7/22/2019 As Flores Do Mal 01
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O sorvete de morango, sim, o sorvete de morango,
agradvel sorvete de morango, me recorda o chicote de couroque o meu bisav utilizava em seu jumento, me lembro bem
dessa cena, o som do chicote cortando o ar, eu prendia a
respirao quando ele erguia o brao segurando firme aquele
chicote, e depois da sonoridade daquele impacto de couro com
couro, eu ria, isso porque Samanta no estava l. Samanta!
Oh, bela menina de olhos castanhos como o couro do chicote,cabelos negros em caracis, aquela maravilhosa e pervertida
menina, se entregava a mim sem pudor, recitando versos de
Garcia Lorca, me gritava ao ouvido quando chegava ao
orgasmo:
Shakespeare Deus!
Na verdade, eu tinha muito medo. No fogoa lenha, permanecia algumas brasas vivas, l fora, no terreiro,
havia um pssaro estranho passeando por baixo do umbuzeiro,
Samanta dormia ainda nua em uma esteira, e uma cobra
deslizava pelo telhado. No havia rudo algum, apenas uma
cintilao e ao longe sons de sininhos. Se houvesse um modo
de eu me mover... mas no havia, eu era um mero espectador,sentado numa cadeira de madeira e couro diante da porta e
prximo da esteira onde Samanta dormia. O pssaro estranho
sumiu por alguns instantes e passou diante da porta, parou,
entrou, dirigiu-se esteira onde estava Samanta e muito
rapidamente subiu em seu ventre e ali ficou em p, imvel, em
cima daquele belo corpo nu. L fora, milhares de pssarosestranhos idnticos estavam parados, todos olhando em
direo da casa.
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E quantas vezes na multido eu morri e agora ressurretotento erguer-me e caminhar. E ganhar o mundo, ganhar o
mundo. Mas ganhar o mundo, no ganhar mundoliteralmente. ganh-lo na metfora de uma estrada que dpara outra estrada, que d para vrias estradas, que do parainterminveis estradas reticncias, que do para o ednicovazio silencioso do nada onde te encontro, me ajoelho diantede ti, me confesso, rogo e rezo.
Mas posso tambm um dia acordar e no quererentender tua loucura insensata, teu egosmo, tua falta mnimade vontade para com o que bom, para com o que d frutosno venenosos e abastece a alma com o sumo da leveza,levando o corpo a voar sobre as ridculas dificuldades e falsasnecessidades cotidianas que nos atormentam, nos roubandoo que temos de melhor: a paz de esprito, o tempo para criar,
acorrentando-nos a um padecimento desprovido de sentido;pois se como dizem: o sofrimento liberta..., muitos queremser escravos sem sofrer, e alguns j o so.Posso amanhecer injuriado, cuspindo bala, e profanar tuasepultura, mijar na tua cara polida estampada na gozao dalpide, rir de tua mgoa, do teu incendirio desespero, de tua
falta de sorte, de teu corao trado, alfinetado e fragmentadocom um beijo. Posso mastigar o que de ti recordo e cuspirimagens tuas na lama dos esgotos; no piso reluzente dopalcio episcopal, do shopping center; na face rgida dosditadores; dos bajuladores; dos sem idias prprias; dosinvejosos; dos afogados; dos inconformados; e ainda exumarteu corpo dissoluto, parcialmente decomposto, arrastando-o
pelo que sobrou dos cabelos na rua da amargura ou pelasavenidas enfeitadas pros dias de carnaval. Posso voltar atrs,
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