e JD não atingiram sequer o nível médio de MCP, dados comprovam estudos sobre a importância dos jogos para o processamento mental. Foi também possível identificar dificuldades na escrita dos participantes nas folhas resposta do TEPIC-M. Por outro lado, foi observada grande motivação dos alunos a participar da pesquisa, o que sugere que propostas de ensino mais dinâmicas e interativas, inclusive com a participação de jogos, venha a contribuir para sua MCP e aprendizagem em geral.

UNITERMOS: Memória de curto prazo. Jogos e brinquedos. Aprendizagem.

a MeMória de curto prazo do universitário e a prática de jogos: uM estudo

coMparativo

Oldemar Nunes – Mestrado em Psicologia

da Saúde pe la Facu ldade de Saúde da

U n i v e r s i d a d e M e t o d i s t a d e S ã o P a u l o .

Vera Barros de Oliveira – Professora Titular do

Mestrado em Psicologia da Saúde pela Faculdade

de Saúde da Universidade Metodista de São Paulo.

Correspondência

Vera Barros de Oliveira

Rua Prof. Artur Ramos, 178 apto 42 – Sirius –

Jardim Paulistano – São Paulo, SP – CEP 01454-010

E-mail: [email protected]

Oldemar Nunes; Vera Barros de Oliveira

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INTRODUÇÃO O estudante universitário percorre um ca-

minho decisivo, uma vez que faz a ponte entre a vida acadêmica e a profissional. A maneira como conduz suas atividades e como desen-volve seus processos mentais é fundamental para que consiga fazer uma síntese dinâmica do que aprendeu e vir a relacionar teoria e prática no mercado de trabalho. A memória de curto prazo tem um papel fundamental em todo o processamento mental, aliando-se de forma pro-funda e íntima à memória de trabalho, ambas indispensáveis à aprendizagem, à aquisição do conhecimento e ao desenvolvimento de habili-dades e competências profissionais.

A associação dos temas saúde e ludicidade, em suas íntimas conexões físicas e mentais, vem a ser um complexo e rico campo de pesquisa, com importantes implicações para todas as di-mensões do desenvolvimento pessoal e social, segundo o modelo de saúde, biopsicossocial, preconizado pela Organização Mundial da Saúde, OMS, em 1978 e 1986, e pela carta de Ottawa.

A prática de jogos, por sua vez, contribui para o desenvolvimento, conservação e recuperação de processos cognitivos e afetivo-relacionais, tendo a seu favor o fato de ser automotivada e geradora de prazer e bem-estar.

Com base nas duas premissas expostas, esta pesquisa investigou o nível da memória de curto prazo de estudantes universitários, comparando os resultados obtidos com a frequência de sua prática de jogos. Partiu da hipótese de que a prática de jogos contribuiria para a memória de curto prazo.

Memória e aprendizagemAprendizagem e memória se entralaçam

todo o tempo. Segundo Pavão1, as regularidades vividas e memorizadas nos permitem uma me-lhor adaptação ao meio, uma vez que o aprender com situações passadas nos possibilita, inclu-sive, prever eventos futuros. Como explica, a capacidade de um organismo se modificar em função das experiências vividas comprova que

ele é capaz de aprender, uma vez que conserva as informações, via memória. Em sua interação com o meio, as redes neurais do organismo se alteram continuamente.

Em visão semelhante, Zimmer2 considera a memória como uma das capacidades vitais que permite ao ser vivo uma adaptação ao ambien-te, ao possibilitar aumentar o conhecimento do mesmo, sendo que os processos de codificação, formados pela representação do mundo no cé-rebro por meio do ajuste de sinapses nas redes neuronais, incluem três etapas: retenção, arma-zenamento e recuperação da mesma.

De forma complementar, memória e orga-nização do pensamento em busca do conhe-cimento também se inter-relacionam intima-mente. Segundo Schwartz & Reisberg3, nós nos lembramos melhor de algo quando vemos ou criamos uma organização naquilo que deve ser lembrado.

A memória também se vincula de forma dinâmica à atenção. Segundo Rueda & Sisto4, “para falar da relação da atenção com a memó-ria deve-se fazer referência ao modelo estrutural ou modal proposto por Atkinson e Shiffrin, em 1968, no qual a informação entraria no sistema de processamento por meio de depósitos sen-soriais específicos e, então, procederia para uma memória de curto prazo limitada, antes de entrar em uma memória permanente e de longo prazo. A “chave” para uma codificação bem sucedida é a atenção, (...) o indivíduo tem que prestar atenção consciente à informação”.

O início do processamento das atividades ce-rebrais se dá no hipocampo e no córtex. Quando o indivíduo percebe um estímulo, a solidez de um determinado conteúdo aprendido requer a modificação de determinadas sinapses e suas principais conexões. Essas alterações estruturais das sinapses são diferentes para cada memória, determinando, assim, a intensidade da aprendi-zagem5. A memória não está localizada em uma estrutura individual e isolada no cérebro. É um fenômeno psicológico e biológico que envolve um conjunto de sistemas cerebrais, os quais se articulam e funcionam em sintonia.

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Segundo o neurofisiologista Silva6, não é a quantidade de neurônios que determina a ca-pacidade de memória, mas sim o número de co-nexões sinápticas e o tamanho das ramificações dos neurônios, cujo desenvolvimento depende diretamente dos estímulos que o cérebro rece-be. As ramificações encontradas nos neurônios podem ser comparadas a galhos de árvore, que se expandem conforme os estímulos que rece-bem, aumentando a quantidade das conexões sinápticas, responsáveis pela transmissão de dados entre os neurônios.

Existem diversos sistemas mnemônicos com características peculiares para as diversas funções mentais7. Especialistas, segundo Spren-ger8, afirmam que na verdade existem vários tipos de memória, pois há diversas fontes de armazenamento de dados em nossa mente e não estão limitadas a uma área determinada de nosso cérebro. Quando se fala em retenção de informações, sabemos que tal assimilação pode se prolongar por um longo período (memória de longo prazo) ou durar apenas na execução de determinada tarefa (memória de curto prazo)9,10.

Segundo Pavão1, os sistemas de memória vêm sendo classificados quanto ao tempo em Memória de Curta Duração (por exemplo, lembrar um número da lista de telefone) e Memória de Longa Duração, a qual pode ser subdividida em Explícita e Implícita. A Memória Curta Duração mantém-se por poucos segundos ou minutos e é susceptível a interferências. É mantida em amnésicos e parkinsonianos, mas fica prejudicada em pacientes com danos fron-tais. A Memória de Longa Duração pode durar semanas e até anos e resiste a interferências. A modalidade Explícita refere-se, por exemplo, às lembranças que arquivamos, e fica prejudica-da em amnésicos, principalmente em relação a eventos mais recentes, mas se mantém em parkinsonianos e em pacientes frontais. Já a Memória de Longa Duração da modalidade Implícita retém, por exemplo, habilidades que adquirimos e se mantém em quadros de amnésia e de danos frontais, mas se apresenta deficitária com parkinsonianos.

Duas grandes linhas de pesquisa de memória podem ser observadas, segundo Richardson-Klavehn e Bjork (1988 apud Rueda & Sisto4); a unicista, de visão unitária, que se utiliza de medidas diretas, explícitas ou declarativas, e o grupo da abordagem das memórias múltiplas, que considera as memórias indiretas ou implí-citas ou não-declarativas. A visão da memória em seus múltiplos sistemas discute a validade de medidas de memória direta vs. indireta, uma vez que considera não existir uma medida unitária da memória,

A memória não é só a retenção de certo conhecimento, mas também ativadora da imaginação, interpretação, problematização, reinvenção, etc., processos estes mentais que atuam sobre o que é recordado pelo indivíduo. A memória é a capacidade do ser humano de conservar e relembrar mentalmente conheci-mentos, conceitos, vivências, fatos, sensações e pensamentos experimentados em tempo ante-rior. A memória refere-se, também, à retenção de habilidades adquiridas ou de informação. Em situações cotidianas, os adultos, especialmente os idosos, podem ter algumas dificuldades de recuperação de memória. Mesmo sendo con-sequência do envelhecimento, a diminuição da eficiência da memória é também influenciada por questões como genética, fatores ambien-tais, vivências, hábitos linguísticos, caráter e personalidade. A perda da memória estaria relacionada com a degeneração dos neurônios cerebrais, sendo que, conforme o indivíduo fos-se envelhecendo, haveria uma perda evolutiva dessas células nervosas, afetando assim sua capacidade de memorização11.

Pesquisas relacionam o nível de escolaridade dos idosos com a deterioração ou não dos seus aspectos cognitivos. Quanto menor o tempo investido em estudos, maiores são os prejuízos cognitivos, principalmente entre as mulheres12. É necessário manter a mente ativa, por exemplo, por meio de leituras, para conservar as ativida-des cognitivas em bom funcionamento.

Já estudos sobre a memória de longo prazo afirmam que os idosos têm um desempenho

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menor que os adultos jovens13. Somente para ilustrar, a memória de longo prazo, segundo Isaki & Plante14, seria a informação retida sob forma de estruturas permanentes de conheci-mento, cuja avaliação é feita através de testes, de conhecimento geral, como conceitos de Matemática e História, por exemplo.

Na década de 70, foi introduzido o conceito de Memória de Trabalho, a qual exigiria um processamento mental mais elaborado, sen-do que a informação retida seria elaborada e transformada, enquanto que a memória de curto prazo faria um armazenamento passivo da infor-mação, conservando-a de forma transitória, sem alterá-la. Estudos sugerem que a memória de trabalho esteja relacionada com a inteligência fluida ou habilidade de raciocínio, enquanto essa relação não é observada na memória de curto prazo. Apesar de serem construtos com características específicas, poderiam ser corre-lacionados, segundo apontam estudos4.

Segundo Damásio15, os fenômenos mentais, como amar, lembrar-se ou esquecer-se de algo, sentir dor, prazer, etc., dependem do funciona-mento de complexas redes neurais nos circuitos cerebrais. A principal atividade cerebral consis-te em preservar o bem-estar e a sobrevivência do organismo, sendo que toda resposta ao meio se dá por meio de imagens mentais, que incluem as mnemônicas. Atividades sentidas como agradáveis ativam mecanismos de recompensa e liberam dopamina e serotonina, neurotrans-missores que alteram o meio ambiente interno, o estado das vísceras, o sistema muscular, a expressão facial, as emoções, os sentimentos e o comportamento. Dessa forma, a experiência de uma situação prazerosa gera reorganização orgânica, em seus aspectos biopsicossociais orientadas por um mapeamento mental neural.

Uma atividade motivadora e prazerosa con-tribui para o funcionamento dos processos men-tais básicos, como a memória, a qual garante o armazenamento da informação, via sinapses16.

Segundo Antunha17, “devido às conexões límbico-frontais, as experiências relativas ao passado e às intenções do futuro tornam-se

carregadas de emoção e atenção.(...) Esse tipo de memória on-line (...) passa a constituir, na adolescência e maturidade, a possibilidade da plenitude da condição humana, a sede da liberdade”.

Jogos e processamento mentalDe meados do século XX para cá, verifica-

se um grande crescimento de estudos sobre o lúdico, vendo-o como atividade automotivada e fonte de desenvolvimento18.

Para Piaget19, o brincar, considerado em seu contexto mais amplo, consiste no primado da assimilação sobre a acomodação, do relaxamen-to sobre a tensão, do prazer sobre o desprazer. Sua curva evolutiva acompanha a passagem gradativa dos esquemas sensório-motores, com a brincadeira corporal, onde predomina o movimento, à brincadeira simbólica ou faz-de conta, e a seguir, os jogos de regras.

Segundo Oliveira20, em leitura piagetiana, a trajetória evolutiva lúdica evidencia como a consciência simbólica se apóia na corporal, evoluindo gradativamente do predomínio do campo perceptivo ao plano das representações, e, desta forma, passa a agir por meio de imagens mentais em relação a objetos, tempos e espaços, pensados, lembrados, antecipados ou imagina-dos. Todas as modalidades lúdicas, individuais ou grupais, realizam uma integração entre o corpo e a mente, o que as torna excelentes estratégias para a saúde mental em relação à adaptação ao meio.

A importância dos jogos também pode ser vista por meio da abordagem da Neuropsico-logia, que afirma que sentir prazer em fazer algo aumenta a autoconfiança e a criatividade, diminui a ansiedade e a impulsividade. As atividades lúdicas criam normalmente o pra-zer e podem ser consideradas como tendo um papel fundamental na formação, preservação e reabilitação das redes neurais durante todo o ciclo vital17.

Estudo revelou justamente como a avaliação cognitiva de processamentos mentais nobres, como a memória prospectiva, vem se utilizando

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da prática de jogos, na análise de estratégias por antecipação21.

Ainda para Oliveira22, os jogos podem ser vis-tos como situações privilegiadas para a apren-dizagem em geral. Habilidades e competências cognitivas e sociais, em sua correspondência dinâmica, são desenvolvidas quando se joga. Voltado para resolver um problema e tendo que seguir certas regras, o cérebro, em sua plasticidade, passa a desenvolver um processo de busca e seleção de estratégias, no qual a atenção e a memória têm um grande papel. A formação de equipes cria situações favoráveis à troca de ideias, a levantar e discutir hipóteses de ação, a antecipar mentalmente as jogadas.

Pesquisa realizada por Campitelli et al.23 comparou a atividade mental em dois grupos, um formado por grandes mestres do xadrez, e outro, por iniciantes no jogo, por meio de res-sonância magnética. Os dados revelaram a im-portância do conhecimento prévio sobre o jogo, arquivado na memória dos mestres, assim como evidenciou o quanto o xadrez contribui para ativar os novos circuitos cerebrais nos iniciantes.

Pesquisa realizada pelo National Institute of Mental Health24, coordenada por Giedd, monitorou durante 13 anos, com o auxílio de exames de ressonância magnética, o cérebro de 1.800 jovens e constatou que sua capacida-de se desenvolve durante toda a vida e não só até os 12 anos como se supunha, mas que as mais profundas transformações na estrutura cerebral ocorrem até os 25 anos. Entre as con-clusões, chama a atenção o dado, segundo o qual, crianças e adolescentes que jogam games registraram aumento do córtex e melhora da coordenação motora.

O foco no envelhecimento vem tendo mais atenção, pois, como ressaltam Gorodscy et al.25, a memória de curto prazo é um dos principais pontos de descontentamento do envelhecer. Relacionado a essa preocupação associada ao envelhecer, estudo realizado por Verghese et al.26, contudo, não encontrou correlação signifi-cativa entre a frequência de atividades de lazer, inclusive com jogos e a perda de memória.

Concluindo, a longa história dos jogos, assim como sua divulgação atual, incluindo pesquisas sobre sua validade junto a desenvolvimento e/ou recuperação de processos mentais, inclusive da memória, torna este tema significativo para o presente estudo.

Objetivos• Avaliar a memória de curto prazo de estu-

dantes universitários;• Verificar a prática de jogos por estudantes

universitários e a frequência com que os mesmos são praticados;

• Comparar o nível de memória de curto pra-zo dos estudantes com sua prática de jogos.

HipóteseA prática de jogos contribui para a memória

de curto prazo.

MÉTODOTrata-se de estudo comparativo descritivo

exploratório.

ParticipantesA amostra foi composta por cem alunos

universitários, de ambos os gêneros, dos cursos de Pedagogia e Letras de Universidade Esta-dual, situada em cidade de baixa densidade demográfica, distante 300 km de Salvador, na Bahia. Grande parte dos participantes residia em cidades ainda menores, nas proximidades, em ambiente rural, com difícil locomoção. A seleção da amostra foi feita por conveniência.

AmbienteOs instrumentos foram aplicados nas pró-

prias salas de aula da Faculdade.

Material e InstrumentoTeste Pictórico de Memória – (TEPIC-M), de

Rueda e Sisto4. Este teste, criado recentemente, apresenta evidências de validade de constructo pelo processo de resposta e também relativa à estrutura interna dos itens: funcionamento diferencial do item (DIF) e ao desenvolvimento.

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Escala auto-avaliativa de utilização de jo-gos de regras. Verifica o tipo de jogo praticado [Motores (JM); de Raciocínio (JR); Digitais (JD)] e sua frequência.

ProcedimentoDevido a pouca duração, os dois instrumen-

tos foram aplicados numa única sessão a um conjunto de 20 participantes de cada vez.

Aspectos ÉticosEsta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de

Ética da Universidade Metodista de São Paulo - CAAE 3858.0.000.214-09, em 8/10/2009. O Termo de Livre e Esclarecido Consentimento foi devidamente preenchido pelos participantes.

RESULTADOS E DISCUSSÃOOs resultados evidenciaram baixo nível de

MCP e de prática de jogos, o que comprova de forma indireta a hipótese levantada de que a prática de jogos contribui para a MCP.

Quanto ao perfil sociodemográfico da amos-tra, observou-se uma participação maior do gênero feminino (77%), o que pode ser expli-cado pelo maior índice feminino nessas duas modalidades de curso (Pedagogia e Letras). Em relação à faixa etária, a maior frequência foi de jovens, 69% entre 18 e 28 anos; 26% entre 29 e 38 anos e apenas 5% acima desta idade.

A distribuição dos participantes por nível de MCP revelou o alarmante dado de 91% abaixo da média (66% Inferior e 25% Médio Inferior).

O baixo índice de pessoas idosas, já espera-do nessa população universitária, não permite comparação com os dados obtidos sobre MCP em relação a diferenças obtidas junto a dife-rentes faixas etárias. Contudo, este baixíssimo índice de MCP verificado em estudantes uni-versitários, jovens em sua maioria, revela-se preocupante, inclusive no sentido de que a memória, como todo processamento mental, deve ser continuamente exercitada, a fim de ser preservada em faixas etárias mais avançadas. Segundo o neurofisiologista Silva6, assim como o corpo precisa de movimento, o cérebro também

necessita de ação para manter e renovar seus circuitos neurais não apenas da memória, mas da capacidade intelectual como um todo.

Considerando, a partir de Geis11, que a me-mória não apenas retém e recupera a informa-ção, mas também ativa processos mentais de imaginação, interpretação, problematização, reinvenção, etc., os dados obtidos revelam uma população universitária deficitária, levando-se em conta que, além de estarem comprometendo sua aprendizagem, estão desenvolvendo pou-cas ferramentas cognitivas e operacionais para enfrentar uma carreira profissional.

Os baixos índices obtidos também são preo-cupantes no sentido em que, apesar de a MCP se diferenciar da MT, ela a possibilita e alicerça, o que leva a supor, com base neste estudo, que a MT também esteja comprometida nesta po-pulação, o que sugere novos estudos. O mesmo vale ser dito em relação à atenção, uma vez que esta vem a ser a chave para a memória4. Esses dados indicam, portanto, que os universitários podem ter também um nível baixo de atenção. O déficit verificado quanto à MCP também foi identificado quanto à prática de jogos, em suas três modalidades: Motores (JM), de Raciocínio (JR) e Digitais (JD).

Esta falta de motivação e de interesse pela prática lúdica, incomum na idade jovem, levan-ta a possibilidade de um baixo nível de moti-vação para a ação e interação em geral, assim como leva a refletir o quanto isto compromete seus processos mentais, com base em estudos que evidenciam a importância da mesma para a flexibilidade e agilidade neural17.

Os resultados da escala auto-avaliativa da prática de jogos revelaram que 83% dos alunos testados não praticam JM. Esta pesquisa cons-tatou a equiparação dos baixos dados entre os que não praticam JM e o baixo nível da MCP verificado, confirmando Diem27, que afirma que a pobreza e falta de movimento não só represen-tam um prejuízo físico, como também impedem a livre evolução psíquica.

Quanto à prática de Jogos de Raciocínio (JR), os dados evidenciaram que 61% dos alunos

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não os praticam e 75% não praticam Jogos Digitais (JD).

Ao se estabelecer a comparação entre os resultados do TEPIC-M e a frequência de par-ticipação em JM, observa-se que uma grande porcentagem (74%) dos que não praticam JM não atingiu sequer o nível médio, e apenas uma pequena minoria (9%) conseguiu superá-lo, com apenas dois participantes chegando ao ní-vel médio, seis participantes ao médio superior e um ao nível superior.

Ao se estabelecer a comparação entre os resultados do TEPIC-M e a frequência de par-ticipação em JR, observa-se que uma grande porcentagem (44%) dos que não praticam JR não atingiu sequer o nível médio, e apenas uma pequena minoria (5%) conseguiu superá-lo, com apenas um participante chegando ao nível médio, quatro participantes ao médio superior e nenhum ao nível superior.

O baixo nível dos resultados descritos é preocupante, uma vez que os jogos têm um papel fundamental na formação, preservação e reabilitação das redes neurais durante todo o ciclo vital28, o que talvez justifique a coerência verificada entre os baixos resultados na verifi-cação da MCP dos universitários e sua prática de jogos, em suas diversas modalidades.

Observações complementares realizadas durante a aplicação do instrumento, assim como na análise dos protocolos preenchidos pelos participantes, revelaram dificuldade na escrita, com vários erros de ortografia. Por outro lado, como fator muito positivo, foi observado grande interesse em participar da pesquisa, vista como uma atividade nova e desafiadora.

CONCLUSÃOOs resultados forneceram informações sobre

três aspectos relevantes a serem considerados junto ao estudante universitário em nossa realidade, que, apesar de frequentar uma universidade estadual, reside em cidade de pequeno porte ou em área rural e distante dos grandes centros de cultura.

Em primeiro lugar, o estudo constatou seu baixo nível de capacidade de retenção de

informação recente, isto é, sua memória de curto prazo. Este dado é muito preocupante, não apenas por dizer respeito a esta modalidade de memória, mas também porque este baixo desempenho evidencia dificuldades também na memória de trabalho, como comprovam estudos que relacionam entre si estas duas modalida-des mnemônicas, assim como uma possível problemática relativa à atenção, o que traz um agravante para a carreira acadêmica deste estudante, assim como para seu desempenho profissional, quando vier a se formar.

Em segundo lugar, o estudo possibilitou verificar o baixo índice da prática de jogos, em suas diversas modalidades propostas, os motores, os de raciocínio e os digitais, dados estes inesperados, que revelam falta de inte-resse e motivação dos participantes, jovens em sua maioria, resultados também na contramão do crescente interesse que se observa hoje em dia por games computadorizados. Finalmente, quanto ao terceiro objetivo da pesquisa, que diz respeito a comparar os resultados dos dados de memória com os da prática de jogos, verificou-se que, em ambos os estudos, os baixos resultados confirmam de forma indireta a hipótese levanta-da no início, de que a prática de jogos contribui para a memória de curto prazo.

Estes dados mostram uma baixa motivação em atividades extracurriculares, que envolvem tanto movimentação física como mental, o que sugere novas investigações que elucidem o que estes estudantes universitários fazem em seu tempo livre. A baixíssima prática de jogos motores também é preocupante, podendo com-prometer sua saúde física em geral, assim como a prevenção de possíveis problemas naturais decorrentes do envelhecer.

Informe colhido na folha de resposta dos participantes, onde deveriam escrever o nome dos objetos que se lembrassem, também evi-denciou falhas, revelando sua dificuldade com a escrita.

Por outro lado, o grande interesse demons-trado em participar da pesquisa e a motivação evidente com que o fizeram levam a crer que

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estes alunos reagiriam de forma muito positiva a uma didática dos professores mais interativa e dinâmica, fazendo com que se utilizassem de seus recursos mentais em sala de aula. Da mesma forma, supõe-se que reagiriam bem a programas de esporte organizados pela Faculdade. Estas considerações conduzem à reflexão da impor-tância da formação dos professores, inclusive dos universitários, levando em conta que estes alunos estão a um passo de entrar no mercado de trabalho e precisam aprender a pensar, a criar e a utilizar devidamente sua memória.

Esta pesquisa levanta a hipótese de que a prática de jogos em ambiente universitário,

SUMMARYThe university student short-term memory and the practice of games:

a comparative study

Objective: This study initially evaluates the short-term memory of University students, then the frequency with which games are practiced is verified, and finally the level of short-term memory observed is related to the playing of games. Methods: We utilize the Pictorial Test of Memory (TEPIC-M), from Rueda and Sisto, duly validated for our reality, and the self-evaluative scale of the practice of movement, being JM for reasoning, JR for digital, JD for games. The research is performed with 100 students of both genders. Results: The short-term memory levels found were very low, 91% lower average. The practice of playing games in their various modalities was also very low, with no practice at all in 74% in JM, 61% in JR and 70% in JD. The comparison between the results in the TEPIC-M and the frequency of participation in JM, JR or JD, proved to be positive, since those who do not practice games, did not reach even the average level of memory. These data confirm previous studies that prove the importance of play for mental processing. It was also possible to identify writing difficulties in fulfilling the response sheets of TEPIC-M. On the other hand, we observed a strong motivation and willingness of the students to participate in the research, which suggests that proposals of more dynamic and interactive teaching, especially with the inclusion of games, will help contributing to the MCP and, consequently, to improve their learning and mental process as a whole.

KEY WORDS: Short-term memory. Play and playthings. Learning.

uma vez difundida e incentivada, seria muito bem aceita e talvez pudesse contribuir para a melhora no processamento mental cognitivo dos alunos, segundo estudos já comprovados e neste trabalho apresentados, com possíveis repercussões para a memória de curto prazo.

Nesse sentido, este estudo acredita ter for-necido dados atuais que evidenciam situações de risco do universitário de nossa realidade e sugere não apenas novas pesquisas, mas também uma ampla reflexão sobre a forma-ção pessoal e profissional desse aluno, para que este se desenvolva de forma mais plena e saudável.

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Artigo derivado da Dissertação de Mestrado do

primeiro autor, orientada pelo segundo autor, defendida

em 2010, na Faculdade de Saúde da Universidade

Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, SP.

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Artigo recebido: 12/2/2010

Aprovado: 4/3/2010

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RELATO DE EXPERIÊNCIA

RESUMO – Este estudo constituiu-se em uma dissertação de mestrado, na qual se pesquisou a Oficina de Palavras, um espaço lúdico, como um espaço potencial para a produção de sentidos subjetivos nos processos de ensino e aprendizagem de alunos com dificuldades na escrita. O referencial teórico abordado são as concepções de subjetividade de Fernando González Rey, que possibilitam compreender a categoria sentido como formações psíquicas dinâmicas do sujeito em constante desenvolvimento, em suas diferentes práticas sociais. Por conta disso, a pesquisa assumiu caráter qualitativo, dentro da Epistemologia Qualitativa. Atividades de conversações e complemento de frases constituíram-se instrumentos para trabalhar e refletir sobre as informações obtidas de maneira construtiva-interpretativa. O presente estudo demonstrou que o processo de aprendizagem da escrita não envolve apenas estruturas cognitivas, mas também aspectos emocionais, afetivos, históricos e sociais e que os aspectos subjetivos estão a todo o momento influenciando no posicionamento do aluno frente aos obstáculos que perpassam a aprendizagem da escrita. A partir desse olhar, entendeu-se que a Psicopedagogia pode oferecer também aos educadores uma nova maneira de conceber os alunos e a construção de conhecimentos, ao considerar que múltiplos aspectos intervenientes nos processos de aprendizagem permitem um espaço dialógico e o posicionamento ativo do aluno, devolvendo ao sujeito algo próprio, pessoal. Ou seja, o reconhecimento de sua autoria de pensamento como ato de produção de sentidos subjetivos.

UNITERMOS: Aprendizagem. Redação. Transtornos de aprendizagem.

ALunoS coM DificuLDADeS nA eScRitA: pRoDução De SentiDoS SuBJetivoS nA oficinA

De pALAvRAS

Beatriz Judith Lima Scoz; Deborah Regina Motta R. Lucchini

Beatriz Judith Lima Scoz – ABPp – UNIFIEO – Graduação em Pedagogia; Mestrado em Psicologia da Educação pela PUC-SP; Doutorado em Psicologia da Educação pela PUC-SP. Pós-Doutorado (em andamento) - Universidade de Brasília (UNB), Atualmente é professor titular curso de pós-graduação no Centro Universitário Fieo (UNIFIEO), coordenadora de pesquisa e pesquisadora do CNPq. Especialização em Psicopedagogia no Instituto Sedes Sapientiae e na Escola de Psicopedagogia de Buenos Aires. Deborah Regina Motta R. Lucchini – CEFAC-UNIFIEO – Mestre em Psicologia Educacional pelo UNIFIEO, Especialista em Educação; Graduada em Pedagogia pelo UNIFIEO. Atualmente é professora e cooperadora do Grupo Experimental de Alfabetização do Instituto CEFAC. Pesquisadora do CNPq.

Correspondência

Deborah Regina Motta R. Lucchini

Av. Martin Lutter King, 980 – Jd. Umuarama –

Osasco, SP – CEP 06030-013

SentiDoS SuBJetivoS nA oficinA De pALAvRAS

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INTRODUÇÃOO grande desafio do sistema educacional é

garantir o acesso e a permanência dos alunos nas escolas e, para isso, pesquisadores da edu-cação precisam encontrar caminhos que levem à superação de muitos entraves que se colocam frente ao segmento dos processos de escolari-zação. Uma das possibilidades é considerar os alunos em sua dimensão ativa: como sujeitos que têm criatividade, emoções, histórias de vida e que tudo isso junto os faz produzir sentidos em seus processos de aprendizagem, evidenciando-se, assim, a construção de suas subjetividades nesses processos.

No que diz respeito ao processo de apren-dizagem da escrita, fazendo uma analogia com os estudos de Scoz1, “a subjetividade também está presente, pois se configura um momento constitutivo essencial, definido pelo sentido que esta aprendizagem tem para o sujeito, dentro da condição singular em que se encontra”. Além desse fato, a subjetividade permeia o modo de estar no mundo e as diferentes situações vi-venciadas pelos sujeitos em geral, inserindo-se assim em suas trajetórias de vida.

Nesse estudo, foram utilizadas as concepções teóricas de González Rey2, que possibilitam um novo lócus de análise para a questão da subje-tividade. As categorias teóricas desenvolvidas por esse autor trazem a ideia de um sujeito concreto, consciente, que assume configurações subjetivas e produz sentidos em decorrência das relações sociais que se estabelecem nos dife-rentes espaços de suas vidas. Conceitos como subjetividade, subjetividade social e individual, produção de sentidos e configurações subjeti-vas serão os pilares centrais para uma análise da proposta acima descrita, ao propiciar um entendimento dos alunos com dificuldades na escrita, como sujeitos de suas próprias experi-ências individuais e sociais, possibilitando-se a compreensão dos aspectos subjetivos presentes em seus processos de aquisição da escrita.

As áreas de estudo e pesquisa da Psicopeda-gogia, entre outras ciências, também foram con-sideradas em seus diferentes níveis de atribui-

ções. Elas também têm articulado alguns temas de estudo sobre a construção da subjetividade. Dessa maneira, a Psicopedagogia possibilita a percepção de entraves que se inserem na con-tinuidade próspera da questão do aprender a escrita. Essa percepção merece ser considerada em termos das contribuições que traz.

Esse estudo constituiu-se em uma disserta-ção de Mestrado, em que se pesquisou a efi-cácia da Oficina de Palavras como um espaço potencial para produção de sentidos subjetivos em crianças com problemas de aprendizagem na escrita.

O modelo de análise utilizado foi a Epis-temologia Qualitativa, proposta por González Rey3, que tem como foco a busca pela produção de conhecimento e a visualização de aspectos particulares e sociais que permeiam a questão da subjetividade. A partir desse modelo, uma tentativa de aproximação para compreender a subjetividade em alunos com dificuldades na escrita foi a utilização do espaço Oficina de Palavras como um instrumento de pesquisa. Trata-se de um espaço lúdico, com poucas crian-ças, que ainda não escrevem satisfatoriamente, cursando o ensino fundamental. Nesse espaço, procurou-se compreender os sentidos subjeti-vos produzidos nos processos de aquisição da escrita. Para tanto, considerou-se as relações de ensino e aprendizagem dos alunos nas escolas, na comunidade de pertencimento, bem como as possíveis relações entre esses sentidos.

UMA CONCEPÇÃO ATUAL DE SUBJETI-VIDADEA teoria da subjetividade desenvolvida nos

últimos vinte anos por Fernando González Rey tenta dar visibilidade às formas complexas por meio das quais se expressa o psiquismo humano a partir de uma perspectiva histórico-cultural4.

Uma das fontes filosóficas dessa teoria é Vygotsky, que se dedicou ao estudo do sujeito individual e social historicamente constituído, buscando uma nova visão da psique humana. Vygotsky considera a psique como um “sistema complexo e dinâmico organizado em sistemas

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de sentido que estão mais além de todo o pro-cesso psíquico pontual”2.

Segundo Scoz1, as construções teóricas pro-duzidas pelo autor russo abriram caminho para que a psicologia social superasse a dicotomia social-individual, ou seja, no enfoque histórico-cultural, indivíduo e sociedade são entendidos como uma unidade dialética que também su-pera a dicotomia externo e interno.

Nesse enfoque, o conceito de subjetividade pressupõe uma alteração na representação da psique, compromissada com uma natureza cul-tural. Explicitando melhor, a subjetividade não faz referência a algo que vem de “fora” e que aparece “internalizado” na pessoa, mas como algo que contempla esses dois espaços de cons-tituição permanente e inter-relacionados, que se constituem de maneira recursiva.

Desse modo, entende-se a subjetividade individual como um momento da subjetividade social, em uma forma recíproca, sem que uma dilua-se na outra. A subjetividade social é um sistema em que se integram distintas configu-rações subjetivas (grupais ou individuais) na vida social. Essa concepção de subjetividade se apresenta nas diversas representações sociais da cultura em que as relações entre os sujeitos são produzidas e revela, assim, o caráter rela-cional do viver humano2.

A categoria sentido é fundamental para a questão da subjetividade na perspectiva de González Rey2. Ela surgiu no ensaio de Vygotsky sobre a consciência, sendo concreti-zada na obra Pensamento e Linguagem (1935) em que o autor escreve:

“O sentido de uma palavra é um agregado de todos os fatos psicológi-cos que surgem em nossa consciên-cia como resultado daquela palavra. O sentido é uma formação dinâmica, fluida e complexa, que tem inúmeras zonas que variam em sua instabili-dade” (apud González Rey5).

A categoria sentido permite analisar as emoções do sujeito que são constitutivas de formas de organização da subjetividade e que

são essenciais para compreendê-la. Foi nes-se caminho que González Rey2 introduziu a categoria sentido subjetivo, rompendo com a dicotomia indivíduo-sociedade. Para esse autor, o fenômeno social se expressa pelo indivíduo, não em seu estado puro, ou seja, terá uma sig-nificação humana.

Entende-se, assim, que a forma como um aluno lida com os desafios que surgem em seu processo de aprender a escrever sofre influência de um conjunto de emoções e processos simbó-licos constituídos por diversas experiências ao longo de sua história.

No momento da aquisição da escrita esses aspectos subjetivos influenciam as atitudes frente às tarefas a serem realizadas, ou seja, mesmo possuindo uma boa estrutura cognitiva, o desempenho dos alunos poderá ser insatisfa-tório, considerando-se as implicações de seus estados emocionais no seu processo de pensar. Kupfer esclarece que “se por um lado temos as funções cognitivas se desenvolvendo, não podemos esquecer que, ao mesmo tempo, há um sujeito se constituindo”.

Assim, junto aos aspectos sociais, verifica-se a emergência da singularidade, pois, no mo-mento da aprendizagem, a produção de sentidos subjetivos possibilita a visibilidade de nuances únicas da vida de cada aluno concreto: suas crenças, valores, expectativas.

Entende-se que a dimensão dos sentidos subjetivos não aparece explícita e direta na expressão intencional do aluno, mas surge indiretamente por expressões muito diversas e não associadas de forma imediata. Por esse motivo, devem ser significadas num processo construtivo-interpretativo, ou seja, conforme as ideias de González Rey6, trata-se de um pro-cesso dinâmico em que surgem diversas ideias em seu percurso, um processo que envolve pensamentos e emoções que podem facilitar o surgimento de novos processos simbólicos.

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEMPara tratar das dificuldades de alunos na

construção da escrita é importante considerar

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o que se entende por dificuldade de aprendiza-gem. Embora as dificuldades de aprendizagem tenham se tornado um dos focos de pesquisas nos últimos anos, elas ainda são pouco compre-endidas, em seu todo, pelo público em geral e até mesmo por muitos profissionais da Educa-ção. De acordo com os estudos da Psicopeda-gogia, o termo dificuldade de aprendizagem dificilmente pode ser atribuído a uma única causa; muitos aspectos diferentes podem pre-judicar a aprendizagem como o funcionamento orgânico, os problemas psicológicos, cognitivos e sociais dos alunos, etc.

Portanto, não se trata de justificar uma di-ficuldade apresentada pelo aluno, em função apenas de alguma situação emocional especí-fica e difícil que esteja sendo vivenciada, por exemplo, no âmbito familiar, como a separação dos pais, a perda de um dos progenitores, etc.

De fato, a aprendizagem humana implica nas dimensões cognitiva social, afetiva, orgânica, numa inter-relação com os fenômenos culturais, de uma maneira interdependente, indissociável e não apenas como uma somatória7. É algo que acompanha o indivíduo desde o seu nascimento e envolve vários componentes intrapsicológi-cos (memória, atenção, etc) e interpsicológicos (relação com o outro), dentro de um contexto sociocultural. Alguns estudiosos, como Pain8, Cagliari9, Soares10, Fernández11, Spinillo12, Sisto13, entre outros, também salientam que a aprendizagem é um processo em permanente construção.

Na concepção de González Rey2, a cons-trução da subjetividade ocorre nas inter-rela-ções entre sociedade/indivíduo, pensamento/emoção, sentido/significado. Nesta pesquisa, os aspectos subjetivos que interferem nas di-ficuldades de aprendizagem da escrita serão considerados a partir dessas inter-relações. Esse modo de pensar a subjetividade impli-ca na concepção de pensamento complexo de Edgar Morin14, que pontua “complexus” como aquilo que é “tecido em conjunto”. É notório que as configurações de sentidos sub-jetivos constituídas ao longo das trajetórias

de vida desempenham papéis fundamentais nos processos de aprendizagem dos alunos: o modo como o aluno se depara com um obs-táculo à sua aprendizagem está diretamente relacionado a essa perspectiva dinâmica e processual.

INTERFACES DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM COM A PSICOPEDA-GOGIA: SUBJETIVIDADE/PRODUÇÃO DE SENTIDOSA Psicopedagogia estuda e lida com pro-

cessos de ensino e aprendizagem e com os problemas e/ou dificuldades decorrentes desse processo, de forma preventiva e terapêutica. Configura-se em um campo de conhecimento multidisciplinar que implica, como anteriormen-te mencionado, aspectos cognitivos, orgânicos, afetivos e sociais.

A mais significativa contribuição dessa abor-dagem reside em nos mostrar as evidências de que as dificuldades de aprendizagem que levam ao fracasso escolar não dependem de uma única causa e que conhecê-las não será o bastante para resolver a questão. Por outro lado, para considerar os múltiplos fatores intervenientes nos processos de aprender e de ensinar não bastam os múltiplos olhares, os múltiplos saberes. Estes precisam ser compartilhados por meio de relações dialógicas nas quais as falas do outro, ainda que diferentes, precisam ser ouvidas e reconhecidas como con-tribuições que garantam as relações entre vários saberes. O conhecimento “novo” surgirá fortale-cido porque é constituído na interação.

A contribuição de Scoz15 pode sintetizar melhor essa ideia:

“(...) os problemas de aprendiza-gem não são restringíveis nem a causas físicas ou psicológicas, nem a análises das conjunturas sociais. É preciso compreendê-los a partir de um enfoque multidimensional, que amalgame fatores orgânicos, cognitivos, afetivos e pedagógicos, percebidos dentro das articulações sociais”.

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Orofino e Zanello (apud González Rey6) com-plementam essa ideia ao afirmarem que inserir o psicopedagogo atuando de modo a se aproxi-mar da multidimensionalidade do ser humano enquanto indivíduo, simultaneamente produto e ator de um determinado contexto histórico-social, é conceber o espaço que produz a ação.

Na atuação psicopedagógica considerada a partir do olhar de González Rey16, os múltiplos saberes e olhares devem ser acompanhados da criação de situações dialógicas com o aluno, na construção de hipóteses sobre configurações subjetivas das dificuldades de aprendizagem relatadas por ele. Desse modo, o psicopedagogo induz espaços de expressão, facilita a emer-gência de novos sentidos subjetivos, ou seja, permite que esse momento seja um processo de produção de novos sistemas de subjetivação, por meio de sua própria ação.

Sendo assim, nos processos preventivos e terapêuticos da Psicopedagogia pode-se abrir um espaço para a produção de novos sentidos na aprendizagem, que poderão surgir quan-do o sujeito afetado, por alguma dificuldade, transforma-se em sujeito diante da sua situação atual e é capaz de produzir novas emoções e processos simbólicos que lhe facilitem o desen-volvimento de novos sentidos subjetivos.

Alícia Fernández11 também enfatiza a di-mensão subjetiva nos processos de aprender e de ensinar. A autora aponta que, muitas vezes, são necessárias intervenções psicopedagógicas que possibilitem devolver ao sujeito algo pró-prio, pessoal, ou seja, o reconhecimento de sua autoria de pensamento como ato de produção de sentidos, como reconhecimento de si mesmo, protagonista ou participante de sua produção.

Para Scoz17, a Psicopedagogia também pode oferecer aos educadores uma nova maneira de conceber os alunos e a construção de conhecimen-tos, ao considerar que múltiplos aspectos interve-nientes nos processos de aprendizagem permitem um espaço dialógico, e o posicionamento ativo do aluno, para que realmente brotem mudanças favoráveis à produção de sentidos subjetivos nos processos de aprender e de ensinar.

A PESQUISARealizar uma pesquisa significa produzir

novos conhecimentos, portanto, é preciso estar livre para refletir e apontar novos caminhos. Tratando-se de questões que não se eviden-ciam, claramente, como os sentidos subjetivos e, consequentemente, os complexos processos que constituem a subjetividade, entendeu-se que a Oficina de Palavras poderia propiciar a oportunidade de interação, de trocas de expe-riências individuais e, ainda, uma oportunidade para lidar com as dificuldades de aprendizagem na escrita de uma maneira não convencional. Entende-se que a sala de aula, muitas vezes, não é suficiente, para a criação desse espaço.

Scoz1, citando Peter Reason (1998), ressalta que algumas propostas metodológicas atuais em pesquisas participativas oferecem:

“Possibilidades mais ricas, coloridas e intensas para a pesquisa do futuro e que o interessante e inovador é a consideração de atividades como a narrativas de histórias, desenhos, pinturas, como valiosos canais de expressão para ressignificar as histó-rias de vida e para validar dados que não podem ser obtidos com meto-dologias de pesquisa tradicionais”.

Para tanto, partiu-se da hipótese de que a Oficina de Palavras poderia ser uma dessas atividades onde seria possível uma aproximação para compreender os sentidos subjetivos que os alunos produzem no processo de aprendizagem da escrita e, por conseguinte, os elementos sub-jetivos presentes nesse processo.

A proposta desse estudo, para entender a construção da subjetividade no processo de aprendizagem de alunos com dificuldade na escrita, permitiu assumir referenciais teóricos abertos a um diálogo recursivo, bem como complementar das esferas implícitas envolvidas nesse processo. Ou seja, uma pesquisa sobre o tema subjetividade, segundo o olhar de Gonzá-lez Rey2, implica a necessidade de novas meto-dologias que gerem um espaço de articulação pesquisador-pesquisado, que possibilita romper

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com a dicotomia e distanciamento que historica-mente transcorreu nas ciências naturais.

Por conta disso, a epistemologia qualitativa proporciona, de forma satisfatória, o alcance às exigências epistemológicas inerentes ao estudo da subjetividade, como parte constitutiva do indivíduo e das diversas formas de organização social.

González Rey6 propõe a defesa do caráter construtivo e interpretativo, o que implica compreender o conhecimento como produção. Dessa forma, é possível uma criação teórica plurideterminada, diferenciada, irregular, in-terativa e histórica, que representa a subjetivi-dade humana. Ou seja, não é uma apropriação da teoria apenas como assimilação linear de uma realidade, mas um processo que mantém o caráter recursivo com os instrumentos usados na pesquisa.

Para compreender essa complexidade, que envolve a questão da subjetividade nos proces-sos de aquisição da escrita, foram necessárias a organização e a seleção de alguns recursos investigativos, como: observações, sistemas conversacionais, desenhos e histórias livres e contextualizadas e complemento de frases, presentes nas etapas da pesquisa.

A Oficina de Palavras contou com a partici-pação de duas alunas de oito anos com dificul-dades de aprendizagem na escrita, em atendi-mento psicopedagógico na Instituição Vivereh. Essa instituição atende, principalmente, alunos que moram nas redondezas, cursando o ensino fundamental em escolas regulares do municí-pio de Osasco. Nesse espaço foram realizadas atividades lúdicas e conversações com objetivos pedagógicos, considerando os interesses dos alunos. É importante ressaltar que a Oficina de Palavras possibilita um espaço livre e seguro para que os alunos tragam suas situações de vida, uma vez que as relações entre mediação/aluno são lúdicas e que suas produções recebem aceitação individual.

A pesquisa realizou-se em oito etapas vi-venciadas com os participantes da pesquisa. Cada etapa teve a duração semanal de uma

hora e meia, totalizando doze horas. Durante os encontros foram discutidos assuntos sobre dificuldades enfrentadas em provas, produções de textos, tarefas, entre outras, possibilitando uma reflexão e verbalização das atividades re-lacionadas ao ato de escrever. As duas alunas participantes da pesquisas foram denominadas: Paula e Heloísa (nomes fictícios).

Selecionaram-se para esse artigo, as eta-pas mais significativas vivenciadas pelas participantes da pesquisa. São elas: Sistemas conversacionais e Complemento de frase. Os Sistemas conversacionais se constituem em uma atividade que, na metodologia qualitativa, representa fonte essencial para refletir como a pessoa se expressa e para garantir a qualidade da informação. O Complemento de frases é um instrumento que apareceu na literatura psicoló-gica como um teste projetivo desenvolvido por Julian Rotter, propondo significados particulares para formas gerais de expressão das pessoas diante das frases. Esse último instrumento foi adequado para as atividades que envolvem relações de ensino e aprendizagem.

CONSTRUÇÕES A PARTIR DAS VIVÊN-CIAS E INFORMAÇÕES DAS ALUNAS PARTICIPANTES

Paula Utilizando como instrumento sistemas con-

versacionaisPaula tem oito anos. É quieta, observadora,

esforçada e alegre. Não gosta de perder ou “ficar para trás” e, quando isso acontece, fica muito chateada. Por conta disso, está sempre competindo com seus colegas. Sua maior vonta-de é aprender a escrever corretamente, porque acha que, dessa forma, vai ficar mais inteligente e ninguém vai rir dela quando escrever alguma palavra errada.

Nessa atividade, a intenção foi deslocar-se do lugar central das perguntas para tentar compreender as produções de sentidos de Paula em suas dificuldades na escrita. A conversa

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fluiu descontraidamente, sobre a elaboração de frases e textos, enfim, sobre a produção escrita.

Evidenciou-se, a partir dos relatos de Pau-la, que muitas vezes ela se “fechava”, não se permitindo expor situações vividas e, principal-mente, expressar suas emoções. Retomando o problema desta pesquisa, observei que, após a dinâmica conversacional, a aluna mostrou-se mais livre, mais disposta ao diálogo, que era a intenção dessa atividade. A reflexão sobre pensamentos de frustração e ira, por cometer erros ortográficos quando escrevia um texto, fez com que a aluna participante expressasse seus sentimentos com mais espontaneidade. Assim, foi possível perceber que, nessa reflexão, Paula produzia sentidos subjetivos e alguns elementos subjetivos e significados internos se evidenciavam.

HeloísaUtilizando como instrumento complemento

de fraseHeloísa é uma menina alegre, mas muito

preocupada e nervosa. Qualquer manifestação dos colegas a respeito de sua escrita na lousa ou em uma atividade realizada na folha de papel sulfite era motivo para ela manifestar sentimen-to de raiva. Muitas vezes, chegava até a bater nos colegas. Apesar de aparentar que é forte, é uma menina frustrada consigo mesma, imatura para sua idade e indecisa. Não gosta de receber críticas, nem sugestões.

Nessa atividade, Heloísa escolheu uma tira de papel contendo algumas frases incompletas, por exemplo:

Eu fico muito nervosa, me sinto raiva eu me odeio quando não consigo escrever certo. Com-pletou a frase escrevendo do seu jeito.

Heloísa sabe que tem dificuldades na escrita, mas o nervosismo que apresentava quando não conseguia escrever certo a impedia de escrever adequadamente. Nesse momento, ela se trans-formava: ficava brava e expressava os sentimen-tos presentes em sua escrita na complementação de frases. Mais uma vez, se confirma o quanto os sentimentos e as emoções são importantes na

produção de sentidos subjetivos e, consequen-temente, na compreensão da subjetividade em construção. Escrever é sempre um espaço de tomada de consciência, pois é nesse momento que sentimentos e emoções são agregados ao ato da escrita.

RESULTADOSAlguns aspectos inerentes à aprendizagem

evidenciaram-se durante a pesquisa, possibili-tando uma aproximação dos elementos subje-tivos presentes nos processos de aquisição da escrita:• Percepção: a percepção de si levou as alunas

à “entrega” de seus dilemas e por conta disso, à superação de valores negativos, o que permitiu a produção de novos sentidos na aprendizagem da escrita. Ao percebe-rem elementos de seu mundo real, fizeram inferências baseadas em conhecimentos adquiridos previamente e em informações sobre a situação presente;

• Atenção: permitiu às alunas o resgate da auto-estima. Tal fato possibilitou menor incidência de erros na produção escrita e, consequentemente, a diminuição do sentimento de medo; possibilitou, ainda, o reconhecimento de suas autorias de pensa-mento, logo, a produção de novos sentidos nos processos de aprendizagem da escrita;

• Memória: levou as alunas a expressarem e reconhecerem a própria criatividade. Assim, elas produziram novos sentidos na vida es-colar: com menos sentimentos de frustração e mais confiança em si mesmas, não se in-timidando quando cometiam erros em suas produções escritas.

CONSIDERAÇÕES FINAISEste trabalho buscou analisar uma experi-

ência concreta acerca da compreensão da sub-jetividade nos processos de aprendizagem da escrita, que considera o sujeito em sua dimen-são ativa e singular, ou seja, como alguém que produz sentidos subjetivos. A concepção atual

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de subjetividade proposta por González Rey2 permitiu ampliar uma discussão de diferentes nuances sobre as experiências de alunos com dificuldade para escrever.

A todo o momento, os alunos produzem sentidos subjetivos na produção escrita, uma vez que essa produção é um processo inter-minável, implicado pela organização atual do sistema subjetivo do sujeito e sua história de vida, considerando-se seus pensamentos, suas emoções e também a ação das pessoas e situa-ções envolvidas em suas experiências.

Nesse movimento, a Oficina de Palavras significou um espaço seguro e diferenciado, que possibilitou a produção de sentidos dos alunos nos processos de construção da escrita, eviden-ciando suas subjetividades em construção.

O valor de uma atividade não está nela mes-mo, mas nos sentidos subjetivos que emergem da atividade em si. Embora o aluno encontre dificuldades no decorrer de suas aprendizagens, quando lhe são oferecidas situações nas quais ele produz sentidos subjetivos, a tarefa, embora difí-cil, prossegue mais tranquila, levando-o a superar as dificuldades que aparecerem nesse processo.

Há também que se considerar o professor e o psicopedagogo, pois suas posturas, enquan-to educadores, certamente contribuirão ou não para a produção de sentidos subjetivos de alunos com dificuldades na escrita, na medida em que a relação professor/aluno, psicopeda-gogo/aluno implica um vínculo afetivo. Ao atentar para essa questão, a escola, os pro-fessores e psicopedagogos poderão contribuir para a promoção de situações favoráveis para o enfrentamento das dificuldades que surgi-rem ao longo do processo educativo.

Enfim, foi possível compreender que os múltiplos saberes e os múltiplos olhares do psicopedagogo e do professor induzem es-paços de expressão, facilitam a emergência de novos sentidos subjetivos, criam situações dialógicas com o aluno, ou seja, possibilitam que o momento de troca entre aluno/psico-pedagogo, aluno/professor, seja um processo de produção de novos sistemas de subjetiva-ção por meio de suas próprias ações, o que permitirá compreender com mais clareza as dificuldades que alguns alunos têm para aprender a escrever.

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SUMMARYStudents with difficulties in writing: production of subjective sense of

words in the workshop

This study was based on a master’s thesis, which researched the Workshop of Words, a play area as a potential space for the production of subjective sense in the teaching and learning of students with difficulties in writing. The theoretical concepts discussed are the subjectivity of Fernando González Rey, which allow to understand the meaning and category training psychic dynamics of the subject under constant development in its different social practices. Because of this, the research took a qualitative, in the Qualitative Epistemology. Activities of talks and additional sentences consisted of tools to work and reflect on the information obtained in a constructive-interpretive. This study demonstrated that the learning process of writing involves not only cognitive, but also emotional, affective, historical and social aspects that are subjective at all times influencing the placement of students in the face of obstacles that go through the learning writing. From that look, it was found that the Psychoeducation can offer, also to educators a new way to design students and the construction of knowledge, considering that many aspects involved in learning processes allow room for dialogue and the active stance of the student returning subject himself to something, people. That is, the recognition of his own thinking as an act of subjective production of meaning.

KEY WORDS: Learning. Writing. Learning disorders.

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professores(as): sentidos do aprender e do ensinar [Tese de Doutorado]. São Paulo:Pontifícia Universidade Católica de São Paulo;2004.

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11. Fernández A. A inteligência aprisio-nada: abordagem psicopedagógica clí-

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Artigorecebido:2/10/2009

Aceito:8/2/2010

Trabalho realizado no Centro Universitário FIEO,

Osasco, SP.

nica da criança e sua família. Porto Alegre:Artmed;1991.

12. Spinillo AG. Trabalho apresentado no V Simpósio Brasileiro de Pesquisa e intercâm-bio Científico. Anpepp, maio;1994.

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14. Morin E. Epistemologia da complexidade. In: Schitman DF, ed. Novos paradigmas, cultura e subjetividade. Porto Alegre:Artes

Médicas;1996. 15. Scoz B. Psicopedagogia e realidade escolar:

o problema escolar e de aprendizagem. 12ª ed. Petrópolis:Vozes;1994.

16. González Rey F. Psicoterapia, subjetivida-de e pós-modernidade: uma aproximação histórico-cultural. São Paulo:Thomson Lea-ming;2007.

17. Scoz B. (Por) uma educação com alma: a objetividade e a subjetividade nos pro-cessos de ensino/aprendizagem. 2ª ed. Petrópolis:Vozes;2001.

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ARTIGO ESPECIAL

RESUMO – Objetivo: Nosso objetivo é apresentar os resultados de um processo de intervenção que visou favorecer a construção de autonomia, pela via da prática reflexiva, de um grupo de educadores sociais. Método: Para o desenvolvimento teórico foi realizada a interlocução entre autores da psicopedagogia, da prática reflexiva e da educação popular. Os participantes deste estudo de caso foram onze educadores sociais de uma Associação de Educação e Assistência Social localizada na periferia da cidade de São Paulo. O processo teve duração de um ano, num total de dezoito encontros que contemplaram as seguintes atividades: 1) observação participante; 2) construção de um “painel de queixas” para o entendimento dos problemas e satisfações vivenciadas; 3) diante das queixas foram produzidos desenhos, a partir da técnica projetiva “par educativo”, que evidenciaram concepções de ensinar e aprender; 4) apresentação de relatos que visavam compreender os modelos de ação para o ensinar; 5) discussão de textos com temáticas pertinentes aos assuntos detectados nos momentos anteriores e; 6) dinâmica para a construção de um mapa conceitual, que objetivou uma reflexão sobre o processo vivenciado e a prática diária. Resultados: Os educadores indicaram um repensar de sua atuação e novas propostas de trabalho, com base em processos interdisciplinares, que teriam como diretrizes a realidade sociocultural e a produção de um trabalho voltado ao resgate da história dos educandos, moradores da periferia, e a construção, com eles, da visão de cidadania para uma sociedade mais justa e humana.

UNITERMOS: Educação. Psicologia social. Aprendizagem.

a inteRvenção pSiCopedagógiCa inStituCional na foRMação Reflexiva

de eduCadoReS SoCiaiS

Sarah Cazella – Psicopedagoga e Coordenadora

pedagógica do Centro Pastoral Santa Fé.

Rinaldo Molina – Psicólogo; Doutor e Mestre em

Educação; professor do curso de Graduação em

Psicologia e de Pós-Graduação em Psicopedagogia

da Universidade Presbiteriana Mackenzie/SP.

Correspondência

Sarah Cazella

Centro Pastoral Santa Fé

Rod. Anhanguera, s/n Km 25,5

São Paulo - SP

Sarah Cazella; Rinaldo Molina

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INTRODUÇÃOA psicopedagogia ganha hoje cada vez mais

espaço e importância no tecido social. Muitos dos envolvidos com os processos escolares apontam o psicopedagogo como aliado na proposição de novos caminhos para a melhoria da aprendi-zagem daqueles que fracassam nos processos desenvolvidos na educação formal. Vários são os estudos que caminham nessa direção, o que pode ser observado nas publicações da Associação Brasileira de Psicopedagogia.

Paralela à educação formal temos no Brasil várias experiências em educação popular, porém há na literatura da psicopedagogia poucos estu-dos que a exploraram1-9.

Nesse sentido, para contribuir na produção de conhecimentos sobre o trabalho do psicopeda-gogo na educação informal, esse artigo objetiva apresentar e analisar uma intervenção em psi-copedagogia institucional com base na prática reflexiva para a construção da autonomia e da melhoria das relações com a aprendizagem de um grupo de educadores populares. Assim, considera que uma intervenção psicopedagógica institu-cional pode contribuir na ação de educadores sociais por meio de uma proposta que favoreça a sua prática reflexiva.

Algumas de suas questões norteadoras foram: Quais as concepções de aprendizagem de educa-dores populares? Quais seus modelos para a ação do ensinar? Quais dificuldades enfrentam em sua prática? Quais mudanças apresentam a partir de um processo de intervenção psicopedagógico institucional?

A experiência foi realizada em uma Associa-ção de Educação e Assistência Social, locada na periferia da cidade de São Paulo, que atende no período noturno, aproximadamente, 150 jovens entre 18 e 29 anos. Os sujeitos do processo de intervenção psicopedagógica foram onze edu-cadores que atuavam como orientadores de grupos de educandos no “Curso C”, oferecido pela Associação.

No desenvolvimento do processo psicopeda-gógico, com duração de um ano, foram realizados aproximadamente dezoito encontros organizados

dentro das possibilidades do cronograma institu-cional da Associação em que o grupo de sujeitos da pesquisa atuava.

No processo de intervenção junto aos educa-dores foram utilizados: A) a análise dos documen-tos da Associação para entender seu processo his-tórico; B) a observação participante10; C) dinâmica de grupo e construção de um painel de queixas; D) a técnica do “par educativo”11; E) reflexão au-tobiográfica12; F) estudos de textos acadêmicos13 e; G) elaboração de mapa conceitual14.

Algumas informações complementares ne-cessárias são: 1) para formalizar a participação na pesquisa, com intuito de evitar faltas éticas na aquisição e análise dos resultados da pesquisa, foram utilizadas a “Carta de informação sobre pesquisa à instituição”, a “Carta de informação ao sujeito de pesquisa” e o “Termo de consenti-mento livre e esclarecido” lidos e assinados pelos educadores e pela instituição; 2) no corpo do texto, cada educador ou educadora foi nomeado com as iniciais do seu nome, a fim de garantir a preservação da privacidade; 3) e, por se tratar de um trabalho voluntário, o número de participan-tes das atividades, acima apresentadas, variou de acordo com a disponibilidade dos envolvidos.

Para desenvolvimento do artigo, inicialmen-te, apresenta-se uma discussão teórica funda-mentada nas referências da psicopedagogia institucional, da prática reflexiva e da educação popular, posteriormente, explicita-se a evolução do processo de intervenção.

REFERÊNCIAS TEÓRICAS ADOTADAS NA INTERVENÇÃO

A Psicopedagogia InstitucionalApesar da prevalência da Psicopedagogia

em seu viés clínico, nas últimas décadas, de-senvolveu-se a compreensão que no ambiente institucional a dificuldade de aprendizagem se-ria gerada ou agravada segundo as concepções adotadas pela escola.

[...] será o problema da não apren-dizagem apenas do aluno? Não estará

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o professor [educador] estagnado em relação à busca de novos conhecimen-tos? Não estará a escola sendo apenas repetitiva, impondo diariamente uma dose de “conhecimentos prontos”, que são “engolidos” pelo aluno e não “digeridos”? Discordâncias entre pro-fessores [educadores] vistas apenas como questão de “temperamento” ou “política” poderiam ser encaradas através do “modelo de aprendiza-gem” de cada um? A atualização da escola apenas em metodologias de ensino não poderia estar deixando de lado as questões de aprendizagem?15.

Foram esses questionamentos que levaram ao aparecimento da psicopedagogia institucional. Para ela, no desenvolvimento do trabalho psicopedagó-gico, a instituição, enquanto espaço físico e psíquico da aprendizagem, seria o objeto de estudo da psico-pedagogia, uma vez que se avaliariam os processos didático-metodológicos e a dinâmica institucional que interfere no processo de aprendizagem.

Então a psicopedagogia institucional16:[...] está vinculada a uma concepção

crítica da Psicopedagogia e, conse-quentemente, da educação, que muito tem a contribuir com as situações de não aprendizagem na escola e com sua consequente superação. Desta forma, a ação do psicopedagogo está centrada na prevenção do fracasso e das dificuldades escolares, não só do aluno como também dos educadores e demais envolvidos neste processo. Para tanto, é necessário que a intervenção psicopedagógica invista na melhoria das relações de aprendizagem e na construção da autonomia não só dos alunos, mas, principalmente, dos edu-cadores. A construção da autonomia do professor [educador], a postura crítica em relação a sua ação pedagógica e o desenvolvimento da autoria de pensa-mento pode acontecer pela intervenção psicopedagógica na escola.

E teria como objetivo16:[...] auxiliar o resgate da institui-

ção com o saber e, portanto, com a possibilidade de aprender. A reflexão sobre o individual e o coletivo traz a possibilidade da tomada de consciên-cia e da inovação por meio da criação de novos espaços de relação com a aprendizagem.

Com isso, o profissional da psicopedagogia institucional assumiria como funções na institui-ção17: administrar as ansiedades geradas neste ambiente18; criar um clima harmonioso nos gru-pos de trabalho19; colaborar com a construção do conhecimento cognitivo20; identificar obstáculos no processo de aprendizagem21,22; implantar recursos preventivos à fragmentação dos con-teúdos23; conceber o aluno como aprendente e o educador como ensinante24; clarear funções e tarefas no grupo25; possibilitar a rotatividade na liderança26; possibilitar a elaboração do conhe-cimento sobre si e do outro27; e contribuir para a reflexão sobre a prática28.

A Educação Popular A educação popular surgiu na década de 1970,

como um movimento inovador capaz de produzir possibilidades educativas para a democratização da Educação em espaços não formais29,30.

Seriam seus objetivos31:“Desenvolver um trabalho no qual

as pessoas sejam capazes de compre-ender o seu contexto sócio-político-econômico-cultural, exercendo, neste entorno, sua cidadania de forma ade-quada. O que revela tratar-se, assim como a educação formal, de uma ação intencional e, portanto, destinada a alcançar determinados fins, porém não em nível escolar. No que tange à educação não formal, a concepção de educação permanente apresenta grandes semelhanças com a de desen-volvimento cultural da comunidade, não podendo ser posta em ação sem mudanças sociais profundas.

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Esta educação se diferenciou de outras, pois sua preocupação era “estimular a participação política [para] transformação das condições opressivas de sua existência social [por base no] desenvolvimento de habilidades básicas, como a leitura e a escrita”32.

A interlocução entre psicopedagogia institu-cional e educação popular se fundamentaria na dimensão social envolvida no processo de apren-dizagem (além dessa temos também as dimen-sões biológica e cognitiva), pois, com ela, haveria a garantia da continuidade do processo histórico e a preservação da sociedade como tal, por meio de transformações evolutivas e estruturais33.

Esta dimensão cumpriria um papel relevante na ruptura das classes sociais, pois supõe trans-formações, incitando assim a necessidade da educação de promover, conscientizar e motivar a militância para essa transformação.

Esta abordagem sociopolítica estava presente nas raízes da educação popular e teve como base teórica, a prática e o discurso de Paulo Freire34,35.

A criticidade no processo de aprendizagem se construiria e se desenvolveria na “curiosidade epistemológica”, concebida como um aprender crítico em que a experiência da produção de sa-beres, que não permite a mera transferência de conteúdos, favoreceria um conhecimento mais abrangente do objeto24.

Se de um lado do processo existe a aprendi-zagem, e com destaque a aprendizagem social, do outro existe o ensino, a ensinagem.

Freire24 indicou alguns saberes indispensá-veis a uma prática educacional crítica e progres-sista do educador comprometido com a educação popular. Para ele, ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e, este ensinar não seria meramente a transferência de conhecimento, mas a possi-bilidade da sua produção, criação e construção.

Assim, a experiência de cada aprendente seria considerada importante no momento da ensinagem e, produzir-se-ia a oportunidade de, no ensinar, deixar transparecer, a quem apren-de, a peculiaridade do ser humano em “estar no mundo e com o mundo”, como ser histórico. Possibilitar-se-ia com isso condições, por meio

do ensinar, para que o sujeito do aprender se assumisse como ser social, por isso capaz de transformar, criar e pensar.

Deste modo, as ideias de Freire24,33,34 fazem eco ao olhar da psicopedagogia institucional, uma vez que esta promoveria a aprendizagem de forma a criar vínculos saudáveis e críticos com o conhecimento.

A Prática ReflexivaDentro do pensamento educacional a corrente

da prática reflexiva definiu que a reflexão sobre a prática profissional seria a estratégia para o desenvolvimento profissional de professores, para nós de educadores, ao defender que os processos de construção do saber profissional partiriam da prática e da ação reflexiva e compartilhada.

Para Gómez36, a formação do professor (edu-cador) reflexivo abrangeu duas grandes áreas. A primeira seria a do componente “científico-cultural” no qual se pretendia assegurar o co-nhecimento do conteúdo a ser ensinado. Já a se-gunda, foi a do componente “psicopedagógico”, que permitia aprender como atuar com eficácia em sala de aula.

“No componente psicopedagógico é preciso distinguir duas fases principais: na primeira, adquire-se o conhecimento dos princípios, leis e teorias que explicam os processos de ensino-aprendizagem e ofe-recem normas e regras para a sua aplicação racional; na segunda, tem lugar a aplicação na prática real ou simulada de tais normas e regras, de modo que o docente adquira competências e capacidades requeridas para uma intervenção eficaz”.

Neste sentido, Zeichner37 defendeu que o processo reflexivo não se limitaria a questões metodológicas do ensino ou a organização da sala de aula, o que poderia significar incorporar novas experiências em velhas estruturas. Esta incluiria também a problematização de aspectos que en-volveriam a organização escolar e sua cultura, por exemplo, práticas concorrentes, estruturas hierárquicas, atuações excludentes, entre outras.

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Para Nóvoa38, na formação do professor (edu-cador), a preocupação da técnica e do conhe-cimento deveria ser superada, permitindo um avanço para a socialização e a reflexão de sua configuração profissional.

“A formação deve estimular uma pers-pectiva crítico-reflexiva, que forneça aos professores [educadores] os meios de um pensamento autônomo e que facilite as di-nâmicas de autoformação participada. Estar em formação implica investimento pessoal, trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos próprios, com vista à construção de uma identidade profissional.”

Ainda para este autor, deveriam ser criados es-paços permanentes dessa formação, em ambientes que favorecessem a troca de experiências e a parti-lha dos saberes, em que cada um dos profissionais seria chamado ao papel de “formador” e também ao papel de “formando”. Este seria o único caminho para a conquista do exercício da autonomia.

“O trabalho centrado na pessoa do pro-fessor [educador] e na sua experiência é particularmente relevante nos períodos de crise e mudança, pois uma das fontes mais importantes de stress é o sentimento de que não se dominam as situações e os contextos de intervenção profissional38.”

Este tipo de formação valorizaria os paradig-mas de formação que promovem a preparação de educadores reflexivos para assumirem res-ponsabilidades frente ao seu próprio desenvol-vimento profissional, diante dos desafios do ato de ensinar. “As situações que os professores [educadores] são obrigados a enfrentar (e a resolver) apresentam características únicas, exigindo, portanto respostas únicas”38.

Para a formação de educadores reflexivos, o desafio estaria na concepção de um espaço institucional educativo, que concebesse o traba-lho prático e a formação de seus profissionais, não como atividades distintas, mas como um processo permanente, integrado ao cotidiano da instituição.

Ou seja, sua metodologia de trabalho se apoiaria na produção de espaços reflexivos

coletivos de formação, presentes nas próprias instituições em que os educadores trabalham, que compreenderiam as possibilidades de re-flexão e tomada de consciência das limitações sociais, culturais, pedagógicas contextuais e da própria profissão.

Diante do contexto teórico colocado, apre-sentamos a seguir o relato e a análise de uma intervenção psicopedagógica realizada com edu-cadores sociais, na educação não formal. O olhar psicopedagógico, as intervenções e o processo reflexivo contribuíram para que o grupo parti-cipasse efetivamente na sugestão de propostas para o trabalho que desenvolviam, buscando autonomia na sua prática e melhorando as con-dições de aprendizagem dos seus educandos.

A PRÁTICA DA PSICOPEDAGOGIA INS-TITUCIONAL NA EDUCAÇÃO POPULAR

Momento um: apresentação das queixasA proposta inicial foi de diagnóstico dos incô-

modos e satisfações sentidas pelos educadores; para que esses não se sentissem constrangidos, foram expressas individualmente e anonimamen-te por escrito. Esse processo foi disparado com a apresentação de dois grandes cartazes: um com a imagem de um saco e outro com a imagem de um prato sob uma toalha. Foram dadas orien-tações para que escrevessem em papeletas, a partir do trabalho diário no “Curso C” e dentro da Associação: a) os incômodos e colassem no cartaz do saco e; b) as vivências boas e colassem no cartaz do prato.

Posteriormente, as papeletas foram lidas e seu conteúdo organizado em categorias determina-das pelos próprios educadores.

Como resultados, uma primeira categoria foi nomeada como “Queixas externas ao trabalho”. Foram elas: A) “O tempo parece pouco para po-dermos ajudar os educandos, tanto na parte da formação humana, quanto no que se refere à parte educacional”; B) “O tempo que nos atropela”; C) “Falhas educacionais aberrantes”; D) “Dificuldade de entendimento dos educandos”; E) “Alternância de humor dos educadores e coordenação”.

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As “queixas A e B” trouxeram o conceito do tempo que educandos e educadores teriam para superar as “queixas C e D”. Segundo Bonals e González21, essas se apresentaram como queixas ilimitadas, pois indicaram o caráter de dificuldade diante de uma situação, em que não estava defi-nida a forma de superação da mesma, causando, muitas vezes, o desânimo e a impotência.

A “queixa D” sugeriu uma separação nas relações entre aprender e ensinar, fato enten-dido por Freire24 como impossível numa relação pedagógica. Assim, evidenciou-se uma queixa de delegação21, pois houve a transferência da não aprendizagem, centrando-a no outro, no caso o educando.

A “queixa E” teve como característica a busca de uma reação psicológica a falta de en-frentamento, a não superação dos problemas de aprendizagem dos educandos, caracterizando-se como uma queixa jogo21.

A segunda categoria foi nomeada como “Queixas de problemas de ordem individual”: A) “Falta de material de apoio para as aulas de Biologia. Esclarecendo – o meu computador está na UTI. Problema pessoal!”; B) “Acho o tempo insuficiente para se trabalhar as disciplinas / sei a importância das optativas, mas acho que deverí-amos ter mais aulas, pois acho a quantidade que temos insuficiente”; C) “Conversas excessivas na turma D, porém considero ser imaturidade específica desta turma por conta da faixa etária”; D) “Uma coisa que me incomodou muito quando comecei a trabalhar com o ‘Curso C’ foi a minha inexperiência em dar aulas, porque apesar de trabalhar com educação popular e formação em Fé e Política há muito tempo me dei conta que eram coisas diferentes”; E) “Educandos engra-çadinhos”; F) “Quando trabalho com uma aula na turma, sinto a falta do trabalho na turma”; G) “Tempo para organizar a aula de laboratório / tenho muitas atividades na memória do com-putador”.

A criação dessa categoria apontou, de ma-neira geral, para a consciência dos educadores de que poderiam e deveriam fazer algo para mudar. Também confirmavam a importância do

processo de intervenção e das reflexões propos-tas, já que as mesmas sugeriram a revisão de algumas ideias, atitudes e propósitos diante de sua atuação.

Na terceira categoria, segundo a reflexão e classificação dos educadores, encontramos as “Queixas de problemas a serem resolvidos”: A) “Falta de uma definição mais clara de tarefas e responsabilidades secundárias nos eventos (semanas / atividades especiais)”; B) “Falta de colaboração dos educadores (todos) na orga-nização de eventos, semana da acolhida, por exemplo. Sempre as mesmas pessoas cuidam dos detalhes de providenciar materiais, etc.”; C) “Existe ainda uma deficiência de logística quanto a preparar as atividades extras com as ‘semanas’, as reuniões de orientação, as saídas planejadas”; D) “Organicidade dos educadores e coordenação”; E) “Eu creio que deveríamos ser mais assíduos nos horários, pois temos pouco tempo para nos prepararmos melhor, devemos otimizar melhor o nosso tempo”; F) “Acho que também, às vezes, acabamos por deixar passar algumas atitudes de alguns educandos. Creio que devemos ser severos com eles, não se esquecendo de sua realidade, mas que essa realidade não sirva de pretexto para deixarmos passar essas atitudes (bagunça, falta de respei-to, atrasos, conversas, desinteresse, etc)”; G) “Decisões que deveriam e devem ser tomadas por toda a equipe reunida”; H) “Algumas coisas que foram ditas que seriam para serem feitas de um jeito e que depois foram feitas totalmente diferente”; I) “Falta de pontualidade”; J) “Ques-tões, decisões em aberto, às vezes não fica claro o que foi decidido ou acabamos nem decidindo. Isso dificulta o andamento do trabalho”; K) “Desorganização (horário)”; L) “Poucos jovens a procura do apoio no plantão de dúvidas. Principalmente os que estão começando”; M) “Às vezes falta limite para as brincadeiras, isso nos faz perder tempo e o foco do que estamos discutindo”.

As “queixas A, B, C, D, G, H e J” evidenciaram a insatisfação com o trabalho coletivo, além das queixas de falta de organização da coordenação

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para que esse trabalho acontecesse. Interessante notar que estas se apresentaram de maneira im-perativa, como queixas que demandavam uma expectativa de mudança de atitude de outras pessoas para haver colaboração na realização das tarefas educativas.

A presença das “queixas E, I, K” retomaram o tema da falta de organização, mas especifica-mente ligadas à questão do tempo. A temática do tempo esteve presente no grupo “Queixas externas ao trabalho”, porém agora apareceram com uma conotação diferente já que se tornaram fatores a serem considerados no processo educa-tivo, ou seja, não mais tão externas as atividades realizadas pelos educadores.

As “queixas F e M” referiam-se diretamente ao comportamento de determinados educandos na realização das atividades.

A “queixa L” revelou o descontentamento quanto a pouca frequência dos educandos no plantão de dúvidas, espaço que possibilitaria o atendimento individualizado e uma tentativa de reverter o quadro de não aprendizagem.

Momento dois: a concepção de ensinar e aprenderDiante das queixas apresentadas, foi iniciada

uma ação que objetivou conhecer e analisar o que cada um dos educadores manifestava como responsabilidade no seu ato de ensinar e como entendia as relações entre ensinante e apren-dente e, assim tivesse a possibilidade de refletir sobre como se via neste processo. Foi utilizada para este trabalho a técnica do “par educativo”. Nela cada educador desenhou uma pessoa que aprende e uma que ensina e formulou uma his-tória envolvendo esses personagens.

AD ao escrever sobre o desenho, uma situação de trânsito feito na frente e no verso da folha com riqueza de detalhes, afirmou que: “essa pessoa que está ensinando [...] não está deixando a pessoa que está aprendendo à vontade e com a calma necessária para aprender, não respeitando o seu tempo e seu raciocínio [...]”. Salientou, com isso, que o educador não deveria se eximir de suas responsabilidades, porém deveria respeitar

a experiência que tem o educando ao favorecer outros esquemas de aprendizagem. Sua frase para o desenho foi: “Aprendendo a dirigir de forma espantosa e assustada”.

FR ao referir-se ao seu desenho, um adulto e uma criança com sua bicicleta na rua, afirmou: “Estar presente em todos eles” seria fundamen-tal ao educador para acompanhar o processo de desenvolvimento da aprendizagem do educando. Fazer-se presente seria o desafio do acompanha-mento permanente, características da materna-gem39. Sua frase para o desenho foi: “Sou eu ensinando meu filho a andar de bicicleta”.

A escrita da história do desenho realizado por LC, uma situação de conflito entre educandos com a presença passiva do educador, pareceu in-comodá-lo no momento em que realizava o dese-nho. Em sua história os educandos brigavam, mas não sabiam o motivo. Quando da intervenção do educador presente no desenho o destaque esteve na frase: “Paulo [educador nomeado no desenho] não podia deixar aquilo acontecer”. Indicou-se um conflito quanto à resolução de problemáticas advindas das relações que os educandos criaram. A história terminou de maneira bastante afetiva “um grande abraço”! Sua frase para o desenho foi: “A necessidade de compreensão, por parte do mediador, dá importância, dá proximidade e compreensão na construção de um ambiente de aprendizagem”.

No desenho realizado por FB, crianças brinca-vam o jogo de amarelinha. Não havia presença de um adulto que fizesse o papel de quem ensi-nava. Na escrita da história do desenho, houve destaque para a ideia de que o lúdico envolveu a criança e nela as situações de aprendizagem espontânea ficariam mais fortes que as situações formais de aprendizagem. A transmissão do conhecimento aconteceu de maneira bastante espontânea entre as crianças que ensinavam, a outras crianças, as regras da brincadeira. Essa característica pareceu muito peculiar, já que FB também lecionava aulas na Educação Infantil. Sua frase para o desenho foi: “Ensinar e aprender em situações não escolares. É importante não escolarizar todos os conhecimentos, eles são da

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vida. Aprende-se no brincar, e em cada fase com coisas diferentes”.

Para EC o ambiente da aprendizagem tam-bém estava relacionado ao espaço não formal. Ele trouxe em sua narrativa a presença de um ambiente cercado por árvores, em que um edu-cador, no desenho representado por um homem cercado por crianças, que aprendeu com “os mais velhos” transmitia para crianças, de forma oral, seus saberes e vivências. Sua frase para o desenho foi: “Conhecer para preservar”.

Numa mesma tendência, ou seja, uma história de aprendizagem e ensino que acontecia em um ambiente extraclasse, BR representou em seu desenho uma criança e um adulto contemplando e conversando embaixo de uma árvore. Em sua apresentação, foi pertinente a afirmativa sobre as dificuldades que os educadores encontravam em ensinar em um ambiente que não fosse a sala de aula. Sua frase para o desenho foi: “Aprender com a realidade do cotidiano, de maneira infor-mal, apreciando o conhecimento”.

Ao narrar a história de seu desenho, uma área urbana com muitos carros e uma escola, EZ tomou o lugar de seus educandos para relacionar o aprender e o ensinar. Detalhadamente apontou a observação dos educandos sobre a realidade como ponto de partida para que a aprendizagem acontecesse em sala de aula. Sua frase para o desenho foi: “Observando e decifrando a pai-sagem”.

O desenho de NZ foi um resgate em sua me-mória do que viveu no período escolar com sua educadora de Língua Portuguesa. NZ definiu que ensinar seria viver aquilo que se sabe com “magia, amor, empatia [...]” e aprender seria “descobrir que o conhecimento pode ser mágico - lugar da criatividade, da experiência do novo – amor, empatia [...]”. NZ afirmou que repetiu a palavra empatia, para aprender e ensinar, por se tratar de um processo de uma “via de mão dupla”. Sua frase para o desenho foi: “Para aprender e ensinar é preciso amor ao conhecimento, empa-tia, acolhida, partilha [...]”.

As memórias negativas do ambiente escolar formal foram lembradas por PL. Em seu desenho,

o professor de matemática, a sua frente, ensinava sem se dar conta de que seu aluno pouco entendia do que ele falava. Na narrativa sobre o desenho, PL destacou que o aprendido pelo aluno foram apenas as palavras: “Blá, Blá, Blá”, dando a conotação de que o conteúdo apresentado pelo professor não possuía nenhum sentido. Sua frase para o desenho foi: “O professor de matemática está ensinando e o aluno não está aprendendo. Enquanto o professor fala, pensa no que ouve, isto é, não entende o raciocínio do professor, mas não tem coragem de falar que não está entendendo”.

Outra situação de trânsito foi criada para re-presentar a situação de ensino e aprendizagem. Desta vez, SL apresentou em seu desenho, com riqueza de detalhes, personagens que foram descritos em sua narrativa como cumpridores de regras específicas para o “trânsito”. Demonstrou preocupação com o papel que cada indivíduo deveria ocupar para que o processo de ensino e aprendizagem pudesse acontecer. Sua frase para o desenho foi: “Aprender também é saber respeitar”.

Dos dez desenhos e das discussões destaca-mos que:• Quatroeducadoresindicaramparaousoda

realidade como ponto de partida e suporte para o trabalho de ensinar, como facilitador da aprendizagem (AD, LC, PL e EZ). Tem-se, assim, a possibilidade de no ensinar deixar transparecer, a quem aprende, a peculiarida-de do ser humano em estar no mundo e com o mundo, como ser histórico, intervindo no mun-do. Assim, deve-se considerar a experiência do aprendente no momento da ensinagem;

• Seteeducadores apontaramparaaneces-sidade de construção da proximidade entre educador e educando (PL, LC, AD, FR, EZ, EC e NZ) e, com isso, nos remeteram aos “saberes necessários à prática educativa” (Freire24), em que ensinar exige do educador o respeito ao que o educando sabe e, além disso, autonomia do ser educando;

• ParaFR,aprendereensinarsignificoutam-bém o acompanhamento permanente do educando pelo educador;

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• FBassinalouaimportânciadaaprendizagemnão escolarizada, ou seja, essa também se dá na vida e no prazer de viver;

• Trêsdesenhosrelacionaram-seapaisagens:dois deles à paisagem natural (BR e EC) e outro à paisagem urbana (EZ). Mais uma vez, a formação dos educadores se fez presente: os dois educadores que representaram a paisagem natural eram formados na área de Biologia e responsáveis por alguns projetos ambientais da Associação. O desenho da paisagem urbana foi feito pelo educador da área de Geografia;

• Doisdesenhosapresentarama temáticadotrânsito e suas regras. Os educadores que os realizaram (AD e SL) ministravam disciplinas das Ciências da Natureza e Matemática, o que evidenciou a preocupação que tinham com as ordens e regras, exigências dessas disciplinas para se alcançar um resultado exato;

• Três desenhos representaram a situação es-colar com a presença física do responsável pelo ensinar – o professor (PL, LC e NZ). Inte-ressante notar que nos desenhos o professor presente faz toda diferença para o processo de quem aprende. Em um dos desenhos, o professor estava distante e não percebeu as dificuldades do aluno, já nos outros dois, a interferência e a proximidade do professor facilitaram a aprendizagem do aluno;

• Doisdesenhostratavamdolúdico(FBeFR).O lúdico se apresentou na convivência diária ao favorecer a construção de uma relação de proximidade entre as pessoas, assim como facilitador na aproximação dos conteúdos à vida dos educandos, o que tornaria o aprender prazeroso e favoreceria a melhoria da apren-dizagem24,34,35. Esta atividade, além de ser um momento

de bastante descontração no grupo, deixou claro que seus componentes valorizavam as atividades educativas não formais, já que em várias situações quem ensina e quem aprende não estavam identificados especificamente com esta função e não estavam no ambiente formal de educação.

Outra questão presente nas discussões da psi-copedagogia, e que se evidenciou nos desenhos e na fala dos educadores foi que no processo educativo, aspectos biológicos, afetivos e intelec-tuais sofreriam influências e seriam influenciados pelas condições socioculturais do indivíduo e do seu meio27.

Momento três: Os educadores modelosEm um processo reflexivo, fez-se importante

o resgate das matrizes pedagógicas, os modelos para a ação do ensinar. Freire40 defendeu esta tese destacando que o processo de resgate contribuiria para a percepção da distância entre aquele que constrói e aquele que reproduz o processo de aprendizagem. Para ele, tal processo “possibilita que [se] compreenda a diferença entre construir conhecimento e reproduzir conhecimento, repetir história e construir história”.

Os dez sujeitos da pesquisa relataram quem/qual eram seus modelos a partir da frase: “Apren-demos sempre a partir de um modelo, nunca do nada. Não existe ação educativa que prescinda de modelos”41.

Como resposta um deles trouxe como modelo para sua atuação a experiência direta com seus educandos. A proposta apresentada era clara para que buscassem em sua memória exemplos de edu-cadores que ajudaram a construir os profissionais que eram hoje. Não houve tempo para discutir a presença dos educandos neste resgate, porém não houve falta de participação do mesmo, já que outros “modelos” foram trazidos em seu registro.

De maneira geral, os educadores citaram que o grupo do qual fazem parte, ou seja, o grupo aqui estudado, colaborou como modelo para a sua atuação individual. Para alguns, essa presença do modelo do comportamento do grupo foi tão importante que o exemplo de ser educador nesse foi levado para outros ambientes de atuação na educação formal.

O nome de um educador, do próprio grupo, foi citado como modelo. Tal situação decorreu da característica comum de que um grupo de educadores passou pela Associação como edu-cando e hoje trabalha nela, tendo no grupo de

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trabalho esse antigo educador. A maneira pecu-liar de como tratava cada um deles favoreceu o resgate, pois tinha uma postura de cumplicidade ao mesmo tempo em que dominava o conteúdo.

Apresentaram-se modelos familiares que ajudaram a construir a maneira de atuar. O ca-ráter, os valores e atitudes de respeito diante do educando e das diferenças que cada um apre-sentava eram, segundo os relatos, contribuições de aprendizagens que construíram dentro das relações familiares.

Outros modelos para a prática pedagógica foram lembrados pelo domínio de certo conteúdo e a aproximação do mesmo com a realidade, mo-delos esses baseados em profissionais de diversas áreas do mercado de trabalho.

Um último dado relevante foi que apenas dois educadores não relataram como modelo educadores/professores antigos, das disciplinas que ministravam no curso.

Momento quatro: As propostas de mudançasApoiados pelas provocações metodológicas

e didáticas de alguns textos, principalmente Fazenda42 e M. Freire43, os educadores foram convidados a confrontar a prática efetivada junto aos educandos na expectativa de evidenciarem aspectos que necessitavam de revisão e refletir sobre as possibilidades do desenvolvimento de novas experiências pedagógicas.

Depois de um longo caminho de reflexão possibilitado pela leitura e discussão dos textos, uma dinâmica foi proposta para a construção de um mapa conceitual. Foi escolhido entre o grupo um dos educadores para ser o escriba de tudo o que acontecesse na reunião e um segundo para registrar o mapa conceitual, que foi construído na lousa, no papel.

A dinâmica tinha como objetivo, a partir da ideia central “Curso C”, que os educado-res individual e coletivamente, e em silêncio, construíssem relações, em um organograma, entre questões da sua prática diária no curso. Ou seja, de forma organizada, cada educador poderia levantar-se, ir à lousa, e contribuir no mapa, também era permitido apagar uma ideia

colocada anteriormente, ou relacioná-la com outras. O grupo aceitou e reagiu com muita expectativa.

Ao final da construção, foi pedido que cada educador registrasse, por escrito, o que era pos-sível ler no que haviam acabado de construir. Quando encerraram esta etapa, houve a partilha e alguns deles relataram ver uma grande confu-são e que não podiam explicar tudo o que estava colocado no mapa conceitual.

No encontro seguinte, cada educador recebeu uma cópia do mapa conceitual construído coleti-vamente. A intenção foi promover uma discussão entre duplas que objetivava o repensar do mapa com a produção de uma nova organização para clarear a atuação do grupo.

Para finalizar esse trabalho, a partir da reor-ganização do mapa, foi criada uma proposta de atividades que tinha como base as atividades já desenvolvidas no “Curso C”, ou seja, simulados, encontros dos educadores, a metodologia utili-zada em sala de aula, a organização das turmas, o cronograma de horários e o material para os educandos.

A reflexão nas duplas foi um momento de muito trabalho criativo, em que os educadores trocaram e leram a forma como enxergavam cada ponto colocado na primeira proposta do mapa conceitual.

O momento seguinte serviu para a partilha das duplas.

A primeira dupla, AD e SL, relatou que a partir do momento que se dedicaram ao mapa algumas coisas pouco compreendidas inicialmente fizeram sentido. Propuseram atividades para além do curso do qual estavam envolvidos: organização de um cronograma específico por eixo temático de aulas “diferentes”; realização de simulados mensais nos finais de semana e; a realização de atividades culturais e esportivas complementares.

A segunda dupla, EC e FR, apresentou uma releitura que evidenciou a saída do caos em que se encontravam frente a tantas questões emergentes. Quanto às sugestões concluíram: algumas sema-nas temáticas da instituição (atividades semestrais em que alguns temas relacionados a questões

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ambientais e de cidadania eram estudados du-rante uma semana por todos os educandos que participavam da Associação) deviam ser agrega-das e repensadas em seu tempo de duração; que era necessário intensificar os temas dos eixos com atividades conjuntas; que o momento coletivo e mensal de assistir um filme, para reflexão de um tema proposto pela Associação, contasse com participação dos educandos em sua preparação; que acontecessem simulados nos finais de semana; que houvesse estímulo aos educandos e aos outros educadores da instituição na participação em lutas sociais e políticas; além da garantia de um dia de encontro por eixo no cronograma de atividades semanais dos educandos.

A terceira dupla, FB e BR, organizou o mapa conceitual por cores, em torno de quatro eixos de atuação: o contexto individual, o contexto coletivo, o que ofereciam no curso e as dúvidas que sur-giram no processo. Sugeriram muitas propostas: encontros de formação do grupo de educadores com mais afinidade temática; otimização do tempo de planejamento coletivo; exploração dos diversos espaços da instituição; preparação dos conteúdos com oportunidades para que os educandos se ex-pressassem por meio de registros; aulas temáticas; o uso de material de apoio, pronto ou elaborado pelos educadores; estudo de meio com diversidade de temas; simpósios preparados pelos educandos; organização da semana da primavera e da cidada-nia; participação dos educandos na preparação da atividade intitulada cine fórum; e integração dos ei-xos, projeto de vida e atividades complementares.

A última dupla, EZ e LC, ao apresentar seu mapa conceitual, provocou um grande debate, caracterizado pela confusão que, segundo os outros participantes, ainda apresentavam em sua leitura. A dupla conseguiu explicar que o proces-so que fizeram era de separar o antes e depois da passagem dos educandos no curso. Sugeriram: adequação do espaço, com diferenciação da organização tradicional de escola; exposições artísticas que atingissem e influenciassem o espaço da sala de aula; semanas temáticas por eixos; mais estudos do meio e; reorganização do cronograma de aulas.

As discussões trouxeram novos ares para as relações entre os educadores e, para finalizar, todas as sugestões foram encaminhadas à co-ordenação geral do projeto como demonstração da necessidade de reformulação de aspectos importantes na produção do trabalho pedagógico com os educandos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS“Talvez que um professor seja um fun-

cionário das instituições que gerenciam la-goas e charcos, especialista em reprodução, peça num aparelho ideológico de Estado. Um educador, ao contrário, é um fundador de mundos, mediador de esperanças, pastor de projetos. Não sei como preparar o educa-dor. Talvez que isto não seja nem necessário e nem possível... É necessário acordá-lo. E aí aprenderemos que educadores não se extinguiram como tropeiros e caixeiros. Por-que, talvez nem tropeiros e nem caixeiros tenham desaparecido, mas permaneçam como memórias de um passado que está mais próximo do nosso futuro que o ontem. Basta que o chamemos do seu sono, por um ato de amor e coragem, E talvez, acordado, ele repetirá o milagre da instauração de novos mundos44”.

Durante a intervenção, ficou clara a necessi-dade da construção de um olhar psicopedagógico específico voltado ao grupo de educadores sociais. Os mesmos possuíam inúmeras práticas, porém lhes faltavam os momentos de análises das mes-mas para perceber a qualidade de sua atuação e o envolvimento com a aprendizagem dos educan-dos que chegavam à educação não formal, sem algumas aprendizagens entendidas como básicas no momento formal da educação escolar.

A psicopedagogia institucional pôde colaborar com este grupo em sua perspectiva preventi-va16, pois favoreceu o resgate das concepções e estratégias metodológicas utilizadas com vistas à diminuição da frequência dos problemas de aprendizagem apresentadas pelos educandos.

No processo, os educadores entenderam que o ambiente em que acontecia o processo de apren-

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der e ensinar poderia se organizar para favorecer que os diversos conhecimentos trabalhados fos-sem usados por seus educandos, diante das várias temáticas abordadas, de forma interdisciplinar24.

Seus modelos de educadores contribuíram para justificar esta ideia, pois tais modelos iam desde pessoas que não atuavam em instituições educacionais, passando por seus familiares, até os educadores identificados como seus companheiros de trabalho ou os professores do passado que domi-navam os conteúdos e os aproximava da realidade.

Na observação desse grupo, foi possível en-tender um conceito defendido por M. Freire43 de que todo educador é um “alfabetizador”, não só entendido como aquele que nos primeiros anos de vida escolar ensina a linguagem escrita à criança, mas como um profissional preocupado com outras linguagens e, em qualquer faixa etária da vida.

Para tanto, sugere-se que a prática de inter-venção crie espaços sistematizados de acompa-nhamento desses educadores, em uma constante entre: a) uma prática estética: apropriação do seu pensamento por meio de referências culturais e pessoais; b) uma prática reflexiva sobre a ação pedagógica: momento para pensar com o outro,

estruturar hipóteses, registrar o processo para revê-lo, aprofundar e ampliar suas ideias e; c) uma prática teórica: significação da realidade por meio de estudos para recriar a prática16,24,28.

Neste processo de intervenção psicopedagó-gica, o desenvolvimento do trabalho foi mediado pelas práticas estéticas, reflexivas e teóricas, o que possibilitou a produção de propostas do grupo de educadores, para a Associação.

Nesse contexto de educação popular, em que se considerou a realidade sociocultural do educando, possibilitou-se o avanço da inter-venção de maneira crítica sobre a atuação dos educadores. Com isso finalizaram com propostas que, fundamentadas na melhoria do trabalho educativo, pretenderam resgatar a história dos educandos da periferia e construir, com eles, discussões sobre a cidadania para uma socie-dade mais justa e humana, como pretende essa concepção de educação.

Por fim, cabe ressaltar a importância do distan-ciamento do profissional psicopedagogo do proces-so vivenciado. Desafio importante para que o en-volvimento necessário possibilitasse intervenções profundas com o devido “cuidado do cuidador”33,45.

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SUMMARYThe institutional psychopedagogic intervention in the reflexive forma-

tion of social educators

Objective: Our goal is to present the results of an intervention process that aimed to promote the construction of autonomy, by means of reflexive practice, the social educator. Methods: For the theoretical development was carried out dialogue between the authors of the pedagogy of reflexive practice and popular education. The participants of this case study were 11 educators of the Association of Education and Social Welfare on the outskirts of São Paulo. The process lasted one year, a total of 18 meetings distributed among the following activities: 1) participant observation in meetings with the coordination of the project and with the group of educators, 2) the construction of a panel of complaints to understand what problems they experienced educators, 3) before complaints were made drawings from the projective technique “par educativo” in revealing their conceptions of teaching and learning, to understand what each one had to act responsibly in their teaching, 4) activities were aimed at understanding the action models for teaching used by teachers; 5) from theoretical readings were discussed issues relevant to the issues identified in the moments before and, finally, 6) was a dynamic proposal to build a conceptual map for reflection on the experienced and the daily practice of educators. Results: The teachers have produced a new work proposal on the basis of disciplinary proceedings, it had as the cultural reality and the production of a work aimed at rescuing the history of students, residents of the periphery, course participants, and build with them idea of citizenship for a more just and humane.

KEY WORDS: Education. Psychology, social. Learning.

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Trabalho realizado no Centro Pastoral Santa Fé,

São Paulo, SP.

Artigo recebido: 19/11/2009

Aprovado: 22/2/2010

em: www.abpp.com.br/pesquisas/01.htm Acesso em 19/11/2009

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ARTIGO ESPECIAL

RESUMO – A mediação escolar passou a se tornar mais frequente a partir da Convenção de Salamanca. As escolas de todo o mundo tiveram que dar conta de incluir crianças que precisavam de ajuda em classes já existentes, muitas vezes com grande número de alunos e professores, cuja formação não havia se preocupado com esses aspectos. O mediador pode atuar como intermediário nas questões sociais e de comportamento, na comunicação e linguagem, nas atividades e/ou brincadeiras escolares, e nas atividades pedagógicas, nas limitações motoras ou da leitura, nos diversos níveis escolares. Um mediador estimulando a aquisição de linguagem e habilidades sociais no cotidiano escolar amplia a possibilidade da quantidade de estímulo recebido, como também a qualidade já que sempre ocorrerá em situação real de uso, diferente do que se pode proporcionar num consultório. Conhecer o aluno que será acompanhado pela mediação, discutir com a equipe pedagógica da escola e com a equipe de apoio terapêutico são pontos fundamentais. Apesar da figura do mediador ser considerada uma adaptação no espaço pedagógico, portanto garantido pela lei, não existe muita clareza quanto o papel e as atribuições deste profissional nem quanto à regulamentação da profissão.

UNITERMOS: Educação especial/tendências. Mainstreaming (Educação). Educação.

Mediação escolaR e inclusão: Revisão, dicas e Reflexões

Correspondência

Renata Mousinho

Av. das Américas 2678 casa 11 - Barra da Tijuca - Rio

de Janeiro, RJ – CEP 22640-102

E-mail: [email protected]

Renata Mousinho; Evelin Schmid; Fernanda Mesquita; Juliana Pereira; Luciana Mendes; Renata Sholl; Vanessa Nóbrega

Renata Mousinho - Mestre e Doutora em Linguística UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Professora da UFRJ. Evelin Schmid - Mestre em Linguística PUC-RJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga Lexus. Fernanda Mesquita - Mestranda em Psicologia UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga Lexus. Juliana Pereira - Mestre em Linguística da UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga AE e Lexus. Luciana Mendes - Mestre em Linguística UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga UFRRJ e Lexus. Renata Sholl - Mestre em Linguística UFRJ. Fonoaudióloga SecretariaMunicipal de Saúde -RJ e Lexus. Vanessa Nóbrega- Mestre em Linguística UFRJ. Especialista em Educação Especial Inclusiva, UGF. Fonoaudióloga Lexus.

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INTRODUÇÃODiversos documentos foram gerados ao

longo dos anos por organizações internacionais na tentativa de garantir o direito universal à educação, como também orientar o processo de inclusão, tais como: Declaração de Cuenca, em 1981; Declaração de Sunderberger, em 1981; Declaração Mundial sobre Educação para Todos – UNESCO, em 1990; aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos - Tailândia, em 1990; Informe Final do Seminário da Unesco de Caracas, em 1992; Declaração de Santiago, em 1993; Normas Uniformes para Pessoas com Incapacidades, aprovadas em Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1993; Declaração de Salamanca, de Princípios, Política e Prática em Educação Especial - Unesco, em 1994; Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência - ONU, em 2006. Vale destacar que os documentos da Unesco em 1990 e em 1994 são considerados internacionalmente momentos históricos a favor da Educação Inclusiva1.

O panorama no Brasil também não é dife-rente historicamente, onde leis e documentos foram criados na intenção de garantir o sucesso da inclusão. Assim, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1998 garante a oferta do atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. A constituição, art. 208, inciso III, o Plano Decenal de Educação para todos, 1993 – 2003, e os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1999 são exemplos de documentos que defendem e asseguram o direito de todos à educação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional (LDB) nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 define, no capítulo V, que a educação para alunos com deficiência deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, assegurando aos mesmos currículo, técnicas, recursos educativos específicos para atender às suas necessidades, métodos dentre outros recursos e adaptações2,3.

Diante da filosofia de inclusão como um movimento mundial, impulsionada sobretudo

pela Convenção de Salamanca, as escolas de todo o mundo tiveram que dar conta de incluir crianças que precisavam de ajuda em classes já existentes, muitas vezes com grande núme-ro de alunos e professores, cuja formação não havia se preocupado com esses aspectos. Neste momento, a opção para muitos foi colocar um profissional especializado na sala de aula, a fim de acompanhar uma criança ou adolescente em parceria com o professor de classe. Com o crescimento e propagação da ideia do mediador escolar, despontou a necessidade de se estudar mais a fundo o assunto, apesar do pouco mate-rial teórico disponível sobre o tema.

A variação na nomenclatura também difi-culta pesquisas mais amplas. Em inglês, por exemplo, pode-se encontrar com o nome de Teacher Assistant, Instructional Assistant, Special Education Teaching Assistant, Special Education Paraprofessional, Teacher Aide, Para-educator, Teaching Assistant, Special Education Aide, Special Education Instructional Assistant, Shadow Aide. No Brasil, já surgiram expressões como facilitador escolar, tutor escolar, assistente educacional e mediador escolar. Esta última de-nominação parece melhor explicitar a função de quem acompanha a criança de inclusão dentro de uma classe regular de ensino, terminologia que será utilizada doravante neste artigo. A pa-lavra “mediador” faz menção àquele indivíduo que media e mediar significa ficar no meio de dois pontos4. O conceito de professor mediador já foi utilizado em outro contexto para carac-terizar aquele que “trabalha com a mediação pedagógica, significando uma atitude e um comportamento do docente que se coloca como um facilitador, incentivador ou motivador da aprendizagem, que ativamente colabora para que o aprendiz chegue aos seus objetivos”5.

Alguns países apresentam mais registros desta experiência. Na França, entre 1998 e 2003, foram desenvolvidas as primeiras inte-grações individuais com mediadores escolares. Esses profissionais eram recrutados e formados por associações, de forma pontual, visando ao tipo de dificuldade que eles acompanhavam.

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Em junho de 2003, eles passaram à responsabi-lidade da Educação Nacional6. Nos EUA, uma característica relevante da mediação é que todo o staff, equipe escolar, deve compreender a dificuldade do aluno, que o faz responder de uma forma diferente dos outros estudantes. É importante o treinamento dos colegas. O staff educacional deve ser treinado diretamente para aquela criança com sua equipe, compreendendo seus pontos fortes e necessidades prioritárias para poder atuar com ela. A equipe deve incluir os professores, fonoaudiólogos, terapeutas ocu-pacionais, além dos pais7. Na Grã-Bretanha, os mediadores escolares trabalham em escolas com professores de turma, a fim de ajudar a oferecer experiências relevantes de aprendizagem para as crianças. Independente do título que apre-sentam, ficam baseados em escolas primárias, secundárias ou especiais. Em escolas primárias e especiais, eles devem ser os primeiros a ajudar uma criança ou um pequeno grupo de crianças com necessidades especiais, ou podem traba-lhar direto numa classe particular. Em escolas secundárias, eles devem trabalhar com uma única criança, abarcando todas as áreas do currículo. Cabe destacar que, na última déca-da, o número de mediadores escolares cresceu impressionantemente neste país8.

No Brasil, fala-se de inclusão com mediador escolar de modo mais intenso em torno dos anos 2000, mas sem nenhum registro sistemático. Aqui surgiram para acompanhar as crianças que necessitavam de auxílio na sala de aula e este era orientado pelos profissionais que acompa-nhavam a criança nas terapias de apoio, aliando trocas com a escola. Aos poucos essa função foi se especializando e ampliando, sendo cada vez mais frequente sua presença em escolas públi-cas e particulares. Exatamente por esse fato, faz-se necessário pontuar a atuação da media-ção escolar e realizar trabalhos científicos que valorizem essa função, para que assim possamos refletir sobre os reais caminhos que nos levam à inclusão e melhor acolher as crianças que necessitam destas pequenas, médias e grandes adaptações. Cabe pontuar que, na maior parte

das vezes, ao menos em escolas privadas, este profissional tem sido pago pelos pais da criança. Estagiários têm sido eventualmente utilizados na rede pública.

Todos esses países, incluindo o Brasil, com-partilham uma característica: a formação de base do mediador pode estar relacionada à área da saúde ou da educação. Portanto, os media-dores escolares podem ser professores, fonoau-diólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, pedagogos, psicopedagogos, fisioterapeutas, sempre acompanhados pela equipe terapêutica da criança ou adolescente e pela equipe escolar. A escolha do mediador está na relação entre sua formação acadêmica e a maior demanda da criança (comunicação, comportamento ou moto-ra, por exemplo). Além disso, o mediador escolar deve ter a aptidão e habilidades interpessoais necessárias para desenvolver e manter relações de trabalho eficazes com as crianças, famílias e demais profissionais que as assistem, que inclui saber respeitar e compreender as dificuldades da família e da criança, ter flexibilidade para se adequar à dinâmica do ambiente escolar que estará se inserindo, disponibilidade para aprender e muita criatividade6,8.

O PAPEL DO MEDIADOR ESCOLARO mediador é aquele que no processo de

aprendizagem favorece a interpretação do es-tímulo ambiental, chamando a atenção para os seus aspectos cruciais, atribuindo significado à informação recebida, possibilitando que a mes-ma aprendizagem de regras e princípios sejam aplicados às novas aprendizagens, tornando o estímulo ambiental relevante e significativo, favorecendo o desenvolvimento9.

O mediador pode levar a criança a detectar variações por meio da diferenciação de infor-mações sensoriais, como visão, audição e outras; reconhecer que está enfrentando um obstáculo e identificar o problema10,11. Pode também con-tribuir para que a criança tome mais iniciativa mediante diferentes contextos, sem deixar que este processo siga automaticamente e encora-jar a criança a ser menos passiva no ambiente.

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Desenvolver a flexibilidade também é impor-tante. O mediador pode atuar criando peque-nas mudanças e problemas para que a criança perceba, inicie, tolere mudanças e aprenda a lidar com estas situações.

De acordo com esses autores, por meio da mediação, a criança pode ser levada a perma-necer por mais tempo em atividades sequenciais que exijam ações complexas e comunicação. Para isso o mediador pode: lançar experiências que solicitem várias etapas na resolução do problema (usando uma forma de comunicação); questionar quem quer resolver o problema; o que deve ser resolvido e oferecer recursos para que o problema seja resolvido. A oferta de recur-sos no auxílio à resolução do problema deve ser realizada de forma sutil, indicando, por exem-plo, onde a resolução do problema pode ser procurada e quais as ferramentas necessárias.

A principal função do mediador é ser o intermediário entre a criança e as situações vivenciadas por ela, onde se depare com dificul-dades de interpretação e ação. Logo, o mediador pode atuar como intermediário nas questões sociais e de comportamento, na comunicação e linguagem, nas atividades e/ou brincadeiras escolares, e nas atividades dirigidas e/ou pe-dagógicas na escola. O mediador também atua em diferentes ambientes escolares, tais como a sala de aula, as dependências da escola, pátio e nos passeios escolares que forem de objetivo social e pedagógico. Também pode acompanhar a criança ao banheiro, principalmente se esti-ver com objetivo de desfralde, auxiliando nos hábitos de higiene, promovendo independência e autonomia no decorrer da rotina. Isso poderá ser acordado junto à equipe escolar, se esta tiver auxiliar de turma, para que não aconteça con-flito nas ações. Adaptar a estrutura física para organizar objetos no entorno, evitando grandes distratores ou exposição daqueles que represen-tam manias é uma ação igualmente relevante.

Mediadores escolares também prestam apoio aos professores em sala de aula. Eles ajudam com as atividades e trabalhos de adaptação indi-vidualizada, a fim de permitir que os professores

ganhem tempo com as demais atividades do dia a dia. Podem ajudar e apoiar as crianças na aprendizagem e aplicação de material de classe. Também proporcionam aos alunos uma atenção individual, quando os alunos estão tendo dificul-dades com o material proposto para o resto do grupo. Algumas adaptações curriculares podem ser feitas seguindo a proposta do professor da turma e das terapias de apoio. Para tanto, é necessário conversar com a equipe terapêutica para que as ações sejam coerentes e uniformes.

A parceria entre mediador e escola favorece o estabelecimento de metas realistas no que se refere ao desenvolvimento, como também possibilita avaliar a criança de acordo com suas próprias conquistas. Como mostra a literatura, o mediador deveria ser encarado como um profissional que assume o papel de auxiliar na inclusão do aluno com deficiência e não o papel de professor principal da criança. Ele deveria ser visto como mais um agente de inclusão, na medida em que ele teria circulação pela insti-tuição, produzindo questionamentos na equipe escolar e estando sempre atento a quando e como deve fazer sua entrada em sala de aula, sem permanecer ali esquecido e excluído junto com o aluno12. Cabe ressaltar que o mediador pode assumir o papel de ser um apoio para que a criança possa ser incluída em um processo educacional que, de outra maneira, ou seja, sem uma pessoa diretamente a apoiando numa relação um para um, poderia ser desestruturante e insuportável, tanto para a escola quanto para o aluno com deficiência13.

Em linhas gerais, observa-se que há diversos tipos de alunos que podem precisar do apoio de um Mediador Escolar, cujas dificuldades podem ser de diversas naturezas, tal qual listado (mas não esgotado) nos próximos tópicos.

• Dificuldade motora geral e acessibilidade: alunos com limitações motoras, mesmo com acessórios que facilitem a locomoção ou digitação, por exemplo, podem necessitar, pelo menos num período de adaptação, de

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mediadores escolares. A implementação de muitos recursos só é possível com este auxílio individualizado. Adaptações de ma-terial também podem ser uma constante;

• Dificuldades comportamentais impor-tantes: determinados comportamentos, sobretudo agressivos, podem colocar em risco a integridade do próprio aluno, bem como de seus colegas. Neste caso, o me-diador escolar pode favorecer interações saudáveis e, quando necessário, intervir em comportamentos que possam prejudi-car alguém no ambiente escolar;

• Dificuldades de concentração e impulsivi-dade: uma criança com déficit de atenção importante pode precisar de um profissio-nal que possa mediar sua atenção e ensiná-lo a se auto-regular no tempo, com seus materiais, facilitando assim a organização da criança, o planejamento de atividades e a antecipação das possíveis reações, como controle da impulsividade, eventualmente;

• Dificuldades de leitura: Nestes casos, o mediador ajuda os estudantes a rever infor-mações sobre trabalhos ou relatórios, aulas de revisão de classe. Compartilha leituras, para que não haja sobrecarga na tarefa. Organiza a produção da escrita, quando a dificuldade prejudica muito a expressão de seus pensamentos. Seguindo a orientação do professor de turma, busca antecipar situações oferecendo outros recursos (ví-deos, fotos, experiências), para que estes não dependam exclusivamente da leitura, criando experiências diferenciadas sobre os mais variados assuntos. Adaptações de materiais podem ser importantes também. Além disso, o mediador pode aproveitar diversas situações do cotidiano escolar para estimular as habilidades necessárias para alfabetização;

• Dificuldades no ensino fundamental II e ensino médio: nesta etapa escolar, o mediador muitas vezes se especializa em um assunto específico, como o Inglês ou Ciências. Ele é muitas vezes responsável

por projetos especiais e pelo preparo de materiais e equipamentos específicos para determinadas disciplinas ou conteúdos;

• Dificuldades na comunicação e interação: A estimulação de linguagem e da interação no ambiente privilegiado da escola visa não somente estimular a fala, como também tem o objetivo de desenvolver e promover a competência comunicativa e interacio-nal. Comumente, este tipo de abordagem produz um efeito no comportamento geral, uma vez que o desenvolvimento da comu-nicação favorece as relações, bem como a organização do mesmo.

Não há uma etapa escolar restrita que preci-se de mediador, e sim uma demanda do aluno.

SUGESTÕES GERAIS: DIFICULDADES NA COMUNICAÇÃO E INTERAÇÃOEm relação ao último tópico, dificuldades na

interação e na comunicação, o papel do media-dor escolar vem no sentido de funcionar como intermediário nas questões sociais e de lingua-gem. O objetivo é ensinar para a criança com características desta natureza a como participar das atividades sociais, como se relacionar com crianças da sua idade e no esclarecimento do que se espera dela em cada situação14.

A possibilidade de considerar o foco atencio-nal do outro, ou seja, seus interesses e chamar a atenção do outro para objetos ou assuntos de interesse mútuo constituem importantes capa-cidades para a aquisição e o desenvolvimento da linguagem, de habilidades sociais e das relações sociais. O seu aprimoramento permite o uso dos gestos, o contato físico e a linguagem para deliberadamente influenciar e dirigir o comportamento do outro durante a comunica-ção. Essas habilidades também possuem uma forte relação com a possibilidade de interpretar e compartilhar emoções e intenções levando em consideração experiências anteriores não só relacionadas a eventos como também em relação a temas de conversação15. Compartilhar a atenção, dividir emoções e expressar suas

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intenções facilitam o engajamento no processo de comunicação social recíproca.

A comunicação não envolve somente o uso da linguagem com função regulatória, ou seja, o uso do outro apenas para atender às suas de-mandas ou com a função de protesto por meio do choro. O compartilhar da atenção propicia o uso da comunicação com propósito social, utilizan-do o apontar para dividir opiniões e interesses sobre determinado objeto. Para crianças que já adquiriram a linguagem, dividir a atenção com o outro garante o suporte para uma comunica-ção efetiva (ou bem sucedida) sobre eventos já ocorridos ou futuros permitindo que a criança considere o que é novo, interessante e importan-te para o seu par interacional. Tal escolha deve ser baseada no foco atencional do ouvinte, seu interesse e conhecimentos prévios15. Essas ações permitem que durante a interação o indivíduo consiga alternar o olhar entre objetos e seu par, com objetivo de monitorar os interesses do inter-locutor e assim conseguir manter reciprocidade na comunicação. A atenção compartilhada traz efeitos na comunicação ao orientar e adequar o comportamento e a linguagem a um padrão social. Por meio do contato visual com o outro, a criança pode adequar o próprio comportamento em virtude do foco de atenção e dos interesses de seus pares.

Dentro deste pressuposto, é importante para a criança em desenvolvimento poder dividir suas emoções, buscar a atenção do outro para compartilhar opiniões e experiências, desen-volver a comunicação recíproca. Também se faz fundamental dividir a intenção e ganhar a atenção do outro na comunicação por meio do uso adequado da linguagem não verbal (expressão facial, gestos, entonação da fala), desenvolver a habilidade de perceber e reparar quebras ou falhas na comunicação, aumentar a gama de funções comunicativas da linguagem, principalmente aquelas que tenham como objetivo as trocas sociais, como por exemplo, dividir e comentar experiências e emoções. Inferir os estados mentais e emoções do outro, selecionar o tópico verbal apropriado, promover

as informações suficientes para dar suporte ao diálogo, conseguir fazer uma leitura adequada das expressões faciais e responder de maneira adequada ajustando o seu próprio comporta-mento também são habilidades importantes a serem desenvolvidas.

Pretendemos oferecer uma série de ideias nas próximas linhas, sem perder de vista alguns aspectos relevantes. Ao atuar com as crianças com transtornos de linguagem, o mediador poderá favorecer as interações sociais. As inte-rações são fundamentais para a construção dos processos mentais superiores. A transformação de processos mentais elementares em funções superiores ocorre por meio das atividades mediadas16. Sendo assim, o mediador poderá incluir a criança no cenário da interação, sendo o elo entre a criança e seus pares e, ao mes-mo tempo, irá traduzir a leitura social para a criança. Estimular a comunicação e a interação social são ferramentas básicas para promover a inclusão destas crianças.

Por esse aspecto, ter um mediador propician-do a aquisição de linguagem e das habilidades sociais no cotidiano escolar amplia a possibi-lidade da quantidade de estímulo recebido, como também a qualidade, já que a estimula-ção sempre ocorrerá em situação real de uso, diferente do que se pode proporcionar num consultório. O mediador favorece, por meio da interação, que a criança desenvolva a leitura e ajuste ao contexto social, aprenda a brincar e a fazer amigos, aprenda a mudar o turno nas situações dialógicas, ensina formas convencio-nais de comunicação, melhora a compreensão da linguagem. Nas crianças que começam a falar tardiamente, facilita o desenvolvimento de vocabulário expressivo durante as rotinas e atividades diárias, expandindo-o.

Outro cuidado que é digno de nota é o da aplicação de dicas sem conhecer a natureza das dificuldades que estão por traz, o que é insuficiente e até arriscado. Estar capacitado naquela área, a fim de que comportamentos ou produções verbais que parecem sem sentido possam ser significados: essa é uma condição

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indispensável para poder lançar mão das su-gestões de forma consciente e produtiva. A escola e o professor devem basear sua prática a partir da compreensão dos diferentes aspectos relacionados a problemas de interação social, interesses restritos e comunicação13.

As sugestões a seguir foram baseadas em diversas fontes7,14,17-34, bem como na prática clínica. A separação em subitens nas seções subsequentes tem somente a função de orga-nizar didaticamente para a leitura os objetivos e metas a serem atingidos por meio das ações propostas. A interrelação entre todos é plena. Vale realçar que são apenas sugestões que só têm função se aplicadas com coerência, conhe-cimento, bom senso e individualização.

Estimulação da comunicação Como já referendamos anteriormente, uma

comunicação bem sucedida previne problemas comportamentais que possam interferir com o aprendizado e o desenvolvimento de relaciona-mentos sociais. A capacidade de estabelecer e manter a demanda de atenção durante a comu-nicação entre pares influencia diretamente no desenvolvimento de habilidades conversacio-nais. Então, o uso adequado de gestos, da lin-guagem simbólica, a habilidade para reconhe-cer e reparar quebras ou falhas na comunicação e responder às dicas do contexto e interpessoais devem fazer parte do repertório de estimulação para melhora da comunicação. Neste sentido que o mediador consegue ampliar e qualificar os aspectos comunicativos no ambiente escolar. É bem documentado na literatura que o melhor prognóstico de indivíduos com dificuldades de interação, comunicação e interesses restritos está intimamente relacionado com sua compe-tência linguística e comunicativa29.

Alguns aspectos que deverão ser estimu-lados:

• Desenvolvimento da comunicação espon-tânea e funcional;

• Aumento do contato visual, reconheci-mento das expressões faciais e seus sig-nificados;

• Desenvolvimento da reciprocidade social, verificando se a comunicação foi efetiva, assim como repará–la e persistir no ato comunicativo;

• Estimulação da imaginação e do simbo-lismo;

• Atribuição de significado às estereotipias;• Melhora da compreensão;• Estimular sempre o apontar e o direciona-

mento do olhar da criança para aquilo ou para quem está falando;

• Estimular a imitação de movimentos, sons e atitudes;

• Estimular a “triangulação do olhar”, que significa olhar para pessoa e para o objeto, alternadamente, fechando os vértices de um triângulo com o olhar;

• Traduzir ou complementar as informações auditivas com informações visuais através de fotos, objetos ou figuras;

• Utilizar fotos de pessoas, locais ou situações para ajudar a criança a compreender o que vai acontecer (antecipação);

• Utilizar informações verbais curtas, ou seja, partir as informações em frases pequenas e objetivas;

• Ajudar a criança a modificar seu discurso utilizando a primeira pessoa, quando esta não o faz;

• Ajudar a criança a organizar seu discurso com lógica e clareza;

• Ajudar a criança a utilizar os turnos de diálogo, respeitando a vez de cada um na comunicação verbal, fazendo-a perceber os marcadores para iniciar ou terminar uma conversa;

• Dirigir a atenção da criança para quem se fala ou para as atividades que estão sendo utilizadas na sala de aula;

• Ensinar a criança a perceber a linguagem corporal, apontando o comportamento corporal do outro como modelo ou o seu próprio;

• Ensinar a criança a perceber as emoções. Pode-se utilizar recursos visuais de expres-são facial, ensinando a criança a detectar

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pistas que indiquem as emoções;• Auxiliar a criança na compreensão de co-

mentários do amigo, sem que aconteça um mal entendido;

• Explicar o sentido de metáforas e expres-sões idiomáticas;

• Fazer uso de assuntos que fazem parte do interesse restrito como parte motivacional e inicial da conversação;

• Favorecer a diminuição do uso de sons e emissões verbais não convencionais, como as estereotipias verbais, a ecolalia (imedia-ta ou remota) e as perguntas incessantes, podendo atribuir significado aos mesmos;

• Responder a qualquer som que a criança faça;

• Usar gestos apropriados, tom de voz, lin-guagem corporal para acentuar as emo-ções;

• Usar agendas de visualização e esquemas de atividades com figuras ou palavras, ro-tina diária e sequência de figuras na área de trabalho para definir a sequência de atividades, auxiliando a linguagem bem como o comportamento;

• Manter a atenção da criança voltada para as ordens e informações dirigidas pela professora;

• Nos momentos livre de pátio e recreio, proporcionar melhor comunicação entre as crianças, direcionando para a interação e fazendo leituras de comportamentos para que a criança saiba como agir junto aos outros amigos.

Comportamento e socializaçãoAs crianças que apresentam dificuldades de

comportamento e socialização são geralmente vistas como excêntricas e bizarras por seus co-legas. Elas têm dificuldade de entender sobre as relações humanas e as regras e convenções sociais. Podem ser ingênuas e não compartilham do senso comum. Sua rigidez gera dificuldade em gerir a mudança e as tornam mais vulne-ráveis e ansiosas. Muitas vezes não gostam de contato físico. Se a situação for mal manejada,

podem acabar exploradas e ridicularizadas por outras crianças. No entanto, elas querem ser parte do mundo social e ter amigos, mas não sabem como fazer para se aproximar35. Então, mediar neste caso significa:

• Proporcionar segurança e confiança nas relações adulto/criança. Um bom engaja-mento afetivo abre as portas para interação;

• Ensinar a criança a como participar das atividades sociais, a como se relacionar com outras crianças e o que se espera dela em cada situação;

• Minimizar a tendência ao isolamento so-cial, facilitando sua interação;

• Ensinar a criança a como abordar o outro na tentativa de interação;

• Minimizar comportamentos inadequados e repetitivos;

• Desviar a atenção da criança em relação às manias, rituais e atividades repetitivas e estereotipadas;

• Intervir nas reações comportamentais drásticas diante de mudanças na rotina ou no ambiente escolar, contextualizando a situação;

• Ensinar a criança a olhar para o grupo e a observar o comportamento das outras, estimulando assim a imitação. O mediador pode direcionar o olhar da criança, apon-tando, virando delicadamente o rosto da criança ou falando baixinho ao seu ouvido;

• Observar o comportamento livre da crian-ça e tentar antecipar as inadequações, prevenindo;

• Minimizar e intervir nas situações de des-conforto sensorial, ensinando a criança a se acalmar, caso necessário, levando-a para outro ambiente;

• Usar histórias ou representações pictóricas (com desenhos esquemáticos) para expli-car soluções e possibilidades de ações em situações sociais difíceis (cortar cabelo, dentista...) ou todas as vezes que a criança tiver reações exacerbadas de birra;

• Estimular a empatia, o vínculo e o prazer do convívio social;

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• Encorajar a criança a solicitar ajuda da professora e dos colegas;

• Controlar o acesso a objetos ou matérias que dispersem ou façam parte do interesse restrito da criança e, consequentemente, o afaste do grupo ou das atividades;

• Aproveitar o interesse restrito para aproxi-má-lo das situações sociais, sendo uma fon-te motivadora inicial do contato e interação;

• Organizar a sequência de atividades da criança visualmente por meio de fotos, gravuras, ou por escrito, visando antecipar concretamente os fatos e, consequente-mente, diminuindo a ansiedade dela;

• Utilizar relógio e calendário para que a criança aprenda a controlar seu tempo e entenda o que significa intervalo de tempo e sequência dos dias da semana e mês;

• Em situações reais de interação, ensinar a criança a se colocar no lugar do outro, refle-tindo sobre os sentimentos e pensamentos das pessoas, exercitando assim a empatia;

• Após uma situação de conflito, rever a si-tuação com a criança, refletindo sobre seu comportamento. Pode-se usar para isso, de-senho esquemático em sequência, como se fosse história em quadrinhos. Neste mesmo sentido, estimular a criança a pensar em si-tuações alternativas de solução do conflito;

• Ensinar habilidades sociais, tais como: se apresentar, cumprimentar as pessoas, despedir-se, pedir algo ou comprar alguma coisa;

• Dar reforço positivo sempre que houver êxito nas ações da criança, ou seu compor-tamento apresentar-se adequado;

• Ignorar, sempre que possível, os com-portamentos inadequados que a criança apresente. Se não for possível, corrigir ou redirecionar;

• Sempre dizer o que espera do compor-tamento da criança em cada situação problema;

• Auxiliar e promover a autonomia, iniciativa e compreensão da criança a respeito daqui-lo que ela está fazendo ou necessita fazer;

• Fornecer um ambiente seguro. Minimizar intrusões inesperadas de estranhos à sala de aula, ou inexplicáveis ruídos repentinos;

• Minimizar as transições. Um tempo de transição de uma atividade para outra pode ser experimentada por alguns como um período onde não há registro exato. Eles estão agitados porque não sabem o que fazer, ou como se comportar;

• Proporcionar uma rotina diária. A criança precisa entender cada rotina e predizer a ordem em que isso ocorre para se concen-trar na tarefa. Isso tira a vontade de saber o que ele ou ela será “depois”. Certifique-se de lado para cumprir as rotinas estabele-cidas;

• Evitar surpresas, preparar a criança com antecedência para eventos especiais, mu-danças de horários ou outras alterações na rotina;

• Tentar reduzir os temores e gradualmente expor crianças a novas atividades, a apre-sentar um novo professor, um novo local de trabalho. Informá-los com calma o que está à frente pode evitar medos obsessivos;

• Alunos novos se beneficiarão enormemente com a presença de um mediador escolar a partir da entrada em classe. É sensato pensar que prevêem atendimento com antecedência, o que limita a ocorrência de birras nos estágios iniciais de adaptação da criança e, assim, reduz o risco de rejeição por parte de outras crianças, e frustração para o professor;

• Auxiliar o grupo no qual a criança esteja inserida a não valorizar, ou a ignorar movi-mentos estereotipados ou outros comporta-mentos inadequados que a criança realize;

• Atuar no momento de entrada e saída da escola, direcionando a criança ao grupo, favorecendo um comportamento contex-tualizado (estimular cumprimento, seguir os outros na fila...);

• Para crianças mais velhas, ensinar outros alunos quais são as mudanças sociais, descrevendo os problemas sociais do seu

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companheiro como verdadeiras dificuldades. O fornecimento de informações, promovendo a empatia e a tolerância de outras crianças que podem impedir mal entendidos;

• Concentrar-se no conhecimento do aluno, a fim de criar situações cooperativas de ensino em que os pontos fortes da criança, como a leitura, o vocabulário, a memória possam ser observados por outros estudan-tes do grupo. Esta abordagem irá aumentar a auto-estima da criança que está se esfor-çando para integrar e conduzir a uma maior aceitação entre os outros alunos;

• Muitas dessas crianças querem amigos, mas não sabem como interagir. Devemos ensiná-los a responder aos estímulos so-ciais e fornecer um repertório de respostas para ser usado em diferentes situações sociais. Ensine a criança a dizer-lhes e como dizê-las;

• O julgamento social dessas crianças muitas vezes só melhora quando as suas regras são aprendidas. Não tenha medo de ser explí-cito: as crianças estão se esforçando para ir além das aparências, sua compreensão de situações sociais geralmente é imatura e muito prática;

• Ensinar a perspectiva e pensamentos dos outros usando jogos dos papéis encenados pelas pessoas e jogos de instrução; estimu-lar a criança a parar e refletir sobre como a pessoa se sente antes dela falar;

• Alguns alunos podem se beneficiar de um sistema de tutoria. O professor pode ligar a criança a outro aluno de sua classe de modo a incluir a criança nas atividades escolares. Há crianças que são especial-mente sensíveis para exercer esse papel, o que chamamos de mediadores naturais.

Jogos e brincadeirasAlém da função comunicativa, a linguagem

possui funções cognitivas, atuando na reso-lução de problemas, no planejamento da ação, na regulação do comportamento e do estado emocional. O simbolismo se refere à compre-

ensão da comunicação gestual, das palavras, da linguagem figurada e da possibilidade de se engajar em brincadeiras que envolvam a ima-ginação e o uso não convencional de objetos, este último corresponde ao jogo simbólico36. As dificuldades no desenvolvimento do simbolismo podem ser encontradas em crianças com difi-culdades sociais e apresentam íntima relação com o desenvolvimento da linguagem. O des-envolvimento do simbolismo deve seguir uma escala de complexidade. Por exemplo, com-portamentos pré-simbólicos como alguns tipos de gestos devem ser estimulados antes do uso de sistemas de comunicação com figuras, que são consideradas habilidades quase simbólicas.

Além do jogo simbólico, as crianças com difi-culdades de interação social também devem ser estimuladas para o jogo livre. Uma vez que con-seguem realizar tais jogos com autonomia, eles deixam de ser um risco para a própria criança, e deixam de ser atividades solitárias e rituali-zadas. Devemos estimular a criança a brincar com uma ou duas crianças sob supervisão, a fim de oferecer a oportunidade a desenvolver suas habilidades sociais.

A estimulação poderá focar:• Aumento do uso de gestos associados com

a emissão verbal;• Uso de gestos convencionados socialmente

(exemplo: balançar a cabeça negativa-mente);

• O interesse diversificado por brinquedos, ensinando a criança a como brincar de forma convencional e funcional;

• O uso da fala durante a brincadeira, dan-do sentido às ações e dizendo o que está acontecendo na brincadeira;

• Para uma abordagem inicial, imitar a forma de brincar da criança e aos poucos propor mudanças na sua brincadeira, ensinando-a a ser flexível;

• A possibilidade de compreender a finali-zação de jogos: ganhar e perder;

• A compreensão dos colegas, para que es-tes visualizem que às vezes é difícil para o amigo compreender que perdeu o jogo,

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mas que nem por isso a criança deixou de ser legal, e que não vai querer brincar outras vezes;

• A busca de ideias de interação e brinca-deiras observando o comportamento das outras crianças, pois estas são mediadores natos e naturais;

• Brincadeiras sensoriais como pular, fazer cócegas, balanço;

• O uso de brinquedos com causa e efeito (esconda e deixe aparecer depois como má-gica; faça cócegas com uma pena ou com algo delicado para estimular os sentidos);

• A brincadeira de ping-pong usando a ver-balização;

• Jogos competitivos que envolvem con-venções sociais, difíceis de serem com-preendidas e aplicadas por crianças com dificuldades sociais.

Tarefas de apoio pedagógicoConsiderando-se o currículo como uma

base para atuação do professor, e não uma prisão para ele e seus alunos, cabe inicial-mente discutir seus modelos. Deixando para trás um modelo fechado, que engessa e parte do pressuposto de que todos aprendem da mesma forma37, abre-se a perspectiva de um currículo aberto, que orienta, mas considera as diferenças individuais, o contexto, a inter-disciplinaridade. Para ensinar na diversida-de, essa flexibilização se torna uma máxima. Partindo-se do pressuposto de que o currículo deva necessariamente estar vinculado ao pro-jeto político pedagógico da escola, trabalhar verdadeiramente com o aluno em sua diver-sidade deve ser uma filosofia, uma política e uma prática institucional. Esta concepção de currículo é compatível com a filosofia de se educar na diversidade. O projeto curricular, neste prisma, deve considerar o movimento da escola para atender às diferenças individuais, à identificação das necessidades educacionais especiais, visando ao planejamento, propostas curriculares diversificadas, flexibilidade na organização e funcionamento da escola.

• Solicitar no início do ano o calendário es-colar e planejamento semanal pedagógico da turma;

• Conhecer o projeto pedagógico e método de aprendizado da escola que a criança está inserida;

• Adaptar, sempre que necessário, e com a orientação da professora e da equipe terapêutica, o planejamento pedagógico para a criança;

• Antecipar as atividades a serem realizadas na sala de aula com esquema de fotos, figuras ou por escrito;

• Ensinar a criança a pedir ajuda ao professor quando não estiver entendendo determi-nada tarefa;

• Ser capaz de improvisar recursos para a criança conseguir executar as tarefas, ou oferecer a tarefa em partes para que seja possível o raciocínio autônomo da criança;

• Junto à equipe escolar e terapêutica, adap-tar as avaliações e provas, mesmo que seja conteúdo, ou formatação ou quantidade de exercícios;

• Motivar o desempenho da criança sempre, estimulando-a a persistir e a manter a atenção na tarefa;

• Buscar temas do seu interesse que possam ser utilizados como recursos para atingir um determinado objetivo pedagógico;

• Desenvolver memória de informação fac-tual e trivial através de jogos;

• Praticar a reflexão sobre estratégias alter-nativas e aprender a pedir ajuda - flexibi-lidade do pensamento;

• Leitura, soletração, cálculo – observar se e quando a criança está utilizando uma estratégia não convencional e auxiliá-la a compreender o processo realizado;

• Pensamento visual – encorajar visualização usando diagramas e analogias. A aprendi-zagem visual é frequentemente melhor;

• Modificar estruturas de perguntas de in-terpretação de textos;

• Buscar recursos extras em DVDs ou jogos para conteúdos que serão desenvolvidos;

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• Escolher os conteúdos mais relevantes para serem trabalhados. Ações devem envolver os alunos no mundo real; isso vai constituir oportunidades para a participação ativa, dirigir seus aprendizados, proporcionar desafio;

• Usar grupos flexíveis. Os grupos devem ser baseados nos objetivos, interesses, necessidades e habilidades. Agrupamento de alunos com necessidades semelhantes e diferentes necessidades devem ter lugar, conforme o caso, para permitir aos estudan-tes a compartilhar e ensinar uns aos outros;

• Usar uma ampla variedade de materiais. Alguns alunos podem apresentar dificul-dade no uso de materiais “tradicionais” de ensino. Usar uma grande variedade de materiais oferece mais chances de ser bem sucedido;

• Misturar formatos das atividades propos-tas, favorecendo alunos que aprendem de forma diferente;

• Flexibilizar avaliações. Os testes tradicio-nais podem ser problemáticos para muitos estudantes, e o mediador poderá refletir com o professor sobre a maneira mais ade-quada o aluno em questão.

LIMITES E CUIDADOS DA MEDIAÇÃO ESCOLARComo em todas as experiências novas, con-

flitos e falhas acontecem, e devem ser tomados como base para uma aprendizagem. Portanto, serão compartilhadas situações que podem ser geradoras de estresse se não devidamente gerenciadas:

IndividualizaçãoA singularidade é uma questão central na

compreensão do desenvolvimento infantil. Esta premissa requer dos profissionais um trabalho individualizado. Cada criança tem diferentes necessidades educacionais, cada um deles tem pontos fortes e desafios diferentes, valores, in-teresses pessoais e personalidade única. Além disso, os sintomas encontrados se manifestam

de forma diferente. Portanto, não é possível estabelecer uma receita única para trabalhar. O que funciona para um, talvez não seja tão útil para outra criança. Conhecer o aluno que será acompanhado pela mediação, discutir com a equipe pedagógica da escola e com a equipe de apoio terapêutico são pontos fundamentais para atender à necessidade específica e assim alcançar os objetivos estabelecidos pela equipe.

Relação mediador - famíliaO Mediador, por acompanhar de perto o de-

senrolar da escolarização, deve ter especial aten-ção ao reportar aos pais sobre os fatos mais im-portantes ocorridos na sala de aula e no ambiente escolar. Este compartilha de informações não deve perder de vista que o objetivo principal é verificar quais foram as situações mais favoráveis de estimulação para aquela criança e possibilitar a sua generalização no ambiente doméstico. As estratégias de estimulação e intervenção peda-gógicas que não forem bem sucedidas devem orientar futuras tentativas/intervenções e somen-te servir para tal propósito. Em hipótese alguma o mediador escolar deve perder de vista a ética das informações que deve passar à família. As impressões pessoais e sugestões no tratamento, por exemplo, devem ser discutidas com toda a equipe. Somente informações pertinentes ao de-senvolvimento da criança, em concordância com a escola e terapeutas, deverão ser repassadas.

Mesmo considerando uma boa relação entre mediador e família, uma grande confiança no trabalho deste profissional, ampliar os momen-tos e ambientes em que o mediador vai trabalhar pode ser uma grande armadilha. Se o objetivo deste profissional é trabalhar em situação de interação e aprendizagem em tempo real, apro-veitar um tempo livre da criança em sua própria casa pode confundi-la, prejudicando a atuação no retorno ao ambiente escolar. Por este motivo, normalmente, a priori, é contraindicado.

Relação mediador – alunoNão se pode perder de vista que o objeti-

vo maior do mediador escolar é promover o

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desenvolvimento da criança, que precisa de um suporte adicional no ambiente natural de apren-dizagem. Portanto, posturas de superproteção ou a atuação como cuidador são ineficientes e não condizem com a proposta da mediação. O profissional deve, sempre em parceria com o professor, saber quando o apoio deve ser mais diretivo, a hora que deve se afastar visando à autonomia. É importante também saber iden-tificar o momento em que um outro aluno pode ser incentivado a assumir momentaneamente esse papel.

Outro problema ético considerado grave nesta relação é a saída do profissional antes do fim do ano letivo. Mudanças constantes de mediadores escolares trazem prejuízos impor-tantes para o desenvolvimento da criança que precisa de um vínculo estável nesta função, como também desorganiza o ambiente escolar. O mediador não pode esquecer que também há vínculos criados com os demais alunos da turma, que ele faz parte da rotina deles. Assumir a mediação é assumir um ano letivo de trabalho, já que o seu desligamento pode provocar uma recusa da escola em aceitar submeter toda a tur-ma à adaptação de um novo adulto em sala de aula, o que comprometerá o desenvolvimento da criança, a relação da família com a escola e da família com os outros pais de alunos.

Relação mediador-professor-escolaO professor da classe é o responsável por

organizar as ações de todos os seus alunos, inclusive do que precisa, ao menos mo-mentaneamente, de um mediador escolar. O mediador atua em parceira com a escola com objetivo de compartilhar conhecimento. Quanto mais os profissionais que assistem a criança estiverem preparados, maior será o desenvolvimento dela e, consequentemente, o êxito profissional daqueles que nela investem. Além disso, a atuação do mediador também diz respeito a atividades que favoreçam a interação do professor com aquela criança. Ter outro adulto na turma atuando com uma criança especifica, não exclui o professor da

relação com seu aluno. O mediador deve estar apto a orientar o professor com estratégias que favoreçam o comportamento interativo com o aluno. O mediador não pode esquecer que a turma, incluindo a criança que ele atua, tem um professor para conduzi-la. É fundamental ter sensibilidade para que o professor não se sinta invadido, mas que ele entenda o media-dor como um parceiro profissional que entrou na turma dele para somar.

Uma pesquisa que visou estudar o papel dos mediadores escolares evidenciou que aqueles que estavam engajados com o planejamento escolar e que concebiam o professor da turma como um parceiro de trabalho eram os que atingiam práticas mais efetivas de inclusão38.

Relação família–escola A inserção do mediador no ambiente es-

colar tem, dentre outros objetivos, facilitar a aprendizagem e a aquisição do conteúdo pe-dagógico. A família, principal interessada no pleno desenvolvimento daquela criança, aspira pela apreensão de conhecimento por parte do aluno e pode, em alguns momentos, questionar determinados objetivos pedagógicos elencados pela equipe da instituição de ensino. Devemos ter cautela nessas situações, pois a equipe pedagógica da escola possui o conhecimento específico necessário para identificar quais serão os objetivos adequados a cada seriação. A parceria é necessária. Se são as famílias os que conhecem seus filhos no dia a dia, os es-pecialistas na área estão na escola e devem ser respeitados em seu papel. Portanto, esta troca, envolvendo também a equipe terapêutica de apoio, é que vai favorecer a adaptação neces-sária ao desenvolvimento da criança.

Outro ponto a ser discutido é quanto à fre-quência do mediador na escola. Nem sempre a lógica “quanto mais, melhor” funciona nestas circunstâncias. Há de se considerar o momen-to da criança, a autonomia adquirida, os tipos de aula propostos em cada dia. Portanto este é mais um ponto a ser definido em função de cada aluno.

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Relação escola–outras famíliasA presença de um profissional na sala de

aula para determinado aluno com o objetivo de realizar intervenções específicas pode soar estranho para muitos pais que desconhecem os entraves que podem ocorrer no desenvol-vimento infantil. O papel do mediador só é justificável na medida em que suas funções são compreendidas e tal esclarecimento deve ser feito a todos os pais daquela classe ou escola. Esse esclarecimento dilui futuros questiona-mentos para que a presença do mediador não gere mal-estar entre os pais. Ademais, inclusão é um movimento útil não somente para crianças com necessidades educacionais especiais, mas para todo cidadão em formação, em busca de uma sociedade mais justa. Por meio dos filhos, os pais de outras crianças podem aprender a se despir de preconceitos, compreendendo que nem todos precisam do mesmo tipo de ajuda.

CONSIDERAÇÕES FINAISA educação inclusiva é um “estudo de caso”,

o que significa dizer que cada caso é único. Não se pode perder de vista a singularidade do su-jeito, seu momento, nem sua história construída na família e continuada na escola. Tanto os pais, quanto os profissionais (professores, mediadores e terapeutas) devem estar cientes que a hete-rogeneidade daqueles que são auxiliados pelos programas de mediação precisa ser levada em consideração quando tratamos das expectativas de evolução.

As crianças devem ser comparadas com elas mesmas, avaliando quais habilidades foram desenvolvidas num determinado espaço de tempo. Portanto, apesar de apresentarmos uma gama de sugestões para favorecer a adaptação da criança ao ambiente escolar e do ambiente escolar à criança, é fundamental que todos os envolvidos no processo tenham conhecimento e sensibilidade para identificar o que é específico para cada aprendiz.

Todos os programas de mediação devem par-tir do nível em que a criança se encontra e, uma vez que não se observem progressos, o programa

deve ser ajustado. Os procedimentos realizados em sala de aula e/ou os ganhos em ambiente terapêutico devem ser implementados em uma variedade de ambientes sempre que possível (em casa, na comunidade, no parquinho) para que as conquistas sejam generalizadas. E, para que as estratégias planejadas sejam efetivas, é fundamental que a criança seja estimulada a ter autonomia dentro de suas possibilidades e que se sinta motivada.

Replicar experiências anteriores ou enqua-drar crianças em soluções pré-moldadas podem ser estratégias pouco eficientes. O mediador deverá ser capaz de criar condições favoráveis e eficazes para que as capacidades da criança possam ser exploradas ao máximo, não no sen-tido de eliminar problemas, mas sim de apro-veitar as situações e experiências que possam facilitar e incrementar o desenvolvimento e a aprendizagem da mesma.

O ajuste dos materiais, das propostas e do ambiente pode ser muitas vezes essencial para o bom andamento da escolarização formal. Prevenir situações estressantes ou intervir no momento certo pode ser determinante para o investimento que aquele aluno fará em suas aprendizagens e relações. Quando uma criança com dificuldades sociais é exposta a estímulos sem a devida intervenção, por exemplo, pode se tornar ansiosa e tensa por causa da saturação de informações que podem lhe parecer sem função. Pode não conseguir se organizar para aprender, desestruturando a si própria como também sua sala de aula, comprometendo o desenvolvimento da turma como um todo. Do mesmo modo uma criança com dificuldades im-portantes na motricidade fina e escrita pode se recusar a realizar algumas tarefas e apresentar birra ou comportamentos não esperados diante de grande quantidade de cópia em tarefa de sala de aula.

Apesar da figura do mediador ser considerada uma adaptação no espaço pedagógico, portanto garantido pela lei, não existe muita clareza quan-to o papel e as atribuições deste profissional, o que pode dificultar que a criança obtenha esse

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benefício. Para que fiquem claros os objetivos e funções deste profissional tão importante, tra-balhos científicos sobre este tema precisam ser desenvolvidos. Um dos próximos desafios também está na regulamentação dessas ações e capacita-ção sistemática e didática dos profissionais, para que possam se desenvolver de uma forma respon-sável, sem correr o risco de cair no descrédito com condutas inadequadas e ações genéricas.

É relevante dizer, mais uma vez, que todos os envolvidos na inclusão (escola, família,

professores, terapeutas e mediadores) precisam trabalhar em consonância, a fim de suprir a necessidade educativa daquela criança, favo-recendo a conquista dos objetivos traçados por toda equipe.

Este artigo não tem a pretensão de esclarecer todas as questões que envolvem a mediação escolar, mas se apresentar como um ponto de partida para futuras experiências e reflexões, tendo em vista que a bibliografia no assunto ainda é incipiente, especialmente no português.

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SUMMARYTeacher assistant and inclusive education: review, tips and reflections

The school mediation has become more frequent from the Salamanca Convention. Schools around the world had to give account to include children who needed help in existing classes, often with large numbers of students and teachers whose training had not been concerned with these aspects. The mediator can act as an intermediary in social and behavior, communication and language, activities and / or school play, and educational activities in the motor or reading in the various school grades. A teacher assistant can stimulate the language acquisition and social skills in everyday school enhances the possibility of the amount of stimulation received, but also the quality as always occur in real situations of use, different from what we can provide a therapy set. To know the student who will be accompanied in school, discuss with the school’s teaching staff and the therapeutic support staff are key points. Although the figure of the teacher assistant can be regarded as an adaptation in the pedagogical space, thus guaranteed by law, there is not much clarity about the role and responsibilities of the professional or on the regulation of the profession.

KEY WORDS: Education, special/trends. Mainstreaming (Education). Education.

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AvAliAção dA hAbilidAde motorA

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ARTIGO DE REVISÃO

RESUMO – Objetivos: Mapear os artigos publicados sobre as avaliações e escalas utilizadas para o diagnóstico de Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC), no período de 2004 a 2009, disponíveis na base de dados PubMed; analisar descritivamente aspectos específicos dos textos: ano de publicação da pesquisa, local, suporte de publicação e forma de coletar os dados; e verificar os tipos de avaliação e escalas utilizadas para o diagnóstico de crianças com TDC. Método: A pesquisa na base de dados iniciou com a busca por descritores em língua inglesa e portuguesa: Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação, avaliação, instrumentos, diagnóstico, escala, combinando dois termos. Resultados: Os resultados indicaram aumento crescente das pesquisas no período de 2004 a 2009. O The Movement Assessment Battery for Children Test (MABC) foi o instrumento de avaliação mais utilizado nos artigos selecionados para este estudo. Porém, mais de 70% dos artigos utilizaram testes complementares para a pesquisa dos problemas motores. Conclusão: Apesar do aumento das pesquisas sobre TDC, ainda são escassos os artigos publicados no Brasil. Quanto aos instrumentos de avaliação encontrados nos artigos científicos, há uma recomendação sobre a associação de instrumentos de avaliação motora e entrevista ou questionários que investiguem o comportamento motor das crianças com pais e professores para melhor definição do diagnóstico de TDC.

UNITERMOS: Transtornos das habilidades motoras. Deficiências do desenvolvimento. Questionários.

trAnstorno do desenvolvimento dA coordenAção: revisão de literAturA sobre

os instrumentos de AvAliAção

Cintia Sicchieri Toniolo – Terapeuta Ocupacional.

Aluna do Curso de Especialização em Intervenção em

Neuropediatria do Núcleo de Estudo em Neuropediatria

e Motricidade da UFSCAR – São Carlos, SP.

Simone Aparecida Capellini – Fonoaudióloga.

Doutora e Pós-Doutora em Ciências Médicas pela

Faculdade de Ciências Médicas da Universidade

Estadual de Campinas, FCM/UNICAMP – Campinas,

SP. Docente do Departamento de Fonoaudiologia

e Programa de Pós-Graduação em Educação da

Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade

Estadual Paulista –FFC/UNESP – Marília, SP.

Correspondência

Simone Aparecida Capellini

Av. Hygino Muzzy Filho, 737 – Marília, SP

CEP 17525-900

E-mail: [email protected]

Cintia Sicchieri Toniolo; Simone Aparecida Capellini

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INTRODUÇÃOOs movimentos desajeitados em crianças é

uma desordem que agora vem despertando inte-resse considerável na literatura. Esta síndrome é conhecida como Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC)1.

Crianças com TDC possuem dificuldades em realizar atividade de automanutenção, como se vestir, higiene pessoal e alimentação, quando comparadas a crianças de mesma faixa etária2. Na área educacional, a disgrafia é relatada como a área de dificuldade mais prevalente3.

A desordem motora é descrita como sendo um sério comprometimento no desenvolvimento da coordenação motora, que não é explicável uni-camente em termos de retardo intelectual, global ou qualquer desordem neurológica congênita ou adquirida específica (a não ser aquela que possa estar implícita na anormalidade da coordenação). É usual que a inabilidade motora esteja associada a algum grau de desempenho comprometido em tarefas cognitivas visoespaciais4.

O diagnóstico do TDC pode ser realizado de acordo com critérios de Manual de Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais (DSM-IV) e as manifestações variam de acordo com a idade e o estágio do desenvolvimento. A prevalência estimada na população infantil entre 5 e 11 anos de idade é de 6%1, porém estes valores podem variar de acordo com os critérios utilizados e a população avaliada.

Para a realização do diagnóstico, deve-se levar em consideração a presença das seguintes características: um prejuízo acentuado no de-senvolvimento da coordenação motora (Critério A); a interferência significativa deste prejuízo no rendimento escolar ou em atividades da vida diária (Critério B); se as dificuldades de coor-denação não ocorrem devido a uma condição médica geral (por exemplo, paralisia cerebral, hemiplegia ou atrofia muscular) ou devido à presença de Transtorno Invasivo do Desenvol-vimento (Critério C), e se, na presença de re-tardo mental, as dificuldades motoras excedem aquelas habitualmente associadas ao transtorno (Critério D)1.

Crianças que apresentam TDC, porém que não são identificadas como tal rapidamente, passam por experiências de fracasso e frus-tração em sua vida diária e acadêmica. São muitas vezes rotuladas como preguiçosas, descoordenadas, desmotivadas, desajeitadas, etc. Podem desenvolver complicações secun-dárias, como dificuldades de aprendizagem, bem como problemas sociais, emocionais e comportamentais5.

A avaliação mais utilizada para avaliar crianças com desordem motora, conforme descrito na literatura, é o Moviment Assess-ment Battery for Children (MABC)6-8. Porém, esta mesma literatura aponta a necessidade de serem desenvolvidos novos testes ou ava-liações que especifiquem melhor o controle e o desenvolvimento motor.

No Brasil, ainda são escassos os estudos com o TDC. Os artigos científicos existen-tes na literatura9-12 enfocam a avaliação de crianças em idade escolar e de crianças com dificuldades de aprendizagem, dislexia e Transtorno do Déficit de Atenção e Hipera-tividade (TDAH).

Além disso, a presença de comorbidades associadas ao TDC é relatada na literatura, como o TDAH10,13,14 e dislexia11, por isso há a necessidade do uso de instrumentos de ava-liação em escolares que permitam identificar as habilidades e dificuldades motoras finas e globais, uma vez que o diagnóstico correto é a base da intervenção adequada15.

Com base no exposto, este estudo tem por objetivo geral mapear os artigos publicados sobre as avaliações e escalas utilizadas para o diagnóstico de TDC no período do primeiro semestre de 2004 ao primeiro semestre de 2009, disponíveis na base de dados PubMed. Como objetivos específicos, este estudo se propõe a analisar descritivamente aspectos específicos dos textos: ano de publicação da pesquisa, local, suporte de publicação e forma de coletar os dados, e verificar os tipos de avaliação e escalas utilizadas para o diagnóstico de crianças com TDC.

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MÉTODOEste estudo caracteriza-se por uma revisão

de literatura sistemática, assim como outros ti-pos de estudo de revisão; trata-se de uma forma de pesquisa que utiliza como fonte de dados a literatura sobre determinado tema16.

A base de dados escolhida para a pesquisa de artigos com informações a respeito de méto-dos avaliação analisados consistiu nos bancos de dados internacionais PubMed disponíveis em serviços online. A pesquisa na base de dados iniciou com a busca dos seguintes descritores em língua inglesa, combinando dois termos: Developmental coordination disorder, assess-ment, scale, diagnosis, instruments. E em língua portuguesa: Transtorno do desenvolvimento da coordenação, avaliação, instrumentos, diagnós-tico, escala, combinando dois termos.

Os resumos obtidos no banco de dados foram comparados entre si para a verificação de su-perposição de artigos. Depois, os resumos foram analisados para selecionar, ainda preliminarmente, trabalhos que atendessem aos critérios de inclusão, ou seja, os trabalhos deveriam considerar instru-mentos de avaliação que não fossem apenas o DSM-IV e o CID 10 e a faixa etária dos sujeitos dos estudos deveria estar entre 6 e 12 anos de idade.

Nesta fase de coleta de dados, foram sele-cionados resumos, os quais foram numerados sequencialmente, e uma nova etapa de busca dos artigos completos permitiu chegar à defi-nição final dos textos que efetivamente foram analisados neste estudo.

Os artigos completos encontrados foram numerados de acordo com os resumos e uma nova análise foi realizada segundo os critérios de exclusão, isto é, os artigos científicos não deveriam ser de relato de casos de TDC em comorbidade com outras doenças. Além disso, foram excluídos os resumos que não disponibi-lizaram os artigos científicos na íntegra.

Os registros dos dados coletados foram ana-lisados por meio do registro em ficha, que con-tinha os seguintes itens: a) caracterização geral do texto: autores, ano, suporte e local de pesquisa; b) aspectos específicos de caracterização:

instrumentos utilizados para a avaliação de TDC, outros instrumentos, número de parti-cipantes, caracterização da amostra (gênero, idade e proveniência), c) caracterização da pesquisa: tipo e avaliadores; e d) especificação dos dados: finalidade do uso do instrumento, validação, forma de coletar dados.

As informações coletadas nas fichas de regis-tro foram codificadas numericamente e distribu-ídas em tabelas do excel. Os resultados foram analisados por meio do Teste de Qui-quadrado para Proporções, com o objetivo de verificar pos-síveis diferenças entre as variáveis deste estudo. Para a análise estatística, foi adotado o nível de significância de 5% (a = 0,050 — significância adotada). A análise dos dados foi realizada uti-lizando o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 17.0.

RESULTADOS E DISCUSSÃOA análise dos resultados considerou 45 ar-

tigos, encontrados na base de dados PubMed, no período do segundo semestre de 2004 ao pri-meiro semestre de 2009. Os artigos analisados referem-se a instrumentos de avaliação motora utilizados para discriminar crianças com TDC.

A Figura 1 apresenta a distribuição dos arti-gos de acordo com o ano de publicação, sendo possível observar um aumento gradativo da publicação entre os anos de 2004 e 2008. No ano de 2008, observou-se maior número de publi-cações sobre o tema, assim, pode-se considerar

Figura 1 - Distribuição dos artigos publicados entre 2004 e 2009.

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um aumento crescente de publicações, porém é necessário considerar que no ano de 2009 houve a publicação de poucos artigos sobre a temática, pois este número reflete apenas o primeiro semestre de 2009.

A literatura8 refere um aumento progres-sivo de pesquisas em relação ao Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação, o que corrobora os dados deste estudo, em que foram encontrados 23 (51,11%) artigos, o que corres-ponde a mais da metade, sobre instrumentos de avaliações publicados entre 2008 e 2009. Este aumento progressivo das pesquisas deve-se ao aumento de queixas e buscas dos pais por melhoria no diagnóstico e tratamento de seus filhos que apresentam baixo desempenho em atividades de vida diária e no desempenho acadêmico2.

Dos 45 artigos pesquisados, foram encontradas pesquisas sobre avaliação do TDC realizadas em 17 países, sendo que 9 (19,57%) artigos foram publicados no Canadá e 7 (15,22%) na Austrália. No Brasil, foram encontrados apenas 2 (4,35%) ar-tigos publicados sobre instrumentos de avaliação em crianças com TDC. Neste estudo, evidenciou-se que 27 artigos foram publicados na Europa e na América do Norte e um fato que foi evidenciado neste estudo é que apenas 19 (42,22%) estudos foram financiados por agências de pesquisa.

Porém, pode-se considerar ainda pequeno o nú-mero de países que publica sobre o assunto, justifi-cando, assim, a pouca divulgação e conhecimento sobre este transtorno. A pequena quantidade de artigos publicados aqui no Brasil pode justificar o desconhecimento de profissionais da educação e da saúde sobre o TDC, além da precariedade dos recursos encontrados aqui, sendo que não há ins-trumentos validados para a população brasileira.

Este estudo mostrou que 44 (88%) artigos descreveram apenas a avaliação motora para o diagnóstico de TDC, enquanto que 5 (10%) abordaram a avaliação motora associada a ques-tionários para a investigação do TDC.

A Figura 2 mostra que o instrumento de ava-liação mais utilizado nos artigos científicos para avaliar o TDC é o MABC, tendo sido utilizado

em 33 (62,26%) dos 45 artigos selecionados para a composição deste estudo. Ressalta-se que 6 (13,33%) artigos utilizaram mais de um teste validado para a realização da pesquisa, associando o teste motor com um questionário estruturado para o conhecimento do perfil motor de crianças, direcionados para pais e professo-res. Dentre os questionários citados nos artigos que compuseram este estudo, 7 (13,21%) se referiram ao Developmental Coordenation Di-sorder Questionnaire (DCDQ).

Figura 2 – Distribuição dos instrumentos de avaliação do TDC.

Quanto ao diagnóstico de TDC, os dados deste estudo revelaram que 60% das pesquisas realizadas no período de 2004 a 2009 utilizaram o MABC como instrumento de investigação e diagnóstico do TDC, conforme descrito na li-teratura6,17. O MABC indica o desempenho da criança em habilidades motoras finas e globais, e é indicado para crianças de 4 a 12 anos e as tarefas são dividas em destreza manual, habili-dade com a bola e equilíbrio estático e dinâmico, em que cada item é pontuado de 0 a 5, podendo chegar a 40 pontos18.

Ainda quanto aos instrumentos de avaliação, verificou-se que o Bruininks-Oseretsky Test of Motor Proficiency (BOMT-P) foi outro instru-mento de avaliação motora citado nos artigos científicos para a avaliação e o diagnóstico do TDC. Todavia, é importante ressaltar que,

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segundo os artigos científicos que discorrem sobre avaliação, não há um teste ideal para investigar o TDC, assim, observou-se em nosso estudo que em grande parte das pesquisas, além de realizar avaliação motora, é necessário utili-zar outros procedimento de coleta de informa-ções sobre o desenvolvimento e o desempenho motor com as crianças19,20.

Dentre os procedimentos de entrevista para a investigação do TDC, foram encontrados em nosso estudo15,21,22 dois instrumentos: o Developmental Coordenation Disorder Questionnaire (DCDQ) e o Children Activity Scales for Parents and Teachers (ChAS/P-T), sendo que o DCDQ foi o instrumento mais utilizado para a coleta de informações com pais21,23. Este instrumento contém 17 itens referentes à coordenação mo-tora, em que a criança é pontuada até 5 pontos em cada item pelos pais após compará-las com crianças na mesma idade21,23.

A utilização de questionário associado à avaliação motora foi pouco encontrada em nosso estudo; apenas 10% das pesquisas in-dicam esta associação, mas a literatura refere que esta combinação favorece o diagnóstico, pois os pais e professores relatam observações importantes sobre o comportamento motor de seus filhos e aspectos que não são observados em avaliação motora, como o desempenho em atividades de vida diária, participação em jo-gos e desempenho em áreas acadêmicas8,23,24.

Neste estudo, 33 (73,33%) artigos utilizaram

instrumentos complementares para o diag-nóstico do TDC. Dos 45 artigos selecionados para este estudo, 8 (17,78%) citaram a Escala Wechsler de Inteligência da Criança (WISC) e 6 (13,33%), os critérios diagnósticos do DSM-IV13,17,25.

A população estudada nos artigos científicos que compuseram este estudo foi composta de 27 (60%) artigos, com predomínio de crianças do gênero masculino, sendo que 25 (55,55%) dos artigos descreveram estudos com população inferior a 50 participantes, conforme apresen-tado na Figura 3.

A literatura26 aponta para um maior número de meninos com TDC do que meninas na faixa etária de 6 a 13 anos de idade, uma vez neste caso as avaliações não são para crianças abaixo desta faixa etária. Neste estudo, 60% das pes-quisas foram realizadas na faixa etária de 6 a 10 anos de idade (Figura 4), considerando que é nesta faixa etária que se encontra um maior número de queixa de educadores em relação aos problemas motores das crianças, já que grande parte das características atrapalha o desempenho acadêmico2,8.

A Figura 5 apresenta a informação referente ao profissional que realizou as avaliações cita-das nos artigos científicos. Apenas 14 (29,79%) artigos informaram que as avaliações foram realizadas por terapeutas ocupacionais (TO).

Os terapeutas ocupacionais são formados para analisar o desenvolvimento das habilidades

Figura 3 – Distribuição do número de participantes. Figura 4 – Distribuição dos participantes em faixa etária.

6 a 10 anos 27

(602%)

10 a 13 anos18

(40%)

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motoras e também para determinar a habilidade de a criança lidar com demandas e atividades da vida diária. Esses profissionais têm a prepara-ção adequada para fazer recomendações sobre como lidar com a criança que tem problemas de movimento. Na situação atual dos serviços de saúde, o TO geralmente atua primariamente como consultor. Nesse papel, o TO vai observar e avaliar a criança, para depois fazer recomen-dações aos pais e professores. Essas recomen-dações podem incluir estratégias específicas ou acomodações para escrita e outras tarefas na sala de aula; dicas para facilitar o ato de se vestir e a alimentação; atividades para melhorar a coordenação motora da criança; ideias para atividades de lazer e esporte na comunidade e o estabelecimento de expectativas apropriadas, para garantir que a criança tenha sucesso24,27.

A partir dos resultados deste estudo, pôde-se observar que, como o TDC é um transtorno que causa alteração em coordenação motora, os profissionais que trabalham com reabili-tação são os mais procurados e, portanto, os que mais desenvolvem pesquisas sobre esta condição26,28.

Por isso, um dos objetivos do uso das avalia-ções do TDC encontrados nos artigos científicos analisados neste estudo foi identificar a preva-lência de crianças com TDC na população19, conforme apresentado na Figura 6.

CONCLUSÃO

149

7 64 3 3 1

(2,13%)(6,38%)(6,38%)(8,51%)(12,77%)(14,89%)(19,15%)(29,79%)

Ter O

cupa

ciona

l

Fisiote

rapeu

ta

Educa

dor F

ísico

Psicólo

go

Psiquia

tra

Pediat

ra

Neurol

ogist

a

Neona

tolog

ista

Figura 5 – Distribuição dos tipos de pesquisadores.

A partir dos resultados encontrados neste estudo, pode-se concluir que as publicações internacionais sobre o TDC vêm aumentando nos últimos anos, progressivamente, entretanto o número de publicações brasileiras ainda é inferior ao de outros países.

Após a realização do mapeamento dos ar-tigos, conclui-se que as publicações na área em relação ao tema vêm crescendo gradativa-mente, pois os pesquisadores buscam analisar e validar instrumentos de avaliações mais adequados para diagnosticar os problemas motores das crianças, porém poucos artigos encontrados tiveram como objetivo principal descrever os critérios diagnóstico do TDC.

Quanto aos instrumentos de avaliação encontrados nos artigos científicos, há uma recomendação sobre a associação entre pro-cedimentos de avaliação motora e entrevista ou questionários que investiguem o compor-tamento motor das crianças com pais e pro-fessores para melhor definição do diagnóstico de TDC.

Como o TDC interfere nas atividades diárias e escolares, os profissionais da área da educa-ção e da saúde devem estar preparados para investigar e tratar as alterações de coordenação motora fina e global para, dessa forma, mini-mizar o impacto do TDC na qualidade de vida social e escolar das crianças.

Figura 6 – Distribuição do objetivo da pesquisa.

Eficáciade Trat

5(11%)

Validação7

(15%)

Prevalência17

(38%)

Carateristicas16

(36%)

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SUMMARYDevelopmental coordination disorder: literature review about assess-

ment tools

Aims: To map the articles published on assessments and scales used for the diagnosis of Developmental Coordination Disorder (DCD) during the first half of 2004 to the first half of 2009 available on PubMed, to descriptively examine specific aspects of the texts: year of publication of research, local, publication media and how data were collected and types of evaluation and scales used for the diagnosis of children with DCD. Method: The research in the database began with the search for the following key terms in English and Portuguese: Developmental coordination disorder, assessment, scale, diagnosis, instruments. Results: The results indicated increasing research in the period from 2004 to 2009. The Movement Assessment Battery for Children Test (MABC) was the most used assessment tool in the articles selected for this study. More than 70% of the articles used complementary tests for the detection of motor problems. Conclusion: Despite the increase in research on DCD there are still few articles published in Brazil. Regarding the evaluation tools found in the papers, there is a recommendation for the association of motor assessment tools or questionnaires and interviews to investigate the motor behavior of children with parents and teachers to better define the diagnosis of DCD.

KEY WORDS: Motor skills disorders. Developmental disabilities. Questionnaires.

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Rev. Psicopedagogia 2010; 27(82): 109-16

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Trabalho realizado na Universidade Federal de São

Carlos – UfSCar – Campus, São Carlos, SP.

Artigo recebido: 11/11/2009

Aprovado: 23/3/2010

Relação céRebRo-compoRtamento

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ARTIGO DE REVISÃO

RESUMO – Estudar a relação entre o cérebro e o comportamento é o principal objetivo da Neuropsicologia. É por meio dessa área de atuação que se pode entender como diferentes áreas cerebrais atuam em conjunto para produzir comportamentos complexos, tal como é o caso da aprendizagem. Problemas em qualquer área do sistema nervoso central podem gerar disfunções e prejudicar o aprendizado. Depreende-se, então, que o profissional que lida com a criança deve ter conhecimentos básicos sobre a neuropsicologia, de modo a compreender as funções mentais. Nesse sentido, a proposta desse artigo de revisão é abordar os fundamentos básicos da neuropsicologia, partindo dos primórdios do conhecimento cerebral, chegando às questões relativas à localização das funções e finalizando com a teoria de Luria sobre o funcionamento cerebral. Espera-se, ainda, motivar os profissionais a buscar novos conhecimentos sobre esse órgão extremamente complexo, que origina todos os comportamentos tipicamente humanos.

UNITERMOS: Neuropsicologia. Ciências do comportamento. Psicofisiologia. Cérebro/fisiologia.

aspectos da Relação céRebRo-compoRta-mento: históRico e consideRações

neuRopsicológicas

Sônia das Dores Rodrigues – Pedagoga/Psicopedagoga

e pesquisadora do DISAPRE (Laboratório de

Distúrbio, Dificuldade de Aprendizagem e

Transtornos da Atenção) FCM/Unicamp.

Sylvia Maria Ciasca – Profa Livre Docente do

Departamento de Neurologia – FCM/Unicamp;

Coordenadora do DISAPRE (Laboratório de Distúrbio,

Dificuldade de Aprendizagem e Transtornos da

Atenção) FCM/Unicamp.

Correspondência

Sônia das Dores Rodrigues

Rua Luis Gama, 937 apto 64 – Castelo –

Campinas, SP – CEP 13070-170

E-mail: [email protected]

Sônia das Dores Rodrigues; Sylvia Maria Ciasca

RodRigues sd & ciasca sm

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INTRODUÇÃOHistoricamente, diferentes áreas de conheci-

mento têm se interessado pelo estudo do sistema nervoso, dentre as quais se destacam a medicina, a psicologia, a física, a química e a matemática1-5. Entretanto, a conscientização de que a interdis-ciplinaridade favoreceria a melhor compreensão do cérebro humano possibilitou a criação de uma nova área de conhecimento (as Neurociências) e revolucionou os estudos científicos sobre o tema. Conforme se verifica no Quadro 1, atualmente diferentes disciplinas estão envolvidas no estudo do desenvolvimento e funcionamento cerebral.

Os diferentes profissionais envolvidos com o estudo do cérebro (comumente denominados de neurocientistas) têm que interagir com as demais áreas de conhecimento, de modo a ana-lisar o funcionamento cerebral sob diferentes ângulos e pontos de vista. Aqui interessa-nos, principalmente, investigar a relação entre cé-rebro e comportamento e, portanto, os aspectos neuropsicológicos do desenvolvimento.

A visão do cérebro no decorrer dos séculos Embora a palavra neurociência seja nova,

existem evidências que mostram que os nossos ancestrais pré-históricos já compreendiam que o

encéfalo (cérebro, cerebelo e tronco encefálico) era essencial para a vida.

Um exemplo disso é a prática da trepanação, realizada por volta de 7.000 anos atrás (Figura 1). Especula-se que essa técnica, que consistia em se fazer orifícios em crânios de indivíduos vivos,

Quadro 1 - Áreas de conhecimentos das neurociências.

Profissionais Disciplina Área de interesse

Neuroquímicos Neurociência molecular Estuda as reações químicas entre as moléculas que são importantes para o funcionamento do sistema

nervoso

Neurofisiologistas Neurociência celular Estuda os circuitos elétricos e celulares que possibili-tam a comunicação do sistema nervoso

Neurobiólogos Neurociência comportamental

Estuda os circuitos complexos de células neuronais que produzem comportamentos e outros fenômenos psicológicos, tais como sono, comportamento emo-

cional, sexual, etc

Neuropsicólogos Neurociência cognitiva (ou Neuropsicologia)

Estuda a relação entre cérebro e comportamento, destacando-se as capacidades mentais mais com-plexas típicas do ser humano, como linguagem,

autoconsciência, memória e aprendizagem

Figura 1 - Evidência de cirurgia cerebral pré-histó-rica (mais de 7.000 anos), onde se nota os orifícios

no cérebro (modificado de Bear et al.1, 2002).

Relação céRebRo-compoRtamento

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tinha como objetivos curar dores de cabeça e transtornos mentais ou abrir as “portas” para a saída de maus espíritos.

Evidências também mostram que os egíp-cios, há 5.000 anos, tinham conhecimento sobre os sintomas dos danos cerebrais. Apesar disso, consideravam que o coração era a sede do espírito e o local de armazenamento da memó-ria. Essa crença fazia com que conservassem somente o corpo para a vida após a morte e re-tirassem e desprezassem o cérebro do cadáver.

Na Grécia antiga, alguns eruditos começaram a perceber a relação entre estrutura e função, o que levou à hipótese de que o encéfalo seria o órgão das sensações. Nessa época, Hipócrates (469-379 a.C.), médico grego, lançou a teoria de que o encéfalo estaria relacionado com as sensa-ções do indivíduo e seria a sede da inteligência. Essa teoria não era facilmente aceita e um dos fa-mosos opositores foi Aristóteles. Para esse filósofo, o coração seria o centro do intelecto e o encéfalo funcionaria como uma espécie de radiador, que resfriava o sangue superaquecido do coração.

Durante o Império Romano, Galeno (130 – 200 d.C), por meio de dissecções de animais, identificou partes distintas no sistema nervoso: o cérebro, de consistência macia, o cerebelo, de consistência mais dura, e compartimentos onde existiam fluidos (ventrículos). A partir de seus ex-perimentos, concluiu que para formar memórias, as sensações precisam ser impressas no cérebro e, naturalmente, isso deveria ocorrer na parte macia (cérebro). Os fluídos passariam pelas tu-bulações ocas (nervos) e gerariam os movimentos (promovidos pelo cerebelo). Reforçava-se, então, a idéia de que o corpo funcionaria por meio do balanço dos fluídos dos quatro ventrículos.

Mais tarde, o matemático e filósofo René Descartes (1596-1650) propôs que a teoria dos fluídos poderia explicar o comportamento de animais, mas não de humanos. Para ele, o homem possuía intelecto e alma e, assim, sugeriu que comportamentos humanos que se assemelhavam ao dos animais tinham os mesmos mecanismos cerebrais. Já as capacidades mentais, exclusiva-mente humanas, ficariam no que denominou de

“mente”, uma entidade espiritual situada fora do cérebro. Essa entidade espiritual manteria contato com a glândula pineal (no cérebro) e por meio desse contato receberia informações sobre as sensações e os comandos dos movimentos.

Entre os séculos XVII e XVIII, os cientistas passaram a dar mais importância à substância cerebral e observaram que o tecido era dividido em substância branca e cinzenta (Figura 2). Ob-servaram, ainda, que a substância branca tinha continuidade com os nervos do corpo e, por meio de fibras, levavam e traziam informações para a substância cinzenta.

A publicação do estudo de Benjamin Franklin (“Experimentos e observações sobre a eletrici-dade”), em 1751, com relato sobre os fenômenos elétricos, impulsionou as pesquisas relativas ao encéfalo. Na virada do século, Luigi Galvani e Bois-Reymond demonstraram que os músculos se movimentavam quando os nervos eram estimu-lados eletricamente e que o encéfalo podia gerar eletricidade, derrubando assim a teoria de que o encéfalo humano funcionava graças aos fluídos.

No final do século XVIII, o sistema nervoso já havia sido completamente dissecado. Identificou-se que toda a superfície cerebral do indivíduo continha um mesmo padrão de saliência (giros) e sulcos (Figura 3A), e que o encéfalo era dividido em lobos (Figura 3B), fato que levou ao início da discussão da localização das funções cerebrais.

Figura 2 - Figura demonstrando as substâncias branca e cinzenta (modificado de Bear et al.1, 2002).

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Figura 3 - Cérebro humano, onde se notam os giros e sulcos (A) e a divisão em lobos (B).

AB

A questão da localização das funções cerebraisApesar dos avanços propiciados pelos

estudos anatômicos, o século XVIII ainda foi marcado pela visão do cérebro como um órgão homogêneo, cuja função era distribuir energia para todo o corpo, segundo a vontade do indi-víduo. É também nesse século que as teorias localizacionistas começaram a ganhar força, merecendo destaque a de Albrecht von Haller (1707-1777). Segundo esse autor, a base da sensação e do movimento estaria na substância branca do cérebro e do cerebelo.

Entretanto, em se tratando de teorias lo-calizacionistas, Franz Gall (1757-1828) é, sem dúvida, aquele que melhor representa essa corrente de pensamento. No século XIX, quando as tentativas de se explicar o intelecto pela fisiologia dos sentidos eram a tônica, Gall lançou o que veio a ser denominado mais tarde de Frenologia. Segundo o autor, o cérebro seria constituído por 35 regiões, que conteriam as faculdades intelectuais e os comportamentos emocionais (tais como generosidade, cora-gem, instintos matrimoniais, amor sexual, etc).

O maior desenvolvimento de um (ou mais) des-ses comportamentos resultaria em proeminên-cias no cérebro que, por sua vez, possibilitaria identificar as diferenças individuais (Figura 4).

Em oposição à Frenologia de Gall, Marie-Jean-Pierre Flourens lançou na mesma época

Figura 4 - Mapa frenológico de Gall.

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(1823) a teoria que veio a ser conhecida como teoria do Campo Agregado. Utilizando o método de ablação experimental em animais (pássaros principalmente), que consiste em destruir partes do sistema nervoso e testar os déficits sensoriais e motores causados pela destruição, ele com-provou o papel do cerebelo nos movimentos motores, comprovando a hipótese levantada por Bell e Magendie. Concluiu o autor que não existiam regiões cerebrais únicas para com-portamentos específicos. Ao contrário, sugeriu que todas as regiões do cérebro participariam de cada função mental, em especial as regiões cerebrais do telencéfalo.

Essas duas correntes de pensamento ganha-ram adeptos de várias áreas de atuação que, por sua vez, levaram a cabo a discussão da localiza-ção ou não das funções mentais complexas até mais ou menos a metade do século XX.

Na linha localizacionista, destacam-se os trabalhos desenvolvidos pelo médico cirurgião Paul Broca e pelo neurologista e psicólogo Karl Wernicke. Broca, em 1861, descreveu o caso de um paciente que tinha lesão na região da parede posterior do lobo frontal (Figura 5). Embora esse paciente não apresentasse qualquer problema motor em sua língua, boca ou cordas vocais, ele era incapaz de falar gramaticalmente em frases completas, ou de expressar seu pensamento por escrito (afasia motora). Tais achados levaram Broca a concluir que a função da linguagem estaria localizada nesta região específica. A importância desse trabalho é tanta que, atu-almente, ele é considerado o marco inicial da neuropsicologia.

Wernicke, por outro lado, descreveu, em 1876, casos de lesões da parte posterior do lobo temporal. Contrariamente ao paciente de Broca, os pacientes de Wernicke tinham capacidade de falar, porém eram incapazes de compreender o que falavam (afasia sensorial). Concluiu, então, que o progra-ma motor, responsável pela execução da fala, estaria na área apontada por Broca, enquanto o programa sensorial estaria na área por ele descrita. Esse pesquisador sugeriu, ainda, o seguinte mo-delo de organização cerebral para a linguagem: a

percepção inicial da fala seria decodificada em áreas sensoriais (visuais ou auditivas), em seguida, a informação seria processada no giro angular; posteriormente, iria para a região posterior do lobo temporal, onde a linguagem seria associada a um significado e, por fim, iria para a região posterior do lobo frontal, que se encarregaria de transformar a sensação sensorial em representação motora.

Mais recentemente, o chamado modelo Wernicke-Geschwind procura explicar como se dá o processamento da palavra falada e da palavra escrita nas diversas áreas cerebrais relacionadas à linguagem (Figura 6).

Retornando à questão da localização, outras pesquisas desenvolvidas à época do debate também relatavam a localização de outras fun-ções em áreas específicas do cérebro, tais como a do neurologista Panizza, que descreveu, em 1855, casos de indivíduos com cegueira perma-nente após lesão na região occipital, e de John M Harlow (1848-1949), que descreveu o conhe-cido caso de Phineas Gage, paciente que passou a apresentar alterações comportamentais após sofrer lesão na região frontal.

Paralelamente a essas questões, as investiga-ções histológicas davam um salto de qualidade com

Figura 5 - Lesão produzida no lobo frontal que resultou em afasia motora (modificado de Bear et

al.1, 2002).

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as descobertas do médico italiano Camilo Golgi e do histologista Santiago Ramon y Cajal. O primeiro desenvolveu o método de coloração por prata, que possibilitou a identificação ao microscópio de toda estrutura do neurônio (corpo celular, dendritos e axônios). Ramon y Cajal, por outro lado, utilizou o método desenvolvido por Golgi e demonstrou que o tecido neural era uma rede de células, e não uma massa contínua, como se acreditava até então.

As investigações farmacológicas também davam a sua contribuição ao demonstrar a na-tureza química da comunicação entre as células neurais, merecendo destaque os trabalhos de-senvolvidos por Claude Bernard (França), Paul Ehrlich (Alemanha) e John Langley (Inglaterra).

Ainda na linha localizacionista, Korbinian Broadman, anatomista alemão, reforçou essa teoria quando se inspirou nos trabalhos de Wer-nicke e Broca e diferenciou, no início do século XX, 52 áreas funcionalmente distintas (Figura 7) no córtex cerebral.

Entretanto, apesar das evidências apresen-tadas, os adeptos da linha do campo agregado continuavam a questionar a validade do prin-cípio da localização nas atividades mentais complexas. Karl Spencer Lashley (1890-1958), por exemplo, estudou a aprendizagem de ani-mais em situações experimentais e, do mesmo modo que Flourens, concluiu que quando uma parte do cérebro animal era lesada, outra parte compensava a perda da função destruída e essa compensação estava relacionada com o tama-nho da lesão, e não com a localização da mesma.

Pelo que se depreende da literatura, pare-ce ser consenso que a resposta a esse conflito (localização ou não das funções mentais) só co-meçou a tomar novo rumo com as investigações de Alexander Ramanovich Luria (1902-1977) em pacientes com lesão do sistema nervoso central.

Em seu trabalho, Luria demonstrou que as funções superiores organizam-se em sistemas funcionais complexos, ou seja, não há participa-ção de apenas uma área específica do cérebro, mas sim da ação de várias áreas. Além disso, preconizou Luria que cérebro está organizado em três unidades funcionais principais, cuja atuação “em concerto” possibilita qualquer tipo de atividade mental (Figura 8).

Figura 7 - Esquema cerebral onde se visualiza as áreas citoarquitetônicas de Broadman.

Figura 8 - Unidades funcionais, segundo Luria5.

Figura 6 - Modelo de processamento da linguagem (modificado de Bear et al.1, 2002).

PALAVRA ESCRITA PALAVRA FALADA

Processamento auditivo inicial Córtex auditivo primário

Reconhecimento auditivo da palavraCórtex têmporo-parietal (giro angular)

e córtex temporal superior anterior

Processamento visual inivialCórtex estriado

Reconhecimento visual da palavraCórtex estra-estriado

Associaçãosemântica

Codificação pré-motoraÁrea motora suplementar

Outros áreas próximas à fissura lateral

Controle motor dafala

Fala

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Unidades funcionais de Luria

Primeira unidade funcionalComo se sabe, toda e qualquer atividade

é desencadeada por algum tipo de estímulo físico. Esse estímulo, por sua vez, desencadeia um fluxo de corrente elétrica que trafega atra-vés de conexões neuronais, até atingir o córtex cerebral. É esse órgão extremamente complexo que se encarrega de processar a informação e enviar a resposta através das vias eferentes.

Entretanto, no caso de funções mentais complexas, a primeira condição para o proces-samento adequado da informação no cérebro é a necessidade de o sujeito estar em estado de vigília. É a primeira unidade funcional que se encarrega de regular o tono, a vigília e os estados mentais do indivíduo.

Dissertando sobre essa primeira unidade funcional, Luria5 atribuiu a Pavlov o mérito de não só ter inferido que a atividade organizada no homem dirigida a metas requer a existência de um nível ótimo de tono cortical, como tam-bém de ter estabelecido três leis neurodinâmi-cas que caracterizam esse tono. A primeira es-tabelece que a intensidade da resposta depende da intensidade do estímulo. A segunda refere que a resposta a um estímulo requer que haja concentração dos processos nervosos e equilí-brio entre a excitação e inibição e, a terceira está relacionada com a mobilidade dos proces-sos nervosos, característica que possibilita ao indivíduo mudar facilmente de uma atividade para outra. Todos esses atributos (intensida-de, concentração e mobilidade dos processos nervosos) são inibidos durante o sono, ou no estado que o precede. Interessante destacar que o tono cortical diminuído perturba a relação entre excitação e inibição, levando à perda da mobilidade e, consequentemente, prejudicando o processamento da informação.

Posteriormente às inferências de Pavlov, descobriu-se que no cérebro há uma estrutura cerebral específica denominada de formação reticular, que é responsável pela manutenção do estado ótimo do tono cortical. Essa estrutura,

constituída por uma rede nervosa de neurô-nios interconectados, situa-se no subcórtex e no tronco cerebral e tem como característica a geração de sinais gradativos (e não do tipo tudo-ou-nada) que modulam o sistema nervoso.

As fibras da formação reticular formam dois sistemas: o sistema reticular ascendente e o sistema reticular descendente. O primeiro (sistema reticular ascendente) faz conexões com o tálamo, o núcleo caudado, o arquicórtex e com o córtex (Figura 9) e tem como função a ativação do córtex e a regulação do estado de

Figura 9 - Esquema cerebral demonstrando a atuação da formação reticular.

sua atividade. Já o segundo (sistema reticular descendente) tem fibras que correm no sentido oposto, ou seja, partem do neocórtex e seguem para o arquicórtex, o núcleo caudado, os núcleos talâmicos, as estruturas mais baixas no me-sencéfalo, no hipotálamo e no tronco cerebral. Assim, ao mesmo tempo que os sistemas da primeira unidade mantêm o tono cortical, eles próprios são influenciados pelo córtex.

Segundo Luria5, diversos experimentos em animais e em humanos demonstraram que lesões e/ou estimulação na formação reticular levam a um ou mais destes estados: diminui-ção pronunciada do tono cortical, estado de sono pronunciado, estado de coma, mudanças

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sucessivas no estado de humor (depressão, in-diferença, euforia), distúrbios de consciência, distúrbios de memória, etc.

Podemos concluir que a primeira unidade funcional não tem qualquer relação direta com a recepção, com o processamento das informações externas, ou com a formação de intenções de comportamentos complexos (dirigidos a metas). Sua única atividade é regular o estado da ativi-dade cortical e o nível de vigilância, essencial para toda e qualquer função cortical superior.

Segunda unidade funcional Contrariamente à primeira unidade, a se-

gunda unidade funcional é responsável pela recepção, análise e pelo armazenamento das informações.

Do ponto de vista histológico, essa região é formada por neurônios isolados, que recebem impulsos individualizados e transmitem infor-mações por meio de sinais do tipo tudo-ou-nada.

Quanto à sua localização, situa-se nas re-giões laterais do neocórtex, sobre a superfície convexa dos hemisférios, ocupando as regiões occipital (visual), temporal (auditiva) e parie-tal (sensorial geral). A característica principal dessa unidade é que a mesma possui grande especificidade modal, já que está adaptada para a recepção de informações visuais, auditivas, vestibulares ou sensoriais gerais. A organização da sua estrutura é hierárquica, formada pelas áreas primárias (ou de projeção), que recebem e analisam as informações vindas do exterior; pelas áreas secundárias (ou motoras de ordem superior), que codificam e convertem as infor-mações, e pelas áreas terciárias (de associação), que coordenam o funcionamento dos vários grupos analisadores.

Nas áreas primárias, formadas por neurônios aferentes da lâmina IV, há grande especificida-de de funções. Os neurônios do sistema visual, por exemplo, respondem somente aos estímulos estritamente visuais, como gradação da cor, movimento e formas dos objetos.

Nas áreas secundárias ocorrem a recepção, a análise e o armazenamento das informações

que chegam do mundo externo. Entretanto, esta área age em conjunto com as zonas terciárias (ou de superposição), que contribuem para a conversão da percepção concreta em pensa-mento abstrato, para a memorização da expe-riência e para o armazenamento da informação.

Terceira unidade funcional A terceira unidade funcional, responsável

pela programação, regulação e verificação da atividade consciente do homem, está localizada nas regiões anteriores dos hemisférios, anterior ao giro pré-central.

Existem duas diferenças básicas entre a ter-ceira unidade funcional, eferente, e a segunda unidade funcional, aferente. A primeira dife-rença diz respeito à organização hierárquica, ou seja, enquanto na segunda unidade os processos seguem uma via ascendente (da zona primária para as secundárias e terciárias), na terceira unidade, os processos seguem uma via descen-dente: começam nos níveis mais altos das zonas terciárias e secundárias, onde os programas motores são planejados, e vão para as estruturas pré-motoras e motoras primárias, que enviam os impulsos para a periferia. A segunda diferença é que na terceira unidade não existem zonas analisadoras modalmente específicas, como ocorre na segunda unidade funcional.

As áreas pré-motoras são as áreas secundá-rias desta terceira unidade funcional. Embora exibam o mesmo tipo de organização morfoló-gica, do tipo vertical estriado, elas apresentam mais camadas superiores de células piramidais pequenas. Assim, a estimulação de partes das áreas pré-motoras resultará em grupos de mo-vimentos organizados (como o giro dos olhos, da cabeça, de todo o corpo, movimento de preensão das mãos, etc) e não em movimentos isolados, como ocorre na área motora primária.

Porém, são nos lobos frontais, mais preci-samente na região pré-frontal, que são execu-tadas as tarefas mais importantes da terceira unidade, já que desempenham papel decisivo na formação de intenções e de programas de regulação e verificação das formas mais

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complexas do comportamento humano. A prin-cipal característica da região pré-frontal é que ela faz conexões com todas as demais áreas do córtex, assim como com os níveis mais inferiores do cérebro (núcleos mediais, ventrais, pulvinar do tálamo, etc). Devido à natureza bidirecional destas conexões, a região pré-frontal é capaz de não só receber e sintetizar as informações recebidas, como também de organizar os impul-sos eferentes, de modo que é capaz de regular toda a estrutura cerebral. Como complemento, vale apenas reforçar que o córtex pré-frontal exerce papel essencial na regulação do estado de atividade, o que o torna capaz de proceder a modificações, segundo as intenções e os planos formulados.

Estudos em animais que tiveram o córtex pré-frontal lesado ou extirpado demonstraram que esta região é essencial para o comporta-mento planejado dirigido a metas, para a sín-tese dos movimentos dirigidos, para a emissão de respostas retardadas e para a regulação e verificação dos comportamentos. No homem, obviamente, experiências desse tipo são limi-tadas e normalmente os estudos que analisam as sequelas de pacientes lesionados comprovam que o córtex pré-frontal é a principal área da atividade consciente do homem. Entretanto, não é demais enfatizar que os processos mentais necessitam do funcionamento e da participação combinada de áreas individuais do cérebro.

Em síntese, a teoria de Luria propõe que a primeira unidade funcional regula o tono, a

vigília e os estados mentais; a segunda unidade obtém, processa e armazena as informações que chegam do mundo exterior e a terceira unidade se encarrega de programar, regular e verificar a atividade mental. Uma das características comuns das unidades funcionais é que elas possuem estrutura hierarquizada, contendo cada uma delas áreas primárias (motoras de projeção), áreas secundárias (motoras superio-res) e terciárias (áreas de associação). Essas três unidades atuam em conjunto e possibilitam a realização de funções corticais complexas.

CONCLUSÃODo exposto, depreende-se que o interesse

pelo funcionamento cerebral surgiu desde os primórdios do desenvolvimento do homem. Desde então, muitas hipóteses foram lançadas, discutidas e refutadas. Mais recentemente, com o surgimento das neurociências e com o aparato tecnológico, muito se avançou em termos de conhecimento sobre o cérebro e suas funções.

Em se tratando da neuropsicologia, que estu-da a relação entre o cérebro e comportamento, as ideias de Luria vêm sendo a base para o entendimento das funções cerebrais e, princi-palmente, para a compreensão das disfunções corticais.

O conhecimento e o domínio dessa teoria é condição básica ao profissional que deseja não só investigar os problemas de aprendizagem da criança e do adolescente, mas principalmente elaborar estratégias de reabilitação eficazes.

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SUMMARYRelationship between brain and behaviour: historical and

neuropsychological considerations

The objective of Neuropsychology is to study the relation between the brain and the behavior. Cerebral areas work together and lead to complex behaviors, such the learning. Damage or dysfunctions in anyone area of the nervous central system can produce learning disabilities. Then, it is important to understand the brain functions. The objective of this work is to make a revision about Neuropsychology since the historical civilization until the theory of Luria. We wait to motivate the search of knowledge about the complex functional system.

KEY WORDS: Neuropsychology. Behavioral sciences. Psychophysiology. Cerebrum/physiology.

REFERÊNCIAS 1. Bear MF, Connors BW, Paradiso MA. Neu-

rociências. Desvendando o sistema nervoso. 2ª ed. Porto Alegre:Artmed; 2002.

2. Ciasca SM. Distúrbios de aprendizagem: processos de avaliação e intervenção. In: Abrisqueta-Gomes J, Santos FH, eds. Re-abilitação neuropsicológica: da teoria à prática. São Paulo:Artes Médicas;2006.

3. Kandel ER, Schwartz JH, Jessel TM. Es-sentials of neural science and behavior. Stanford:Appleton & Lange;1995.

4. Kristensen CH, Almeida ROM, Gomes WB. Desenvolvimento histórico e fundamentos me-todológicos da neuropsicologia cognitiva. Psi-cologia: Reflexão e Crítica. 2001;14(2):259-74.

5. Luria AR. Fundamentos de neuropsicologia. São Paulo:Edusp;1983.

Trabalho realizado na Universidade Estadual de

Campinas – Unicamp, Campinas, SP.

Artigo recebido: 15/1/2010

Aprovado: 18/3/2010

A PsicoPedAgogiA e o Atendimento PedAgógico hosPitAlAr

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MONOGRAFIA

RESUMO – Este artigo se propõe a levantar as contribuições da Psicopedagogia para o Atendimento Pedagógico Hospitalar. Para tanto, foram realizados estudos sobre o processo de hospitalização infantil e a forma de aprendizagem neste contexto, as atribuições e legislações sobre Classe Hospitalar, assim como a Psicopedagogia Institucional como abordagem para atender tal demanda. Foi realizada uma entrevista com uma psicopedagoga que atua em uma Classe Hospitalar, no intuito de compreender a realidade deste tipo de atendimento. O estudo revela que a Psicopedagogia, por meio de uma visão institucional e sistêmica, pode contribuir significativamente com o atendimento pedagógico hospitalar, não somente em casos de possíveis dificuldades de aprendizagem, mas, principalmente, no planejamento das atividades e na formação dos educadores.

UNITERMOS: Atendimento pedagógico hospitalar. Psicopedagogia institucional. Hospitalização infantil.

A PsicoPedAgogiA e o Atendimento PedAgó-gico hosPitAlAr

Michele Oristina Carioca de Lima - Psicóloga com

Especialização em Psicopedagogia pela Universidade

Cidade de São Paulo.

Maria Cristina Natel - Pedagoga, Psicopedagoga,

Especialista em P E I - Programa de Enriquecimento

Instrumental (nível 1 e 2) e Especialista em LPAD -

Evalucion Dinâmica Del Potencial de Aprendizaje

(nível 1). Membro do Conselho da Associação

Brasileira de Psicopedagogia - ABPp da Diretoria

da ABPp - Seção São Paulo e Docente em Cursos de

Psicopedagogia.

Correspondência

Michelle Cristina Carioca de Lima

Rua Alexandre Levi, 202 Apto. 34 A – Cambuci – São

Paulo, SP - CEP 01520-000

E-mail: [email protected]

Michelle Cristina Carioca de Lima; Maria Cristina Natel

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INTRODUÇÃOO acompanhamento pedagógico hospitalar

já é uma realidade em muitos hospitais pelo Brasil. Pode-se entender que é uma das ferra-mentas da humanização hospitalar existentes, além de propiciar a continuidade ao direito de escolaridade das crianças, independente de sua situação.

A atuação de professores e demais profis-sionais da Educação deve levar em conta o contexto da hospitalização infantil, com todo o impacto no cotidiano, na convivência familiar e sentimentos de angústia e temor vivenciados pelas crianças a serem acompanhadas. Estes fatores podem estar presentes em possíveis dificuldades de aprendizagem já que, para ocorrer sucesso na aprendizagem, é necessário haver um equilíbrio entre os fatores biológico, cognitivo, social e emocional.

Frente a esta circunstância, como os profis-sionais da Educação poderão lidar com o ensino destes alunos e até mesmo, intervir quando houver alguma dificuldade de aprendizagem? Considerando que a Psicopedagogia surge para lidar com situações de não-aprendizagem, quais são as contribuições da Psicopedagogia para o atendimento pedagógico hospitalar? Estes questionamentos foram os motores para elaboração deste artigo.

Para responder estas dúvidas, foi realizado um levantamento teórico sobre a hospitalização infantil e o processo de aprendizagem dentro deste contexto, passando pela regulamentação das Classes Hospitalares e a contribuição do processo de humanização hospitalar. E para en-tender como ocorre o atendimento pedagógico hospitalar, também foi feito um estudo sobre as atribuições e principais características deste tipo de atendimento e, por fim, uma explanação sobre a Psicopedagogia Institucional como a abordagem mais adequada para aprimorar o trabalho realizado em uma Classe Hospitalar.

Com o objetivo de levantar as contribuições do profissional da Psicopedagogia no acompa-nhamento pedagógico hospitalar, o presente artigo propõe uma reflexão sobre a atuação

deste profissional em uma instituição – em es-pecial, uma instituição hospitalar – e também colabora para delimitar as atribuições de cada profissional envolvido neste tipo de atendimen-to, visando sempre uma melhora do quadro da criança e do adolescente hospitalizado.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A hospitalização infantil e o processo de aprendizagemPara que possamos compreender melhor o

público alvo de uma Classe Hospitalar, farei uma breve explanação sobre a hospitalização infantil e a interação com a Aprendizagem, no intuito de entender como a Psicopedagogia pode contribuir para este tipo de acompanha-mento pedagógico.

O processo de hospitalização pode ser um evento traumático para qualquer pessoa. Du-rante este momento, a pessoa perde sua singu-laridade e passa a responder aos procedimentos médicos que muitas vezes são dolorosos. Além disto, o indivíduo passa a ser identificado por números, ser reconhecido por sua doença e até mesmo a vestir-se igual a todos os internados. Tais procedimentos e regras são adotados para que os profissionais de saúde possam tratar das enfermidades de seus pacientes, visando disci-plina e garantindo, assim, o tratamento correto e coerente com a cientificidade exigida1.

Considerando todos estes aspectos, podemos compreender que uma hospitalização pode ser ainda mais traumática para uma criança porque a imagem que temos dela é de um ser que está no mundo, explorando-o e brincando com toda a energia possível. Quando hospitalizada, a criança depara-se com o impedimento de brincar e conti-nuar a explorar este mundo porque deve cumprir regras e se submeter a procedimentos médicos.

A hospitalização vem como uma “bruxa mal-vada”, que retira da criança o seu cotidiano de fantasias, brincadeiras e explorações e a coloca em um lugar sombrio, cheio de pessoas doentes e que pedem ajuda a pessoas vestidas de branco para aliviar a dor.

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Alguns autores estudam os impactos no de-senvolvimento infantil quando ocorre uma in-tervenção hospitalar. Segundo Mitre e Gomes2, a hospitalização para uma criança pode levar a traumas, porque a afasta do seu cotidiano e de seu ambiente familiar, sendo um momento de crise que, independente do tempo de duração, será singular em sua vida. Lerner3 retrata que a criança vivencia situações angustiantes e assus-tadoras, como o medo do abandono dos pais e familiares e o medo do desconhecido. A sensa-ção de abandono se dá pela regras do hospital: muitas vezes os pais não podem estar o tempo todo com a criança porque podem aumentar o risco de infecções e atrapalhar os procedimentos hospitalares. E o medo do desconhecido “está presente (...), pois o hospital é um ambiente diferente, estranho e ameaçador, sendo que as fantasias e imagens que as crianças elaboram a respeito do hospital são fundamentalmente persecutórias”.

Além destes pontos levantados, podem ocorrer, ainda, complicações no desenvolvi-mento físico e psíquico da criança hospitalizada, dependendo do tempo de internação ou se o quadro for crônico ou agudo, podendo levar a um atraso no crescimento e no desenvolvimen-to psicomotor e também gerar complicações psíquicas, como depressão e comportamentos regressivos3.

Levando-se em conta tais aspectos apontados sobre a hospitalização infantil, podemos iniciar uma reflexão sobre o processo de aprendizagem das crianças que estão enfermas e sob cuidado constante. Conforme Paín4, a aprendizagem possibilita a transmissão da cultura a todos e também disponibiliza a sua transformação por intermédio da Educação. O ato de aprender está presente em nossas vidas desde o momento do nascimento e nos acompanha até o momento da morte. Aprendendo, estamos nos adaptando e adequando o mundo externo às nossas próprias demandas.

Porto5 salienta que a aprendizagem possui uma função integradora, estando diretamente relacionada ao desenvolvimento psicológico,

denotando as possibilidades de interação e adaptação da pessoa à realidade ao longo da vida, sofrendo múltiplas influências de fatores ambientais e individuais.

Esta integração descrita por Porto5 envolve dois aspectos: o mundo interno e o mundo externo do indivíduo. Ambos se relacionam dialeticamente, um alimentando o outro simul-taneamente. Paín4 considera tais fatores como inerentes à aprendizagem: o aspecto social (como fator externo), o orgânico, a condição cognitiva e a dinâmica do comportamento, sen-do os últimos retratados como fatores internos. Desta forma, a autora ressalta a aprendizagem como um processo dinâmico e que possibilita um processamento da realidade e, concomitan-temente, uma alteração no comportamento do sujeito, que atuará ativamente sobre a realidade a qual está inserido.

Se levarmos em conta a perspectiva de que com a aprendizagem o sujeito poderá atuar em seu contexto e, por fim, transformá-lo, pode-mos entender que disponibilizar um momento para o aprender à uma criança hospitalizada significará uma retomada à sua condição de agente de sua realidade. Durante uma ativida-de, a criança conseguirá explorar o seu meio e intervir, permitindo assim que seja no mundo, diferentemente quando está submetida a pro-cedimentos médicos – neste instante ela age e não simplesmente, reage.

Para Ceccim6, manter a aprendizagem por meio das classes hospitalares possibilita uma alteração na vivência de hospitalização da criança, porque resgata os aspectos de saúde mantidos, mesmo em face da doença, enquanto respeita e valoriza os processos afetivos e cog-nitivos de construção de uma inteligência de si, (...) do mundo, (...) do estar no mundo e inventar seu problemas e soluções.

Assim sendo, podemos compreender que o processo de aprendizagem torna-se um fator terapêutico para criança hospitalizada, já que “ser e se sentir real dizem respeito essencial-mente à saúde (...)”7. Porém, este processo somente poderá acontecer adequadamente se

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o ambiente lhe propiciar condições favoráveis para sua ação e espontaneidade.

Conforme Winnicott8, uma criança somente pode voltar-se para o aprender quando se sente cuidada e com suas necessidades atendidas. Somente estabelecida a integração, é que o indivíduo poderá explorar e compreender o mundo exterior, apropriando-se dele e por fim, modificando-o. E esta integração somente será possível com o estabelecimento de um ambiente suficientemente bom, no qual irá lhe favorecer e intermediar suas experiências e angústias.

Com isto, a proposta de um atendimento pe-dagógico hospitalar propõe o estabelecimento de um espaço adequado para este aprender. As chamadas classes hospitalares configuram este lugar adaptado para que a criança hospitalizada possa explorá-lo e agir da melhor maneira pos-sível, conforme suas demandas internas.

Esta adequação do ambiente hospitalar contribui para uma melhora significativa da experiência de uma internação. É com este en-foque que o próximo tópico será relatado, para que possamos compreender o contexto ao quais as recentes classes hospitalares estão inseridas.

A humanização hospitalar e a legalização das classes hospitalaresO acompanhamento pedagógico hospitalar

já é realidade em muitos hospitais brasileiros. Porém, este tipo de intervenção é recente e, no intuito de entendermos como ocorreu esta conquista, será necessário voltarmos no tempo.

Ao realizarmos um breve retrospecto do histórico do ambiente hospitalar, notaremos que este ambiente, antes caracterizado por uma função de assistência e exclusão, sofreu trans-formações e se constituiu em uma instituição médica com uma função terapêutica, chegando hoje a compor um ambiente institucional que se preocupa com as relações humanas de aten-dimento e não somente com o tratamento e a cura da doença1.

Visando uma cura efetiva, os hospitais en-xergaram novas demandas de atuação de outros profissionais além dos médicos, já que apenas

a cura física não estava sendo eficaz no trata-mento terapêutico e que havia a necessidade de um olhar mais individualizado e singular para cada paciente.

Esse olhar implica em um processo de huma-nização no ambiente hospitalar, sendo o termo “humanização” mais antigo do que parece. A ideia desse conceito vem da época hipocrática, na qual imperava o discurso de que o médico deveria ser o conhecedor da alma humana e da cultura em que estava inserida; a cura era um processo que envolvia o indivíduo doente em sua totalidade, isto é, que o compreendia de maneira biopsicossocial9.

De acordo Manzano e Lima1, atualmente na área da saúde, o tema é bastante difundido, principalmente após o lançamento do Projeto Piloto de Humanização Hospitalar, em 2000, pelo Ministério da Saúde. Tal projeto de hu-manização das relações hospitalares teve como objetivo criar uma nova cultura de relações entre os trabalhadores de saúde e os usuários, na busca da valorização da vida humana. Por isso, podemos pensar que no campo da saúde os relacionamentos não devem ficar somente no campo do conhecimento e da linguagem técnica.

Após este projeto inicial, o Ministério da Saúde lançou em 2002 uma Política Nacional de Humanização (PNH) que tem como foco a atenção e gestão no Sistema Único de Saú-de (SUS). A campanha de humanização dos ambientes hospitalares ganha então o nome de “HumanizaSUS”10. Esta política tem como objetivo a integralidade, a universalidade, o aumento da equidade (igualdade na assistência à saúde) e a incorporação de novas tecnologias e especialização dos saberes presentes no campo da Saúde.

Os gestores desta política compreendem a humanização como a valorização dos usuários, profissionais e gestores de saúde que participam deste contexto, visando ao desenvolvimento da autonomia entre os indivíduos, estabelecendo responsabilidades mútuas e criação de vínculos solidários, contando com a participação coletiva

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nas ações tomadas e não atribuindo responsabi-lidade ou especificações às diferentes funções e profissões embora influencie todas elas.

A operacionalização deste programa pre-visto pelo Ministério da Saúde ocorre com uma troca e construção de saberes provindos de um trabalho de equipe multiprofissional, com a construção de redes solidárias e que interagem com o SUS de forma participativa e protagonista de muitas ações, com a valorização do subjetivo e do social nas práticas de atenção à saúde e também na gestão do SUS, fortalecendo assim a autonomia e o protagonismo dos sujeitos envolvidos.

Humanizar é, portanto, o ato de tornar huma-no. E deve ser entendido em saúde como uma valorização do respeito à vida e das condições humanas, considerando os aspectos individuais e particulares de cada pessoa, como a história de vida deste indivíduo, os seus medos, suas an-gústias, suas crenças e sonhos, os seus anseios e demais singularidades.

Partindo destes princípios, podemos con-siderar que a proposta de acompanhamento pedagógico hospitalar pode contribuir consi-deravelmente para a manutenção deste pro-jeto de humanização. E acompanhando todo este movimento para regulamentação de uma política nacional de humanização, as classes hospitalares também surgem como mais uma ferramenta a ser implementada pelos hospitais.

Segundo Fonseca11, em 1995, há um reco-nhecimento pela legislação brasileira acerca do direito da continuidade de escolarização às crianças e adolescentes hospitalizados e no ano anterior, no documento do MEC, há a denomi-nação de classes hospitalares, sendo aquelas que “objetivam atender pedagógico-educacio-nalmente às necessidades do desenvolvimento psíquico e cognitivo de crianças e jovens que (...) se encontram impossibilitados de partilhar as experiências sócio-intelectivas de sua família, de sua escola e de seu grupo social”.

Em 2001, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação

Especial e no artigo 13 há uma referência sobre a escola no ambiente hospitalar, com caráter obrigatório a partir de 200211. Conforme o mo-vimento nacional, cada estado viu-se obrigado a estabelecer legislação específica para aten-der esta nova determinação. Segundo Noffs e Rachman12, em 2000, o então deputado Milton Flávio elaborou a lei nº 10.685 que dispõe sobre o acompanhamento educacional da criança e do adolescente internados para tratamento de saúde. Diante a esta nova realidade, o Ministé-rio da Educação, por intermédio da Secretaria da Educação Especial, elaborou em 2002 um documento denominado “Classe Hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações”.

Assim, concomitantemente à divulgação da PNH (Política Nacional de Humanização), as classes hospitalares também obtiveram o respal-do legal para sua implementação e estruturação no ambiente hospitalar e, com isso, a autoriza-ção necessária para possibilitar a continuida-de do aprendizado e auxiliar na melhoria do quadro das crianças e adolescentes internados.

Contudo, tais legislações não esclarecem de forma detalhada e prática a maneira como cada instituição hospitalar deve implementar este tipo de acompanhamento pedagógico. Até por falta de estudos mais apurados, os hospitais recorrem à Diretoria de Ensino das regiões correspondentes para buscar não somente os profissionais capacitados para realizar as ativi-dades curriculares, mas, também, para seguir o currículo estipulado para as demais escolas de aula regular.

E com esta falta de orientação, algumas adaptações do currículo destinado aos alunos de grade regular à realidade de um ambiente hos-pitalar podem tornar-se prejudiciais a este tipo de intervenção. Conforme Noffs e Rachman12, “faz-se necessário esclarecer que tal oferta de ensino no ambiente hospitalar deve ser pensada com cautela, pois não pode ser reduzido à mera transferência das práticas do ensino regular ao ensino hospitalar, considerando as diferentes demandas dos diversos alunos-pacientes”.

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Frente a esta situação, encontramos uma oportunidade para a Psicopedagogia intervir e auxiliar os professores e demais profissio-nais destinados a este tipo de acompanha-mento pedagógico. Por isto, a seguir, tratarei sobre a rotina e demais características impor-tantes de uma Classe Hospitalar e entender como a Psicopedagogia pode contribuir para a melhoria desta intervenção em franca ex-pansão.

A Classe Hospitalar e suas principais atri-buiçõesConforme observamos no tópico anterior, a

organização do acompanhamento pedagógico hospitalar não obedece a uma regra única. Cada instituição sente-se livre para organizar este tipo de intervenção, porque ainda não há uma diretriz clara e precisa sobre o assunto por parte dos órgãos responsáveis, até mesmo porque esta atuação encontra-se em um intercâmbio entre o campo da Educação e da Saúde.

Porém, ao realizarmos uma pesquisa apura-da sobre a atuação dos profissionais em Classe Hospitalar, encontramos algumas orientações em comum que devem ser consideradas. Entre elas, Noffs e Rachman12, durante um trabalho de assessoria psicopedagógica a professoras que trabalhavam em um hospital geral público da cidade de São Paulo, apontam as principais diferenças encontradas entre as classes regu-lares e as classes hospitalares. Dentre estas características, destaco tais peculariedades de uma Classe Hospitalar:• Alunosemsériesdiferentes;• Númerodealunosvariadeacordo coma

demanda do setor;• Nãoháconstânciaefrequênciaprecisados

alunos;• A temáticaplanejadadeve ser iniciada e

finalizada no mesmo período;• Local emqueocorremas atividades éde

acordo com a possibilidade da instituição (brinquedoteca, por exemplo) ou, conforme possibilidade do aluno, as atividades são realizadas no próprio leito da criança.

Barros13 revela que, devido à sua caracte-rística multiseriada, a Classe Hospitalar possui uma estrutura dinâmica e caracteriza-se por ser um grupo aberto. Mas, mesmo assim, cabe ao profissional elaborar um programa com temas centrais que nortearão a prática pedagógica. Funghetto et al.14 salientam que o desenvol-vimento destes temas acontecerá conforme as fases de desenvolvimento de cada criança a ser atendida e que a presença de crianças com idades mistas possibilita uma nova prá-tica pedagógica porque “às vezes as crianças mais velhas davam aulas às crianças menores e desenvolviam atividades de acordo com sua idade e interesse14.

Cabe ao educador elaborar e repensar estra-tégias que estimulem a criança hospitalizada a continuar com as atividades porque às vezes este aluno pode se sentir indisposto devido ao quadro de sua enfermidade. Além deste aspecto, outros eventos podem interromper (temporariamente ou não) o acompanhamento pedagógico, como, por exemplo, a administra-ção de uma medicação. Segundo Fonseca11, tais circunstâncias poderiam ser consideradas como uma interferência, mas devem ser com-preendidas como uma dinâmica do cotidiano da Classe Hospitalar. O profissional deve aprovei-tar cada momento vivenciado como “ganchos para dinamizar ou re-estruturar a atividade, (...) abrindo uma nova janela para o interesse do aluno e seu desempenho frente às atividades em desenvolvimento”.

Ao pensar em um planejamento de ativi-dades, o educador deve estar ciente que sua programação terá começo, meio e fim no mesmo dia11. Isto porque a rotatividade destas crianças é uma variável não controlada; às vezes, uma criança poderá participar da Classe Hospitalar somente em um dia porque o seu quadro clínico agravou ou então porque recebeu alta. Sendo assim, antes de iniciar o acompanhamento, o profissional deverá ler o prontuário de cada criança internada para ter conhecimento da situação real e ter tempo hábil para fazer qual-quer tipo de adequação em seu planejamento.

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Outra adaptação que o profissional da Edu-cação deverá realizar se refere ao ambiente em que ocorrerão as atividades. Dependerá dos recursos disponíveis da Instituição: em alguns casos, o hospital dispõe um leito desativado ou um espaço inutilizado para que uma estrutura com mesas e cadeiras possa ser montada; em ou-tros, a brinquedoteca é o local disponibilizado. Mas, conforme a realidade, poderá acontecer o acompanhamento na enfermaria, no próprio leito, em um refeitório ou outro local em que haja uma mesa e uma cadeira11.

Partindo desta rápida descrição da rotina de uma Classe Hospitalar, podemos refletir que o educador envolvido neste tipo de intervenção deverá possuir uma boa habilidade de adapta-ção, sensibilidade e disposição para contribuir com seu trabalho para uma melhora – muitas vezes, sutil – do quadro clínico de uma criança hospitalizada15. A relação com outros profissio-nais da área da saúde também faz parte do co-tidiano deste educador e com eles, é necessário manter um bom relacionamento e cultivar uma boa comunicação para que o trabalho como um todo seja eficaz.

O comprometimento também é fundamental durante a atuação deste educador. Segundo Fonseca11, “é imprescindível ao professor tentar manter os horários e a frequência de atendi-mento aos seus alunos, uma vez que a criança hospitalizada já vive muitas incertezas do ponto de vista médico (...)”. Considerando tudo isto, o professor não pode ser mais uma incerteza na vida da criança.

O educador da Classe Hospitalar também deve ter uma ótima observação, que, conforme Fonseca11, é um instrumento muito importante. Observando todas as variáveis que compõem o acompanhamento e aliando a um registro sobre o desempenho das crianças, este profissional poderá compreender possíveis demandas de um atendimento mais específico a algum paciente ou, então, renovar e planejar outras atividades que atendam as demandas destas crianças.

Todo este quadro apresentado me remete a uma indagação: como a Psicopedagogia pode

auxiliar este educador a realizar suas atribui-ções da melhor forma possível e, ainda, ajudar no diagnóstico e na intervenção de prováveis dificuldades de aprendizagem de uma criança hospitalizada? O Psicopedagogo pode ser o profissional que atenderá às demandas de re-flexão e compreensão por parte do professor a respeito deste aluno tão particular? Para tentar responder tais questões, irei recorrer a uma breve explanação sobre a Psicopedagogia Ins-titucional, considerando-a como o olhar mais adequado para este tipo de acompanhamento pedagógico.

A Psicopedagogia institucional e o atendi-mento pedagógico hospitalarAté o momento, realizei uma rápida des-

crição dos componentes envolvidos em um Acompanhamento Pedagógico Hospitalar, iniciando pelo público atendido, a aprendiza-gem neste espaço, levantando dados sobre a contextualização desta abordagem, assim como a legislação envolvida e as características deste tipo de atuação.

Diante deste cenário, encontro na Psico-pedagogia um olhar específico para abordar questões não somente dos alunos (as crianças hospitalizadas) e suas possíveis dificuldades, mas também, de forma mais ampla, todo o am-biente envolvido neste aprender.

Conforme Porto5, a Psicopedagogia ainda é uma ciência nova e que está em plena cons-trução. Ela surge para atender uma demanda específica: “(...) para auxiliar a intervenção e prevenção dos problemas de aprendizagem5”. Considerando o caráter preventivo, o psicope-dagogo realiza uma investigação institucional, avaliando os processos didáticos e metodológi-cos aplicados, além de analisar toda a dinâmica existente dos profissionais desta instituição, para assim encontrar os possíveis problemas e propiciar a intervenção adequada para uma reestruturação deste ambiente5.

Esta análise, ainda segundo a autora, é rea-lizada por meio de uma abordagem sistêmica e crítica. Com isto, a Psicopedagogia Institucional

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renova a forma de atuar dentro das instituições escolares ou em qualquer outra instituição onde possa ocorrer a aprendizagem – como no caso de um hospital. Levando em conta a relação existente entre a instituição e o aprender, o psicopedagogo pode contribuir para uma ade-quação das interações existentes entre aquele que ensina e aprende. Porto5 reforça que “a reflexão sobre o individual e o coletivo traz a possibilidade da tomada de consciência e da inovação por meio da criação de novos espaços de reflexão com a aprendizagem”.

Apesar de seu surgimento estar relacionado com as dificuldades de aprendizagem, a Psico-pedagogia tem como objeto de estudo todo o processo de aprendizagem. Gasparian16 ressalta que, dentre as características da aprendizagem, o psicopedagogo também deve estar atento às relações de todos os elementos que compõem um ambiente em que ocorra o aprender. E pensando em uma Classe Hospitalar, é possível entender que o olhar do profissional deverá abranger a instituição hospitalar e todas suas características.

Retomando o capítulo anterior sobre as atri-buições de uma Classe Hospitalar e relembrando as responsabilidades dos educadores, podemos entender que oferecer um espaço de escuta e reflexão a estes profissionais poderá garantir a autonomia necessária para que possam desem-penhar da melhor forma este tipo de acompanha-mento pedagógico. Noffs e Rachman12 reforçam que, propiciando este lugar, o educador poderá também estimular a autonomia do aluno, per-cebendo que a possibilidade de tomar decisão é um aspecto saudável. Além disto, outro ponto destacado pelas autoras é a necessidade de for-mar os educadores contratados para trabalhar em um ambiente hospitalar, adequando as propostas didáticas à rotina da internação. Como tais profis-sionais, em sua maioria, não possuem formação específica em Pedagogia Hospitalar, podem ocor-rer muitas confusões quando o professor resolve, por exemplo, aplicar um currículo de uma classe regular sem realizar as adaptações necessárias para a aplicação em uma Classe Hospitalar.

Uma formação adequada deste educador possibilitará uma melhora na maneira como irá realizar este acompanhamento. Noffs e Rach-man12 identificaram esta demanda de apoio e afirmam que tal necessidade possibilita a atu-ação do psicopedagogo, já que pode contribuir para a formação específica e também para uma formação pessoal.

No primeiro tipo de formação, o psicope-dagogo auxilia o educador a refletir sobre o seu papel em uma Classe Hospitalar e saber que a sua atuação é diferente de um professor de uma classe regular e também, de um pro-fessor particular. Quanto à formação pessoal, Noffs e Rachman12 consideram como o apoio a ser feito com maior ênfase porque irá ofe-recer recursos a estes profissionais para que possam lidar com as crianças hospitalizadas e descobrir o aspecto saudável das mesmas. Ao identificar a potencialidade de uma criança internada, o educador poderá utilizá-la como ponto de partida para seu trabalho e contribuir para sua melhora.

Ainda sobre a necessidade de um apoio aos professores, Fighera15 salienta que “(...) compe-te ao sistema educacional e serviços de saúde oferecerem assessoramento permanente ao pro-fessor, bem como inseri-lo na equipe de saúde que coordena o projeto terapêutico individual.”

Porto5 reforça que o psicopedagogo, quando em intervenção institucional, utiliza técnicas e atividades como reuniões e discussões, para conseguir a ressignificação do educador em relação ao aprender. Para a autora, esta ação é coletiva e torna-se a peça-chave para o seu sucesso.

Além do aspecto de apoio aos professores, o psicopedagogo também poderá compreender como se dá a aprendizagem das crianças da ins-tituição analisada e, assim, contribuir com mais dados aos educadores, para que possam realizar um planejamento de trabalho mais condizente com a demanda existente.

A leitura psicopedagógica possibilita a iden-tificação do significado da aprendizagem para cada aluno, bem como da sua modalidade de

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aprendizagem, da etapa operatória do pensa-mento, das suas dificuldades e possibilidades. A organização de um modelo sadio de ensino-aprendizagem no espaço escolar implica a ressignificação do conhecimento e o respeito ao processo cognitivo e às pulsões epistemofílicas do aluno5.

Com a explanação teórica feita até o momen-to, iniciamos uma visualização dos elementos existentes na Psicopedagogia que auxiliam o atendimento pedagógico das crianças e ado-lescentes hospitalizados. As possibilidades de intervenção com um enfoque institucional revelam-se necessárias para o bom andamento do trabalho. Porém, para que possamos fechar esta pesquisa, é preciso olhar para o cotidiano deste tipo de atendimento.

Sendo assim, na sequência veremos os da-dos coletados em uma entrevista realizada com uma psicopedagoga que atua em uma Classe Hospitalar e seguiremos neste caminho com o objetivo de entender como a Psicopedagogia pode contribuir com o Atendimento Pedagógico Hospitalar.

MÉTODO DA PESQUISAPara levantar os dados de análise desta

pesquisa, foi utilizada a abordagem qualitativa porque esta permite uma melhor compreensão do fenômeno estudado já que, conforme Chizzot-ti17, existe uma interdependência entre o objeto de estudo e a subjetividade do sujeito analisado que é inseparável. A partir desta abordagem, foi escolhida a técnica de estudo de caso que permite coletar e registrar dados a partir de um caso particular e como instrumento de coleta de dados, foi utilizada a entrevista não diretiva.

Todos os cuidados éticos foram tomados nesta pesquisa e, para garantir o sigilo do pro-fissional entrevistado, foi elaborado um termo de consentimento livre e esclarecido com lin-guagem clara e objetiva, solicitando a possibi-lidade de gravação da entrevista para posterior transcrição, explicando o intuito do trabalho, garantindo o sigilo dos dados coletados e o anonimato do psicopedagogo participante.

Ao definir o critério de escolha do profis-sional participante, foi decidido que seria um psicopedagogo e que a faixa etária e sexo não seriam relevantes na escolha, porém, o fator determinante seria a experiência profissional junto à área hospitalar e ao atendimento pe-dagógico hospitalar. E, conforme este critério, a psicopedagoga escolhida é uma profissional que atua na área desde 2005 e que receberá neste artigo o nome fictício de Helena. Ela trabalha em um hospital particular especiali-zado no tratamento oncológico e localizado na cidade de São Paulo.

A entrevista ocorreu no hospital, onde He-lena trabalha, em um local destinado ao aten-dimento pedagógico das crianças internadas e que está localizado no andar da Pediatria. Durante a entrevista, uma pedagoga estava terminando um trabalho e, por um momento, a entrevista foi interrompida para que Helena pudesse atender a um telefonema. A entrevista durou 40 minutos.

RESULTADOS E ANÁLISEOs resultados obtidos serão analisados com

base na fundamentação teórica apresentada anteriormente e com o intuito de compreender como a Psicopedagogia contribui para o aten-dimento pedagógico hospitalar.

Para tanto, a entrevista foi transcrita. As falas de Helena foram separadas em cate-gorias para uma análise adequada e que respondesse os questionamentos levantados durante a explanação teórica. As categorias encontradas foram: 1) A importância da Psi-copedagogia para o Atendimento Pedagógico Hospitalar; 2) Atuação do psicopedagogo na Classe Hospitalar; 3) Formação dos pro-fessores da Classe Hospitalar; 4) Relaciona-mento com a equipe médica; 5) Legislação da Classe Hospitalar. Vale ressaltar que esta categorização foi feita para fins didáticos e para facilitar a leitura dos dados coletados. Abaixo seguem as análises das categorias acima descritas e as falas da profissional estão destacadas em itálico.

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A importância da Psicopedagogia para o atendimento pedagógico hospitalarNesta categoria é possível entender como

a Psicopedagogia contribui para o trabalho realizado em uma Classe Hospitalar. Na visão da entrevistada, a contribuição da Psicopeda-gogia está na maneira diferenciada em avaliar as necessidades dos pacientes: “(...) para poder intervir, para avaliar, para identificar onde está a dificuldade do aluno, se é com relação à família, se é com relação ao tratamento, se é com relação ao retorno à escola (...).”.

Esta citação nos remete à possibilidade que a Psicopedagogia Institucional oferece aos profissionais da Educação: um olhar amplo sobre o processo de ensino-aprendizagem, con-siderando todos os aspectos envolvidos e que estão interligados fortemente. Ao avaliar uma dificuldade de aprendizagem, o psicopedagogo que atua em uma Classe Hospitalar utilizará uma abordagem sistêmica e levará em consi-deração o vínculo estabelecido do aluno com a instituição, o impacto do tratamento no seu desempenho assim como a própria relação fa-miliar e também, após o período de internação, o seu retorno ao ambiente escolar.

Outro ponto trazido por Helena é a necessi-dade de se ter um apoio psicopedagógico nas reuniões realizadas com os professores do local: “nem que fosse para dar assessoria, mas tem que ter, porque é um olhar complementar e a gente precisa disso. É uma diversidade muito grande, são muitas dificuldades (...) da doença, da situação crítica, por tudo que a criança passa que a família passa as dificuldades dos profes-sores também”.

Isto reflete a necessidade de se oferecer um espaço de escuta e reflexão a estes profissionais, conforme divulgado por Noffs e Rachman12. Ao discutir o cotidiano de suas atividades, os pro-fissionais da Classe Hospitalar podem refletir suas ações, o seu papel neste tipo de acompa-nhamento e também, conseguirão desenvolver autonomia na abordagem escolhida que irá atender as necessidades do paciente da melhor forma possível.

Atuação do Psicopedagogo na Classe Hos-pitalarCom este tópico podemos compreender,

baseando-se na rotina desta instituição, como o Psicopedagogo atua em uma Classe Hospitalar. Helena revela que “(...) quando a criança é aten-dida pedagogicamente (...) fazendo uma ativi-dade lúdica, escolar ou pedagógica e a gente percebe que nos diferentes espaços essa criança apresenta uma dificuldade ou não consegue fa-zer uma atividade ou até de brincar (...) ou tem uma alteração muito grande daquela atividade que a gente está pedindo a gente então elege a criança para fazer uma discussão de caso (...) e a gente fala ‘ah, vamos encaminhar para fazer uma avaliação psicopedagógica’(...)”.

Nesta citação é possível perceber que a Psicopedagogia ganha espaço nas instituições quando uma dificuldade de aprendizagem fica evidente. Antes, durante o planejamento das atividades ela não está presente porque, conforme visto anteriormente, é uma ciência recente e que está em processo de construção e reconhecimento entre os demais profissionais. Sendo assim, a Psicopedagogia é geralmente acionada quando a dificuldade fica explícita e se torna necessária uma avaliação para entender o quadro encontrado.

Esta expectativa de se realizar uma avaliação psicopedagógica somente quando um sintoma é retratado também está presente entre os pro-fissionais da equipe médica: “(...) às vezes até a equipe médica, de uns dois anos pra cá, vem ocorrendo de encaminharem um ou outro pa-ciente que apresenta uma dificuldade específica duradoura de aprendizagem (...).”.

Com este dado podemos compreender que a Psicopedagogia está vinculada exclusivamente ao tratamento de uma dificuldade já existente, principalmente entre a equipe médica.

Formação dos professores da Classe HospitalarA formação dos professores que atuam em

uma Classe Hospitalar também foi discutida du-rante a entrevista com Helena. Nesta categoria podemos entender quais são as especializações

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necessárias para este tipo de atuação. Para Helena, “não dá para trabalhar sem ter Peda-gogia e sem ter especializações na área, por exemplo, Psicopedagogia, Educação Especial ou especializações de deficiências outras. Ela complementa ainda dizendo que “formação nunca é demais, (...) porque as pessoas mudam muito rápidas e o professor está sempre queren-do fazer alguma coisa diferente (...).”.

Portanto, a formação constante destes pro-fissionais se torna um ponto obrigatório para uma atuação adequada. Conforme vimos, o comprometimento do educador é o norte que fará com que busque maiores informações e fundamentações teóricas para que sua prática se renove a cada dia e a cada aluno atendido.

Outro ponto levantado por Helena é que o Hospital possui uma parceria com a Secre-taria Municipal de Educação de São Paulo e oferece cursos de aperfeiçoamento na área de Atendimento Pedagógico Hospitalar. E, por conta destes cursos, os professores da própria Classe Hospitalar da instituição participam do planejamento e da elaboração de materiais: “outra coisa que proporcionou uma troca de saberes muito grande para gente foi quando a gente começou a fazer estes cursos de formação, porque isso de preparar aula junto, (...) a gente troca muito.”.

Ou seja, durante esta preparação de cursos, os próprios professores repensam suas práticas e realizam uma reflexão bastante produtiva de suas atribuições neste tipo de atendimento.

Relacionamento com a equipe médicaAlém do aspecto de formação dos profes-

sores, os cursos também proporcionaram um melhor entendimento por parte da equipe médica do hospital sobre o trabalho realizado na Classe Hospitalar. Helena revela que “até dois anos atrás a gente está contextualizado na Pediatria, mas não tinha contato direto com os médicos. Depois dos cursos a gente começou a receber um ou outro encaminhamento dos médicos (...).”.

Isto denota que o trabalho realizado em uma Classe Hospitalar, até pouco tempo, não era valorizado pela equipe médica porque o foco da atuação destes profissionais como exposto na fundamentação teórica, é tratar com a maior cientificidade possível o quadro enfermo dos pacientes, principalmente nos casos de câncer. Com as mudanças propostas pelo processo de humanização hospitalar, este tipo de olhar está sendo alterado e ações que visam um tratamen-to mais amplo estão ganhando espaço dentro da instituição.

Legislação da Classe HospitalarPor fim, esta última categoria nos possibilita

compreender que a regularização do atendi-mento pedagógico hospitalar ainda necessita de adequações. Helena salienta que a legislação existente “é muito frágil, ela não coloca quem deve dar este atendimento, em que hospitais, ela não coloca se é fundamental I e II, ela não diz nada”.

Esta falta de orientação mais específica possibilita falha no decorrer do atendimento pedagógico hospitalar. E, como vimos anterior-mente, a mais comum é a de utilizar o currículo estipulado para escolas de aula regular em uma Classe Hospitalar, sem fazer as devidas adapta-ções já que este tipo de classe é caracterizado por ser multiseriada. Sendo assim, um olhar especializado se faz necessário para coordenar este tipo de atendimento em uma instituição hospitalar.

CONCLUSÃOValendo-se de tudo o que foi exposto até o

momento e contando com a entrevista realizada, é possível atingir o objetivo do presente artigo, compreendendo como a Psicopedagogia pode contribuir para o Atendimento Pedagógico Hospitalar.

A entrevistada reforça a concepção de que um olhar institucional para este tipo de acom-panhamento se faz necessário porque todos os elementos fazem parte do processo de aprendi-zagem – a enfermidade da criança, a instituição

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hospitalar e seu cotidiano, as relações familia-res – enfim, o contexto no qual este aluno está inserido pede um olhar mais amplo e atento às suas necessidades e às suas potencialidades. E, para tanto, a Psicopedagogia Institucional revela-se a abordagem mais apropriada para este tipo de intervenção.

Outro ponto a concluir seria sobre o espaço que este tipo de atendimento tem hoje nos hos-pitais. Como vimos, por intermédio do processo de humanização hospitalar, intervenções como a Classe Hospitalar ganham força dentro da instituição, com o reconhecimento dos demais profissionais de saúde.

A atuação da Psicopedagogia em um am-biente hospitalar adquire forma e durante este processo de estruturação, ainda existe um pres-

suposto de que esta ciência trabalhe somente com as dificuldades de aprendizagem. É preciso demonstrar aos demais profissionais – e refor-çar entre os próprios psicopedagogos – que a Psicopedagogia deve estar presente em todos os momentos em que ocorra a aprendizagem, desde o planejamento de uma atividade, pas-sando pela formação e discussão de casos com os educadores e por fim, intervindo em possíveis dificuldades de aprendizagem.

Considerando este ponto de vista e adotando uma visão institucional, o psicopedagogo poderá contribuir com o seu conhecimento de todo pro-cesso de aprendizagem para a atuação em uma Classe Hospitalar e, assim, aprimorar este tipo de atendimento pedagógico tão essencial para as crianças e os adolescentes hospitalizados.

SUMMARYPsychopedagogy and service educational hospital

This article aims to raise the contributions from Psychopedagogy to Service Educational Hospital. Therefore, studies were performed on the process of child hospitalization and form of learning in this context, the functions and laws about class and the Hospital Institutional Psychoeducation as an approach to meet this demand. We carried out an interview with a professional which operates in a Class Hospital in order to understand the reality of this type of care. The study shows that Psychopedagogy through an institutional vision and systemic, can contribute significantly to the care teaching hospital, not only in cases of possible learning difficulties, but mainly in planning activities and training of educators.

KEY WORDS: Care teaching hospital. Institutional psychopedagogy. Child hospitalization.

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manização da atenção e gestão no Sistema Único de Saúde – HumanizaSUS. Disponível em www.saude.gov.br. Acesso em 6/5/2005.

11. Fonseca ES. Atendimento escolar no am-biente hospitalar. São Paulo:Memnon;2003.

12. Noffs NA, Rachman VCB. Psicopedagogia e saúde: reflexões sobre a atuação psicopeda-gógica no contexto hospitalar. Revista Psi-copedagogia, 2007.

13. Barros ASS. Contribuições da educação profissional em saúde à formação para o trabalho em Classe Hospitalar. Caderno CEDES. 2007;27. Disponível no site http://www.scielo.br. Acesso em 12/5/2008.

14. Funghetto SS, Freitas SN, Oliveira VF. Clas-se hospitalar: uma vivência através do lúdi-co. Pátio. 1999;Ano III Nº 10.

15. Fighera TM. Pedagogia hospitalar: o pa-ciente frente a uma nova abordagem de ensino. Disponível no site http://www.psi-copedagogia.com.br. Acesso em 15/5/2008.

16. Gasparian MCC. Psicopedagogia institu-cional sistêmica. São Paulo:Abril Cultu-ral;1997.

17. Chizzotti A. Pesquisa em Ciências Huma-nas e Sociais. 5ª ed. São Paulo:Cortez;2001.

Artigo recebido: 1/10/2009

Aceito: 12/12/2009

Trabalho realizado na Universidade Cidade de

São Paulo, São Paulo, SP. Artigo apresentado ao

módulo Pesquisa em Psicopedagogia, do curso

de Especialização Lato Sensu em Psicopedagogia

Clínica e Institucional, sob orientação da professora

Maria Cristina Natel.

Campos mCm & sCiCChitano RmJ

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RESENHA

Maria Célia Malta Campos - Doutora em Psicologia

Escolar pelo Instituto de Psicologia da Universidade de

São Paulo. Psicopedagoga clínica, assessora escolar para

metodologia de ensino e dificuldades de aprendizagem.

Pesquisa e atua na formação docente em oficinas de jogos.

Rosa Maria Junqueira Scicchitano- psicopedagoga.

Especialização em Educação Especial, Universidade

Católica de Louvain, Bélgica; Mestrado em Edu-cação

Especial, W.C.U., Carolina do Norte, U.S.A; Doutorado

em Psicologia, Universidade de São Paulo; Professora da

Universidade Estadual de Londrina.

Correspondência

Maria Célia Rabello Malta Campos

E-mail: [email protected]

a esCRita oRtogRáfiCa na esCola e na ClíniCa: teoRia, avaliação e tRatamento

Resenha: Maria Célia Malta Campos; Rosa Maria Junqueira Scicchitano

Resenha do livro: Moojen SMP. A escrita ortográfica na escola e na clínica: teoria, avaliação e tratamento. São Paulo:Casa do Psicólogo;2009.

Sonia Moojen é fonoaudióloga e psicope-dagoga, colaboradora bastante ativa na seção Rio Grande do Sul, desde a sua fundação, como também muito tem contribuído como conselhei-ra na ABPp Nacional. Agora ela nos oferece uma obra que expressa sua longa e profícua dedicação ao tema da aprendizagem da leitura-escrita. Desde 1982, Moojen dedica-se a essa área de aprendizagem, sendo que, em 1985, já publicava pesquisa sobre o delineamento do perfil ortográfico individual e coletivo de esco-lares com base no teste do Ditado Balanceado, por ela formulado.

Em um momento em que as mais variadas formas e instâncias de avaliação das aprendi-zagens dos alunos são realizadas no país, sendo valorizadas como essenciais para a melhoria da qualidade do ensino, Moojen traz a público a construção desse instrumento de avaliação da ortografia, cuidadosamente elaborado e norma-tizado para nosso país, tão carente de testes pró-prios, particularmente de testes de linguagem.

Além de poder usar um bom instrumento de medida, fazer a análise dos erros de escrita é im-prescindível para o entendimento dos processos linguísticos subjacentes e para o planejamento de estratégias de trabalho. Porém como proce-der? Quais seriam os obstáculos a serem ven-cidos a cada etapa da escolaridade, no campo da escrita ortográfica? Quais erros mereceriam atenção prioritária, sob quais critérios? Tendo em vista sua compreensão de que essas refe-rências de trabalho são muito importantes para professores e psicopedagogos, Sonia Moojen organizou um modelo de classificação dos erros na escrita que tivesse aplicabilidade e agilidade tanto no trabalho clínico como no trabalho em sala de aula.

Composta por 12 capítulos, a obra encon-tra-se organizada em torno de três eixos, como indica o seu título e, por isso, poderá servir a vários interesses. Os quatro primeiros capí-tulos apresentam teorias sobre a linguagem escrita e, neles, os leitores que procuram

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conhecimentos teóricos sobre aprendizagem da linguagem escrita, sua avaliação e ensino, terão contato com os modelos mais atuais, tendo como ponto central e integrador a caracterização do que seja erro ortográfico, numa visão de processo e de evolução da aprendizagem da ortografia. De fato, as con-siderações sobre o erro, particularmente sobre o erro ortográfico, no capítulo 2, mobilizam no leitor importantes reflexões sobre o ensino da ortografia na escola. O capítulo 3 - Classifica-ção dos erros na escrita - traduz a experiência pessoal e profissional da autora, no trabalho clínico e no trabalho docente com professores, psicopedagogos e fonoaudiólogos.

Aqueles que procuram meios seguros e cientificamente comprovados para efetuar a avaliação das aquisições dos alunos em orto-grafia serão gratificados, no capitulo 5, com extensa e detalhada explanação do instrumento avaliativo criado e normatizado pela autora. O estudo de Moojen permite comparar os resul-tados coletivos e/ou individuais com os grupos normativos extraídos da população escolar de escolas públicas e privadas da cidade de Porto Alegre. Desse modo, é possível aferir-se o grau de discrepância dos resultados com relação ao esperado, de acordo com série escolar e classe social e, assim, identificar com maior segurança os casos que realmente configuram um proble-ma de aprendizagem e merecem atenção mais intensa e específica.

Nos capítulos 6, 7 e 8, a autora oferece estudos de caso, nos quais demonstra como analisa os resultados da aplicação do teste e como define o perfil ortográfico de uma turma ou de um aluno em particular. Inclui a discussão de um caso de dislexia, sendo de grande valor sua discussão acerca desse transtorno, tão divulgado e frequentemente mal compreendido. O acompanhamento dos progressos dos grupos de alunos e dos casos individuais também é descrito com base nes-ses casos concretos.

Por último, o leitor que está à procura de recursos para promover as aprendizagens na

ortografia também encontrará respostas, na terceira parte da obra. Os capítulos 9, 10 e 11 são dedicados a exemplificar estratégias de trabalho específicas, de acordo com os tipos de erros ortográficos, os quais a autora agrupa em três categorias: dificuldades derivadas da conversão fonema-grafema, problemas oriun-dos das regras contextuais da escrita e aqueles derivados das irregularidades da língua.

Na dimensão do tratamento das dificul-dades ortográficas oriundas da conversão fonema-grafema, Moojen pondera que as relações e correspondências entre fonemas e grafemas constituem as bases de qualquer escrita alfabética e, por isso, têm grande relevância para a consciência ortográfica. Essa importância justifica maior atenção para essas aquisições, mediante maior estí-mulo da oralidade, com uso de brincadeiras e experimentações com a linguagem oral. Apesar de reconhecer a relevância do as-pecto fonológico, a autora ressalta que não advoga a adoção de um método de alfabeti-zação essencialmente fônico, tendo em vista a contribuição de outros aspectos linguísticos para a aprendizagem da escrita.

Com amplos fundamentos teóricos e sólido enraizamento na prática, Moojen aborda, de modo equilibrado e judicioso, questões suscetíveis a intensas divergências em meios acadêmicos e educacionais. Uma delas, e talvez a mais sensível, diz respeito aos princí-pios metodológicos derivados da abordagem psicogenética ou da abordagem fonológica. Não encarando a questão como dilema ou como uma dicotomia (como querem as fac-ções pró e contra essas abordagens), a autora propõe a existência de uma interação entre a consciência fonológica, como aspecto básico da linguagem e da escrita alfabética, e a construção das hipóteses sobre a escrita. Tal posição é fundamentada em uma ampla pes-quisa, coordenada por Moojen e realizada por uma equipe multidisciplinar, no ano de 2000. Os objetivos, a metodologia e seus resultados encontram-se detalhados no capítulo final

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da obra e permitem compreender a mútua determinação entre habilidades derivadas da consciência fonológica e dos níveis de hipóteses da escrita. Moojen classifica as tarefas mais fáceis e as mais difíceis no ní-vel do fonema e da sílaba e identifica que o progressivo domínio da escrita alfabética influi no conhecimento metafonológico e, ao mesmo tempo, é beneficiado por ele.

A compreensão essencial que se apreende da leitura de seu livro é que a aprendizagem da escrita ortográfica é um processo evolutivo que integra diversos fatores interdependentes, desde a base neurológica e a consciência fono-

lógica até os fatores ambientais, como classe social e metodologia de ensino, onde o erro ortográfico assinala a existência de etapas no domínio da norma.

É importante destacar a grande contribuição do trabalho de Sonia Moojen para o Diagnóstico Psicopedagógico e, de modo especial, para o diagnóstico diferencial entre Dificuldades de Ortografia, Disortografia e Transtornos Severos de Aprendizagem da Leitura e da Escrita ou Dislexia.

Certamente, é um livro para quem quer fun-damentar e enriquecer sua prática pedagógica ou psicopedagógica.

Resenha realizada no Consultório particular das

autoras

Artigo recebido: 3/4/2010

Aprovado: 29/4/2010

A Revista Psicopedagogia, órgão de comunicaçãoda Associação Brasileira de Psicopedagogia, éindexada em: LILACS (Literatura Latino - Americanae do Caribe em Ciências da Saúde), BibliografiaBrasileira de Educação (BBE), Latindex (SistemaRegional de Información en Línea para RevistasCientíficas de América Latina, el Caribe, España yPortugal), CLASE (Citas Latinoamericanas emCiencias Sociales y Humanidades), EDUBASE(Faculdade de Educação, Universidade de Campinas),INDEX PSI (Conselho Federal de Psicologia),Catálogo Coletivo Nacional (Instituto Brasileiro deInformação em Ciência e Tecnologia) e DescriçãoBibliográfica da Fundação Carlos Chagas (DBFCC).Tem por objetivo publicar artigos inéditos na área depsicopedagogia, em especial: resultados de pesquisade caráter teórico/empírico; revisões críticas daliteratura de pesquisa educacional temática oumetodológica e reflexões críticas sobre experiênciaspedagógicas que ampliem e aprofundem oconhecimento na área e que não tenham sidopublicados em outros periódicos. A RevistaPsicopedagogia utiliza as normas Vancouver(Uniform Requirements for Manuscript Submitted toBiomedical Journals, organizadas pelo InternationalCommittee of Medical Journals Editors, disponíveisem http://www.icmje.org) e aceita para publicação asseguintes colaborações:

1. Artigo Original: relato completo de inves-tigação. Limitado a 20 laudas, sua estrutura deveconter: introdução, métodos (procedimentos básicos),resultados, discussão e conclusão. Deve conter ainda:resumo e summary, unitermos e key words.

2. Artigo de Revisão: revisão crítica da literaturaabordando conhecimentos sobre determinado temade forma abrangente, mediante consulta, análise einterpretação da bibliografia pertinente. Limite:20 laudas e deve incluir resumo, summary, unitermose key words.

3. Relato de Pesquisa ou Experiência: análise deimplicações conceituais/investigação e descrição depesquisas originais. Limite: 20 laudas e deve conter:resumo e summary, unitermos e key words.

4. Dissertação, Tese e Monografia: Limite:20 laudas e deve conter: resumo, summary, unitermose key words.

5. Resenha de Livros: abordagem de obra recém-publicada. Limite: 4 laudas. Dispensam resumo,summary, unitermos e key words.

6. Ponto de Vista: temas de relevância para oconhecimento científico e universitário apresentadosna forma de comentário que favoreçam novas idéiasou perspectivas para o assunto. Limite: 4 laudas.Dispensa resumo, summary, unitermos e key words.

7. Artigo Especial: textos elaborados a convite doeditor responsável, de grande relevância para aespecialidade, não classificáveis nas categorias deartigos listados anteriormente. Deve conter: resumo,summary, unitermos e key words.

8. Entrevista: com psicopedagogos ou estudiososde área correlata e/ou depoimentos de profissionaisque atuem no campo da Psicopedagogia.

INFORMAÇÕES GERAISOs artigos e correspondências deverão ser

enviados à:Revista da Associação Brasileira de Psicope-dagogiaRua Teodoro Sampaio, 417 - Cj. 1105405-000 - São Paulo - SP

Cada original deverá vir acompanhado de duasvias impressas e CD em sistema PC, fotografias,gráficos, etc. O conteúdo do material enviado parapublicação na Revista Psicopedagogia não pode tersido publicado anteriormente, nem submetido parapublicação em outros veículos. A Revista Psicope-dagogia possui os direitos autorais de todos os artigospor ela publicados. A reprodução total dos artigos emoutras publicações requer autorização por escrito doEditor. Todos os artigos publicados são revisados pormembros do Conselho Editorial, e a decisão sobre aaceitação do artigo para publicação ocorrerá, sempreque possível, no prazo de três meses a partir da data deseu recebimento. Na seleção dos artigos parapublicação, são avaliados a originalidade, a relevânciado tema e a qualidade da metodologia científicautilizada, além da adequação às normas editoriaisadotadas pela revista. Artigos recusados não serãodevolvidos ao autor. O Conselho Editorial reserva-se odireito de fazer pequenas modificações no texto dosautores para agilizar seu processo de submissão oupublicação. Quando da publicação, provas impressasserão enviadas aos autores, devendo ser revisadas edevolvidas no prazo de cinco dias. Caso os autores nãoas devolvam, indicando possíveis correções, o trabalhoserá publicado conforme a prova.

PREPARAÇÃO DOS TRABALHOSOs artigos podem ser escritos em português ou

espanhol, e devem se enquadrar em uma das diferentesseções da revista. O trabalho deverá ser redigido emcorpo 12 (Times New Roman), numa só face do papel,no máximo em 20 laudas de 30 linhas cada, espaço 1,5linha, com margem de 3cm de cada lado, no topo e nopé de cada página. Os manuscritos devem ser apre-sentados nesta seqüência: página título, resumos emportuguês e inglês (summary), key words, unitermos,texto, referências, tabelas e/ou ilustrações.

PÁGINA TÍTULODeverá conter:A) título do trabalho em português e inglêsB) nome, sobrenome do (s) autor (es) e instituição

pertencente (s);C) nome e endereço da instituição onde o trabalho

foi realizado;D) título resumido (não exceder quatro palavras);E) Carta de apresentação, contendo assinatura de

todos os autores, responsabilizando-se pelo conteúdodo trabalho, concordando com as normas depublicação e cedendo o direito de publicação à RevistaPsicopedagogia, porém apenas um deve ser indicadocomo responsável pela troca de correspondência. Deveconter telefone, fax e endereço para contato.

NORMAS PARA PUBLICAÇÃO

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F) Aspectos éticos – Carta dos autores revelandoeventuais conflitos de interesse (profissionais,financeiros e benefícios diretos ou indiretos) quepossam influenciar os resultados da pesquisa. Na cartadeve constar ainda a data da aprovação do trabalhopelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição àqual estão vinculados os autores.

ESTRUTURA DO TEXTOOs Artigos Originais devem conter, obrigato-

riamente:A) Introdução: Deve indicar o objetivo de

trabalho e a hipótese formulada;B) Métodos (Procedimentos Básicos): Breves

descrições dos procedimentos utilizados;C) Resultados: Síntese dos achados, podendo

ser apresentados com figuras ou tabelas queilustrem pontos importantes;

D) Discussão: Inclui o achado, a validade e osignificado do trabalho;

E) Conclusão: considerações finais.Referências a “ resultados não publicados” e

“comunicação pessoal” devem aparecer, entreparênteses, seguindo o(s) nome (s) individual (is) notexto. Exemplo: Oliveira AC, Silva PA e Garden LC(resultados não publicados). O autor deve obterpermissão para usar “comunicação pessoal”.

RESUMO e SUMMARYSão obrigatórios para os Artigos Especiais,

Artigos Originais, de Revisão, Relato de Experiênciaou Pesquisa, Dissertação, Tese e Monografia,devendo conter no máximo 250 palavras. Após oresumo deverão ser indicados no máximo seisUnitermos (recomenda-se o vocabulário controladodo “Decs-Descritores em Ciências da Saúde”,publicação da Bireme (www.bireme.br/terminologiaemsaude). O Summary (tradução doresumo para o inglês) deve acompanhar o mesmomodelo do resumo e ser seguido de Key words(tradução dos Unitermos para o inglês).

AGRADECIMENTOSApenas a quem colabore de modo significativo na

realização do trabalho. Devem vir antes dasReferências Bibliográficas.

REFERÊNCIASAs referências devem ser dispostas por ordem de

entrada no texto e numeradas consecutivamente deforma sobrescrita, sendo obrigatória sua citação.Exemplo: como já demonstraram diversos autores6,9,15.Devem ser citados todos os autores do trabalho,quando até seis; acima deste número, citam-se osseis primeiros seguidos de et al. O periódico deveráter seu nome abreviado segundo o Cummulated IndexMedicus ou, se não for possível, a AssociaçãoBrasileira de Normas Técnicas (ABNT). Exemplosde tipos de referências:

1. Padrão ( Só um autor)Noffs NA. A formação de educadores para uma

escola inclusiva. Rev Psicopedagogia 2002; 19: 41-4.2. Padrão (Entre dois e seis autores) Wippel MLM, Goulart DF, Moreira ALGB, Bozza

MGG. Capacidade para a prática interdisciplinar:um relato de experiência. Rev Psicopedagogia 2002;19: 66-73.

3. Padrão (Mais de seis autores)Araújo VJF, De Carlucci Jr D, Sasaki SU, Montag

E, Azato FN, Cordeiro NC, et al. Perfil da incidênciade câncer em hospital geral em São Paulo. Rev HospClin Fac Med Univ São Paulo 1998;53:110-3.

4. Ausência de autorCancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J

1994;84:15.5. Organização como autorSociedade Brasileira de Cardiologia. III

Diretrizes Brasileiras sobre dislipidemias. Arq BrasCardiol 2001;77:1-48.

6. Livros e outras obras monográficas - Autor(es)pessoal(is)

Gasparian MC. A Psicopedagogia institucionalsistêmica. São Paulo:Abril Cultural;1997.

7. Capítulo em um livroPiaget, J. Problemas de epistemologia genética.

In: Piaget J. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural;1978. p. 211-71.

8. Dissertação/TeseMendes MH. Psicopedagogia: uma identidade em

construção [Dissertação/Tese]. São Paulo:Univer-sidade São Marcos;1998.

9. Referência em formato eletrônicoFundação Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística – IBGE. Censo Demográfico e Estimativas,1996. Disponível no URL: http://www.ibge.gov.br

Os editores se dão ao direito de excluir refe-rências não indicadas no texto ou elaboradaserroneamente.

FIGURAS, TABELAS E GRÁFICOSSerão aceitas no máximo seis ilustrações por

artigo, as quais compreendem: figuras, tabelas,gráficos, diagramas, fotografias e desenhosesquemáticos. No caso de utilização de fotografiasou figuras, solicita-se o envio dos originais ou cópiasdigitalizadas em formato .TIF, com resolução mínimade 300 dpi. O aproveitamento ficará condicionado àqualidade do material enviado e devem serapresentados em preto e branco, em folhas separadase acompanhados de legenda que permita compreendero significado dos dados reunidos. Assinalar, no texto,pelo seu número de ordem, os locais em que os quadrose tabelas devem ser intercalados. Quando extraídosde outros trabalhos previamente publicados, devemvir acompanhados da permissão, por escrito, para asua reprodução.

ABREVIAÇÕES / NOMENCLATURA / NOTASDE RODAPÉ

O uso de abreviações deve ser mínimo. Quandoexpressões extensas devem ser repetidas, recomenda-se que suas iniciais as substituam após a primeiramenção. Esta deve ser seguida das iniciais entreparênteses. Notas de rodapé somente se estritamentenecessárias. Devem ser assinaladas no texto eapresentadas em folha separada, ou após asreferências, com subtítulo nota de rodapé.

La Revista Psicopedagogía, órgano decomunicación de la Asociación Brasileña dePsicopedagogía (Associação Brasileira de Psicope-dagogia) és indexada en: LILACS (Literatura Latino- Americana e do Caribe em Ciências da Saúde),Bibliografia Brasileira de Educação (BBE), Latindex(Sistema Regional de Información en Línea paraRevistas Científicas de América Latina, el Caribe,España y Portugal), CLASE (Citas Latinoamericanasem Ciencias Sociales y Humanidades), EDUBASE(Faculdade de Educação, Universidade deCampinas), INDEX PSI (Conselho Federal dePsicologia), Catálogo Coletivo Nacional (InstitutoBrasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia)y Descrição Bibliográfica da Fundação CarlosChagas (DBFCC). Tiene por objetivo publicarartículos en la área de psicopedagogía, en especial:resultados de investigación de carácter teórico /empírico; revisiones críticas de la literatura deinvestigación educacional temática o metodológicay reflexiones críticas respecto a experienciaspedagógicas que amplíen el conocimiento en el áreay que no tengan sido publicados en otros periódicos.La Revista Psicopedagogía emplea las normasVancouver (Uniform Requirements for ManuscriptSubmitted to Biomedical Journals, organizadas porel International Committee of Medical JournalsEditors, disponible en http://www.icmje.org) y aceptapara publicación lãs siguientes colaboraciones:

1. Artículo Original: relato completo de investi-gación. Limitado a 20 páginas, su estructura debecontener: introducción, métodos (procedimientosbásicos), resultados, discusión y conclusión. Debecontener aun: sumario y summary, palabras llave ykey words.

2. Artículo de Revisión: revisión crítica de la litera-tura abordando conocimientos respecto a determinadotema de manera a abarcar, por medio de consulta,análisis e interpretación de la bibliografía pertinente.Limite: 20 páginas y debe incluir sumario, summary,palabras llave y key words.

3. Relato de Investigación o experiencia: análisisde implicaciones conceptuales/investigación ydescripción de experimentos originales. Limite: 20páginas y debe contener: sumario y summary,palabras llave y key words.

4. Disertación, Tesis y Monografia: Límite: 20páginas y debe contener: sumario, summary, palabrasllave y key words.

5. Reseña de Libros: abordaje de obra recién-publicada. Límite: 4 páginas. No requieren sumario,summary, palabras llave y key words.

6. Punto de Vista: temas relevantes para elconocimiento científico y universitario presentados enla forma de comentarios que favorezcan nuevas ideas operspectivas para el asunto. Limite: 4 páginas. Norequiere: sumario, summary, palabras llave y key words.

7. Artículo especial: textos elaborados, ainvitación del editor, de gran importância para laespecialidad, no classificados en las categorias deartículos mencionados anteriormente. Debe contener:sumario y summary, palabras llave y key words.

8. Entrevista: con los psicopedagogos y estudiososde áreas semejantes y / o testimonios de los

profesionales que actúan en el ámbito de laPsicopedagogía.

INFORMACIONES GENERALESLos artículos y correspondencias deberán ser

enviados para: Revista da Associação Brasileira dePsicopedagogia

Rua Teodoro Sampaio, 417 - Cj. 1105405-000 - São Paulo - SP - Brasil

Cada original tiene que venir seguido de dos copias,inclusive con CD en sistema PC, fotografías, gráficos,etc. El contenido del material enviado para publicaciónen la Revista Psicopedagogía no puede Haber sidopublicado anteriormente, ni sometido para publicaciónen otros medios de comunicación. La Revista Psico-pedagogía posee los derechos de autoría de todos losartículos en ella publicados. La reproducción total delos artículos en otras publicaciones requiereautorización por escrito del Editor. Todos los artículospublicados son revisados por miembros Del ConsejoEditorial, y la decisión respecto a la aceptación delartículo para publicación ocurrirá, siempre queposible, en el plazo de tres meses a partir de la fecha desu recibimiento. En la selección de los artículos parapublicación, se evalúan la originalidad, la relevanciadel tema y la calidad de la metodología científicautilizada, además de la adecuación a las normaseditoriales adoptadas por el periódico. Artículosrecusados no serán devueltos al autor. El ConsejoEditorial se reserva el derecho de realizar pequeñasmodificaciones en el texto de los autores, para agilizarel proceso de sumisión o publicación. Cuando de lapublicación, pruebas impresas serán enviadas a losautores, debiendo ser revisadas y devueltos en el plazode cinco días. En el caso que los autores no lasdevuelvan indicando posibles correcciones, el trabajoserá publicado de acuerdo con la prueba.

PREPARACIÓN DE LOS TRABAJOSLos artículos pueden ser escritos en portugués o

español, y debem encuadrarse en una de las diferentessecciones de la revista. El trabajo deberá ser redactadoen cuerpo 12 (Times New Roman), en una sola faz(anverso) del papel, en el máximo de 20 páginas con30 líneas cada, espacio 1,5 línea, con margen de 3cmde cada lado, en el alto y al pie de cada página. Losmanuscritos deben ser presentados en esta secuencia:página título, sumarios en portugués y inglés(summary), key words, palabras llave, textos,referencias, tablas y/o ilustraciones.

PÁGINA TÍTULODeberá contener:A) título del trabajo en portugués y inglésB) nombre, apelido de lo(s) autor (es) y institución

a que pertenece(n);C) título resumido (no exceder quatro palabras);D) Carta de presentación, conteniendo firma de todos

los autores, haciendose responsables por el contenidodel trabajo, concordando con las normas de publicacióny cediendo el derecho de publicación a la Revista Psicope-dagogía, pero solamente uno de ellos debe ser indicadocomo responsable por la troca de correspondencia. Debecontener teléfono, fax y dirección para contacto.

NORMAS PARA PUBLICACIÓN

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E) Aspectos éticos – Carta de los autores revelandoeventuales conflictos (profesionales, financieros ybeneficios directos o indirectos) que puedan influenciarlos resultados de la investigación. En la carta deberáconstar aun la fecha de aprobación del trabajo por elComité de Ética en Investigaciones de la instituciónla cual se encuentran vinculados los autores.

ESTRUCTURA DEL TEXTOLos Artículos Originales deben contener,

obligatoriamente:A) Introducción: Debe indicar el objetivo del

trabajo y la hipótesis formulada;B) Métodos (Procedimientos Básicos): Breves

descripciones de los procedimientos empleados;C) Resultados: Síntesis de los dos hallazgos,

pudiendo ser presentados con figuras o tablas queilustren puntos importantes;

D) Discusión: Incluye el hallazgo, la validez y elsignificado del trabajo;

E) Conclusión: consideraciones finales.Referencias de “resultados no publicados” y

“comunicación personal” deben aparecer, entreparéntesis, siguiendo lo(s) nombre (s) individual (es)en el texto. Ejemplo: Oliveira AC, Silva PA y GardenLC (resultados no publicados). El autor debe obtenerpermisión para usar “comunicación personal”.

SUMARIO y SUMMARYSon obligatorios para los Artículos Especiales,

Artículos Originales, de Revisión, Relato deExperiencia o Investigación, Disertación, Tesis yMonografía, debendo contener en el máximo 250palabras. Tras el sumario deberán ser indicados en elmáximo seis palabras llave (se recomienda elvocabulario controlado del “Decs-Descriptores enCiencias de la Salud”, publicación de la Bireme(www.bireme.br/terminologiaemsaude). El Summary(traducción del sumario para el inglés) debeacompañar el mismo modelo del sumario y serseguido de key words (traducción de las palabras llavepara el inglés).

AGRADECIMIENTOSSolamente a quien colabore de manera signifi-

cativa en la realización del trabajo. Deben venir antesde las Referencias Bibliográficas.

REFERENCIASLas referencias deben ser dispuestas por orden de

entrada en el texto y numeradas consecutivamente demanera sobrescrita, siendo obligatoria su citación.Ejemplo: como ya manifestaran diversos autores6,9,15.Deben ser citados todos los autores del trabajo si sunúmero no es superior a seis; cuando superan estenúmero, se citan los seis primeiros seguidos de et al.El nombre de la revista debe ser abreviado según elCummulated Index Medicus o, si ello no fuere posible,según la Associação Brasileira de Normas Técnicas(ABNT). Ejemplos de tipos de referencias:

1. Estándar ( Solamente un autor)Noffs NA. A formação de educadores para uma

escola inclusiva. Rev Psicopedagogia 2002;19:41-4.

2. Estándar (Entre dos y seis autores)Wippel MLM, Goulart DF, Moreira ALGB, Bozza

MGG. Capacidade para a prática interdisciplinar:um relato de experiência. Rev Psicopedagogia2002;19: 66-73.

3. Estándar (Más de seis autores)Araújo VJF, De Carlucci Jr D, Sasaki SU, Montag

E, Azato FN, Cordeiro NC, et al. Perfil da incidênciade câncer em hospital geral em São Paulo. Rev HospClin Fac Med Univ São Paulo 1998;53:110-3.

4. Ausencia de autorCancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J

1994;84:15.5. Organización como autorSociedade Brasileira de Cardiologia. III

Diretrizes Brasileiras sobre dislipidemias. Arq BrasCardiol 2001;77:1-48.

6. Libros y otras obras monográficas - Autor(es)personal(es)

Gasparian MC. A Psicopedagogia institucionalsistêmica. São Paulo:Abril Cultural;1997.

7. Capítulo en un libroPiaget, J. Problemas de epistemologia genética.

In: Piaget J. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural;1978. p. 211-71.

8. Disertación/TesisMendes MH. Psicopedagogia: uma identidade em

construção [Dissertação/Tese]. São Paulo:Univer-sidade São Marcos;1998.

9. Referencia en formato electrónicoFundação Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística - IBGE. Censo Demográfico e Estimativas,1996. Disponível no URL: http://www.ibge.gov.br

Los editores se dan el derecho de excluir referenciasno indicadas en el texto o elaboradas erróneamente.

FIGURAS, TABLAS Y GRÁFICOSSerán aceptas el máximo de seis ilustraciones por

artículo, las cuales comprenden: figuras, tablas,gráficos, diagramas, fotografías y diseños esquemá-ticos. En el caso de empleo de fotografías o figuras, sesolicita el envío de los originales o copias digitalizadasen formato .TIF, con resolución mínima de 300 dpi.El aprovechamiento quedará condicionado a lacualidad del material enviado y deben ser presentadosen negro y blanco, en hojas separadas y seguidos deleyenda que permita entender el significado de losdatos reunidos. Señalar, en el texto, por su número deorden, los sitios en que los cuadros y tablas deben serintercalados. Cuando extraídos de otros trabajospreviamente publicados, deben venir seguidos depermisión, por escrito, para su reproducción.

ABREVIAMIENTOS / NOMENCLATURA/NOTAS DE RODAPIÉ

El uso de abreviamientos debe ser mínimo. Cuandoexpresiones extensas deben ser repetidas, se recomiendaque sus iniciales las reemplacen tras la primeramención. Esta debe ser seguida de las iniciales entreparêntesis. Notas de rodapié solamente se estrictamentenecesario. Deben ser señaladas em el texto y presentadasem hojas separadas, o trás las referencias, com subtítulonota de rodapié.

Revista de Psicopedagogia is a communication organ from Associação Brasileira de Psicopedagogia indexed in LILACS ( Latin Literature – American and Caribbean in Health Science, Brazilian Education Bibliography (BBE), Latindex (Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugual), CLA-SE (Citas Lationoamericanas em Ciencias Sociales y Humanidades), EDUBASE (Education College, Campinas University), INDEX PSI (Psychology Fe-deral Council) Catálogo Coletivo Nacional (Brazilian Information Institute in Science and Technology) and Carlos Chagas´ Bibliographic Description Foundation (DBFCC). It aims to publish unpublished articles on psychopedagogy, mainly: research results with practical/empirical character; critical review on educational researches literature or critical re-flections on pedagogical experiences that somehow can expand or deepen the knowledge of the area and those which have not been published before. Revista Psicopedagogia uses the standards from Vancouver (Uniform Requirements for Manuscript Submitted to Biomedical Journals, organized by International Committee of Medical Journals Editors, available at http://www.icmje.org) and is accepted for publication the following collaborations:

1. Original Articles: complete report of an in-vestigation. Up to 20 lauds. The manuscript must be arranged in the following order: introduction, methods (basic procedures), results, discussion and conclusion. It is also needed: abstract and summary, descriptors and keywords.

2. Review Articles: critical review of literature towards the knowledge on a specific topic, under conference, analysis and interpretation of a relevant bibliography. Up to 20 lauds and it must be included abstract, summary, descriptors and keywords.

3. Case Study: analysis of some investigation/conceptual implications and description of original researches. Up to 20 lauds. Abstract, summary, des-criptors and keywords must be included.

4. Dissertation, Thesis and Monograph: Up to 20 lauds and it is necessary: abstract, summary, descriptors and keywords.

5. Books Reviews: approach of a newly publi-shed publication. Up to 4 lauds. Abstract, summary, descriptors and keywords are no needed.

6. Point of View: relevant topics for the scientific area or for students, presented as a point of view which has the intention of discussing new ideas or perspectives on the issue. Up to 4 lauds. Abstract, summary and keywords are no needed.

7. Special Articles: manuscripts written under the editor ’s invitation. With a great relevance for the topic in discussion. It is not classified into the categories of the previous listed ones. It must have: abstract, summary, descriptors and keywords.

8. Interview: accountants from people directly involved in the areas: researchers, professionals or psychopedagogue.

GeneRAl InfORMATIOnThe manuscripts must be sent to: Revista da Associação Brasileira de Psicopeda-gogiaRua Teodoro Sampaio, 417 – Cj. 1105405-000 – São Paulo – SP – Brasil

Which original must be followed by 2 printed version and CD (for PC users), pictures, graphics, etc. The whole material sent to Revista Psicopeda-gogia must not be previous published in any other means of communication. The author(s) transfer(s) the article copyright to Revista de Psicopedagogia The reproduction of the articles in any other publi-cation requires the editor ’s authorization. All the articles are revised by the members of the Editorial Council, and the response of the manuscripts ac-ceptance will be available, as much as possible, in three months (from the arrival date). Besides the journal publication requirements adequacy, topic relevance, originality, quality of the scientific me-thods are evaluated in the articles for publication. Refused articles will not be sent to the author(s). The Editorial Council holds the right to make few changes in the articles in order to adequate and speed up the publication process. When the printed versions were sent to the author(s) for revisions, they must return in 5 days, if the manuscripts were not sent back with the modifications, the work will be published according to the first version.

MAnuSCRIPT PRePARATIOnThe articles must be written in Portuguese or

Spanish, and must be suitable for one of the sections of the journal. The work must be typed in Times New Roman 12, in one face of the sheet in 20 lauds of 30 lines each (1,5 spaced-lines). The margins must have 3 cm in each part (laterals, top and bottom). The manuscripts must be presented as the following sequence: title page, abstracts (Portuguese) and summary (English), keywords, descriptors, text, references, tables or/and illustrations.

TITle PAGeIt must be followed by:A) The manuscript name (in Portuguese and

English)B) First and last name of each author C) Name and address of the department (s) and

institution (s) to which the work should be attribute

D) A short title (up to 4 words)E) A letter of introduction. Each author must

sign the text taking the responsibility for the manuscript and in accordance with the RE-VISTA PSICOPEDAGOGICA publication re-quirements and also giving up the copyright for publication in the journal. Only one author should be elected to be in charge of exchan-ging mails ( Be sure to include the person’s

PuBlICATIOn RequIReMenTS

name, address, phone, FAX and e-mail)F) Ethical Aspects: A letter from the authors

revealing the conflicts of interests (financial professionals and direct or indirect benefits) that may influence the research results. An authorization from the Committee of Ethical Research of the institution or department where the author(s) is (are) linked must also be included.

TexT STRuCTuReThe original Articles must be followed by:A) Introduction: The objective of the work and

the hypothesis.B) Methodology: A short descriptions of the

procedures. C) Results: A summary of the findings (pictures,

tables can be used to illustrated the main points).

D) Discussion: The meaning, the relevance and the validity from the finding

E) Conclusion: Final considerationsReferences like “unpublished results” and

“personal communication” must appear between parentheses, followed by the individual name(s) in the text. Example: Oliveira AC, and Garden LC (un-published results). The author must obtain the sui-table permission to use “personal communication”

ABSTRACT AnD SuMMARYIt is needed for the Special Articles, Original

Articles, Review, Accountants of Experience or Research, Dissertation, Theses and Monograph. It must have up to 250 words. Be sure to indicate six descriptors (it is recommended from “Decs-Descritores em Ciência da Saúde”, BIREME, www.bireme.br/terminologiaemsaude). The summary needs to be similar to the abstract model and also with keywords.

ACKnOWleDGMenTSExclusively for those who collaborated in the

research. It must be posted in the bibliographical references.

BIBlIOGRAPhICAl RefeRenCeSThe references must be presented in the same

text order and consecutively numbered in the overwrite type. It is needed the appropriate citation. Example: As many authors have already demons-trated 6,9,15. All authors must be listed until 6; above this number, it is used to list the first 6 ones followed by et al. The name must be abbreviated according to Cummulated Index Medicus or, in case of impossibility, to Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Examples of References:

1. Standard (one author)Noffs NA. A formação de educadores para uma

escola inclusiva. Rev Psicopedagogia 2002;19:41-42. Standard (2-6 authors)Wippel MLM, Goulart DF, Moreira ALGB, Bozza

MGG. Capacidade para a prática interdisciplinar:

um relato de experiência. Rev Psicopedagogia 2002;19:66-73

3. Standard (more than 6 authors)Araújo VJF, De Carlucci Jr D, Sasaki SU, Montag

E, Azato FN, Cordeiro NC, et al. Perfil da incidência de câncer em hospital geral de São Paulo. Rev Hosp Clin Fac Univ São Paulo 1998;53:110-3.

4. Lack of authorshipCancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J

1994;84:155. Organizations as authorsSociedade Brasileira de Cardiologia. III Diretri-

zes Brasileiras sobre dislipidemias. Arq Bras Cardiol 2001: 77:1-48

6. Books and other monographic work – Personal Author(s)

Gasparian MC. A Psicopedagogia institucional sistêmica. São Paulo: Abril Cultural; 1997.

7. In booksPiaget, J. Problemas de espitemologia genéti-

ca. In: Piaget J. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural;1978.p.221-71.

8. Dissertations and ThesisMendes MH. Psicopedagogia: uma identi-

dade em construção [Dissertation/These]. São Paulo:Universidade São Marcos;1998.

9. In eletronic formatFundação Instituto Brasileiro de Geografia e Es-

tatística – IBGE. Censo Demográfico e Estimativas, 1996. Avaliable from: http://www.ibge.gov.br

The editors hold the right to exclude references that are not listed in the text or inappropriate men-tioned.

PICTuReS, TABleS AnD GRAPhICSIllustrations should be limited in 6 per article,

among pictures, tables, diagram, graphics and sche-matic drawings. In case of using pictures or drawing, it is necessary to send the original ones or digitalized copies in TIF format, with the minimum of 300dpi resolution. The will be used in the text if the quality of the materials were appropriate. The material should be send in black and write, in separated sheets and followed by a legend that allows the meaning com-prehension of the data. Make sure to signalize in the text, by using numbers, the correct place where the illustrations must be included. If the illustrations had been published before, a written authorization must follow them.

ABReVIATIOnS/ nOMenClATuReS /fOOT-nOTeS

The use of abbreviations must be minimum. When long expressions are repeated, it is recommended that the initials replace after its mention. These must be followed by their initials in parentheses. Footnote only when it is really needed. They must be marked in the text and presented in a separated sheet, or right after the bibliographical references marked as footnote.

PONTO DE VISTA

A Associação Brasileira de Psicopedagogia, ABPp, este ano completa 30 anos de existência como a única representante da Psicopedagogia no Brasil.

Nestes anos, a ABPp vem cuidando não apenas das questões referentes à formação, ao perfil e ao reconhecimento do profissional psicopedago-go, mas também tem protagonizado importantes conquistas, entre elas, a consolidação da Psicopedagogia junto à sociedade que já a legitimou pelo importante papel que desempenha na compreensão dos processos de ensino-aprendizagem.

Na busca e fidelização de seus ideais, um dos compromissos da ABPp é a construção de conhecimento. Nesse sentido, a ABPp está promovendo, ao longo de 2010, uma série de programações para comemorar e divulgar seus 30 anos de existência.

Assim sendo, a ABPp tem singular e grata satisfação em convidar todos os seus associados a participar deste momento tão significativo. Para tanto, criamos para esse ano um evento especial, composto de três partes. Nas próximas páginas seguem algumas informações.

Aguardamos sua visita no site www.abpp30anos.com.br, para saber mais sobre cada atividade programada e contar com a sua participação.

Cordialmente,

Quézia Bombonatto Presidente Nacional da ABPp

ApresentAção

Encontro com a Universidade Aprendizagem sob o enfoque

Psicopedagógico

Aos Coordenadores,A Associação Brasileira de Psicopedagogia, ABPp,

este ano completa 30 anos de existência como a única

representante da Psicopedagogia no Brasil. A ABPp é

uma entidade de caráter científico-cultural, sem fins

lucrativos, que congrega profissionais militantes na área

da Psicopedagogia e outras afins. Nestes anos, a ABPp

vem cuidando não apenas das questões referentes à

formação, ao perfil e ao reconhecimento do profissio-

nal psicopedagogo, mas também tem protagonizado

importantes conquistas, entre elas, a consolidação da

Psicopedagogia junto à sociedade que já a legitimou

pelo importante papel que desempenha na compreen-

são dos processos de ensino-aprendizagem. Na busca

e fidelização de seus ideais, um dos compromissos

da ABPp é a construção de conhecimento. Buscando

atender os parâmetros de cientificidade estabelecidos

pelos órgãos competentes no nosso país e enfatizando a

pesquisa e a produção científica no campo da Psicope-

dagogia, esta Associação tem procurado dialogar com

as instituições acadêmicas de todo o país, no sentido

de, juntos, construirem diretrizes para a formação do

psicopedagogo. Nesse sentido, a ABPp está promoven-

do, ao longo de 2010, uma série de programações para

comemorar e divulgar seus 30 anos de existência. Entre

elas a realização de palestras oferecidas, gratuitamente,

pelos membros da diretoria da ABPp, às universidades e

instituições de ensino que se manifestem interessadas.

A palestra a ser ministrada nessa ocasião, cujo tema é

“A Aprendizagem sob o enfoque psicopedagógico”,

tem como objetivo elucidar as questões relativas ao

processo de aprendizagem e como a práxis psicopeda-

gógica, dado seu caráter interdisciplinar, pode intervir

no desenvolvimento normal ou patológico de referido

processo, tendo em vista os aspectos cognitivos, afetivo-

emocionais e socioculturais que interferem na relação do

sujeito com o aprender ou, ainda, com o não aprender.

Assim sendo, a ABPp terá singular e grata satisfação em

compartilhar este momento tão significativo com esta

conceituada instituição. Para tanto, aguardamos sua

inscrição, sem ônus, por meio do site www.abpp30anos.

com.br, onde também as demais informações para a

participação deste projeto estão disponíveis, juntamente

com os outros eventos programados para este ano.

Sala Psicopedagógica On-line“Navegar no saber Psicopedagógico”

8 Evento on-lineA ABPp inova criando a Sala Psicopedagógica

on line.

Seis colóquios on-line, com profissionais reconhe-

cidos na área discutindo temas relevantes sobre o

aprender e o ensinar, respondendo, ao vivo, as per-

guntas dos participantes inscritos, possibilitando uma

efetiva interatividade.

Cada conferência oferece uma hora e meia de

interatividade!

DAtAs

26 de abril, 17 de maio, 7 de junho, 26 de julho,

23 de agosto e 20 de setembro.

Inscreva-se, assista e participe fazendo

perguntas ao vivo!

Certificado de participação nas 6 palestras.

ProgrAmAção

Salas Psicopedagógicas já realizadas (Disponíveis

para inscritos, mesmo depois da apresentação ao vivo)

Dra. Nadia Aparecida Bossa

A técnica e o instrumental no fazer psicopedagó-

gico: uma abordagem da prática

Edimara de Lima e Neide Aquino Noffs

Psicopedagogia: as diferentes expectativas, os dife-

rentes, olhares nas diferentes realidades escolares

Neander Abreu e maria Angélica rocha

Mecanismos biológicos da capacidade de

memorização

Palestrantes das próximas Salas:

Evelise Portilho e marisa Irene siqueira Castanho.

Erasmo Casella, Fábio Barbirato e

maria Irene maluf.

marcos mercadante e telma Pantano.

Certificado de participação na Sala

Psicopedagógica com carga horária de 15 horas

Simpósio InternacionalConhecer...Fazer...Compartilhar...

Ser PsicopedagogoDe 14 a 16 de outubro

Local: na UNIP, em São Paulo. Av. Vergueiro, 1211 - Paraíso - em frente à estação Vergueiro do Metrô.

Além de palestras e cursos, serão 5 Salas Psicopedagógicas com debates entre os palestrantes e simposiatas.

I. Psicopedagogia sob o enfoque da Neurociência, Neuropedagogia e Neuropsicologia

II. Psicopedagogia nas várias fases da vida

III. Psicopedagogia sob o enfoque da Psicanálise

IV. Psicopedagogia nas várias instituições: família, escola, hospital e empresa

V. Sala Psicopedagógica Virtual: videoconferências com debate mediado por palestrantes

Neste evento em comemoração aos 30 anos da ABPp, estamos trazendo uma nova modalidade de apresentação:

Alícia Fernandez e Victor da Fonseca participarão do Simpósio através de videoconferência, com mesa de debate

após as apresentações.

PArtICIPE!

Internacionais

P Alícia Fernandez (Argentina) - videoconferência

P Victor da Fonseca (Portugal) - videoconferência

P Márcia Melo (Portugal)

P Albertina Mitjáns Marinez (Cuba)

P Fernando Luiz Gonzáles Rey (Cuba)

Nacionais

P Ana Paula Loureiro e Costa

P Antônio Carlos Ronca

P Beatriz Scoz

P Cesar Moraes

P Dirce Encarnacion

P Dulce Consuelo

P Edith Rubinstein

P Eudes Moreira da Silva

P Eloisa Fagali

P Erasmo Casella

P Fabiani Ortiz Portella

P Fábio Barbirato

P Galeára Matos de França Silva

P Ingrid Taricano

P Laura Monte Serrat Barbosa

P Linamara Rizzo Battistella - Secretária de Estado dos

Direitos da Pessoa com Deficiência

P Maria Angélica Rocha

P Maria Cecília Castro Gasparian

P Maria Célia Malta Campos

P Maria José Weyne Melo de Castro

P Maria Irene Maluf

P Maria Luiza Puglise Munhoz

P Maria Tereza Andion

P Márcia Simões

P Mônica Mendes

P Neide de Aquino Noffs

P Neusa Hickel

P Nívea Maria de Carvalho Fabrício

P Quézia Bombonatto

P Roberto Gambini

P Silvia Ciasca

P Sônia Maria Colli

P Sônia Maria Kuster

P Telma Pantâno

P Yara Prates

PALEstrANtEs CoNVIDADos

A ABPp criou uma oportunidade única para o

estudante Universitário que deseja se iniciar na pro-

dução científica.

Os melhores trabalhos receberão uma menção

honrosa.

o que é o Fórum de Iniciação Científica?

É um espaço na Internet dedicado à publicação de

trabalhos de alunos da área de Psicopedagogia, no

início da carreira científica, a título de experiência.

Qual é o objetivo do Fórum?

Incentivar a produção científica na área da Psico-

pedagogia e proporcionar uma nova modalidade de

exposição de trabalhos, favorecendo o amadureci-

mento e o surgimento de novos talentos.

A ideia é que o público interessado possa ler e

compartilhar experiências com os estudantes, fazendo

comentários e discutindo pelo site os aspectos dese-

jados, enriquecendo e incentivando o aluno no início

de sua carreira.

todos os trabalhos postados no Fórum serão

publicados?

Não. Serão previamente analisados pela Comis-

são Científica do evento e deverão estar dentro das

normas exigidas para o Fórum.

Quem poderá ler os trabalhos publicados no

Fórum?

Todos os internautas interessados. Basta entrar

no site http://www.abpp30anos.com.br e acessar o

Fórum.

O Que é o Fórum e Normas para Publicações de Trabalhos?

Como é feita a interação entre o leitor do site e o autor de cada trabalho?

Para cada trabalho há um link para o leitor deixar, se desejar, seus comentários e perguntas a respeito do assunto apresentado. Para comentar o leitor deverá se registrar.

todos os comentários serão publicados?Não. Apenas os comentários que contribuírem para

o crescimento do aluno. Os demais serão encaminhados ao autor, a título de análise.

Qual a diferença entre enviar um trabalho para o Fórum de Iniciação Científica e para trabalhos Científicos?

Os trabalhos enviados para o Fórum serão analisa-dos pela Comissão Científica do evento como textos de iniciantes na área científica. Serão publicados apenas na Internet e, no final do evento, os melhores receberão uma menção honrosa.

Os trabalhos enviados como Trabalhos Científicos têm regras muito diferentes, são classificados nas ca-tegorias Pôster ou Apresentação Oral e avaliados com o critério próprio da produção científica. Os aprovados serão expostos em outubro de 2010, no IV Simpósio Internacional da ABPp - “Conhecer...Fazer...Compar-tilhar...Ser Psicopedagogo”.

Veja as normas para participação e a premiação para os melhores na página de Trabalhos Científicos, desse site.

somente as pessoas inscritas e em dia com os pagamentos poderão participar!

Primeiro Fórum de Iniciação Científica

Normas para envio dos trabalhos

FÓrUm DE INICIAção CIENtÍFICA

I. Apresentação

Nestes 30 anos de trabalho contínuo, a ABPp vem

cuidando das questões referentes à formação, ao perfil

e ao reconhecimento do profissional psicopedagogo.

Na busca e fidelização de seus ideais, um dos com-

promissos da ABPp é a construção de conhecimento e,

sendo assim, oportuniza neste momento, por meio do

FÓRUM DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, a valorização

do trabalho de novos talentos em nossa área, o desen-

volvimento do pensar cientificamente e da criatividade

decorrentes das condições criadas pelo confronto direto

com os problemas de pesquisa.

Além do enorme valor pedagógico, o Fórum de

Iniciação Científica constitui-se como um instrumento

de integração entre o autor da pesquisa e os internau-

tas, pois será possível que se façam comentários e/ou

perguntas sobre o trabalho científico, seja de caráter

teórico ou prático, apresentado e desenvolvido dentro

de princípios éticos.

II.Normas para entrega de resumos para o

Programa de Iniciação Científica

1. Só serão aceitos trabalhos em que pelo menos

um dos autores esteja matriculado regularmente

em um curso de Psicopedagogia ou de área afim,

graduação ou pós-graduação, e esteja inscrito em

um dos eventos do 1° Encontro de Aperfeiçoa-

mento Profissional e Científico da ABPp

2. Será permitido o envio de, no máximo, dois re-

sumos por participante.

3. Os trabalhos elaborados por alunos de gradua-

ção deverão ter obrigatoriamente, no elenco de

autores, o nome do professor orientador.

4. Serão observados e avaliados os seguintes crité-

rios de qualidade dos resumos: tema relevante,

objetividade e condução lógica, fontes utilizadas

(bibliografia), métodos e técnicas desenvolvidos,

discussão e conclusões.

5. Os resumos serão analisados quanto à adequa-

ção, à proposta do evento e ao cumprimento

das normas de apresentação definidas por esse

documento. A não observância dos critérios

estabelecidos impedirá a aceitação do trabalho.

6. O resumo deverá obrigatoriamente sumarizar

o trabalho em, NO MÁXIMO, 250 PALAVRAS.

O conteúdo do trabalho científico, sem foto-

grafias, documento no formato “Word (. doc)”,

com espaçamento entre linhas de 1,5cm, fonte

Times New Roman, tamanho 12 e margens de

2,5 cm. Sugestões para o conteúdo do resumo:

título: Um bom título permite aos leitores identi-

ficar o tema e ajuda aos centros de documentação

a catalogar e a classificar o material. O título de-

verá se limitar ao máximo de dez palavras e des-

crever de forma concisa e clara o tema do artigo.

objetivos: Explicar claramente, em poucas frases,

as premissas teóricas e justificativas do estudo.

material e métodos: A descrição deve ser clara

e suficiente para que outro pesquisador possa

reproduzir ou dar continuidade ao estudo. Des-

crever a metodologia estatística, permitindo que

qualquer leitor com razoável conhecimento sobre

o tema e acesso aos dados originais possa veri-

ficar os resultados apresentados. Evitar o uso de

termos imprecisos, tais como: aleatório, normal,

importante, etc, sem definí-los.

resultados: Devem ser apresentados de forma

sintética e clara. Tudo que conste deste ítem deve

haver sido extraído do método. O uso de análises

estatísticos descritivos e comparativos deve ser

estimulado.

Conclusões: São baseadas nos resultados obtidos.

referências bibliográficas.

7. O resultado da seleção dos temas livres enviados

será comunicado ao responsável pelo trabalho

exclusivamente por e-mail.

Investimento

Participando dos dois eventos você receberá um certificado de 40 horas.

Você pode optar em fazer a inscrição por evento (Opções B e C) ou inscrever-se nos dois eventos (Opção A), obtendo o desconto oferecido para esta modalidade, conforme valores abaixo.

Opção APACOTE - Simpósio Internacional e Sala Psicopedagógica On-line - Certificado de 40 horas

Pagamento à vista

Inscrição de fevereiro a 30/junho

Parcelado em 4x

Inscrição de fevereiro a 30/junho

Pagamento à vista

Inscrição de 1/julho a 1/outubro

Parcelado em 3 X

Inscrição de 1/julho a 1/agosto

Parcelado em 2 X

Inscrição de 1/julho a 1/setembro

Inscrição no local

Pagamento à vista

Profissionais R$ 470,00 4 x R$ 122,00 R$ 490,00 3 x R$ 168,00 2 x R$ 249,00 R$ 515,00

Estudantes R$ 375,00 4 x R$ 98,00 R$ 385,00 3 x R$ 132,00 2 x R$ 196,00 R$ 410,00

Associados ABPp R$ 350,00 4 x R$ 91,00 R$ 365,00 3 x R$ 125,00 2 x R$ 186,00 R$ 385,00

Titulares ABPp R$ 325,00 4 x R$ 85,00 R$ 340,00 3 x R$ 116,00 2 x R$ 173,00 R$ 360,00

NÃO HAVERÁ DEVOLUÇÃO DE VALORES DE INSCRIÇÕES. Para as categorias Associados e Titulares da ABPp é necessária a apresentação do comprovante e de estar em dia com a anuidade/10. A inscrição para Estudantes só é válida com apresentação do comprovante de matrícula de 2009. Os descontos não são cumulativos.

Opção BSimpósio Internacional - de 14 a 16 de outubro de 2010 - Certificado de Participação - carga horária de 25 horas

Pagamento à vista

Inscrição de fevereiro a 30/junho

Parcelado em 4x

Inscrição de fevereiro a 30/junho

Pagamento à vista

Inscrição de 1/julho a 1/outubro

Parcelado em 3 X

Inscrição de 1/julho a 1/agosto

Parcelado em 2 X

Inscrição de 1/julho a 1/setembro

Inscrição no local

Pagamento à vista

Profissionais R$ 380,00 4x R$ 99,00 R$ 400,00 3 x R$ 137,00 2 x R$ 204,00 R$ 440,00

Estudantes R$ 300,00 4x R$ 80,00 R$ 320,00 3 x R$ 110,00 2 x R$ 163,00 R$ 350,00

Associados ABPp R$ 285,00 4x R$ 75,00 R$ 300,00 3 x R$ 102,00 2 x R$ 153,00 R$ 330,00

Titulares ABPp R$ 265,00 4x R$ 70,00 R$ 280,00 3 x R$ 96,00 2 x R$ 143,00 R$ 310,00

NÃO HAVERÁ DEVOLUÇÃO DE VALORES DE INSCRIÇÕES. Para as categorias Associados e Titulares da ABPp é necessária a apresentação do comprovante e de estar em dia com a anuidade/2010. A inscrição para Estudantes só é válida com apresentação do comprovante de matrícula de 2010. Os descontos não são cumulativos.

Opção CSala Psicopedagógica On-line - veja o cronograma no site - Certificado de Participação - carga horária de 15 horas

Pagamento à vista

Inscrição de fevereiro a 30/junho

Pagamento à vista

Inscrição de 1/julho a 1/outubro

Profissionais R$ 190,00 R$ 220,00

Estudantes R$ 150,00 R$ 180,00

Associados ABPp R$ 132,00 R$ 165,00

Titulares ABPp R$ 122,00 R$ 155,00

NÃO HAVERÁ DEVOLUÇÃO DE VALORES DE INSCRIÇÕES. Para as categorias Associados e Titulares da ABPp é necessária a apresentação do comprovante e de estar em dia com a anuidade/2010. A inscrição para Estudantes só é válida com apresentação do comprovante de matrícula de 2010. Os descontos não são cumulativos.

.

O encontro é composto de 3 partes!Certificado com carga horária de 40 horas.

IV Simpósio Internacional

“Conhecer...Fazer...Compartilhar

...Ser Psicopedagogo”

Dias 14, 15 e 16 de outubro,

em São Paulo.

Sala Psicopedagógica On-line

“Navegar no saber Psicopedagógico”

Seis colóquios on-line,

ao vivo.

Encontro com a Universidade

“Aprendizagem sob o enfoque

Psicopedagogógico”

A ABPp oferece, graciosamente, uma palestra. Entre em contato conosco!

Telefone: (11) 3554-1758

Mais informações no site www.abpp30anos.com.br

ASSOCIADOS TITULARES PARA REVISTA Nº 82 – 2010

ALAGOAS

Maceió

ELIANE CALHEIROS CANSANÇÃ[email protected] (82) 3223-4258 – Farol

BAHIA

Feira de Santana

LOURDES MARIA DA SILVA [email protected](75) 3221-3456 – Mangabeira

Itabuna

GENIGLEIDE SANTOS DA [email protected](73) 3617-0372 – São Caetano

Salvador

ARLENE NASCIMENTO [email protected](71) 9983-0470 – Caminho das Árvores

DEBORA SILVA DE CASTRO [email protected](71) 3341-2708 – Candeal

IARA FERNANDES PEREIRA [email protected](71) 3351-9973 – Brotas

JOZELIA DE ABREU [email protected](71) 3341-2708 Caminho das Árvores

KARENINA [email protected](71) 3345-3535 – Pituba

MARIA ANGELICA MOREIRA [email protected](71) 3797-5270 – Pituba

SANDRA MARIA FURTADO [email protected](71) 3351-9973 – Itaigara

CEARÁ

Fortaleza

ANDRÉA AYRES COSTA DE [email protected](85) 3261-0064 – Aldeota

ELIANE CÁSSIA ROCHA [email protected](85) 3244-2820 – Dionísio Torres

GALEÁRA MATOS DE FRANÇA SILVA [email protected](85) 3264-0322 – Aldeota

GERALDO LEMOS DA [email protected](85) 3246-7000 – Dionísio Torres

MARIA JOSÉ WEYNE MELO DE CASTRO [email protected](85) 3261-0064 Parque Manibura

OTILIA DAMARIS [email protected](85) 3246-7000 – Dionísio Torres

Tianguá

GRAÇA MARIA DE MORAIS AGUIAR E [email protected](88) 9963-5854 – Centro

DISTRITO FEDERAL

Guará

ELINE LIMA M. DE [email protected](61) 3901-7583 – Vila Tecnológica

ESPÍRITO SANTO

Vitória

MARIA DA GRAÇA VON KRUGER [email protected](27) 3225-9978 – Praia do Canto

GOIÁS

Goiânia

CARLA BARBOSA DE ANDRADE [email protected](62) 3225-9805 – Setor Oeste

JANAÍNA CARLA R. DOS [email protected](62) 3241-7837 – Setor Sul

LUCIANA BARROS DE ALMEIDA [email protected](62) 3293-3067 – Setor Marista

MARISTELA NUNES [email protected](62) 3259-0247 – Nova Suíça

MATO GROSSO

Cuiabá

ÂNGELA CRISTINA MUNHOZ [email protected](65) 9214-4484 – Jardim Cuiabá

MINAS GERAIS

Campanha

RAMONA CARVALHO FERNANDEZ [email protected](35) 3261-2119 – Centro

Pouso Alegre

SÔNIA REGINA BELLARDI TAVARES [email protected](35) 3425-3456 – Santa Filomena

Uberlândia

SANDRA MEIRE DE OLIVEIRA R. [email protected](34) 3224-3687 – Lidice

Varginha

HELENA SCHERER [email protected](35) 3212-7296 – Novo Horizonte

JÚLIA EUGÊNIA GONÇ[email protected](35) 3222-1214 – Centro

MARIA CLARA R. R. [email protected]

(35) 3212-3496 – Centro

MARIA ISABEL SILVA PINTO REZENDE [email protected] (35) 3212-9120 – Jardim Andere

REGINA CLÁUDIA A. S. FERRAZ [email protected](35) 3214-5660 – Jardim Andere

PARÁ

Belém

CARMEM CYLBELLE PEREIRA ALVES VIÉ[email protected](91) 3259-3531 – São Braz

ELIANE SOUZA DE DEUS NETO [email protected](91) 3259-3531 – Cidade Velha

MARIA DE NAZARÉ DO VALE [email protected](91) 9981-2076 – São Braz

PARANÁ

Curitiba

ARLETE ZAGONEL [email protected](41) 3363-1500 – Santa Candida

CINTIA BENTO M. VEIGA [email protected](41) 3332-2156 – Rebouças

EVELISE M. LABATUT PORTILHO [email protected](41) 3271-1655 – Prado Velho

FABIANE CASAGRANDE C. O. [email protected](41) 3022-4041 – Batel

ISABEL CRISTINA HIERRO PAROLIN [email protected](41) 3264-8061 – Alto da XV

ISABELA CRISTINA DA [email protected]

(41) 3026-2865 – Cabral

LAURA MONTE SERRAT [email protected](41) 3363-1500 – Alto da Glória

REGINA BONAT PIANOVSKI [email protected](41) 3345-8798 – Portão

SONIA MARIA GOMES DE SÁ KUSTER [email protected](41) 3264-8061 – Centro

Foz do Iguaçu

ANA ZANIN ROVANI [email protected](45) 3025-6103 – Centro

Guarapuava

ADRIANA CRISTINE LUCCHIN [email protected](42) 3622-4022 – Trianon

Londrina

ROSA MARIA JUNQUEIRA [email protected](43) 3342-7308 Jardim Caiçaras

Maringá

GEIVA CAROLINA [email protected](44) 3261-4127 Vila Morangueira

IVONILCE FÁTIMA RIGOLIN [email protected](44) 3224-7752 – Zona 4

NERLI NONATO RIBEIRO [email protected](44) 3261-4887 Campus Universitário

São José dos Pinhais

LORIANE DE FÁTIMA FERREIRA [email protected] (41) 3282-9357 – Centro

PERNAMBUCO

Recife

DAISY FLORIZA C. [email protected](81) 3326-1927 – Boa Viagem

PIAUÍ

Teresina

AMÉLIA CUNHA RIO LIMA COSTAamé[email protected](86) 3233-2878 – Fátima

JOYCE MARIA BARBOSA DE [email protected](86) 3221-1013 – Centro/Sul

RIO DE JANEIRO

Ilha do Governador

DULCE CONSUELO RIBEIRO SOARES [email protected](21) 3366-2468 – Freguesia

Niterói

FÁTIMA GALVÃO PALMA [email protected](21) 2710-5577 – Icaraí

Rio de Janeiro

ANA MARIA ZENICOLA [email protected](21) 2556-3767 – Flamengo

ANA PAULA LOUREIRO E [email protected](21) 2436-1803 – Jacarepaguá

CLYTIA SIANO FREIRE DE [email protected](21) 2247-3185 – Ipanema

DIRCE MARIA MORRISSY [email protected](21) 2236-2012 – Copacabana

HELOISA BEATRIZ ALICE [email protected](21) 2259-9959 – Jardim Botânico

LUCIA HELENA MACHADO [email protected](21) 2239-5878 – Gávea

MARIA HELENA C. LISBOA [email protected](21) 2266-0818 – Humaitá

MARIA KATIANA VELUK [email protected](21) 2527-1933 – São Conrado

MARIA LÚCIA DE OLIVEIRA FIGUEIREDO [email protected](21) 9346-4020 – Botafogo

MARLENE DIAS PEREIRA [email protected] (21) 9739-5332 – Leblon

MARTHA IZAURA DO NASCIMENTO [email protected](21) 2570-0065 – Barra da Tijuca

RIO GRANDE DO NORTE

Natal

EDNALVA DE AZEVEDO [email protected](84) 3221-6573 – Lagoa Seca

SONIA APARECIDA MONÇÃO GONÇ[email protected](84) 3211-4220 – Ribeira

RIO GRANDE DO SUL

Porto Alegre

CLARA GENI BERLIM [email protected](51) 3221-1740 – Santana

SANDRA MARIA CORDEIRO SCHRÖEDER [email protected](51) 3328-3872 Chácara das Pedras

SONIA MARIA PALLAORO MOOJEN [email protected](51) 3333-8300 – Petrópolis

SANTA CATARINA

Florianópolis

ALBERTINA C. MATTOS [email protected](48) 3244-5984 – Estreito

ANA CRISTINA BARBOSA [email protected](48) 3223-0641 – Centro

ELZA ADELE GUERRA [email protected](48) 3232-4031 – Centro

JANICE MARIA [email protected](48) 8453-7791 – Ingleses

MARIA LÚCIA ALMADA [email protected](48) 3331-1952 – Trindade

SÃO PAULO

Araraquara

ALINE RECK PADILHA ABRANTES [email protected](11) 3335-7440 – Centro

Cotia

MARIA CECILIA CASTRO GASPARIAN [email protected](11) 4702-2192 – Granja Viana

Jacareí

ANA MARIA LUKASCHEK [email protected](12) 3951-7929

Ribeirão Preto

ANA LUCIA DE ABREU [email protected](16) 3021-5490 – Jardim Sumaré

Santos

ANGELA COTROFE RODRIGUES [email protected](13) 3232-5020 – Boqueirão

São Bernardo do Campo

BEATRIZ PICCOLO [email protected](11) 4368-0013 – Rudge Ramos

São Paulo

ADA MARIA GOMES [email protected](11) 2261-2377 – Jardim França

ANA LISETE P. [email protected](11) 3885-7200 – Jardim Paulista

BEATRIZ JUDITH LIMA [email protected](11) 3651-9914 Alto de Pinheiros

CARLA [email protected](11) 3815-5774 – Vila Madalena

CLEOMAR LANDIM DE [email protected](11) 9302-5501 – Moema

CRISTINA DIAS [email protected](11) 3021-1583 Alto de Pinheiros

DILAINA PAULA DOS [email protected](11) 6255-8477 – Santana

ELOISA QUADROS [email protected](11) 3864-2869 – Perdizes

HERVAL G. [email protected](11) 3257-5106 – Higienópolis

LEDA MARIA CODEÇO [email protected](11) 3082-4986 – Vila Olímpia

LUCIA BERNSTEIN [email protected](11) 3209-8071 – Aclimação

MÁRCIA ALVES SIMÕ[email protected](11) 8192-0921 – Tatuapé

MARGARIDA AZEVEDO [email protected](11) 3021-8707 Alto de Pinheiros

MARIA BERNADETE GIOMETTI PORTÁ[email protected](11) 2950-6072 – Santana

MARIA CÉLIA R. MALTA [email protected](11) 3819-9097 – Alto de Pinheiros

MARIA CRISTINA [email protected](11) 5081-2057 – Vila Mariana

MARIA DE FATIMA MARQUES [email protected](11) 3052-2381 – Jardim Paulista

MARIA IRENE [email protected] (11) 3258-5715 – Higienópolis

MARIA TERESA MESSEDER [email protected](11) 3023-5834 – Alto de Pinheiros

MARISA IRENE S. CASTANHO [email protected](11) 3491-0522 – Ipiranga

MÔNICA HOEHNE [email protected](11) 5041-1988 Alto de Pinheiros

NÁDIA APARECIDA [email protected](11) 2268-4545 – Mooca

NEIDE DE AQUINO [email protected](11) 3670-8162 – Perdizes

NIVEA MARIA DE CARVALHO [email protected](11) 3868-3850 – Perdizes

QUÉZIA BOMBONATTO [email protected](11) 3815-8710 – Vila Madalena

SANDRA G. DE SÁ KRAFT MOREIRA DO [email protected](11) 3805-9799 – Morumbi

SANDRA LIA NISTERHOFEN SANTILLI [email protected](11) 3259-0837 – Higienópolis

SILVIA AMARAL DE MELLO [email protected](11) 3097-8328 – Pinheiros

SONIA MARIA COLLI DE SOUZA [email protected](11) 3287-8406 – Bela Vista

TELMA [email protected](11) 3062-6580 – Jardins

VALÉRIA RIVELLINO [email protected](11) 5041-7896 – Brooklin

VÂNIA CARVALHO BUENO DE [email protected](11) 3865-2155 – Perdizes

VERA MEIDE MIGUEL [email protected](11) 3511-3888 – Pacaembu

WYLMA FERRAZ [email protected](11) 3721-6421 – Morumbi

YARA [email protected](11) 2976-8937 – Vila Ester

Valinhos

SILVANA [email protected](19) 3829-1704 – Recanto

Vinhedo

CRISTINA VANDOROS QUILICI [email protected](19) 9259-6652 – Portal Itália

SERGIPE

Aracaju

AUREDITE CARDOSO [email protected](79) 3211-8668 – São José

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