o que é biblioteca digital
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Afinal, o que biblioteca digital?
INTRODUO
omeando na dcada passada, a idia debiblioteca digital, tal qual genericamente
imaginamos, tem se transformado no pa-
radigma reiterado dos sistemas e servios
bibliotecrios. Desde ento, um nmero
impressionante de iniciativas, que incluem
produtos e servios de informao digital,
infra-estrutura tcnica, normativa e comer-
cial, consrcios em escala global, tem sido
continuamente desenvolvido em torno
dessa idia.
LUIS FERNANDO SAYO
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LUIS FERNANDO
SAYO membroda ComissoNacional de EnergiaNuclear (CNEN).
As bibliotecas digitais surgem num con-
texto que sobrepe, por um lado, a integra-
o e uso das tecnologias de informao e de
comunicao, das redes de computadores,
das tecnologias de apresentao e o bara-
teamento dos meios de armazenamento
em massa; e, por outro, a disponibilidade
crescente de contedos digitais em escala
planetria, a possibilidade de digitalizao a
um custo economicamente vivel de con-
tedos em mdias convencionais e, ainda,
o fenmeno conhecido como coernciadas mdias digitais, que abre a possibilidade
singular para a concepo de novos servios
de informao a partir da integrao de
objetos digitais heterogneos.
Esse contexto de rpidas transforma-
es oferece as condies primordiais para
o estabelecimento de uma infra-estrutura
tcnica que viabiliza o surgimento de diver-
sas atividades centradas no conhecimento
e na informao globalmente distribudos.
Alm do mais, a ambientao tecnologica-
mente favorvel exerce uma forte influncia
sobre a reconfigurao dos mercados de
contedos e no delineamento de uma nova
dinmica para a economia da informao,
que rapidamente vai incorporando novos
patamares de consumo de contedos digi-
tais. Assim sendo, surgem diversos produtos
e servios de informao resultados de
concepes inditas ou de inovaes sobre
servios j consagrados. Dentre eles, impul-
sionada por um conjunto heterogneo de
foras, est a idia de biblioteca digital.
Verdadeiramente, ns estamos ainda
nos primeiros estgios do entendimento
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de todas as implicaes dessa tecnologia
e das suas potencialidades. Termos como
redes de conhecimento, colaboratrios
e bibliotecas digitais tm significados que
se misturam. H uma forte sobreposio de
significados entre a pesquisa e o desenvol-
vimento em arquitetura para federao de
colees digitais autnomas e seus servios
associados e a arquitetura necessria ao
comrcio eletrnico em larga escala, como
apontava Dan Atkins (1998). Dez anos
no foram suficientes para resolver essas
ambigidades. A observao de Atkins
continua viva nas agendas das comunidades
envolvidas com a questo.
No obstante a intensa atividade de
pesquisa, de utilizao e de exploraocomercial das bibliotecas digitais, no se
tem um consenso estvel do que seja exa-
tamente uma biblioteca digital e das suas
vinculaes com a biblioteca tradicional e
com a biblioteconomia. O termo biblioteca
digital vem sendo aplicado a uma varie-
dade extraordinria de coisas do catlogo
on-line de comrcio eletrnico coleo
de programas de computadores , grande
parte delas desvinculada do conceito quetemos de biblioteca.
A busca por uma definio mais precisa
e consensual para biblioteca digital esbar-
ra tambm na existncia de trs termos
biblioteca digital, biblioteca eletrnica e
biblioteca virtual que possuem diferentes
significados, mas que so usados freqente-
mente para designar a mesma coisa.
Ainda h mitos que envolvem as bi-
bliotecas digitais, o que aumenta o grau de
mal-entendidos sobre o problema. Kuny e
Cleveland (1998) analisaram a irrealida-
de em torno das bibliotecas digitais num
artigo cujo objetivo explcito era ser uma
provocao, uma refutao ao tecnologismo
exacerbado e aos excessos retricos que
caracterizavam as expectativas em torno
do tema biblioteca digital. Segundo os
autores, essa mistificao foi impulsionada
pelas companhias tecnolgicas, polticos e
revistas vanguardistas as mesmas forasque nos deram mitos como o paperless
office (escritrio sem papel) e vaticinaram
o fim dos livros.
A diversidade de atores envolvidos na
curta histria das bibliotecas digitais bem
como o complexo de tecnologias necess-
rias ao seu pleno funcionamento parecem
ser o motivo mais bvio para idia pouco
precisa do que seja uma biblioteca digital.
Entretanto, outros fatores intervm nas
sobreposies conceituais, um deles o
extraordinrio potencial de crescimento em
diversos domnios e as expectativas geradas
nos mais diversos segmentos da sociedade
(Sayo, 2008). Alm do mais, a realizao
desses potenciais, numa perspectiva social
e humanstica, constitui um desafio que re-
quer uma interao sofisticada entre vrias
disciplinas tecnolgicas e sociais.
Por outro lado, a linha que separa aconcepo quase ingnua de biblioteca
digital como um mero sistema compu-
tacional para armazenamento e acesso a
informaes eletrnicas tem sido rapida-
mente pulverizada pela idia avassaladora
de um ambiente voltado para a criao e
para o compartilhamento de informaes
digitais. Esse ambiente formado por um
complexo de servios e de colees de con-
tedos distribudos, gerenciados de formaautnoma, contudo interoperveis. Nesse
patamar, viabiliza-se tambm o surgimento
de uma nova economia da informao e de
modelos de negcios que vo moldando
as novas possibilidades de distribuio
de contedos de toda natureza via rede de
computadores.
sobre o que biblioteca digital, a tica
como ela vista por diversos grupos sociais
e a natureza da sua vinculao e apropria-
o pela biblioteca tradicional, que vamos
discutir rapidamente neste texto.
VISES SOBRE AS BIBLIOTECAS
DIGITAIS
Criou-se, historicamente, uma enorme
expectativa em torno das potencialidadesdas bibliotecas digitais, no somente em
termos de um novo paradigma de sistema
de informaes, de busca e recuperao,
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mas tambm como um recurso estratgico
dentro de contextos altamente institucionali-
zados, como governo, educao, cidadania,
negcios e pesquisa cientfica.
O conceito de uma biblioteca digital
meramente equivalente a uma coleo de
objetos digitalizados, assistida por uma
ferramenta de gesto de informao, torna-
se tosco e j no cabe nas utopias desses
inmeros setores. A idia de biblioteca
digital como um ambiente distribudo
que integra colees, servios e pessoas na
sustentao do ciclo de vida completo de
criao, disseminao, uso e preservao
de dados, informao e conhecimento
(Duguid, 1997) conforme preconizado
pelo relatrio final do Santa F PlanningWorkshop on Distributed Knowledge Work
Environments , talvez esteja mais prxima
do que se almeja para bibliotecas digitais
agora e num futuro possvel.
A complexidade das bibliotecas digitais
em termos tecnolgicos e organizacionais,
somada ao seu universo vasto e variado de
usurios e multiplicidade de vises reais
e imaginrias sobre as suas possibilidades
e a sua extenso, impacta significativamen-te a construo de uma definio comum.
Apesar das intensas atividades de pes-
quisa e de desenvolvimento em torno das
vrias vertentes do problema, no se tem
absolutamente claro o significado do termo
biblioteca digital (Harter, 1997).
Passada mais de uma dcada, a afirmao
de Harter continua sendo irritantemente
verdadeira: biblioteca digital uma idia
em movimento, ainda se desenvolvendo
e tomando forma. Ns estamos agora
na adolescncia das bibliotecas digitais,
confirmam Lagoze e seus colaboradores
(2005, p. 1) pensando nos motivos de preo-
cupao e otimismo que essa fase turbulenta
representa.
A impossibilidade de uma definio
de consenso acontece por vrios motivos,
porm, o mais importante deles que o
termo biblioteca digital usado para de-
notar um nmero extraordinrio de coisas de colees pessoais at a internet intei-
ra. Na maioria das vezes essas coisas s
tm em comum uma remota manipulao
de recursos informacionais digitalizados
(Harter, 1997). Somam-se ainda o grande
nmero de atores que contriburam para
o desenvolvimento e a implementao de
bibliotecas digitais e aqueles que esto
envolvidos profissionalmente no seu uso,
alm, claro, do dinamismo prprio da
ambientao tecnolgica que sustenta essas
bibliotecas. Biblioteca digital representa um
espao sinrgico de um grande nmero de
reas da tecnologia da informao e vrias
outras disciplinas e campos de pesquisa,
como biblioteconomia, cincia da informa-
o, museologia, arquivologia e gesto do
conhecimento, para citar algumas das mais
importantes (Candela et al., 2007).
Dessa forma, a maioria das definies fortemente influenciada pela percepo e
pontos de vista particulares de pessoas e de
organizaes de diversas reas que estive-
ram envolvidas em empreendimentos volta-
dos para a construo e o uso de bibliotecas
digitais. A diversidade de contribuies que
tanto serviu para o enriquecimento da rea
criou, ao mesmo tempo, uma zona obscura
de indefinies. Para ilustrar essa plurali-
dade de vises e possibilidades de uso, umresumo da tica dos cientistas da informao
e bibliotecrios, cientistas da computao,
arquivistas, polticos e governantes, edito-
res, educadores e professores, comunidades
da rea cultural e do comrcio eletrnico
apresentado a seguir tendo como base o
artigo de Urs (2007).
A comunidade de biblioteconomia e
cincia da informao visualiza a biblioteca
digital menos como um sistema de compu-
tao uma mquina e mais como uma
instituio, como uma extenso lgica do
que as bibliotecas vm fazendo desde os
tempos imemoriais, ou seja, adquirindo,
organizando e disseminando conhecimento
usando as tecnologias correntes. O que o
bibliotecrio deseja a ampliao dos re-
cursos e dos servios disponveis e tambm
a audincia das bibliotecas. Na sua pers-
pectiva prtica, o acesso simultneo a um
mesmo documento digital por um nmeroindefinido de usurios significa o fim da lista
de emprstimo. Para ele a biblioteca digital
um estgio a mais no desenvolvimento
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contnuo de novos meios de publicao em
que a biblioteca soma a responsabilidade de
tambm ser uma publicadora web , bem
como uma nova infra-estrutura tecnolgica
e organizacional voltada para potencializar
a sua misso de disseminar informao e
conhecimento. Porm, enquanto os profis-
sionais de informao tm uma perspectiva
de continuidade evolutiva em relao s
bibliotecas digitais, outras vises impor-
tantes se sobrepem.
Os profissionais da rea de cincia da
computao enxergam as bibliotecas digi-
tais como uma extenso dos sistemas de
computadores em rede um sistema que
oferece facilidades informacionais. Essas
vises se fragmentam medida que seanalisa com um grau a mais de detalhes as
diferentes reas que compem o domnio
da cincia da computao. Por exemplo,
enquanto os pesquisadores da rea de
recuperao da informao (RI) vem as
bibliotecas digitais como uma ampliao
dos sistemas de recuperao de informao
em que os documentos e sua representa-
o (ou descrio) so diferentes da RI
tradicional, quem trabalha com sistemasmultimdia considera as bibliotecas digi-
tais uma aplicao dessa tecnologia; para
pesquisadores da rea de base de dados, a
biblioteca digital to-somente uma ampla
base de dados.
Apesar das controvrsias apaixona-
das, a maioria dos polticos e governantes
percebe a biblioteca digital como parte da
infra-estrutura tecnolgica necessria para
a superao da desigualdade informacional
e de acesso, e como mais um recurso para
apoio dos programas de incluso digital.
Consideram, com maior nfase, a biblioteca
digital como um insumo bsico para a pes-
quisa, o ensino superior e a ps-graduao
e como um instrumento para a maior visi-
bilidade de bens e instituies culturais. Os
governantes, com intensidade varivel, tm
investido em infra-estrutura computacional
e de redes que beneficiam diretamente as
iniciativas na rea de bibliotecas digitais.Grande parte dos projetos mais relevantes
so iniciativas do poder pblico, financiados
por suas agncias e, no raro, apoiados por
segmentos da iniciativa privada interessada
em expandir suas reas de atuao.
Os editores, desde a revoluo de Gu-
temberg, tm continuamente desempenhado
um papel fundamental na facilitao da
produo e distribuio de informao. A
percepo da indstria editorial em relao
nova mdia representada pelas bibliotecas
digitais ambivalente: em contrapartida s
novas oportunidades mercadolgicas exis-
tem as ameaas representadas pelas novas
formas de autopublicao e o movimento
crescente em torno do acesso livre, o que
exige uma adaptao permanente a um
meio que se renova constantemente. Numa
viso otimista, para o mundo editorial, a
biblioteca digital constitui um novo modode distribuio de contedos e um novo
mercado bastante competitivo a ser
conquistado, num contexto de mudana
da economia da informao. Para isso os
editores esto se adaptando ao paradigma
da publicao eletrnica, integrando mdias,
criando novos modelos de negcio, como
os portais agregadores, e estabelecendo
parcerias com organizaes mais prximas
ao mundo da internet.Para os educadores e os professores que
sempre tiveram uma relao de colaborao
quase que simbitica com as bibliotecas
tradicionais, as bibliotecas digitais podem
ser um meio de ampliar essa relao clssica.
Para eles as bibliotecas digitais constituem
um novo recurso de aprendizado, apoiados
por contedos multimdia, interatividade
e integrao de informaes heterogneas
de que o ensino e, particularmente, o en-
sino a distncia no podem prescindir. As
bibliotecas digitais abrem possibilidades
extraordinrias para a educao e o ensi-
no, mudando paradigmas e estabelecendo
novas metodologias pedaggicas. So as
reas que mais podem se beneficiar dessa
nova tecnologia.
Para os arquivistas, as bibliotecas
digitais rompem com a relao quase an-
tagnica entre a preservao e o acesso
existente no mundo do papel e dos demaismateriais analgicos (Sayo, 2005). Isso
acontece na medida em que a digitalizao
se torna um meio de preservar os contedos
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raros, nicos ou frgeis, ao mesmo tempo
em que proporciona acesso universal a
representaes digitais desses contedos
atravs das bibliotecas e arquivos digitais.
A digitalizao vista pelos arquivistas
como uma alternativa microfilmagem
tradicional com a ressalva dos problemas de
integridade e confiabilidade dos contedos
digitais, ou seja, do seu valor de prova e de
sua preservao de longo prazo, que uma
preocupao constante de toda a comuni-
dade arquivstica.
Para os pesquisadores, a colaborao a
chave para a pesquisa e o desenvolvimento.
Nesse sentido, eles percebem a biblioteca
digital como um espao dinmico voltado
para a gerao, o compartilhamento e adisseminao de conhecimento. Atravs das
bibliotecas digitais, os dados de pesquisa
agora podem ser acessados em escala plane-
tria pelos pesquisadores interessados. Essa
caracterstica de grande importncia para
o surgimento do conceito de colaborat-
rios resultado da contrao das palavras
colaborao e laboratrio, significando
um centro de pesquisa sem paredes onde os
pesquisadores interagem eletronicamenteno desenvolvimento de projetos inovadores.
Projetos como Genoma Humano, baseados
em compartilhamento internacional de dados
de pesquisa e anlises, so exemplos signifi-
cantes da idia de um colaboratrio.
Ainda h a perspectiva da biblioteca digi-
tal como forma de apropriao do mundo da
informao pelo comrcio eletrnico. Para
as organizaes comerciais, as bibliotecas
digitais estabelecem um novo mercado glo-
bal, constituindo, para alguns autores, um
caso especfico de economia da informao
(Schuble & Smeaton, 1998). Um dado
importante que os desenvolvedores de
bibliotecas digitais tm deliberadamente in-
corporado modelos econmicos e de preos
nas arquiteturas de bibliotecas digitais.
No campo cultural, o que se observa
que a biblioteca digital um meio privile-
giado de dar visibilidade global a manifes-
taes culturais antes circunscritas s suascomunidades e sem canais de comunicao
para fora delas. O desenvolvimento de
metodologias e tcnicas para recuperao
multilnge de informao, somado ao de-
senvolvimento de recursos lingsticos para
serem acoplados s bibliotecas digitais, vai
ajudar as comunidades que se expressam
em outros idiomas que no o ingls a su-
perarem as barreiras lingsticas no acesso
e na disseminao de informaes.
A BIBLIOTECA VERSUSA
GOOGLIZAO
Tentando interpretar essa pluralidade de
entendimentos e expectativas sobre o que
biblioteca digital, Harter (1997) contrapeas duas vises extremas sobre a natureza das
bibliotecas digitais: uma viso abrangente
que toma a biblioteca digital tal como a web
hoje anrquica e individualista; e uma
viso que toma a biblioteca digital como
uma metfora, ou mesmo uma extenso,
da biblioteca tradicional. No espao entre
esses limites so discutidas as diferenas
essenciais: propriedades de localizao
fsica, de contedo, de critrios de seleo,de organizao, controle de autoridades, de
autoria, de acesso, de grupos de usurios-
alvo, de servios, de taxao e de fixidade
conceito que est relacionado com a
integridade e a segurana dos contedos e
suas propriedades de permanncia.
Num extremo, est a googlizao das
bibliotecas digitais, referindo-se incmoda
e errnea concepo de que o Google (http://
www.google.com.br) representa a apoteose
da informao digital e que os problemas
existentes nesse domnio j foram resolvidos
ou sero resolvidos por esse servio ou por
outra ferramenta semelhante. Esse estreita-
mento das discusses conduz viso mope
de que a biblioteca digital est limitada
busca e ao acesso funes essenciais (e
ainda desafiadoras), mas que so somente
parte do ambiente informacional circuns-
crito pela idia plena de biblioteca, seja ela
imaginria ou real (Lagoze et al., 2005).Essa viso est turvada pelo fato de mais
e mais pessoas estarem usando a internet
como a principal fonte de informao. De
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fato, a internet tem sido referida por muitos
como uma vasta biblioteca, contendo todo
tipo de informao conhecida pelos seres
humanos (Wallace, 1999). Entretanto, essa
constatao no pode ser ignorada como
elemento de compreenso do seu contr-
rio, pois, diferentemente das bibliotecas
tradicionais, onde as fontes de informao
adicionadas s colees so cuidadosamente
selecionadas, organizadas e descritas clas-
sificadas, catalogadas, indexadas, resumidas
, isso no acontece com freqncia nas
colees encontradas na internet. Porm,
a infra-estrutura oferecida pela internet
um veculo de dramtica importncia para
a distribuio de informao de qualidade
para os usurios, e parte essencial da infra-estrutura tecnolgica de que as bibliotecas
digitais no podem prescindir.
No outro extremo, observa-se uma ten-
dncia convergente na direo do enquadra-
mento das bibliotecas digitais aos cnones
biblioteconmicos, principalmente no que
concerne organizao e representao
dos recursos informacionais e tambm s
relaes orgnicas com suas comunidades-
alvo. Isso parece indicar que as bibliotecasdigitais devem se equiparar s bibliotecas
tradicionais, ao mesmo tempo em que
criam condies tcnicas para expandir os
limites, as formulaes e o alcance espacial
e temporal do que sempre conhecemos
como biblioteca. Entretanto, importante
assinalar que vai ficando cada vez mais n-
tido que essa viso expandida de biblioteca
exige novas reflexes sobre os modelos de
informao e de servios sobre os quais elas
estaro baseadas.
Essa convergncia para a bibliotecono-
mia pode ser justificada de vrias maneiras,
porm a mais convincente delas tambm
a mais bvia: biblioteca digital continua
sendo biblioteca.
O progresso tecnolgico mudou a maneira
como as bibliotecas fazem o seu trabalho,
mas no a razo do seu trabalho. Ainda
que desenvolvimentos tecnolgicos maiscontundentes como a conexo de um
computador a outro numa cadeia contnua
pelo mundo afora possam alterar o con-
ceito fundamental de biblioteca no sculo
XXI, podemos supor que a tecnologia no
vai mudar substancialmente o negcio das
bibliotecas, que conectar pessoas com
informaes (Kuny & Cleveland, 1998,
p. 1 traduo nossa).
imprescindvel compreender que a
tecnologia atual est focada na converso
de papel para formatos digitais e no na
converso da biblioteca in totopara formatos
digitais (Brown, 2005). Assim como uma
biblioteca de audiovisual ou de microfilmes
continua sendo uma biblioteca, o conceito
atual de biblioteca digital constitui um
subconjunto de um conceito mais extenso
de biblioteca, e no um substituto para ele.Todos os valores e funes da biblioteca
continuam vlidos, o que muda so os
objetos fsicos que formam a biblioteca e,
naturalmente, o instrumental tecnolgico
para manipul-los. As mdias digitais devem
ser vistas como um novo suporte na longa
lista de materiais que a civilizao tem, ao
longo da histria, utilizado para registrar e
transmitir o conhecimento para geraes
futuras. Como os outros materiais, nspodemos esperar que eles sejam utilizados
na proporo em que a sua disponibilidade
local, as tecnologias de apoio, seu custo
e a sua confiabilidade sejam adequados e
suficientes para armazenar e disseminar
informao e conhecimento de acordo
com as exigncias do seu tempo. As novas
geraes de bibliotecas digitais no devem
ser consideradas como meros repositrios
de informaes estticas. Antes disso, elas
devem ser reconhecidas como ncleo inicial
do que, num estgio futuro, constituir uma
parte substancial do conhecimento humano
(Thanos, 2004).
BIBLIOTECA DIGITAL:
INVENO OU REINVENO?
O conceito de biblioteca digital no
algo que desponta desvinculado da idia
ancestral que temos de biblioteca. Ao
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contrrio, ele se desenvolve tendo como
fundamento uma analogia direta com a
biblioteca tradicional e com a sua misso
de organizar colees impressas e outros
artefatos, de operar servios e sistemas
que facilitem o acesso fsico e intelectual
e tambm o acesso de longo prazo aos
seus estoques informacionais.
Assim como no surgimento de outras
concepes da era digital, que so recria-
es de idias j estabelecidas, como , por
exemplo, o correio eletrnico, a biblioteca
digital, num primeiro momento, espelha-se
na biblioteca tradicional, para em seguida
expandir esse conceito j consagrado atra-
vs da apropriao e uso das tecnologias
disponveis.Adicionando o adjetivo digital ao
nome biblioteca, o futuro parece estar
reconciliado com o passado (Lyman,
1996). Alegorias futursticas como biblio-
tecas digitais e publicaes eletrnicas so
tranqilizadoras porque elas sugerem uma
continuidade institucional entre o passado e
o futuro. Pois, se verdade que a inovao
tecnolgica geralmente comea imitando o
passado, no so as novas ferramentas queconstituem inovao, mas sim as novas ins-
tituies. Elas acalmam e ocultam a tenso
latente que existe entre tecnologia digital e
as instituies de uma sociedade industrial,
tenses que levam a questes importantes
sobre a natureza das bibliotecas digitais
(Lyman, 1996, p. 1). Em outras palavras, bi-
bliotecas digitais parecem oferecer-nos toda
a convenincia, a eficincia, a sofisticao da
tecnologia digital dentro da idia familiar e
confortvel de uma biblioteca (McPherson,
1997). Nessa direo, a biblioteca digital
parece antes querer reforar os fundamentos
da biblioteca e da biblioteconomia do que
aniquil-los, como temem alguns.
O produto que gerenciamos nas biblio-
tecas tradicionais informao, e o seu
invlucro que nos mais familiar, o pa-
dro cdice, tem influncia decisiva sobre
a arquitetura da biblioteca e sobre o seu
funcionamento, mas ele no define por si so que uma biblioteca. Ns no estamos
preocupados em qualificar nossas bibliote-
cas chamando-as de bibliotecas de tabletes
ou bibliotecas de rolos de papiros, por que
ento temos que qualificar as bibliotecas
digitais?, interroga-se Braund (1999) num
artigo com um ttulo interessante: Virtual
ou Real: o Termo Biblioteca o Bastante
(traduo nossa).
Mas, apesar de a biblioteca digital ser, na
maioria das vezes, um servio vinculado
biblioteca tradicional, fica claro que existe
uma distino que deve ser feita entre elas.
Os invlucros fsicos e monolticos em que
a informao est fixada por exemplo, um
livro so adequados ao acesso direto pelos
nossos sentidos e podem ser manuseados
fisicamente; por outro lado, dados digitais
so constitudos de sinais eletrnicos que
independem de mdias, mas que dependemde mquinas e programas de computado-
res que os interpretem antes de qualquer
interao humana com eles. A transio
do impresso para o digital implica tambm
a criao de camadas de funcionalidades,
de modos diferenciados de disseminao
e entrega da informao e na forma como
nos relacionamos com ela. A informao
digital no antagnica informao im-
pressa, porm, no patamar atual, tambmno a sua mmica. O seu surgimento muda
muita coisa.
A passagem inicial do impresso para
o digital teve como nfase a converso
retrospectiva direta de contedos impres-
sos para formatos digitais, por exemplo, a
converso de documentos raros, frgeis ou
muito consultados. A verso digitalizada
dos estoques informacionais da biblioteca
tradicional proporcionou a possibilidade
indita do acesso independente de distn-
cia e de tempo, o compartilhamento por
mais de um usurio de uma mesma obra a
um custo muito baixo e, claro, o acesso
instantneo e fcil a uma verso digital do
texto completo.
Muito alm da mera converso retros-
pectiva, a emergncia da web acelerou o
surgimento de novos gneros de tipos de
documentos que no tinham equivalncia
no domnio da informao impressa e exis-tiam somente no domnio da computao
e da comunicao em rede. No contexto
ciberespao, a informao digital pode
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ser transportada na velocidade da luz,
armazenada em densidade atmica, e con-
vergir em novos tipos de documentos que
combinam texto, imagem, grficos, vdeo,
udio, hiperlinks, applets e tudo mais que
a inovao tecnolgica e fora do mercado
possam proporcionar.
As bibliotecas digitais incluem as fun-
cionalidades das bibliotecas tradicionais,
mas potencialmente vo alm em escopo
e significado. O ambiente da biblioteca
digital um espao dinmico, constitudo
de informaes eletrnicas, com nveis
diferenciados de granularidade, e servios
que possibilitam inmeras configuraes
nas suas formas de disseminao e uma
gama extraordinria de usos e resos paraos seus estoques informacionais e para as
representaes correspondentes.
A substituio de papel pelo documento
eletrnico est assentada em algumas impor-
tantes diferenas: no armazenamento distri-
budo em formas digitais, na comunicao
direta, on-line, na obteno do material via
redes de computadores, na multiplicidade
de cpias a partir de uma verso original,
no nvel de granularidade que possveltratar as informaes digitais e nas suas
possibilidades de reso. Essas diferenas se
desdobram em transformaes to profun-
das que eventualmente deixam a biblioteca
digital distante de uma mera expresso da
biblioteca tradicional (McPherson, 1997).
Essas diferenas e transformaes que
ainda esto em curso as tentativas de
definio tentam traduzir.
UMA DEFINIO POSSVEL
Os sonhos e as utopias, juntamente
com as realidades, expressam-se de diver-
sas formas quando adicionamos o termo
digital idia precisa que a maioria de
ns tem sobre o que biblioteca. No mo-
mento em que se analisa a multiplicidade
de idias sobre o que biblioteca digital,o nico consenso possvel de se distinguir
que o conceito de biblioteca digital no
equivalente a uma mera coleo digitali-
zada apoiada por uma ferramenta de gesto
de informao. Esse primeiro patamar na
evoluo das bibliotecas digitais foi substi-
tudo por um conceito mais sofisticado que
envolve um ambiente onde esto reunidas
colees, servios e pessoas com a misso
de dar apoio ao ciclo completo de criao,
disseminao, uso e preservao de dados,
informao e conhecimento, como prope
Paul Duguid (1997).
necessrio trazer, portanto, o debate
para dentro dos limites da realidade onde
atuam os bibliotecrios e demais profissio-
nais do conhecimento e onde se desenrolam
pesquisas e as prticas mais importantes
para a rea. Localizar os possveis atributos
e propriedades das bibliotecas digitais nesseespao de pesquisas e prticas pode ajudar a
definir as vinculaes das bibliotecas digi-
tais ao universo das bibliotecas. Os autores
Savanur e Negaraj (2004) e Urs (2007) tri-
lharam esse caminho e definiram conjuntos
de caractersticas que contornam o desafio
de uma definio mais formal. Antes deles,
a Association of Research Libraries (ARL)
lanou mo da mesma estratgia, registrada
no documento Definition and Purposes of aDigital Library (ARL, 1995). Essas carac-
tersticas foram reunidas a seguir:
as bibliotecas digitais so a contraparte
digital das bibliotecas tradicionais e incluem
materiais eletrnicos (digitais) bem como
materiais impressos e ainda outros materiais
por exemplo, udio, vdeo e objetos que
no se enquadram na mdia impressa e nem
podem ser disseminados em formato digital
ainda;
uma biblioteca digital possui e controla
a informao. Ela oferece acesso infor-
mao, e no apenas aponta para ela;
uma biblioteca tem uma estrutura organi-
zacional unificada com pontos consistentes
para acesso aos dados;
uma biblioteca digital no uma entidade
nica, ela pode tambm oferecer acesso
a materiais digitais e recursos de outras
bibliotecas digitais; bibliotecas digitais apiam o acesso rpi-
do e eficiente a uma grande quantidade de
fontes de informao distribudas, porm
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vinculadas por links e que so plenamente
integradas;
bibliotecas digitais tm colees que:
a) so volumosas e persistentes ao longo
do tempo; b) so bem organizadas e bem
gerenciadas; c) contm formatos variados;
d) contm objetos e no somente a sua
representao; e) contm objetos que no
podem ser obtidos de outra forma;
bibliotecas digitais incluem todos os
processos e servios oferecidos pelas
bibliotecas tradicionais, embora esses
processos tenham que ser revisados para
acomodar diferenas entre mdias digitais
e impressas;
as bibliotecas digitais cumprem o para-
digma do acesso onipresente, a qualquerhora e em qualquer lugar. Existe uma bi-
blioteca onde houver um computador pes-
soal conectado a uma rede. As bibliotecas
digitais esto sempre disponveis;
as bibliotecas digitais intensificam o
conceito de compartilhamento de recursos
provenientes das bibliotecas tradicionais;
as bibliotecas digitais se dirigem a uma ou a
um conjunto de comunidades de usurios.
A Digital Library Federation (DLF) foi
mais adiante. Ela registra na sua pgina web
(http://www.diglib.org/about/dldefinition.
htm) uma definio abrangente que insti-
tucionaliza a viso biblioteconmica das
bibliotecas digitais:
Bibliotecas digitais so organizaes
que disponibilizam os recursos, incluindo
pessoal especializado, para selecionar, es-
truturar, oferecer acesso intelectual, inter-
pretar, distribuir, preservar a integridade e
assegurar a persistncia ao longo do tempo
de colees de trabalhos digitais, de forma
que eles estejam pronta e economicamente
disponveis para uso de uma comunidade
definida ou um conjunto de comunidades
(traduo nossa).
A prpria DLF oferece uma interpretao
para a definio que ela estabelece: Pode-se, naturalmente, revisar, refinar e de outra
forma melhorar essa definio abrangente.
Entretanto, o que se prope aqui princi-
palmente sugerir que existe um conjunto
de atributos que confere coerncia ao con-
ceito de biblioteca digital. Esses atributos
incluem funes de colees, organizao,
preservao, acesso e economia. O que sig-
nifica dizer que os projetos que envolvam
bibliotecas digitais precisam ser definidos
e mensurados segundo o desenvolvimento
desses atributos. Porm, importante dei-
xar claro que a definio proposta tambm
enfatiza que as bibliotecas digitais devem
ser definidas e mensuradas em relao s
comunidades a que elas servem.
Esses atributos, de certa forma, do
densidade ao conceito proposto pela DLF,
ao mesmo tempo em que jogam luz sobre
outras funes biblioteconmicas importan-tes para o desenvolvimento de bibliotecas
digitais, que no somente a busca e o acesso
a colees digitais. As propostas da ARL
e da DLF revelam que a biblioteca digital
no est isenta de administrar os servios
de uma biblioteca no seu elenco de funes,
e que a sua vertente digital deve conviver
com as outras modalidades de informao
disponveis, estabelecendo uma possvel
convergncia entre os reinos digital e oimpresso.
A definio da DLF tem sido adotada
amplamente por grande parte das comunida-
des vinculadas s reas de biblioteconomia
e de cincia da informao. Tem sido ado-
tada tambm como marco primordial dos
principais projetos de pesquisa das muitas
reas que permeiam os estudos em biblioteca
digital. Entretanto, como vimos anterior-
mente, ela revela apenas uma das muitas
faces do que universalmente discutido e
entendido como biblioteca digital.
GUISA DE CONCLUSO
A idia de biblioteca digital tem mui-
tas faces, mas nenhuma delas a define
completamente e esgota todos seus signi-
ficados. As definies de biblioteca digitalse reconfiguram de acordo com os seus
inmeros protagonistas que se espalham
por muitas reas.
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Mesmo no contexto mais restrito da
biblioteconomia e da cincia da informa-
o, h uma multiplicidade de vises sobre
a natureza das bibliotecas digitais que se
sobrepem, e de prticas que se concreti-
zam em harmonia com essas vises. O que
se pode concluir com algum risco que oconceito de biblioteca digital algo ainda no
estgio transiente de evoluo e que prova-
velmente guardar significados distintos ou
receber denominaes distintas medida
que as atuais sobreposies conceituais se
resolvam. O breve passado das bibliotecas
digitais no foi capaz de resolver essas am-
bigidades, quem sabe o futuro seja rpido
em harmoniz-las.
No entanto, o que se observa que adivergncia se instala menos em relao
natureza dos servios, produtos e interaes
que uma biblioteca digital pode oferecer
isso parece cada vez mais claro e con-
sensual , e mais em relao natureza
da sua vinculao com a biblioteca e seus
fundamentos.
Essa questo deve ser ressaltada, pois
est reiteradamente explcito nas definies
correntes que biblioteca digital e biblioteca
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Acesso em: 30/maio/2008.
tradicional so coisas separadas e distintas.
Elas no incluem a perspectiva simples de
que a biblioteca pode ser as duas coisas:
impressa e digital.
O digital no o antagnico do im-
presso, como o rolo de papiro no o
antagnico do livro. Para cumprir o seupapel ancestral a biblioteca sempre se
apropriou das mais avanadas tecnologias
disponveis e vem continuamente evoluin-
do no ritmo dessas tecnologias. Assim foi
com a tecnologia de microfilme, com a
computao e agora com a web. Desde o
surgimento dessas tecnologias, percebeu-
se que elas trariam um ganho extraordi-
nrio de produtividade e de amplitude
nas funes administrativas, tcnicas ede intercmbio de informao e conheci-
mento no mundo das bibliotecas.
Portanto, a biblioteca digital mais um
marco que no traz aniquilamentos e nem
pontos de singularidade na continuidade
evolutiva das bibliotecas, que caminham
rapidamente para se tornarem palcios
hbridos de acesso informao e ao conhe-
cimento distribudo, para onde convergem e
se integram todos os tipos de mdias.
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