TRATADO SOBRE RESIDUOS

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TRATADO SOBRE RESÍDUOS [23] PREÂMBULO Considerando que: 1. Os recursos naturais da Terra são limitados e devem ser utilizados de forma responsável, socialmente justa e ambientalmente sustentável. 2. A cooperação ativa entre os povos, o respeito aos direitos humanos e à democracia participativa, incluindo o acesso à educação e à informação imparcial, são pré-requisitos básicos para uma sociedade justa, pacífica e igualitária. 3. A sociedade como um todo, em particular as classes carentes, sofre os impactos na sua saúde, bem como arca com o custo sócio-econômico da contaminação dos alimentos, água e solo, além da poluição do ar, causados pelo atual modelo de desenvolvimento sócio-econômico dominante. 4. A indiscriminada produção de resíduos causa grave desequilíbrio ambiental, o qual ameaça a integridade dos ecossistemas e intensifica os danos ao bem estar social, econômico e cultural dos habitantes da Terra. 5. As legislações e regulamentações nacionais e internacionais sobre diferentes categorias de resíduos, tais como urbano, industrial, perigoso e nuclear, são altamente ambíguas e heterogêneas de país para país, representando, portanto grande obstáculo a uma ação global efetiva e ambientalmente sadia. 6. As comunidades não exercem controle sobre a produção, transporte, importação e exportação, tratamento, liberação e destinação final dos resíduos, apesar de serem as mais ameaçadas pelas atividades de manejo dos mesmos. 7. Considerando ainda as propostas contidas na “Agenda Ya Wananchi – Plano de Ação dos Cidadãos para a Década de 90”, adotada na Conferência Global de ONGs, ocorrida em Paris, em dezembro de 1991, os cidadãos representantes das ONGs e Movimentos Sociais de todo o mundo, reunidos no Fórum Internacional de ONGs e Movimentos Sociais “Compromissos para o Futuro”, ocorrido no Rio de Janeiro, em junho de 1992, então comprometidos a fazer escolhas responsáveis para o bem das gerações futuras, adotam os seguintes princípios e compromissos, como plataforma básica para ações futuras. PRINCÍPIOS 1. As forças sociais, em todos os países, devem trabalhar para atingir o nível zero na produção de resíduos perigosos e nucleares.

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1. Os recursos naturais da Terra são limitados e devem ser utilizados de forma responsável, socialmente justa e ambientalmente sustentável. 3. A sociedade como um todo, em particular as classes carentes, sofre os impactos na sua saúde, bem como arca com o custo sócio-econômico da contaminação dos alimentos, água e solo, além da poluição do ar, causados pelo atual modelo de desenvolvimento sócio-econômico dominante. Considerando que: PRINCÍPIOS [23]

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TRATADO SOBRE RESÍDUOS[23]

PREÂMBULO

Considerando que:

1. Os recursos naturais da Terra são limitados e devem ser utilizados de formaresponsável, socialmente justa e ambientalmente sustentável.

2. A cooperação ativa entre os povos, o respeito aos direitos humanos e àdemocracia participativa, incluindo o acesso à educação e à informaçãoimparcial, são pré-requisitos básicos para uma sociedade justa, pacífica eigualitária.

3. A sociedade como um todo, em particular as classes carentes, sofre osimpactos na sua saúde, bem como arca com o custo sócio-econômico dacontaminação dos alimentos, água e solo, além da poluição do ar, causadospelo atual modelo de desenvolvimento sócio-econômico dominante.

4. A indiscriminada produção de resíduos causa grave desequilíbrio ambiental, oqual ameaça a integridade dos ecossistemas e intensifica os danos ao bemestar social, econômico e cultural dos habitantes da Terra.

5. As legislações e regulamentações nacionais e internacionais sobre diferentescategorias de resíduos, tais como urbano, industrial, perigoso e nuclear, sãoaltamente ambíguas e heterogêneas de país para país, representando, portantogrande obstáculo a uma ação global efetiva e ambientalmente sadia.

6. As comunidades não exercem controle sobre a produção, transporte,importação e exportação, tratamento, liberação e destinação final dos resíduos,apesar de serem as mais ameaçadas pelas atividades de manejo dos mesmos.

7. Considerando ainda as propostas contidas na “Agenda Ya Wananchi – Planode Ação dos Cidadãos para a Década de 90”, adotada na Conferência Global deONGs, ocorrida em Paris, em dezembro de 1991, os cidadãos representantesdas ONGs e Movimentos Sociais de todo o mundo, reunidos no FórumInternacional de ONGs e Movimentos Sociais “Compromissos para o Futuro”,ocorrido no Rio de Janeiro, em junho de 1992, então comprometidos a fazerescolhas responsáveis para o bem das gerações futuras, adotam os seguintesprincípios e compromissos, como plataforma básica para ações futuras.

PRINCÍPIOS

1. As forças sociais, em todos os países, devem trabalhar para atingir o nívelzero na produção de resíduos perigosos e nucleares.

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2. A adoção de qualquer nova tecnologia ou processo industrial deve serprecedida de um princípio preventivo com relação à produção de resíduos. Émais sábio preveni-los do que remediar seus impactos negativos na saúdehumana e meio ambiente.

3. Todos os principais programas de educação ambiental devem enfatizar aimportância de uma cultura pluralista, o respeito às tradições locais relativas aouso de recursos naturais, e ao estilo de vida de cada população.

4. A sociedade como um todo tem direito de acesso à informação ampla eirrestrita sobre todos os passos da produção e administração de resíduos,incluindo as diversas formas de armazenagem, transporte e destinação final dosmesmos. A sociedade também tem o direito ao acesso ilimitado e àdisseminação de informações sobre quantidade todos os tipos de resíduosproduzidos e os riscos envolvidos, em qualquer parte do mundo onda não hajaalgum tipo de controle, restrição ou censura.

5. O impacto imediato do resíduo urbano é local, e a solução deste problemadeve, portanto, ser iniciada a nível local, a partir da introdução de alternativasambientalmente sadias. A tomada de decisões deve incluir a participaçãopopular, não devendo estar sob controle exclusivo das autoridades.

6. Os problemas gerados pelos resíduos industriais, perigosos e nuclearesexistentes devem ser prevenidos, e soluções devem ser encontradas pelospróprios produtores. Tais soluções devem ser licenciadas e controladas pelasautoridades, bem como por grupos de pessoas eleitos para essa função. Todosos custos de manuseio e limpeza, diretos ou indiretos, devem ser assumidospelos próprios produtores dos resíduos. A segurança e a saúde dostrabalhadores deve estar garantida.

7. Com o objetivo de substituir a produção de energia nuclear, governos eindústrias devem incentivar investimentos em pesquisas sobre tecnologias deenergia renovável.

8. A adoção de regulações nacionais e internacionais dirigidas ao implementode tecnologias de produção final limpas, que minimizem resíduos em suasorigem e eliminem materiais de embalagem que não sejam bio-degradáveis,reutilizáveis ou recicláveis, é um passo essencial para a criação de novasatitudes sociais, bem como para prevenir os impactos negativos do consumismoilimitado.

9. Os métodos de reciclagem informais, existentes atualmente em muitascidades, devem fornecer a base para o desenvolvimento de esquemas públicosde recuperação de matérias-primas nos resíduos urbanos. Entretanto, é damaior importância considerar as necessidades dos setores mais pobres dasociedade, os quais se acham dependentes da renda obtida com materiaisreciclados.

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10. Legislações ambientais mais severas e completas, vigentes em qualquerpaís, devem ser estendidas à comunidade global, como medida de emergência.A longo prazo, novas regulamentações globais de produção e controle deresíduos, bem como códigos para o exercício destas atividades, devem serimplementados, baseados em avaliações independentes e realistas sobre osimpactos dos resíduos na biosfera, bem como sobre a saúde e integridadereprodutiva de todas as espécies.

11. Resíduos industriais, perigosos e nucleares devem ser armazenados emantidos no país de origem, mesmo que sejam considerados bens econômicos.Multinacionais devem ser proibidas de tomar decisões sobre em que localdevem ser mantidos tais resíduos.

12. Todos os resíduos militares devem obedecer às normas e legislações a queestão sujeitos outros tipos de resíduos.

13. Os países não devem incomodar seus vizinhos, relativamente à destinaçãofinal de seus resíduos.

14. Os compromissos relativos à ações organizacionais entre ONGs devem estarconcluídos no mundo todo, em um ano.

PLANOS DE AÇÃO E COMPROMISSOS

1. Desenvolver, através das redes internacionais disponíveis, um levantamentopermanente de acidentes, rotas de transporte e problemas latentes, relativos aresíduos nucleares e perigosos, incluindo localização, datas, agentes envolvidos,soluções e resultados.

2. Promover a formação de redes de comunicação locais, regionais einternacionais, para compartilhar informações e organizar grupos de pressãoque possam atuar conjuntamente no controle, denúncias, ações desolidariedade, e, em caso de violação grave, boicotes pela luta por justiça,saúde, e sustentabilidade ambiental a nível global.

3. Incentivar o desenvolvimento de pesquisas, acessíveis a todos, visando acriação de uma rede de bancos de dados, sobre tecnologias específicas epadrões de serviços, qualidade e custos na administração de resíduos, de formaa oferecer às comunidades locais as bases necessárias para tomada de decisõesresponsáveis.

4. Estimular organizações internacionais para o estabelecimento de uma redeinternacional de treinamento em liberação de resíduos.

5. Exigir a realização de levantamentos e estudos sobre impacto ambiental,antes de implementação de qualquer atividade que gere resíduos e que possacausar danos ao meio ambiente ou às comunidades, as quais terão participação

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prioritária na avaliação de tais estudos, inclusive com poder de veto aosprojetos.

6. Defender novos estilos de vida, que possam promover integralmente oequilíbrio entre a saúde pública e a saúde dos ecossistemas, de forma aviabilizar um modelo de desenvolvimento econômico e social que não ameace omeio ambiente nem gere resíduos tão perigosos e incontroláveis.

7. Identificar e articular especialistas e centros de referência através da criaçãode uma rede internacional para esta finalidade, de forma a oferecer assistênciatécnica independente a movimentos locais, em questões relativas a resíduos.

8. Influenciar os governos a desenvolverem políticas abrangentes e efetivas naadministração de resíduos e legislações que observem os mais altos padrõesinternacionais de saúde humana e ambiental, bem como a estabelecerem umcódigo de prática internacional com relação aos resíduos.

9. Pressionar os empresários a diminuírem a produção de resíduos, através dodesenvolvimento e implementação de tecnologias de produção mais “limpas”.

10. Exigir responsabilidade pública na determinação de como manejar resíduos.

11. Proibir o lançamento de resíduos sem tratamento na água, no solo, no ar eno espaço cósmico.

12. Pressionar governos locais, regionais e nacionais para adoção demecanismos legais, financeiros e de controle, que garantam:

q a responsabilidade dos produtores de resíduos com relação aos efeitos dosmesmos no meio ambiente e nos seres vivos;

q a proibição definitiva da importação e exportação de resíduos;q a proibição da construção e uso de incineradores e tecnologias similares,

que apenas mudam o estado físico dos resíduos;q a educação e o rigor no licenciamento minucioso para os transportadores de

resíduos.

13. Pressionar para que todas as corporações em nossos países assumampadrões de trabalho e segurança tão altos quanto os mais altos estabelecidosem qualquer país.

14. Rejeitar a exportação de metodologia, atualmente em uso em muitospaíses, para a avaliação dos impactos na saúde e meio ambiente, de diversasatividades designadas “avaliação de riscos à saúde”, por serem meramentemodelos estatísticos de manipulação, justificando mortes.

15. Pressionar os governos para que exijam que o tratamento, isolamento edestinação dos resíduos seja feito nos países de origem, com base naresponsabilidade total por parte dos produtores de tais resíduos. Tal

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responsabilidade inclui a obrigação de restaurar, descontaminar e recuperarqualquer área que tenha sido afetada por qualquer tipo de resíduo.

16. Estabelecer campanhas para exigir o direito ao público de ser informadosobre produção, uso e comércio de qualquer tipo de resíduo.

17. Denunciar sistematicamente qualquer prática nociva e ilegal referente aomanejo de qualquer espécie de resíduo, a nível nacional e internacional.

Em relação a resíduos urbanos

18. Promover campanhas educativas visando a mudança de valores e estilos devida, de forma a diminuir a produção de resíduos.

19. Organizar campanhas voltadas à eliminação de embalagens que não sejamrecicláveis, biodegradáveis ou reutilizáveis.

20. Exigir a seleção na fonte para a coleta de resíduos urbanos, de forma aaumentar as possibilidade de reciclagem e evitar riscos de contaminaçãodecorrentes da não-seleção.

21. Pressionar os governos locais e nacionais a implementarem sistemasdescentralizados de administração de resíduos, utilizando tecnologia adequadaao ambiente local, bem como apropriada a seu contexto sócio-cultural.

22. Promover campanhas educativas a nível local, regional e internacional, parareduzir, reutilizar e reciclar os resíduos, ao máximo grau possível.

23. Dirigir campanhas educativas para que os cidadãos tomem consciência deseus direitos de acesso total e irrestrito aos serviços públicos de coleta,tratamento e disposição final de resíduos inevitáveis. Tais serviços devem serde boa qualidade e ter um custo legítimo.

24. Mobilizar a sociedade contra a instalação de novos incineradores e a favorda desativação dos já existentes.

25. Pressionar os organismos governamentais a estabelecerem planosinstitucionais de administração de resíduos, incluindo campanhas educativas,coleta, marketing de recicláveis, destinação final ambientalmente segura eaquisição de mercadorias de conteúdo reciclável.

Em relação a resíduos perigosos

26. Pressionar os governos locais, regionais e nacional a estabeleceremmecanismos legais, financeiros e de controle que garantam;q o decréscimo da produção de resíduos perigosos, levando as indústrias a

introduzirem tecnologias preventivas e substitutivas daquelas que gerem

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tais resíduos, tanto na forma de resíduos industriais como na forma debens de consumo;

q a publicação regular e controle rigorosos das rotas de transporte desubstâncias químicas perigosas, de e para seus locais de produção. No casode transporte regular através de áreas habitadas, deve haver uma préviaavaliação pública dos riscos, segundo a qual a população potencialmenteafetada aprovará ou não o uso de tais rotas;

q a proibição da importação de tecnologias que gerem resíduos perigosos, eque tenham sido rejeitadas em seus países de origem, incluindo a denúnciasistemática da prática de empréstimos financeiros vinculados a aceitação detais tecnologias.

27. Formar grupos de pressão para a taxação do uso de produtos químicos eseu despejo pela indústria, como um desestímulo ao uso abusivo de taisprodutos. Os fundos arrecadados com tal tributo serão destinados àscomunidades, de forma que possam contratar seus próprios técnicos ecientistas para conduzir estudos e elaborar relatórios ambientais. Desta forma,a população estaria habilitada para inspecionar e supervisionarpermanentemente as instalações industriais, a informação sobre substânciasquímicas e utilizadas por grupos econômicos, bem como sobre suasarmazenagem e disposição final. Tais informações estarão disponíveis semqualquer ônus, à toda a população.

28. Pleitear uma revisão imediata na política e legislação referentes ao uso ecomercialização de todos os produtos agro-químicos, bem como proibir suaexportação e tráfico, no caso de terem sido probidas em seu país de origem.

Em relação a resíduos nucleares

29. Providenciar a inclusão, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, deuma artigo que amplie o espectro dos direitos do homem, abrangendo asegurança ecológica e, em particular, segurança contra irradiação.

30. Mobilizar a sociedade para a elaboração de legislações nacionais einternacionais que contenham os seguintes elementos:

q proibição definitiva da construção de instalações nucleares;q desativar e substituir os reatores nucleares existentes, divulgando os

métodos, critérios e prazos empregados nesse processo;q proibição da queima de plutônio;q os resíduos nucleares devem ser armazenados de forma controlada e

recuperável, de maneira que as futuras geração possam reembalá-los emantê-los em segurança;

q proibição do uso de fontes lacradas por irradiação de alimentos exploraçãode petróleo, e solução final adequada para aquelas já existentes;

q garantir que o tratamento e armazenagem dos resíduos nucleares sejamfeitos nos países de origem, dentro do princípio da total responsabilidadepor parte dos produtores de tais resíduos. Tal responsabilidade inclui a

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obrigação de restaurar, descontaminar e recuperar, descontaminar erecuperar qualquer área que tenha sido afetada por vazamentosradioativos;

q iniciar, efetivamente, o controle, administração e isolamento de resíduosnucleares de uso hospitalar;

q deve haver supervisão por parte da saúde pública e assistência médica paraos trabalhadores e outras pessoas expostas a acidentes nucleares.Informações sobre tais acidentes devem ser divulgadas por sistemas deinformática.

31. Exigir proteção contra os perigos da radiação, para os trabalhadores deinstalações nucleares.

32. Promover e reforçar a proibição da mineração de urânio e do transporte deplutônio, tanto dentro dos países como entre si.

33. Lutar em todos os países, por zonas livres de radiação nuclear.