Notas de Matemática Básica

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Notas de Matem ´ atica B ´ asica Jorge Delgado Sebasti ˜ ao Firmo Pedro N ´ obrega Depto. de Matem´ atica Aplicada Instituto de Matem ´ atica - UFF PROIN-CAPES 1998

Transcript of Notas de Matemática Básica

  • Notas de Matematica Basica

    Jorge Delgado Sebastiao Firmo Pedro Nobrega

    Depto. de Matematica Aplicada

    Instituto de Matematica - UFF

    PROIN-CAPES 1998

  • J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega ii Instituto de Matematica - UFF

  • Conteudo

    1 Conjuntos 1

    2 Os Inteiros 19

    3 Os Racionais e os Irracionais 69

    0

  • Captulo 1

    Conjuntos

    1.1 Introducao

    As teorias estudadas emmatematica sao construdas sempre partindo de alguns fatos con-

    siderados basicos. Tais fatos sao chamados axiomas. Os axiomas junto com as definicoes dos

    conceitos que a teoria pretende estudar dao lugar, apos raciocnios logicos, a resultados cha-

    mados proposicoes. A sequencia de conclusoes logicas utilizadas para chegar a um resultado

    determinado partindo das definicoes, axiomas e outros resultados, e chamada demonstracao.

    A palavra teorema e reservada a proposicoes de carater relevante na teoria em questao, da

    mesma maneira, um lema e uma proposicao que sera usada como ferramenta fundamental para

    provar outras proposicoes. Os corolarios sao proposicoes que se obtem como consequencia di-

    reta de proposicoes e teoremas importantes.

    Todo lema, proposicao, teorema e corolario, tem um enunciado. Todo enunciado se divide

    em duas partes, as hipoteses e as teses. A demonstracao do resultado (seja um lema, uma

    proposicao, um teorema ou um corolario) pode ser descrita da seguinte maneira: usar os axio-

    mas, definicoes e resultados previos da teoria para chegar a`s teses partindo das hipoteses por

    meio de um raciocnio logico. Isto se resume dizendo que a hipotese implica a tese e escreve-se

    Hipotese = TeseO smbolo = significa que partindo da parte da esquerda (Hipotese) e usando um ra-

    ciocnio logico baseado nos axiomas, definicoes e resultados anteriores da teoria, se obtem

    como consequencia o lado direito (Tese).

    Por exemplo consideremos o seguinte enunciado:

    1

  • Conjuntos 1.2 Conjuntos

    Teorema. (Pitagoras) Seja T um triangulo retangulo cujos catetos medem a e b respectivamente

    e cuja hipotenusa mede c. Entao a2 + b2 = c2.

    A hipotese diz que a, b e c sao respectivamente os catetos e a hipotenusa de um triangulo

    retangulo T , e a tese diz que a2 + b2 = c2. Mais tarde no texto veremos uma demonstracao do

    teorema de Pitagoras.

    Devemos observar tambem a validade das hipoteses dos nossos resultados, assim como a

    veracidade de cada um dos passos logicos nas demonstracoes. Veja por exemplo a passagem

    de B. Russell citada nas primeiras paginas desta apostila, na qual uma hipotese falsa da origem

    a conclusoes absurdas.

    Em matematica e frequente o uso de quantificadores. Estes sao apenas um simbolismo

    que nos permite descrever a abrangencia de fatos ou propriedades sobre uma determinada

    colecao de objetos. Temos dois tipos de quantificadores: o quantificador de existencia, escrito

    simbolicamente (leia-se existe... ou existem...), e o quantificador de universalidade, escrito (leia-se para todo...). O quantificador de existencia e algumas vezes usado com o ponto deexclamacao ! para indicar que certo objeto existe e e o unico que possui as propriedades queo determinam.

    1.2 Conjuntos

    Neste captulo introduziremos algumas nocoes basicas da teoria de conjuntos. Nao apre-

    sentaremos uma exposicao axiomatica e rigorosa da teoria, mas sim uma exposicao intuitiva e

    simples, incluindo apenas o material e a terminologia que usaremos mais adiante.

    Para nos um conjunto sera qualquer colecao dada de objetos.

    Embora esta definicao do termo conjunto seja intuitivamente clara, ela nao e formal-

    mente correta, pois a palavra colecao e ainda indefinida. Na verdade, a nocao de conjunto em

    matematica e uma nocao indefinida (da mesma maneira que a nocao de ponto na Geometria

    Euclidiana) e e necessaria uma lista de axiomas para trabalhar com conjuntos e suas propri-

    edades. Na pratica, uma introducao heurstica, como a que apresentamos a continuacao, e

    suficiente.

    Os conjuntos serao designados (salvo mencao explcita) por letras maiusculas, deixando

    as minusculas para designar objetos dos conjuntos. Se a e um objeto do conjunto A, dizemos

    que a pertence a A, ou que a e elemento do conjunto A e escrevemos a A. Se a e um objeto

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 2 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos 1.2 Conjuntos

    que nao pertence ao conjunto A escrevemos a / A e dizemos que a nao e um elemento doconjunto A. Se a, b A, a notacao a = b significa que a e b sao o mesmo elemento de A.

    Os conjuntos podem ser descritos de duas maneiras:

    A. Escrevendo numa lista os seus elementos, e englobando tal lista entre chaves {. . .}. Por

    exemplo,

    A = {azul, verde, vermelho, laranja, maca},

    B = {banana, morango, maca, azul}.

    Quando representamos um conjunto por extensao mediante uma lista, as repeticoes e a

    ordem na qual aparecem os elementos na lista sao irrelevantes. Por exemplo, o conjunto A

    acima e tambem representado como

    A = {azul,verde, vermelho, laranja, azul, maca, verde},

    ou ainda

    A = {vermelho,laranja azul, maca, verde}.

    B. Por meio de uma propriedade que caracteriza dos elementos do conjunto. Por exemplo

    C e o conjunto que consiste dos nomes das cores do arco-ris,

    D e o conjunto dos nomes das frutas tropicais.

    Se P e uma propriedade sobre objetos, dizemos que o objeto x satisfaz a propriedade Pe escrevemos P(x) se a propriedade P e verdadeira para x.

    Designamos por {x ; P(x)} o conjunto formado pelos objetos x para os quais P(x).Por exemplo, segundo os exemplos acima,

    C = {x ; x e o nome de uma cor do arco-ris}

    D = {x ; x e o nome de uma fruta tropical}.

    A caracterizacao (b) e principalmente util quando o conjunto tem tantos elementos que

    seria praticamente impossvel coloca-los numa lista. Consideremos por exemplo:

    E = {x ; x e o nome de um assinante do catalogo telefonico do Rio de Janeiro},

    ou pior ainda,

    F = {x ; x e o nome de um assinante de algum catalogo telefonico de alguma cidade do mundo}.

    Quando todo elemento de um conjunto A e tambem elemento de um conjunto B, dizemos

    que A e um subconjunto de B, ou que A esta contido em B e escrevemos A B. As vezes di-zemos tambem que B contem A e escrevemos B A. Se A nao esta contido em B escrevemos

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  • Conjuntos 1.2 Conjuntos

    A 6 B. Dizemos tambem que A nao e subconjunto de B ou que B nao contem A e escrevemosB 6 A.

    Nos nossos exemplos vemos que,

    A = {azul, verde, vermelho, laranja, maca} 6 B = {banana, morango, maca, azul},

    e nos conjuntos dos assinantes dos catalogos telefonicos E F.Dizemos que dois conjuntos sao iguais quando contem exatamente os mesmos elementos.

    Neste caso escrevemos A = B. Quando os conjuntos A e B nao sao iguais escrevemos A 6= B.Quando A B mas A 6= B dizemos que A e um subconjunto proprio de B.A partir das definicoes acima podemos inferir que

    i. Qualquer que seja o conjunto A vale A A.ii. Se A B e B C, entao A C.iii. Se A e B sao conjuntos, (A = B ) (A B e B A ).

    Vamos explicar o significado do smbolo , se p e q sao proposicoes ou afirmativas.Escrever p q significa que, tomando como hipotese p podemos obter como consequencialogica q (isto e p implica q, que se escreve p = q) e similarmente, tomando como hipoteseq podemos obter como consequencia logica p (isto e q implica p, que se escreve q = p).Resumindo, p q equivale a`s duas afirmativas simultaneas p = q e q = p.

    Dado um conjunto A podemos considerar o conjunto {x ; x A e x 6= x}. Tal conjunto echamado o subconjunto vazio de A e se designa por A. E claro da definicao que A A.

    Vamos apresentar agora a nossa primeira proposicao. A sua demonstracao sera feita pelo

    metodo do absurdo. Tal metodo consiste em negar a tese e apos uma sequencia de conclusoes

    logicas, obter uma afirmativa que seja claramente falsa ou que entre em contradicao com as

    nossas premissas ou conhecimentos anteriores.

    Proposicao 1.2.1. Se A e B sao conjuntos quaisquer, entao A = B.

    Demonstracao. Procedendo pelo absurdo, vamos supor que A e B sejam conjuntos tais que

    A 6= B.Segundo o item iii. acima, A 6= B significa que A 6 B ou que B 6 A.Caso A 6 B, devera existir um elemento x A tal que x / B.Pela definicao de A vemos que x sera um elemento de A tal que x 6= x, o qual e absurdo,

    pois qualquer objeto e igual a se proprio.

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  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    Caso seja B 6 A se procede da mesma maneira.O absurdo indica entao que a nossa hipotese de existirem conjuntos A e B tais que A 6=

    B e errada. A conclusao disto e a veracidade da proposicao. C.Q.D.

    O quadrado que temos colocado no extremo direito da ultima linha acima indica que a

    demonstracao esta terminada. Alguns autores escrevem as letras CQD que significam Como

    Queria-se Demonstrar para indicar o fim de uma demonstracao.

    Como consequencia da proposicao anterior obtemos o seguinte resultado.

    Corolario 1.2.2. Existe um unico conjunto , chamado o conjunto vazio, que nao contemelementos e esta contido em qualquer conjunto.

    Demonstracao. Para provar este resultado simplesmente consideramos um conjunto qualquer

    A e definimos = A. Pela definicao de A obtemos que nao contem elementos, pelaproposicao, = B B qualquer que seja o conjunto B. Isto prova que o conjunto existe.

    Agora provaremos que ele e unico. Seja um conjunto com as mesmas propriedades de. Pela proposicao anterior, = . Como possui as mesmas propriedades de ,temos que . Logo = , e portanto o conjunto existe e e unico. C.Q.D.

    O corolario acima e um exemplo de um resultado de Existencia e Unicidade. Ele diz

    que sob certas hipoteses, certos objetos existem e sao unicos. A demonstracao deste tipo

    de resultados divide-se em duas partes: provar a existencia do objeto e depois demonstrar que

    ele e unico. Existem varios procedimentos para provar a existencia de um certo objeto, um deles

    e construir ou exemplificar um objeto com as propriedades requeridas. A demonstracao da parte

    da unicidade pode ser feita, por exemplo, das seguintes maneiras

    (a) Mostrando que qualquer objeto com as mesmas propriedades do nosso tera ne-

    cessariamente que ser igual ao nosso (como foi feito na demonstracao acima).

    (b) Pelo absurdo, isto e, supoe-se a existencia de outro objeto (outro significa dis-

    tinto) com as mesmas propriedades do objeto em questao e chega-se a um absurdo.

    1.3 Operacoes com Conjuntos

    Nesta parte vamos introduzir as leis basicas de formacao e operacao com conjuntos.

    Definicao. Dados dois conjuntos A e B, definimos a uniao A B e a intersecao A B deA e B da seguinte maneira:

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  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    A B = {x ; x A ou x B} e A B = {x ; x A e x B}.

    Dito em palavras, A B e o conjunto cujos elementos pertencem ao conjunto A ou aoconjunto B. O conjunto A B e o conjunto cujos elementos pertencem ao conjunto A e aoconjunto B simultaneamente.

    Na figura abaixo vemos dois conjuntos A e B, a sua uniao A B e a sua intersecao A Brespectivamente.

    Fig. 1 (a). Representacao de A B. Fig. 1 (b). Representacao de A B.

    Por exemplo, se A e B sao os conjuntos dos exemplos da secao anterior, tem-se

    A B = {azul, verde, vermelho, laranja, maca, banana, morango},A B = {azul, maca}.

    Observe que os elementos repetidos foram eliminados.

    Da definicao acima vemos que A e B possuem elementos em comum se, e somente se,

    A B 6= .Dois conjuntos A e B sao chamados disjuntos se AB = , isto e, se A e B nao possuem

    elementos em comum.

    Outro fato evidente da definicao e que, qualquer que seja o conjuntoA valem as igualdades

    A = A = A .

    Tambem da definicao obtem-se diretamente a seguinte proposicao:

    Proposicao 1.3.1. Sejam A, B, C, D conjuntos quaisquer. Entao

    (a) A B A A B.(b) Se A C e B D, entao A B C D e A B C D.

    Demonstracao. Exerccio.

    As propriedades formais das operacoes de uniao () e intersecao () sao colocadas noseguinte resultado:

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  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    Teorema 1.3.2. Para quaisquer conjuntos A, B, C, valem as seguintes propriedades:

    (1) Idempotencia: A A = A = A A.(2) Associatividade: A (B C) = (A B) C e A (B C) = (A B) C.(3) Comutatividade: A B = B A e A B = B A.(4) Distributividade: A (BC) = (AB) (AC) e A (BC) = (AB) (AC).

    Demonstracao. Nao e difcil provar (1)-(3), exerccio. Vamos provar apenas a primeira das

    formulas de distributividade.

    Lembramos que dois conjuntos sao iguais se, e somente se, um esta contido no outro.

    Portanto, provar a formula em questao equivale a provar que o conjunto do lado esquerdo esta

    contido no conjunto do lado direito e que este, por sua vez, esta contido no primeiro:

    Prova da inclusao A (B C) (A B) (A C):x A (B C) = (x A) e (x B C)

    = (x A) e [(x B) ou (x C)]= [(x A) e (x B)] ou [(x A) e (x C)]= [(x A B) ou (x A C)]= x (A B) (A C).

    Prova da inclusao A (B C) (A B) (A C):As implicacoes = da prova da inclusao anterior podem ser invertidas a = (verifique!).

    Leia entao a prova de baixo para cima. C.Q.D.

    O seguinte resultado relaciona os smbolos , e .

    Proposicao 1.3.3. Sejam A e B conjuntos quaisquer. As seguintes afirmativas sao equivalen-

    tes:

    (1) A B.(2) A = A B.(3) B = A B.

    Demonstracao. Primeiramente vejamos o significado do enunciado: Dizer que duas proposicoes

    p e q sao equivalentes significa que p q, isto e, p = q e q = p. Temos que provar, entao,que (1) (2), (1) (3) e (2) (3). Basta provar (1) (2) e (1) (3).

    Prova de (1) (2): Suponhamos que (1) e verdadeira. Entao A = A A A B A,isto e, A = A B provando assim (2). Se (2) e verdadeira, A = A B B, provando (1).

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  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    Prova de (1) (3): Se (1) e verdadeira, B = B B A B B, isto e, B = A B. Se(3) e verdadeira, B = A B A, provando (1). C.Q.D.

    Embora as operacoes e foram definidas para dois conjuntos, podemos generalizar ereescrever a definicao para mais de dois conjuntos, mesmo para famlias de conjuntos:

    Definicao. Seja um conjunto nao vazio. Se a cada elemento corresponde um conjuntoA, dizemos que a colecao F = {A ; } (que tambem se designa por F = {A}) e umafamlia de conjuntos indexada por . O conjunto e chamado o conjunto de ndices da famlia.

    Observamos que qualquer conjunto nao vazio A pode servir como conjunto de ndices de

    uma famlia de conjuntos. Com efeito, para cada a A seja Aa = {a} e consideremos a famliaF = {Aa}aA. Tambem todo conjunto F , cujos elementos sao conjuntos, pode ser consideradocomo uma famlia de conjuntos indexada por F (i.e. auto-indexada). De fato, F = {AF}FF , ondeAF = F para todo F F .

    Definicao. Seja X um conjunto dado e F = {A} uma famlia de subconjuntos de X. Sedefine a uniao e a intersecao da famlia F como

    A = {x X ; tal que x A} e

    A = {x X ; x A }

    Por exemplo, se X e um conjunto qualquer, e para cada x X escrevemos Ax = {x}podemos considerar a famlia {Ax}xX indexada por X. Resulta que

    xX

    Ax = X exX

    Ax = .

    Observando com cuidado, podemos ver que a uniao e a intersecao de uma famlia inde-

    pende da maneira como esta indexada. Isto e, se = e F = {A} e uma famlia indexadapor , entao

    A =

    A e

    A =

    A.

    Pode-se provar com um pouco de esforco, que a uniao de famlias distribui sobre a intersecao e

    que a intersecao de famlias distribui sobre a uniao. Para enunciar este fato usaremos a nocao

    de produto cartesiano que introduziremos em breve.

    Definimos a seguir uma outra operacao entre conjuntos

    Definicao. Sejam A e B conjuntos. Definimos o conjunto diferenca A B como sendo o

    conjunto que consiste dos elementos de A que nao sao elementos de B, i.e.

    A B = {x ; x A e x / B}.

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  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    E importante observar que, se A e B sao conjuntos, AB e BA sao, em geral, conjuntos

    diferentes. Tambem e claro que A B A.

    Fig. 2 (a). Representacao de A B. Fig. 2 (b). Representacao de B A.

    Por exemplo, se A e B sao os conjuntos dos exemplos anteriores, entao

    A B = {verde, vermelho, laranja} e BA = {banana, morango}.

    Definicao. Se A, X sao conjuntos e A X, o complementar de A com respeito a X e oconjunto {XA = XA.

    Por exemplo, se A = {azul, verde, vermelho, laranja, maca} e o conjunto dos nossos exem-

    plos anteriores e B = {azul, verde, vermelho}, entao {AB = {laranja, maca}.

    A figura abaixo e uma representacao da nocao de complementar.

    Fig.3. O complementar de A em relacao a X.

    Proposicao 1.3.4. Sejam A, B e C conjuntos quaisquer e X um conjunto que contem A B.Entao

    i. A = A e AA = .

    ii. B C = A C A B.iii. A B = A (A B).iv. A B = A {XB.

    Demonstracao. Prova de i. Ja que nao contem elementos,

    A = {x ; x A e x / } = {x ; x A} = A.E observando que nenhum objeto x pode ser tal que x A e x / A, obtemos que AA = .

    Prova de ii. Observe que,

    B C (x B = x C) (x / C = x / B).J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 9 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    Portanto

    (x A C) = (x A e x / C) = (x A e x / B) = x (A B),isto e, todo elemento de A C e tambem elemento de A B. Logo A C A C.

    Prova de iii. A inclusao A B A (A B) e consequencia de ii., pois A B B. Paraa outra inclusao observamos que

    (x A (A B)) = (x A e x / A B) = (x A e (x / A ou x / B)) =((x A e x / A) ou (x A e x / B)) = ((x AA) ou (x A B)).

    Como, por i., AA = , obtemos

    ((x AA) ou (x A B)) = (x A B),e portanto A (A B) A B. Observe que as implicacoes = do argumento podem serinvertidas a=, isto e, substitudas por para provar as duas inclusoes simultaneamente.

    Prova de iv. Ja que A B X, isto e, (x A B) = x X, obtemosA B = {x ; x A e x / B} = {x X ; x A e x / B}

    = {x X ; x A} {x X ; x / B} = {x ; x A} {x ; x X e x / B}= A (X B) = A {XB. C.Q.D.

    As propriedades basicas do complementar sao dadas no seguinte resultado:

    Proposicao 1.3.5. Sejam A e B conjuntos e X um conjunto que contem A B. Entao:(a) A {XA = , e A {XA = X.(b) {X({XA) = A.

    (c) {X = X, e {XX = .

    (d) A B {XB {XA(e) (Leis de De Morgan) As relacoes entre as operacoes e com {X sao:

    {X(A B) = ({XA) ({XB) e {X(A B) = ({XA) ({XB).

    Demonstracao. Os itens (a)-(d) sao simples e os deixaremos como exerccio para o leitor.

    Provemos a primeira das leis de De Morgan:

    x {X(A B) (x X e x / A B) (x Xe ((x / A) e (x / B)))J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 10 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    (x X e x / A) e (x X e x / B) (x {XA) e (x {XB) x ({XA) ({XB).A segunda das formulas de De Morgan pode ser provada de maneira similar, mas tambem

    pode ser obtida da primeira com ajuda do item (b). De fato, como

    {X({XA {XB) = {X({XA) {X({XB) = A B,

    temos que {XA {XB = {X({X({XA {XB)) = {X(A B). C.Q.D.

    As leis de De Morgan podem ser generalizadas, sem dificuldade, a unioes e interseccoes

    de famlias de conjuntos da seguinte maneira: Se F = {A} e uma famlia de subconjuntosde um conjunto X, entao

    {X(

    A)=

    ({XA), e {X(

    A)=

    ({XA).

    Vamos introduzir outra operacao entre conjuntos, o produto cartesiano. O resultado desta

    nova operacao sera um conjunto de natureza diferente da natureza dos conjuntos envolvidos.

    Na definicao a seguir, a nocao de par ordenado desempenha papel fundamental. Se a e b

    sao dois objetos quaisquer (nao necessariamente pertencentes ao mesmo conjunto), podemos

    considerar o objeto (a, b) no qual os elementos a e b serao denominados a primeira coordenada

    e a segunda coordenada do par (a, b), respectivamente.

    Dizemos que os pares ordenados (a, b) e (c, d) sao iguais e escrevemos (a, b) = (c, d) se,

    e somente se, a = c e b = d, isto e, dois pares ordenados sao iguais se, e somente se, as suas

    coordenadas correspondentes sao iguais.

    Observemos entao que, se (a, b) e um par ordenado, entao

    (a, b) = (b, a) se, e somente se, a = b.

    Definicao. Sejam A e B dois conjuntos quaisquer. Designamos por A B o conjunto cujoselementos sao todos os possveis pares ordenados (a, b) onde a A e b B. Isto e,

    A B = {(a, b) ; a A e b B}.

    Na Fig.4. mostramos uma representacao grafica do produto cartesiano, na qual o conjunto

    A consiste de tres segmentos horizontais de pontos (os elementos de A sao os pontos dos

    segmentos) e B consiste de um segmento vertical de pontos. O produto cartesiano destes dois

    conjuntos e formado pelos pontos das faixas retangulares indicadas.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 11 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    Fig.4. O produto cartesiano representado graficamente

    Por exemplo, sejam A = {a, b, c} e B = {?, }. Entao

    A B = {(a, ?), (a, ), (b, ?), (b, ), (c, ?), (c, )}.

    Observe por exemplo, que os pares ordenados (?, a), (a, a), (, ?) nao pertencem a AB.De maneira similar podemos definir o produto cartesiano de tres ou mais conjuntos. Se A,

    B, e C sao conjuntos, definimos ABC como sendo o conjunto (AB)C e similarmente, seA1, A2, . . . , An sao conjuntos, definimos A1 A2 . . .An como sendo o conjunto (A1 A2 . . .An1)An. Os elementos de A1A2 . . .An sao as n-uplas ordenadas (a1, a2, . . . , an)onde a1 A1, a2 A2, . . . , an An, e duas n-uplas (a1, a2, . . . , an) e (b1, b2, . . . , bn) de A1 A2 . . . An sao consideradas iguais se, e so se, a1 = b1, a2 = b2, . . . , an = bn. Todas aspropriedades que estudaremos sobre o produto cartesiano de dois conjuntos continuam validas

    para o produto cartesiano de mais de 2 conjuntos.

    A seguinte proposicao descreve duas propriedades basicas do produto cartesiano.

    Proposicao 1.3.6. Sejam A, B, C, D conjuntos. Entao:

    (a) A B = (A = ) ou (B = ).(b) Se CD 6= , tem-se: (CD A B) ( (C A) e (D B) ).

    Demonstracao.

    (a) A propriedade do enunciado (a) equivale1 a

    (A B 6= ) (A 6= ) e (B 6= ).Se A B 6= , existe (a, b) A B, e pela definicao de A B, a A e b B. Logo A 6= eB 6= .

    1Se p e q sao proposicoes logicas, a proposicao (p q) (qp qq) e sempre verdadeira independen-temente dos valores logicos de p e q, onde qp e qq sao as negativas de p e q respectivamente.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 12 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos 1.3 Operacoes com Conjuntos

    Reciprocamente, se A 6= e B 6= , existem elementos a A e b B. Portanto o parordenado (a, b) pertence ao produto A B, i.e., A B 6= .

    (b) Suponhamos primeiro que CD A B. Como, por hipotese, CD 6= , pelo item(a), C 6= e D 6= . Seja d0 D um elemento fixo. Pela definicao do produto cartesiano temos

    c C = (c, d0) CD A B = (c, d0) A B = c A,logo C A. Similarmente verifica-se que D B (exerccio).

    Reciprocamente, para todo (c, d) CD, tem-se c C e d D, e por hipotese, c A ed B. Logo (c, d) A B, provando que CD A B. C.Q.D.

    No item (b) da proposicao acima, e importante observar que a hipotese C D 6= efundamental. Por exemplo, sejam A C, A 6= C, B qualquer conjunto nao vazio e D = .Entao C D = A B, mas e falso que C A. A hipotese C D 6= e usada apenas naimplicacao =.

    O ultimo resultado desta secao diz que o produto cartesiano verifica a propriedade distri-

    butiva sobre as operacoes , e .

    Proposicao 1.3.7. Se A, B, C sao conjuntos, valem as seguintes formulas de distributividade:

    (a) A (B C) = (A B) (A C).(b) A (B C) = (A B) (A C).(c) A (B C) = (A B) (A C).

    Demonstracao. Prova de (a): Para todo (a, b) tem-se

    (a, b) A (B C) (a A) e (b B C) (a A) e (b B ou b C) (a A e b B) ou (a A e b C) (a, b) A B ou (a, b) A C (a, b) (A B) (A C).Os itens (b) e (c) podem ser demonstrados de maneira similar. C.Q.D.

    Consideremos, de novo, duas famlias de conjuntos F = {A} e G = {B} . Pode-seprovar, sem dificuldade, que valem as seguintes propriedades distributivas:(

    A) (

    B)=

    (,)

    (A B), e(

    A) (

    B)=

    (,)

    (A B),

    Dito em palavras, a intersecao (resp. uniao) de duas unioes (resp. interseccoes) de famlias e

    igual a` uniao (resp. intersecao) da famlia I = {A B}(,) (resp. U = {A B}(,) )

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 13 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos 1.4 O Conjunto Potencia

    indexada pelo conjunto . Mais ainda, ao inves de considerar duas famlias podemos con-siderar uma famlia de famlias e provar propriedades similares, mas este ponto e bem mais

    delicado e o deixaremos para um curso avancado.

    De maneira similar, podemos demonstrar que as unioes e interseccoes de famlias se

    distribuem sobre o produto cartesiano, isto e, se F e G sao as famlias acima, entao(

    A) (

    B)=

    (,)

    (A B), e(

    A) (

    B)=

    (,)

    (A B),

    1.4 O Conjunto Potencia

    Finalizamos o nosso primeiro captulo com um exemplo muito importante.

    Definicao. Se A e um conjunto qualquer, designamos por P(A) ou 2A o conjunto cujos elemen-tos sao todos os subconjuntos de A. Tal conjunto e chamado o conjunto potencia de A. Isto e, o

    conjunto potencia e determinado pela propriedade B A B P(A).Resumimos alguns fatos basicos sobre o conjunto potencia de um conjunto dado na se-

    guinte proposicao:

    Proposicao 1.4.1. Sejam A, B e X conjuntos quaisquer, tais que A X. Entao:(a) a A {a} P(A).(b) , A P(A). Em particular P(A) 6= .(c) A B = P(A) P(B).(d) P e comutam, isto e, P(A B) = (P(A)) (P(B)).(e) P e NAO comutam. Mais exatamente, vale que P(A B) (P(A)) (P(B))

    mas a igualdade nem sempre se verifica.

    (f) P(A) P({XA) = P() = {}.

    Demonstracao. Os itens (a)-(c) seguem facilmente da definicao. O item (f) e consequencia

    direta de (d) e do fato de que A e {XA sao conjuntos disjuntos.

    Prova de (d): Para todo conjunto C tem-se que

    C P(A B) (C A B) (C A e C B) (C P(A) e C P(B)) C P(A) P(B).J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 14 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos Exerccios

    Prova de (e): Observamos que, como A A B e B A B tem-se, em virtude de (c),que P(A) P(A B) e P(B) P(A B). Logo,

    P(A) P(B) P(A B).

    Para mostrar que a igualdade nem sempre e verdadeira basta dar um exemplo (isto e, um

    contra-exemplo para a igualdade da afirmativa):

    Consideremos A = {?} e B = {}, entao P(A) = {, A}, P(B) = {, B}, e portanto, P(A) P(B) = {, A, B}. Por outro lado, A B = {?, } e P(A B) = {, A, B, A B}. ComoA B / P(A) P(B), os conjuntos P(A B) e P(A)) (P(B) sao distintos. C.Q.D.

    E interessante observar aqui que (e) e (f) podem ser generalizados a famlias de conjuntos.

    Isto e, se F = {A} e uma famlia de conjuntos, entao valem as relacoes:

    P(A) = P(

    A

    )e

    P(A) P(

    A

    ).

    Exerccios

    1. Prove que a relacao e uma relacao transitiva, i.e., se A, B e C sao conjuntos tais que A Be B C, entao A C. Prove, dando um contra-exemplo, que a relacao nao e transitiva.2. Sejam A, B e C conjuntos. Prove que

    (a) Se B A, entao B C A C e B C A C.(b) As operacoes e sao comutativas e associativas:

    A B = B A e A B = B A,

    A (B C) = (A B) C e A (B C) = (A B) C.

    3. Sejam A = {?} e B = {?, }. Diga se as afirmacoes abaixo sao falsas ou verdadeiras, ejustifique sua resposta:

    (a) A B (b) A B (c) ? A (d) B4. Sejam A e B subconjuntos de um conjunto X. Prove que:

    (a) A B = A {XB B {XA.(b) A B = X {XB A {XA B.J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 15 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos Exerccios

    5. Sejam A e B conjuntos quaisquer. Prove que:

    (a) Os conjuntos (A B) e (A B) sao disjuntos e A = (A B) (A B).(b) Os conjuntos A e BA sao disjuntos e A B = A (BA).6. Prove que A {A} se, e somente se, A = .7. Prove as seguintes relacoes:

    (a) (A C) (B C) = (A B) C, (b) (A C) (B C) = (A B) C,(c) (A C) (B C) = (A B) C, (d) (A B) (A C) = A (C B),(e) (A B) (A C) = A (B C), (f) (A B) (A C) = A (B C).

    8. Sejam A e B conjuntos quaisquer. Prove que existe um unico conjunto X que verifica as

    igualdades A X = A B e A X = simultaneamente.9. Sejam A = {0, 1, 2, {2}, 3} e B = {{1}, 1, 4}.

    (a) Determine A B e A B.(b) Diga se as afirmacoes abaixo sao falsas ou verdadeiras, e justifique sua resposta:

    2 A {2} A {2} A {2, {2}} 6= {{2}, 2} {2, {2}} A 2 A .

    10. Dados dois conjuntos A e B sua diferenca simetrica e definida como sendo o conjunto

    AB = (A B) (BA). Prove que AB = (A B) (A B). Interprete a diferenca simetricapor meio de um desenho.

    11. SejamA e B conjuntos nao vazios. Prove que, se (AB)(BA) = CC, entaoA = B = C.12. Sejam A,B X e C,D Y conjuntos. Prove que:(a) (A C) (BD) = (A B) (C D).(b) (A C) (BD) (A B) (C D).(d) (A B) (C D) = (A C) (BD) (AD) (B C).(e) {XY(BD) = (({XB) Y) (X ({YD)).(e) De um contra-exemplo para mostrar que a igualdade em (b) nem sempre e verdadeira.

    13. Designamos por N o conjunto dos numeros naturais N = {0, 1, 2, 3, . . .}. Dizemos que umconjunto A e finito se podemos fazer uma correspondencia entre os elementos de A e os ele-

    mentos de um subconjunto de N da forma {1, 2, 3, . . . , n} para algum n N. Convencionamosque o conjunto vazio e finito. Se A e um conjunto finito que se corresponde com o subconjunto

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 16 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos Exerccios

    {1, 2, . . . , n}, dizemos que A possui n elementos. O natural n e o cardinal de A e o designamos

    por #A. O conjunto vazio tem cardinal 0, isto e, # = 0. Os conjuntos com cardinal 1 saochamados conjuntos unitarios.

    Se A e B sao conjuntos finitos mostre que

    #(A B) = #(A) + #(B) #(A B) .

    14. Sejam A um conjunto com 10 elementos e B um conjunto com 15 elementos. O que se

    pode dizer do cardinal de A B, A B e A B ?15. Uma pesquisa mostra que 63% do povo americano gosta de queijo enquanto 76% gosta

    de maca. O que se pode dizer sobre a porcentagem do povo americano que gosta de queijo e

    maca?

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 17 Instituto de Matematica - UFF

  • Conjuntos Exerccios

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 18 Instituto de Matematica - UFF

  • Captulo 2

    Os Inteiros

    2.1 Notacao

    Este captulo sera dedicado a estudar as propriedades do conjunto Z dos numeros inteiros:

    Z = {. . . ,4,3,2,1, 0, 1, 2, 3, 4, . . .}.

    Dentre os subconjuntos de Z destacamos os seguintes:

    O conjunto dos numeros naturais N = {0, 1, 2, 3, . . .}. O conjunto dos numeros naturais nao nulos N = N {0} = {1, 2, 3, . . .}.Este conjunto tambem e chamado o conjunto dos numeros inteiros positivos e se designa por

    Z+.

    O conjunto dos numeros inteiros nao nulos Z = Z {0} = {. . . ,3,2,1, 1, 2, 3, . . .}. O conjunto dos numeros inteiros negativos Z = {1,2,3, . . .}.Do acima estabelecido segue que o conjunto dos inteiros nao positivos e o conjunto

    {ZZ+ = Z Z+ = {0,1,2,3, . . .}.

    Analogamente, o conjunto dos inteiros nao negativos e o conjunto

    {ZZ = Z Z = {0, 1, 2, 3, . . .}.

    Dizemos que um numero inteiro a Z tem sinal positivo, se a e positivo, isto e, a Z+, edizemos que tem sinal negativo, se a e negativo, a Z.

    19

  • Os Inteiros 2.2 Operacoes

    Dados a, b Z, dizemos que a e b tem o mesmo sinal quando ambos tem sinal positivo ouambos tem sinal negativo, isto e, ambos pertencem a Z+ ou ambos pertencem a Z. Diremosque a e b tem sinais contrarios quando um deles e positivo e o outro e negativo.

    2.2 Operacoes

    No captulo anterior estudamos algumas operacoes sobre conjuntos. Estas operacoes nos per-

    mitiram construir, a partir de conjuntos dados, um novo conjunto. Nesta secao vamos introduzir

    a nocao de operacao desde um ponto de vista global e depois enfocar a nossa atencao em

    operacoes definidas no conjunto Z dos numeros inteiros.

    Definicao. Seja A um conjunto nao vazio. Uma operacao sobre A e uma lei que a cada par

    ordenado de elementos de A faz corresponder um elemento de A. Se ? e uma operacao em

    A e (a, b) A A, escrevemos ?(a, b) ou a ? b para designar o elemento de A determinadoao aplicar a operacao ao par ordenado (a, b). Dizemos que a ? b e o resultado de aplicar a

    operacao ? ao par ordenado (a, b) AA.Em smbolos escrevemos

    ? : AA A(a, b) 7 a ? b .

    Da definicao de operacao obtemos que: dados a, b A, se a = a e b = b entao, a?b = a ?b .

    Por exemplo, consideremos um conjunto A = {,} contendo dois elementos. Definimos uma

    operacao ? : AA A mediante a seguinte tabela:?

    Nesta tabela, escrevemos a primeira coordenada dos pares ordenados

    de A A na coluna embaixo de ?, e a segunda coordenada na fila a`direita de ?. A primeira fila da tabuada se lee: ? = , ? = , e a

    segunda fila ? = e ? = .Neste exemplo observamos que, quaisquer que sejam x, y A tem-se x ? y = y ? x. Umaoperacao verificando esta propriedade e chamada comutativa. Tambem, quaisquer que sejam

    x, y, z A, vale x? (y? z) = (x?y)? z (verifique este fato!). Uma operacao com esta propriedadee chamada associativa. O elemento de A tem a propriedade de que ? x = x ? = x, isto e,

    e um elemento neutro para a operacao ?.

    Vejamos outro exemplo. Seja B = {0, 1, 2, 3, 4} e consideremos a operacao ? : B B Bdefinida pela tabela abaixo:

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 20 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.2 Operacoes

    ? 0 1 2 3 4

    0 0 0 0 0 0

    1 0 1 2 3 4

    2 0 2 4 1 3

    3 0 3 1 4 2

    4 0 4 3 2 1

    Segundo esta tabela vemos que 1?x = x?1 = x qualquer

    que seja x B, isto e, 1 e um elemento neutro para aoperacao ?. Observando com cuidado vemos que a tabu-

    ada e simetrica em relacao a` diagonal, logo a operacao ?

    e comutativa. Podemos verificar que a operacao ? e as-

    sociativa e que para cada x B {0}, existe y B tal quex ? y = 1, pois 1 ? 1 = 1, 2 ? 3 = 3 ? 2 = 1 e 4 ? 4 = 1.

    Vamos agora enfocar a nossa atencao no conjunto Z dos numeros inteiros.

    Sobre o conjunto Z dos numeros inteiros podemos definir muitas operacoes. As operacoesde soma e de multiplicacao, com as quais ja estamos familiarizados, serao de fundamental

    importancia no resto deste captulo:

    + : Z Z Z (m,n) 7 m+ n (operacao de soma ou adicao) : Z Z Z (m,n) 7 m n (operacao de multiplicacao ou produto)

    A multiplicacao de dois numeros inteiros a e b sera tambem designada pela justaposicao ab,

    isto e, colocando um numero apos o outro. Esta terminologia devera ser usada com cuidado,

    por exemplo: 15 e o inteiro quinze e nao 1 5. Por outro lado, se a Z, 2a se entende como 2 a.Da nocao geral de operacao, tem-se a seguinte regra que utilizaremos com frequencia:

    Dados a, b, c Z temos que

    (i) se a = b entao a+ c = b+ c ,

    (ii) se a = b entao a c = b c .

    Mais tarde voltaremos a falar sobre esta regra, ou mais especificamente, sobre a sua recproca

    (vide as leis de cancelamento para adicao e multiplicacao).

    Na pratica fazemos uso das operacoes de soma e multiplicacao, junto com uma serie de pro-

    priedades ou regras de manipulacao, que na maioria dos casos aplicamos de maneira quase

    automatica sem reparar muito nos detalhes.

    Com o objetivo de entender com mais detalhe a natureza destas operacoes e mesmo para en-

    tender o por que de alguns erros que se cometem com frequencia na pratica, vamos apresentar

    tais propriedades e fazer uma analise cuidadosa das consequencias e fatos que delas se obtem

    .

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 21 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.2 Operacoes

    Propriedades das operacoes de soma e de multiplicacao em Z:

    (1) Comutatividade: a+ b = b+ a para todo a, b Z, a b = b a para todo a, b Z.

    (2) Associatividade: (a+ b) + c = a+ (b+ c) para todo a, b, c Z, (a b) c = a (b c) para todo a, b, c Z.

    (3) Distributividade: a (b+ c) = a b+ a c para todo a, b, c Z, (a+ b) c = a c+ b c para todo a, b, c Z.

    (4) Existencia de elementos neutros (0 para a adicao e 1 para a multiplicacao): 0+ a = a = a+ 0 para todo a Z. 1 a = a = a 1 para todo a Z.

    (5) Existencia de simetricos: a+ (a) = 0 = (a) + a para todo a Z.

    Notacao. Dados a, b Z, escrevemos a b para significar a + (b), isto e, a soma de a como simetrico de b. O numero a b se le a menos b.

    Observamos que a propriedade descrita no item (5) diz respeito apenas a` operacao de

    soma. Dado a Z, o numero a Z e chamado o simetrico de a.Como dito anteriormente, podemos definir varias operacoes sobre Z. Uma delas, com a

    qual estamos bastante familiarizados e a operacao diferenca dada pela notacao acima:

    : Z Z Z(a, b) 7 a b = a+ (b),

    Outro exemplo de operacao definida sobre o conjunto Z e:

    : Z Z Z(a, b) 7 a b = 2 a+ b.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 22 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.2 Operacoes

    Muita atencao!!

    Observe que nos sabemos somar apenas dois elementos de cada vez. O que significaentao uma expressao tao conhecida como a + b + c onde a, b, c Z? Melhor dizendo,faz sentido a expressao acima? De fato, mantendo a ordem em que a, b, c aparecem na

    expressao so podemos opera-los como a + (b + c) ou (a + b) + c o que da na mesma,

    segundo a propriedade de associatividade da soma. E por esta razao que a + b + c faz

    sentido. Se quisermos alterar a ordem em que a, b, c aparecem na expressao tambem

    podemos faze-lo, desta vez, lancando mao da propriedade de comutatividade.

    Em virtude das propriedades associativa e comutativa da multiplicacao, as mesmas

    consideracoes acima podem ser aplicadas ao produto de tres ou mais inteiros, isto e,

    se a, b, c Z, o produto a b c pode ser entendido como a (b c) ou como (a b) c, ouainda como b (a c) etc. Outro exemplo, se a, b, c, d, e, f, g Z,

    a+ b+ c+ d+ e+ f+ g = (a+ (b+ (c+ (d+ (e+ f))))) + g

    = ((a+ b) + (c+ d)) + ((e+ f) + g) = etc.

    a b c d e f g = ((a b) (c (d (e f)))) g= ((a b) (c (d (e f)))) g = etc.

    Do item anterior conclumos que nas expressoes a+ (b+ c) e (a+ b) + c com a, b, c Zpodemos ignorar o parenteses, isto e, a + (b + c) = a + b + c = (a + b) + c. Sera que

    podemos fazer isto na expressao a (b c), escrevendo a (b c) = a b c =

    (ab)c ? Se a operacao diferenca fosse associativa, poderamos faze-lo mas isto nao e

    verdade (prove!). Exatamente por esta razao tambem nao podemos ignorar o parenteses

    na expressao a(b+c), escrevendo a(b+c) = ab+c. De fato, a(b+c) = (ab)c.

    O que e intrigante e que apesar da operacao diferenca nao ser associativa nos bem que

    entendemos o que significa a b c ! Bem, neste caso quando lemos a expressao

    a b c de fato estamos lendo (a b) c e nao a (b c). Isto e uma convencao que,

    evidentemente, respeitaremos.

    Trabalhando com as operacoes de soma e multiplicacao sobre Z nos utilizaremos comfrequencia as propriedades de (1) a` (5). Alem delas, utilizaremos tambem varias de suas con-

    sequencias, listadas abaixo e de facil demonstracao.

    Consequencia 1. 0 a = 0 = a 0 , a Z.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 23 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.2 Operacoes

    Demonstracao. Das propriedades acima descritas temos que 0 a = (0 + 0) a = 0 a + 0 a.Agora, somando (0 a) a cada membro da equacao 0 a = 0 a + 0 a nos conclumos que0 a = 0 para todo a Z. Da segue que 0 a = 0 = a 0 para todo a Z. C.Q.D.

    Consequencia 2. (1) a = a , a Z.

    Demonstracao. Temos que (1) a + a = (1) a + (1) a = (1 + 1) a = 0 a = 0.Agora, somando a a cada um dos membros da equacao (1) a+ a = 0 nos conclumos que(1) a = a, a Z. C.Q.D.

    Destas duas consequencias temos: 0 = (1) 0 = 0.

    Consequencia 3. Mais geralmente, repetindo adequadamente os argumentos acima, nos

    conclumos que

    a (b) = (a) b = a b , a, b Z.E esta propriedade que nos permite garantir que

    a (b c) = a b a c , a, b, c Z.

    De fato,

    a (b c) = a (b+ (c)) = a b+ a (c) = a b+ (a c) = a b a c.

    Consequencia 4. a b = 0 a = b.Demonstracao. Com efeito,

    a b = 0 a+ (b) = 0 pela definicao da diferenca a b (a+ (b)) + b = 0+ b somando b em ambos lados da igualdade a+ ((b) + b) = b pela propriedade associativa a+ 0 = b pela propriedade dos simetricos a = b pela propriedade do elemento neutro aditivo. C.Q.D.Consequencia 5. (1)(1) = 1 e portanto, (a) = a, para todo a Z.

    Demonstracao. Com efeito, tem-se

    (1)(1) 1 = (1)(1) + (1) = (1)(1) + (1) 1 = (1)(1+ 1) = (1) 0 = 0.

    e entao, pelo item anterior (1)(1) = 1.

    Logo, (a) = (1)((1)a) = ((1)(1))a = 1 a = a, para todo a Z. C.Q.D.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 24 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.2 Operacoes

    Repare que, se a Z+ entao a Z e reciprocamente, se a Z entao a Z+.Portanto devemos ter cuidado com o seguinte:

    E falso que: Se a e um inteiro, entao a e um inteiro negativo.

    Com efeito, observe que

    (1) = (1)[(1)1] = [(1)(1)]1 = 1 1 = 1((3)) = (1)[(1){(1)3}] = (1)[{(1)(1)}3] = (1)[1 3] = (1)3 = 3

    ((((n)))) = n, para todo n Z, e assim por diante.

    Consequencia 6. Lei do cancelamento para a adicao.

    Dados a, b, c Z temos:a+ c = b+ c = a = b

    Demonstracao. Sejam a, b, c Z e suponhamos que a+ c = b+ c. Assim , obtemos:a+ c = b+ c = a+ c+ (c) = b+ c+ (c) = a+ 0 = b+ 0 = a = b,

    e a demonstracao esta terminada. C.Q.D.

    Para demonstrar a lei do cancelamento para a multiplicacao precisamos do seguinte lema.

    Lema 2.2.1. Sejam a, b Z. Se a b = 0 entao a = 0 ou b = 0.

    A demonstracao deste lema sera feita mais tarde quando introduzirmos o conceito de divisi-

    bilidade. Vamos agora utiliza-lo para demonstrar a lei do cancelamento para a multiplicacao.

    Consequencia 7. Lei do cancelamento para a multiplicacao.

    Dados a, b, c Z com c 6= 0 temos:a c = b c = a = b

    Demonstracao. Sejam a, b, c Z e suponhamos que a c = b c. Assim , obtemos:a c = b c = a c b c = 0 = (a b) c = 0 = a b = 0 ou c = 0.

    Como c 6= 0 por hipotese, segue do lema acima que ab = 0, isto e, a = b e a demonstracaoesta terminada. C.Q.D.

    Definicao. Seja a Z. O valor absoluto ou modulo de a, denotado |a| se define por

    |a| =

    a , se a e positivo

    0 , se a = 0

    a , se a e negativo .

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 25 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    Desta definicao temos que, se a Z, entao |a| e um inteiro positivo. Alem disso,

    |a| = 0 a = 0.Por exemplo, |2| = 2 = (2) = | 2|.

    E importante observar que, | a| = a se, e somente se, a e um inteiro positivo.

    Exerccios

    1. Calcule

    (a) 2 2(3 (1)) + (5 3(5 2(1(2 4)))).

    (b) 3+ (3 (4 2(1 2)2)(2 3(1+ (3 2+ 2))(2))).(c) 2 |2(2+ (5 2(3 | 4|)))| | |3 |2| | 1| |.

    2. Sejam a Z e b Z. Diga se as afirmacoes abaixo sao falsas ou verdadeiras e justifiquesuas respostas.

    (i) a e um inteiro negativo,

    (ii) a+ b e um inteiro positivo,

    (iii) 2a e um inteiro positivo,

    (iv) a a e um inteiro positivo,(v) 100 a e um inteiro nao negativo,

    (vi) 0 e 2 tem o mesmo sinal,

    (vii) 1+ (a b)(a b) e um inteiro positivo,

    (viii) |b| e nao negativo,

    (ix) |a+ 3| = a+ 3,

    3. Elimine os parenteses nas expressoes abaixo.

    (i) a 3(2a (a+ b) a(b 2(a+ b))a b),

    (ii) 2(a+ 1 b(2 2a(1 b)) 3b 2(4 (a 2))),

    (iii) (2 |a| + 3(a (a 1) + |a+ 1|) 2(1 |a+ 3|)).

    4. Determinar tres inteiros, sabendo que a soma do primeiro com o segundo e 32, a soma do

    segundo com o terceiro e 36 e a soma do primeiro com o terceiro e 34.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 26 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    5. Considere dois inteiros de soma S, de diferenca D e de produto P. Responda as questoes

    seguintes selecionando a resposta correta dentre as propostas.

    (a) Adicionamos 5 a um dos inteiros e 3 ao outro. O que acontece com S?

    (b) Adicionamos 4 a cada um dos inteiros. O que acontece com S? E com D?

    (c) Multiplicamos cada inteiro por 2. O que acontece com S? E com D? E com P?

    (d) Multiplicamos um dos inteiros por 5 e o outro por 3. O que acontece com P?

    Respostas propostas.

    (i) Nao varia.

    (ii) Aumenta de 5.

    (iii) Diminui de 8.

    (iv) Dobra.

    (v) Fica multiplicada por 15.

    (vi) Triplica.

    (vii) Fica multiplicada por 4.

    (viii) Aumenta de 8.

    6. Um filho tem 11 anos e sua mae 35 anos. Daqui a quantos anos a idade da mae sera o triplo

    da idade do filho.

    7. A idade de duas pessoas somam 120 anos. Subtraindo-se 10 anos da idade da mais velha e

    acrescentando-os a` da mais moca, as idades tornam-se iguais. Qual a idade de cada uma?

    8. Um radio e uma televisao custam juntos R$ 1.500,00. Comprando apenas o radio me sobraria

    R$ 200,00mas para adquirir a televisao precisava ter mais R$ 300,00 do que possuo. Quanto

    custou o radio, a televisao e quanto possuo?

    9. Duas cidades A e B distam 200 km. A`s 8 horas, parte de A para B, um trem com velocidade

    de 30 km por hora e, duas horas depois, parte de B para A um outro trem com velocidade de 40

    km por hora. A que distancia de A, dar-se-a o encontro dos trens?

    10. Determine o valor de a Z na equacao

    2(a (2 a) + (1 2a)(2 3(5 2))) = 3a (a 2(a 3(a 1))).

    11. Use o Lema 2.2.1 para mostrar que se a, b, c Z sao tais que abc = 0 entao ou a = 0 ou

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 27 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    b = 0 ou c = 0.

    12. Determine todas as solucoes inteiras das equacoes:

    (i) (a+ 2)(2 a)(a 2(a 2)) = 0,

    (ii) (a 2)(3+ b)ab = 0,

    (iii) (a 1)(3+ b)(a b) = 0,

    (iv) ab+ 3a 2b = 6,

    (v) |a| = 1,

    (vi) |a 2| = 3,

    (vii) |2 a| |b+ 3| = 0,(ix) |a| + a = 0.

    13. Use a lei de cancelamento da multiplicacao para determinar todas as solucoes inteiras das

    equacoes:

    (i) 2a = 2, (ii) 2a = a, (iii) ab = b.

    14. Mostre que a hipotese, a 6= 0 na lei de cancelamento para a multiplicacao, e essencial.

    15. Da associatividade da operacao soma podemos concluir que (a b) + c = a (b + c)?

    Justifique sua resposta.

    16. Mostre que o Lema 2.2.1 usado para demonstrar a lei do cancelamento para a multiplicacao

    e de fato equivalente a tal lei, i.e., mostre que a lei implica o lema e que o lema implica a lei.

    Alias, esta ultima parte nos ja fizemos.

    17. Sejam a, b Z. Mostre que |a| = |b| se, e somente se, a = b ou a = b.

    18. Considere dois inteiros iguais a e b.

    Temos entao que:

    a = b = a2 = ab = a2 b2 = ab b2 = (a b)(a+ b) = (a b)b.Usando a lei do cancelamento para a multiplicacao, obtemos a+b = b. agora tomando a = 1 =

    b conclumos que 2 = 1.

    Onde esta o erro?

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 28 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    2.3 Potencias Naturais de Numeros Inteiros

    Definicao:

    a0 = 1 para todo a Z

    ak = a . . . a k vezes

    para todo a Z e k N.

    Nesse contexto temos: a1 = a , a2 = a a , a3 = a a a = a2 a , e assim por diante.Na definicao acima, nos dizemos que an e uma potencia tendo como base o inteiro a e como

    expoente o natural n.

    Propriedades das potencias.

    Dados a, b Z e m,n N temos:

    1. am+n = am an

    2. (a b)n = an bn

    3. (an)m = anm

    Voce entendeu o porque da condicao a, b Z ao inves da condicao a, b Z ? Ela serveapenas para evitar a potencia 00 que nao foi definida. Uma outra forma de enunciar a primeira

    regra, poderia ser, por exemplo:

    Sejam a Z e m,n N tais que am+n, am e an estao definidos. Entao am+n = am an.

    Exerccios

    1. Sejam a, b Z. Mostre que:(i) (a+ b)2 = a2 + 2ab+ b2,

    (ii) (a b)2 = a2 2ab+ b2,

    (iii) (a+ b)(a b) = a2 b2,

    (iv) (a+ b)3 = a3 + 3a2b+ 3ab2 + b3.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 29 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    2. Use o desenvolvimento de (a+ b)3 para concluir que

    (a b)3 = a3 3a2b+ 3ab2 b3.

    3. Diga se e falso ou verdadeiro e justifique sua resposta:

    (a) 2k+1 + 6 = 2(3+ 2k) para todo k N,(b) 6n+1 6n = 2n 3n+1 + 2n+1 3n para todo n N,(c) 2n + 10m = 2n(1+ 10mn 5n) para todo m,n N com m n.

    4. Seja a Z. Mostre que a2 = 1 se, e somente se a = 1 ou a = 1.

    Demonstracao. Temos que a2 = 1 a2 1 = 0 (a 1)(a + 1) = 0. Agora, usando oLema 2.2.1 obtemos

    (a 1)(a+ 1) = 0 a+ 1 = 0 ou a 1 = 0 a = 1 ou a = 1. C.Q.D.5. Use o Lema 2.2.1 para mostrar que se a2 = 0, a Z, entao a = 0.

    6. Use uma das leis de cancelamento para demonstrar que se a2 = 0 com a Z entao a = 0.

    7. Determine os valores da variavel n para os quais as expressoes abaixo fazem sentido em Z.

    (a) 2n,

    (b) (5)n2,

    (c) 2n3 + (2+ n)n+1,

    (d) (2+ n)2+n,

    (e) 2n1,

    (f) 32(n4) 53nn2.

    8. Determine as solucoes inteiras das equacoes:

    (a) (a 1)2 = 0,

    (b) (a 2)2 = 1,

    (c) a2 b2 = 0,

    (d) a2 a+ 6 = 0,

    (e) a2(b+ 1) = a(b+ 1),

    (f) (a 1)3 = a(1 a)2.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 30 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.4 O Binomio de Newton

    (g) a4 16 = 0.

    9. Sejam a, b Z e coloquemos c = a b. Temos entao que a = b+ c. Multiplicando ambos osmembros por a b temos:

    (a b)a = (a b)(b+ c) = a2 ab = ab+ ac b2 bc = a2 ab ac = ab b2 bc= a(a b c) = b(a b c).

    Agora, pela lei do cancelamento para a multiplicacao conclumos que a = b.

    E voce, o que acha disto?

    2.4 O Binomio de Newton

    Muitas vezes temos necessidade de considerar somas com um grande numero de parcelas,

    ou somas com um numero n de termos, onde n e um inteiro positivo qualquer. Por exemplo,

    a1 + a2 + a3 + a4 + a5 + a6 + a7 + a8 + a9 + a10 ,

    b1 + b2 + . . .+ b7 ,

    b1 + . . .+ b8 + b9 ,

    c1 + . . .+ cn , onde n Z+,a0 + a1 + . . .+ ak , onde k N .

    Fixaremos agora uma notacao que facilitara a manipulacao destas somas.

    Sejam n Z+ e a1, a2, . . . , an Z. Escrevemosni=1

    ai (le-se somatorio de ai variando i de 1 ate n)

    para indicar a soma a1 + a2 + . . .+ an.

    De forma similar, escrevemos:

    n+1i=0

    ai = a0 + a1 + . . .+ an+1 , onde n Z+,kj=2

    bj = b2 + . . .+ bk , onde k {2, 3, 4, . . .},m+2k=4

    ck = c4 + c3 + . . .+ cm + cm+1 + cm+2 , onde m Z+,

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 31 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.4 O Binomio de Newton

    pn=0

    a2n = a0 + a2 + a4 + . . .+ a2(p1) + a2p , onde p Z+.

    Note que cada uma das quatro ultimas somas possui um numero mnimo de termos e um

    numero total (nao confundir com maximo) de termos: a primeira delas possui no mnimo 3

    termos e um total de n+ 2 termos, a segunda possui um mnimo de 1 termo e um total de k 1

    termos, a terceira possui um mnimo de 8 termos e um total de ...

    Atencao! Ainda com relacao a`s ultimas quatro somas, e importante voce perceber que, na

    primeira delas, o resultado da adicao de suas parcelas depende de n mas nao de i, na segunda

    o resultado depende de k mas nao de j, na terceira o resultado depende de m mas nao de k, e

    na quarta o resultado depende de p e nao de n.

    Lema 2.4.1 Para quaisquer a, b Z e n Z+, vale a seguinte identidade:

    an bn = (a b)

    n1i=0

    an1i bi .

    Demonstracao. Para demonstrar o lema efetuamos as operacoes indicadas no segundo mem-

    bro da identidade com o objetivo de obter o primeiro membro.

    Temos:

    n1i=0

    an1i bi = an1b0 + an2b1 + an3b2 + . . .+ a2bn3 + a1bn2 + a0bn1.

    Multiplicando ambos os membros desta identidade por a b e efetuando as operacoes:

    (a b)

    n1i=0

    an1i bi = a (

    n1i=0

    an1i bi)

    b (

    n1i=0

    an1i bi)

    = (anb0 + an1b1 + an2b2 + . . .+ a3bn3 + a2bn2 + a1bn1)

    (an1b1 + an2b2 + an3b3 + . . .+ a2bn2 + a1bn1 + a0bn)

    = anb0 a0bn = an bn,

    e a demonstracao esta terminada. C.Q.D.

    Teorema (do binomio de Newton). Dados a, b Z e n Z+ temos:

    (a+ b)n =

    nk=0

    (n

    k

    )akbnk,

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 32 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    onde(n

    k

    )e o numero de combinacoes de n elementos k a` k.

    Veremos mais tarde uma formula para a combinacao de n elementos k a` k mas, voce pode

    concluir com facilidade que:

    1. combinar n elementos 0 a` 0 so podemos faze-lo atraves da colecao com zero elementos,

    isto e, da colecao vazia, e entao (n

    0

    )= 1,

    2. podemos combinar n elementos 1 a` 1 de n maneiras diferentes, e entao(n

    1

    )= n,

    3. podemos combinar n elementos n a` n de uma unica maneira, e entao(n

    n

    )= 1,

    4. podemos combinar n elementos n1 a` n1 de n maneiras diferentes, para isto basta ver

    que uma combinacao com n1 elementos e construda retirando um elemento da colecao

    com n elementos, e entao (n

    n 1

    )= n.

    Por enquanto, vamos nos contentar com isso.

    Exerccios

    1. Quantas parcelas tem as expressoes escritas abaixo:

    (a) a1 + a2 + . . .+ an, onde n Z+,(b) am + am+1 + . . .+ am+s, onde m Z e s Z+,

    (c)n1i=0

    ai+1, onde n 3 Z+,

    (d) am1 + am + . . .+ am+s, onde m Z e s Z+.

    2. Qual o numero mnimo de parcelas que podera ocorrer em cada uma das expressoes do

    exerccio anterior?

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 33 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    3. Reescreva as expressoes abaixo sem usar o smbolo de somatorio.

    (a)nj=0

    aj + 3, onde n N,

    (b)2ni=0

    (1)i ai+1, onde n N,

    (c)n1k=4

    k+2, onde n N.

    4. Qual o numero mnimo de parcelas que podera ocorrer em cada uma das expressoes do

    exerccio anterior?

    5. Sejam p Z e n Z+. Mostre que:

    (a) (a b)n =n

    k=0

    (1)nk(n

    k

    )akbnk,

    (b) (1+ a)n =ni=0

    (n

    i

    )ai,

    (c)n

    k=0

    ak =

    npi=p

    ai+p,

    (d)ni=0

    ai = a0 +

    n1i=0

    ai+1,

    (e)ni=0

    (n

    i

    )= 2n,

    (f)n

    k=0

    (1)k(n

    k

    )= 0.

    6. Mostre que

    (a)ni=0

    (ai + bi) =

    ni=0

    ai +

    ni=0

    bi,

    (b)ni=0

    (c ai) = cni=0

    ai,

    (c)ni=1

    (ai ai1) = an a0.

    7. Diga se as afirmacoes abaixo sao falsas ou verdadeiras justificando suas respostas.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 34 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.5 A Reta Orientada e os Numeros Inteiros

    (a)100n=0

    n2 =

    100n=1

    n2,

    (b)n

    k=0

    (1+ k) = 1+

    nk=0

    k, onde n Z+,

    (c)ni=1

    (i+ 1)4 =

    n1i=0

    i4, onde n Z+,

    (d)n

    k=1

    k2 =

    nsj=1s

    (j+ s)2.

    8. Mostre que (n

    2

    )=

    n1k=1

    (n k) = n(n 1)

    n1k=1

    k,

    para todo n {2, 3, 4, . . .}.

    9. Compare(n

    p

    )e(

    n

    n p

    ).

    10. Seja A um conjunto com n elementos (n N). Mostre que o numero de subconjuntos de Ae 2n. Isto e, #P(A) = 2n.

    11. Qual e o coeficiente de a2x2 no desenvolvimento de (2x+ a)4?

    12. Qual e o coeficiente de x4 no desenvolvimento de (x+ 3)5?

    13. Qual e o coeficiente de ax3 no desenvolvimento de (a x+ 1)4?

    Indicacao: Desenvolva (a x+ 1)4 como ((a x) + 1)4.

    2.5 A Reta Orientada e os Numeros Inteiros

    Considere uma reta e sobre ela fixemos uma orientacao, isto e, fixemos um sentido de

    percurso.

    Representacoes graficas:reta sem orientacao

    sentido de percurso fixado reta anterior com orientacao fixadareta anterior com orientacao oposta

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 35 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.5 A Reta Orientada e os Numeros Inteiros

    Uma reta sobre a qual fixamos uma orientacao (i.e. um sentido de percurso) sera dita uma

    reta orientada. Assim, uma reta orientada e constituda de dois ingredientes: da reta e da

    orientacao escolhida sobre ela.

    Os tres pontinhos colocados a` direita e a` esquerda nas representacoes graficas acima ser-

    vem apenas para indicar que estamos representando graficamente uma parte da reta ou da reta

    orientada. Daqui para frente vamos propositadamente esquece-los, nao esquecendo no entanto

    que estamos representando graficamente uma parte da reta ou da reta orientada.

    Numa reta orientada podemos falar em pontos a` direita (resp. a` esquerda) de um ponto

    dado, da seguinte maneira.

    Seja P um ponto de uma reta orientada. Os pontos a` direita de P sao aqueles que podem

    ser atingidos a partir de P, seguindo o sentido de percurso fixado. Os pontos a` esquerda sao

    aqueles que podem ser atingidos a partir de P, seguindo o sentido de percurso oposto a`quele

    fixado.pontos a` direita de P

    reta orientadaP

    pontos a` esquerda de P

    Pois bem, fixemos em definitivo uma reta orientada r, um ponto arbitrario O sobre ela (cha-

    mado de origem) e um segmento de reta u (dito, unidade de comprimento).

    O ru

    (segmento de reta) unidade de comprimento

    Agora, vamos inserir os numeros inteiros na reta orientada, colocando o numero 0 (zero) na

    origem, os inteiros positivos a` direita da origem e os inteiros negativos a` esquerda da origem,

    como mostrado na figura a seguir.u u u u u u u u

    n n + 1 3 2 1 0 1 2 3 (n 1) n r

    Isto e feito da seguinte maneira:

    1 e 1 sao colocados a` uma unidade da origem,

    2 e 2 sao colocados a` 2 unidades da origem,

    3 e 3 sao colocados a` 3 unidades da origem,...

    ......

    n e n sao colocados a` n unidades da origem, para cada n Z+.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 36 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.5 A Reta Orientada e os Numeros Inteiros

    Diremos que n e n foram colocados na reta orientada, simetricamente em relacao a ori-

    gem. Tambem diremos que o numero 1 foi obtido da origem por translacao a` direita de uma

    unidade, que o numero 1 foi obtido da origem por translacao a` esquerda de uma unidade, que

    2 foi obtido da origem por translacao a` direita de 2 unidade (ou de 1 por translacao a` direita de

    uma unidade), que 2 foi obtido da origem por translacao a` esquerda de 2 unidade (ou de 1 por

    translacao de 3 unidades), e assim por diante.

    De forma mais geral, dados a Z e b Z+ diremos que

    1. a + b (na reta orientada) foi obtido de a (na reta orientada) pela translacao a` direita de b

    unidades, ou simplesmente, a+ b foi obtido transladando a de b,

    2. a b (na reta orientada) foi obtido de a (na reta orientada) pela translacao a` esquerda de

    b unidades, ou simplesmente, a b foi obtido transladando a de b.

    Assim, dados a, b Z entenderemos que a + b e obtido transladando a de b (translacao a`direita se b e positivo, a` esquerda se b e negativo e translacao nula se b = 0).

    Uma outra propriedade importante desta forma de inserir os inteiros na reta orientada, ou

    digamos assim, de mergulhar os inteiros na reta orientada, e a seguinte.

    Dados dois pontos P,Q da reta orientada, existem no maximo um numero finito de inteiros

    entre eles.

    Em particular,

    dado um ponto P da reta orientada, sempre existem inteiros a` direita de P e inteiros a`

    esquerda de P.

    Mais precisamente,

    i. dado um ponto P da reta orientada, existe n0 Z+ tal que n0 esta a` direita de P,P

    n0 Z

    ii. dado um ponto P da reta orientada, existe n0 Z tal que n0 esta a` esquerda de P.P

    n0 Z

    Observe que em ambos os casos o inteiro n0 depende do ponto P considerado.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 37 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    Agora, seja A um subconjunto de Z. Diremos que A e limitado inferiormente (ou, cotadoinferiormente) se existe um ponto P da reta orientada tal que todo elemento de A esta a` direita

    de P. Diremos que A e limitado superiormente (ou, cotado superiormente) se existe um ponto Q

    da reta orientada tal que todo elemento de A esta a` esquerda de P.

    Exemplos.

    a. O conjunto N e limitado inferiormente. Para ver isso, fixe um ponto P da reta, a` esquerdada origem. Neste caso, todo elemento de N esta a` direita de P, o que mostra que N elimitado inferiormente.

    b. O conjunto Z+ nao e limitado superiormente, pois, ja vimos que dado um ponto Q das retaorientada sempre existe um inteiro positivo a` sua direita.

    c. O conjunto Z e limitado superiormente, pois, todo elemento de Z esta a` esquerda daorigem.

    d. O conjunto Z nao e limitado inferiormente nem superiormente. Isto segue do fato que dadoum ponto P sempre existem inteiros a` direita e a` esquerda de P.

    Na proxima secao falaremos de uma outra propriedade de Z enquanto subconjunto da retaorientada. Esta importante propriedade estara relacionada com o conceito de subconjuntos

    limitados inferiormente e superiormente.

    Exerccios

    1. Diga se e falso ou verdadeiro e justifique sua resposta.

    (a) O conjunto dos inteiros nao positivos e limitado inferiormente,

    (b) O conjunto dos inteiros nao negativos e limitado inferiormente.

    2. Sejam A,B Z. Mostre que(a) Se A e B sao limitados superiormente entao, A B e A B sao limitados superiormente.(b) Se A e limitado inferiormente e B e limitado superiormente entao, A B e limitado superior-mente e inferiormente.

    3. Diga se e falso ou verdadeiro e justifique sua resposta.

    (a) Entre dois pontos distintos da reta orientada existe pelo menos um numero inteiro,

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 38 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.6 A Relacao de Ordem

    (b) Dado um ponto P da reta orientada existe um inteiro n0 Z+ tal que n0 5 esta a` direita deP,

    (c) Dado um ponto P da reta orientada existe um inteiro n0 Z+ tal que n0+100 esta a` esquerdade P.

    4. Seja P um ponto da reta orientada e M Z. Mostre que existe n0 Z+ tal que n0 M estaa` direita de P.

    5. Mostre que subconjuntos de conjuntos limitados superiormente (resp. inferiormente) sao

    limitados superiormente (resp. inferiormente).

    6. Nesta secao, nos definimos o que significa um subconjunto de Z ser limitado superiormente.Colocamos agora uma nova definicao: Dizemos que um subconjunto nao vazio A Z e limitadosuperiormente quando existe um numero inteiro N tal que todo elemento de A esta a` esquerda

    de N.

    Mostre que a definicao antiga e a nova sao de fato equivalentes, isto e, mostre que todo sub-

    conjunto nao vazio de Z que e limitado superiormente em relacao a uma das definicoes tambemsera limitado superiormente em relacao a` outra.

    2.6 A Relacao de Ordem (primeiro contato)

    Apos representar o conjunto Z na reta orientada vamos utilizar a orientacao fixada na retapara introduzir em Z uma ordenacao.

    Definicao. Sejam a, b Z. Diremos que a e menor que b (notacao a < b) quando a estaa` esquerda de b na reta orientada. Equivalentemente, diremos que a e maior que b (notacao

    b > a) quando b esta a` direita de a.

    Neste contexto, os inteiros positivos sao aqueles que sao maiores do que zero e os inteiros

    negativos sao aqueles que sao menores do que zero.

    Esta forma de comparacao entre elementos de Z, introduzida pela definicao acima, sera ditarelacao de ordem.

    Observe que, definida a relacao < ao definir a relacao > nao introduzimos nada de novo,

    a nao ser uma nova notacao. Dizer que b > a e, exatamente, dizer que a < b.

    A relacao de ordem que acabamos de introduzir tem algumas propriedades fundamentais

    que utilizaremos com muita frequencia, sem demonstracao.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 39 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.6 A Relacao de Ordem

    Propriedades da relacao < .

    Sejam a, b, c Z.(1) se a < b e b < c entao a < c (transitividade),

    (2) se a 6= b entao a < b ou b < a (dois elementos distintos sao comparaveis),(3) se a < b entao a+ c < b+ c,

    (4) se a < b e c > 0 entao ac < bc,

    (5) se a < b e c < 0 entao ac > bc.

    Alem disso, segue das propriedades acima que(6) 0 < a < b = 0 < an < bn , quando n Z+.De posse destas propriedades podemos demonstrar com facilidade os seguintes lemas que

    nos sao muito familiares.

    Lema 2.6.1. Dados a, b Z temos que(i) a, b > 0 = a b > 0,(ii) a, b < 0 = a b > 0.

    Demonstracao. Suponhamos entao que a e b sao ambos positivos. Como b e positivo, multipli-

    cando ambos os membro da desigualdade a > 0 por b, obtemos

    a > 0 = a b > 0 b = a b > 0,e a demonstracao do caso (i) esta terminada. A demonstracao do caso (ii) e uma repeticao da

    demonstracao do caso (i). C.Q.D.

    Lema 2.6.2. Se a, b Z tem sinais contrarios (i.e. se um e positivo e o outro e negativo) entaoa b < 0.

    Demonstracao. Para demonstrar este lema basta considerar o caso em que a > 0 e b < 0.

    Admitamos pois este fato. Como b e positivo, multiplicando ambos os membros da desigualdade

    a < 0 por b, obtemos

    a < 0 = a b < 0 b = a b < 0,e a demonstracao esta terminada. C.Q.D.

    No lema seguinte, nos enunciamos a recproca da afirmacao do Lema 2.6.1.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 40 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.6 A Relacao de Ordem

    Lema 2.6.3 Sejam a, b Z tais que a b > 0. Entao, ou ambos sao positivos, ou ambos saonegativos.

    Demonstracao. Primeiramente observamos que se a b > 0 entao a, b Z pois se um delesse anula, o produto a.b tambem sera nulo. Por outro lado, se a, b Z e tem sinais contrariosentao, o Lema 2.6.2 garante que a b < 0. Agora, segue das duas afirmacoes acima que, ou a eb sao ambos positivos, ou a e b sao ambos negativos e a demonstracao esta terminada. C.Q.D.

    Agora, demonstraremos a recproca da afirmacao do Lema 2.6.2.

    Lema 2.6.4 Sejam a, b Z tais que a b < 0. Entao a e b tem sinais contrarios.

    Demonstracao. Novamente observamos que se a b < 0 entao a, b Z. Por outro lado, oLema 2.6.3 nos diz que a e b nao podem ter o mesmo sinal pois, neste caso teramos a b > 0.So nos resta entao a possibilidade de termos a e b com sinais contrarios, o que demonstra o

    resultado. C.Q.D.

    A proposicao abaixo enuncia os resultados descritos nos Lemas 2.6.1 a 2.6.4.

    Proposicao 2.6.5 Dados a, b Z temos:(i) a b < 0 a e b tem sinais contrarios,(ii) a b > 0 a e b tem o mesmo sinal.Este resultado tem papel importante no estudo de certos tipos de inequacoes.

    Vamos agora falar de uma nova e importante propriedade da qual dotamos o conjunto dos

    numeros inteiros ao inser-lo na reta orientada, como descrito na secao 2.5. Esta propriedade

    diz o seguinte:

    Seja A um subconjunto nao vazio de Z que e limitado inferiormente. Entao, existe um ele-mento a0 A com a seguinte propriedade: todo elemento do conjunto A, distinto do elementoa0, e maior do que a0.

    O elemento a0 e dito omenor elemento (oumnimo) do conjunto A e e denotado por min(A).

    Analogamente,

    Seja A um subconjunto nao vazio de Z que e limitado superiormente. Entao, existe umelemento b0 A com a seguinte propriedade: todo elemento do conjuntoA, distinto do elementob0, e menor do que b0.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 41 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.6 A Relacao de Ordem

    O elemento b0 e dito omaior elemento (oumaximo) do conjuntoA e e denotado por max(A).

    Exemplos.

    (a) O conjunto Z+ tem como menor elemento o numero 1. O conjunto Z+ nao tem maiorelemento pois nao e limitado superiormente.

    (b) O conjunto Z tem como maior elemento o numero 1. O conjunto Z nao tem menorelemento pois nao e limitado inferiormente.

    (c) O conjunto Z nao tem menor elemento nem maior elemento.

    A propriedade descrita acima nos permite fazer a seguinte construcao.

    Sejam A um subconjunto de Z e P um ponto da reta orientada.

    Se o conjunto A tem pontos a` direita de P entao o conjunto de tais pontos , Adir , e nao

    vazio e limitado inferiormente logo, podemos falar em min(Adir). Tal elemento e dito o primeiro

    elemento de A a` direita de P.

    Se o conjunto A tem pontos a` esquerda de P entao o conjunto de tais pontos , Aesq , e

    nao vazio e limitado superiormente logo, podemos falar em max(Aesq). Tal elemento e dito o

    primeiro elemento de A a` esquerda de P.

    Exemplos.

    1. Considere o caso em que A = Z. Assim, dado um ponto P da reta orientada temos

    elementos de A a` direita e a` esquerda de P. Se P e um ponto da reta que nao representa um

    numero inteiro, entao P esta entre dois inteiros consecutivos n0 e n0 + 1, onde o primeiro e o

    inteiro mais proximo de P pela esquerda e o segundo e o inteiro mais proximo de P pela direita.

    E importante lembrar que o inteiro n0 depende de P.

    2. O que fizemos no exemplo anterior pode ser feito com um subconjunto qualquer A Zque tenha a seguinte propriedade: dado um ponto P da reta existem elementos de A a` direita e a`

    esquerda de P. Neste caso, o conjunto Adir(P) e nao vazio e limitado inferiormente, similarmente

    Adir(P) e nao vazio e limitado superiormente. Consequentemente, podemos falar no primeiro

    elemento de A a` direita de P e no primeiro elemento de A a` esquerda de P. Em particular, dado

    n Z podemos falar no primeiro elemento de A a` esquerda de n e no primeiro elemento de Aa` direita de n.

    Antes de seguir adiante voce deve tentar resolver alguns exerccios desta secao.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 42 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.6 A Relacao de Ordem

    Combinando as relacoes de menor e de igual, definimos a relacao de menor ou igual

    (notacao ) por:a b se, e somente se a < b ou a = b.

    Propriedades da relacao . Sejam a, b, c Z. (1) a a,

    (2) se a b e b a entao a = b,(3) se a b e b c entao a c (transitividade),(4) a b ou b a (dois elementos quaisquer sao comparaveis),(5) se a b entao a+ c b+ c,y(6) se a b e c > 0 entao ac bc,(7) se a b e c < 0 entao ac bc.

    Alem disso, segue das propriedades acima que(8) 0 < a b = 0 < an bn, quando n N.

    Terminaremos esta secao demonstrando o seguinte teorema.

    Teorema 2.6.6. Se a, b Z sao tais que a b = 1 entao a = 1 = b ou entao a = 1 = b

    Demonstracao. Primeiramente observamos que se ab = 1 entao ou ambos sao positivos ou

    ambos sao negativos. Assim, para resolver o problema e suficiente analisar dois casos.

    Caso 1. a, b Z+.Neste caso, e de observacao imediata que se a = 1 entao b = 1 e vice-versa. Resta agora

    analisar o que ocorre quando ambos sao maiores do que 1. Nesta condicao podemos escrever

    a = 1+ n ; n 1 e b = 1+m ; m 1. Segue da que

    1 = ab = (1+ n)(1+m) = 1+m+ n+mn > 1,

    o que e absurdo. Logo, a = 1 = b.

    Caso 2. a, b Z.Como ab = 1 e a, b Z entao a,b Z+ e temos que

    (a)(b) = ab = 1.

    Desta forma reduzimos o problema ao caso anterior e, consequentemente, podemos concluir

    que a = 1 = b, isto e, a = 1 = b. C.Q.D.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 43 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    Este teorema nos diz que a equacao xy = 1 , analisada no universo dos numeros inteiros,

    apresenta apenas duas solucoes: a solucao x = 1 e y = 1 e a solucao x = 1 e y = 1.

    Veremos mais tarde que a mesma equacao, analisada no universo dos numeros racionais, tera

    uma infinidade de solucoes.

    Corolario 2.6.7. Sejam a Z+ e n N tais que an = 1. Entao n = 0 ou a = 1.

    Demonstracao. Se n = 0 nada resta a demonstrar. Se n = 1 entao temos a1 = 1, isto e, a = 1,

    mostrando que o corolario e verdadeiro tambem para n = 1. Suponhamos agora que n 2.Neste caso, an pode ser escrito na forma an = a b e a equacao an = 1 toma a forma a b = 1.Como a, b N segue do Teorema 2.6.6 que a = 1 e a demonstracao esta terminada. C.Q.D.

    Este corolario descreve uma propriedade importante das potencias naturais de numeros

    inteiros que nao foi citada na seccao 2.3.

    De pose da relacao de ordem podemos reescrever a definicao de valor absoluto de um

    numero inteiro a da seguinte forma:

    |a| =

    a , se a 0a , se a < 0 .

    Exerccios

    1. Diga se e falso ou verdadeiro e justifique sua resposta.

    Sejam x, y, z Z tais que x y > 0 e z 6= 0. x+ z > y+ z z z+ 1 xy+ x y xz2 yz2 xz4 > 0 z2 + xy > y2.

    2. Sejam a, b Z. Mostre que(a) (a+ b)2 = a2 + b2 se, e somente se a = 0 ou b = 0 ,

    (b) (a+ b)2 > a2 + b2 se, e somente se a e b tem o mesmo sinal,

    (c) (a+ b)2 < a2 + b2 se, e somente se a e b tem sinais contrarios.

    3. Considere os conjuntos:

    (a) A = {2n;n Z e n 0}

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 44 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    (b) B = {4n ; n Z e n 0}(c) C = {4n+ 3 ; n Z e n 0}(d) D = {3n+ 1 ; n Z e n 0}(e) E = {2n(1)n ; n Z e n 0}Descreva A B, C D, A E, A E e C D.

    4. Para cada uma das inequacoes abaixo, determine o subconjunto dos numeros inteiros que a

    satisfaz.

    (a) x+ 2 < 2x+ 1,

    (b) x (2 x) > 2x+ 1,

    (c) x 2(x 1) > 2 (1+ x).

    5. Mostre que a equacao 2x = 1 nao tem solucao em Z.

    6. Determine as solucoes inteiras das inequacoes

    (a) x2 9 > 0,

    (b) x2 3,(c) 2x < 1.

    7. Sejam a,m,n Z+ com a > 1. Mostre que am < an quando m < n.

    8. Mostre que 2n > n para todo n N. Sugestao. Use o binomio de Newton.

    9. Use o Teorema 2.6.6 para concluir que se a, b Z sao tais que ab = 1 entao a = 1 = bou a = 1 = b.

    10. Determine todas as solucoes inteiras da equacao |ab| = 1.

    11. Sejam a, b, c Z. Determine todas as solucoes da equacao abc = 1.

    12. Ate que ponto a hipotese a Z+ no Corolario 2.6.7 e essencial ?

    13. Sejam a Z e n N. Determine as solucoes da equacao an = 1.

    14. Sejam a, b N tais que a + b = 0. Mostre que a = 0 = b. Sugestao. Faca umademonstracao por absurdo, supondo inicialmente que a > 0.

    15. Sejam a, b Z tais que |a| + |b| = 0. Mostre que a = 0 = b.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 45 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.7 Uma Primeira Nocao de limite

    16. Sejam p, q N e n N. Mostre que se pn = qn entao p = q.Sugestao. Suponha que p > q, use o binomio de Newton e o exerccio anterior.

    17. Sejam a1, a2, . . . , an Z tais que a1 a2 . . . an = 0. Mostre que existe um inteiro k com1 k n tal que ak = 0.

    18. Sejam a1, a2, . . . , an N tais que a1a2. . .an = 1. Mostre que ai = 1 para todo i {1, . . . , n}.

    19. Sejam a1, a2, . . . , an N tais queni=1

    ai = 0. Mostre que ai = 0 para todo i {1, . . . , n}.

    20. Mostre que todo subconjunto nao vazio de Z+ (resp. de Z) possui um menor elemento(resp. um maior elemento).

    21. Mostre que |a2| = |a|2 = a2 para todo a Z.

    22. Sejam a1, a2, . . . , an Z tais queni=1

    |ai| = 0. Mostre que ai = 0 para todo i {1, . . . , n}.

    2.7 Uma Primeira Nocao de limite

    Uma ideia muito interessante e sutil que segue das nocoes que acabamos de introduzir, ou

    mais especificamente, da representacao dos inteiros na reta orientada, e a seguinte:

    Considere a sucessao 1, 2, 3, . . . constituda de todos os inteiros positivos, colocados em

    ordem crescente, e seja P um ponto da reta orientada. Vimos, como propriedade da nossa

    representacao, que existe n0 Z+ tal que n0 esta a` direita de P. Consequentemente, todointeiro n > n0 estara a` direita de P.

    Ou seja, a sucessao 1, 2, 3, . . . tem a seguinte propriedade:

    Dado um ponto P da reta orientada, existe n0 Z+ tal que,

    n > n0 = n esta a` direita de P.Nos referiremos a esta propriedade dizendo que,

    a sucessao 1, 2, 3, . . . , n, . . . tende a` infinito,

    ou escrevendo, n (le-se, n tende a` infinito).Agora, seja b Z+ e considere a sucessao b, 2b, 3b, . . . , nb, . . .

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 46 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.7 Uma Primeira Nocao de limite

    Vamos mostrar que esta sucessao tem uma propriedade semelhante a`quela da sucessao

    1, 2, 3, . . . , n, . . .:

    Dado um ponto P da reta orientada, existe n0 Z+ tal que

    n > n0 = nb esta a` direita de P.Fixemos P na reta orientada. Existe n0 Z+ a` direita de P. Como b 1, resulta:

    n > n0 = nb > n0b = nb > n0b > n0 = nb esta a` direita de P,demonstrando o que pretendamos.

    Nos referimos a este fato escrevendo: nb quando n , ou limnnb =.

    Consideremos agora a sucessao 20, 21, 22, 23, . . . , 2n, . . .

    Dito de outra forma, consideramos a sucessao cujo termo geral e 2n, onde n N. Vejamosque esta sucessao tambem verifica

    limn 2n =.

    Para isto, devemos mostrar que:

    dado um ponto P da reta orientada, existe n0 Z+ tal que,

    n > n0 = 2n esta a` direita de P.Antes de mostrar esta propriedade, vamos mostrar que 2n > n para todo n Z+.

    Utilizando o binomio de Newton, obtemos:

    2n = (1+ 1)n =

    ni=0

    (n

    i

    )1i 1ni =

    ni=0

    (n

    i

    )=

    (n

    0

    )+

    (n

    1

    )+ . . .+

    (n

    n 1

    )+

    (n

    n

    )

    (n

    0

    )+

    (n

    1

    )= 1+ n > n.

    Fixemos agora um ponto P na reta orientada, e seja n0 Z+ a` direita de P. Entao:

    n > n0 = 2n > 2n0 = 2n > 2n0 > n0 = 2n esta a` direita de P,demonstrando o que pretendamos.

    Neste tipo de questao, dado um ponto P qualquer da reta, precisamos achar n0 satisfazendo

    a uma determinada condicao. Ate agora, dado o ponto P, nos parece que determinar o inteiro

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 47 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.7 Uma Primeira Nocao de limite

    n0 e facil, basta toma-lo a` direita de P, o difcil e mostrar que n0 vai servir para o que queremos.

    Engano! Regra geral, temos dois problemas nao triviais neste tipo de questao: determinar

    um inteiro que tenha chances reais de satisfazer a condicao, e depois mostrar que de fato, ele

    satisfaz a condicao. A dificuldade vem do fato que o inteiro n0 depende de P e, evidentemente,

    da sucessao que estamos estudando.

    Antes de estabelecer a proxima definicao, facamos mais um exemplo.

    Fixemos c Z e consideremos a sucessao de termo geral 2n+c, onde n Z+. Mostraremosque

    limn(2n+ c) =.

    Para isso devemos mostrar que:

    Dado um ponto P da reta orientada, existe n0 Z+ tal que

    n > n0 = 2n+ c esta d`ireita de P.Seja dado um ponto P da reta orientada e passemos a determinar o n0. Suponhamos, por

    um instante, que descobrimos um inteiro n0 tal que 2n0 esta a` direita de P. Nesta situacao

    temos:

    n > n0 = 2n > 2n0 = 2n+ c > 2n0 + c = 2n+ c esta a` direita de P.O problema agora e determinar n0 Z+ tal que 2n0 + c esta a` direita de P. Uma maneira defazer isto e a seguinte: Seja m0 um inteiro a` direita de P e consideremos um inteiro positivo n0tal que n0 > m0 c (isto e, n0 + c > m0). Como n0 1 temos:

    2n0 > n0 = 2n0 + c > n0 + c > m0 = 2n0 + c esta a` direita de P.Este exemplo serve para mostrar que a determinacao do inteiro n0 nem sempre e trivial.

    Estamos agora em condicao de entender a seguinte definicao:

    Definicao. Seja an, com n Z+, o termo geral de uma sucessao de numeros inteiros. Diremosque o limite de an quando n tende a e escrevemos lim

    nan = , quando dado um ponto Pda reta orientada, existe n0 Z+ tal que

    n > n0 = an esta a` direita de P.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 48 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    Aparentemente, algo menos exigente seria:

    Definicao. Seja an, com n Z+, o termo geral de uma sucessao de numeros inteiros. Dizemosque lim

    nan = quando: dado K Z+, existe n0 Z+ tal que n > n0 = an > K.De fato, estas duas definicoes sao equivalentes. Isto vem do fato que dado um ponto P da

    reta orientada, sempre existe um inteiro positivo depois dele.

    Daqui para frente estaremos utilizando apenas esta segunda definicao

    Notacao. No seguinte, designaremos por

    {an}, ou {an}nZ+, ou {an}n=1, ou {an}n1,a sucessao de inteiros a1, a2, . . . , an . . ..

    Similarmente, a sucessao a0, a1, . . . , an, . . . se designa por {an}nN, ou {an}n=0, ou ainda{an}n0.

    Exerccios

    1. Mostre que

    (a) limnn! =, onde n! = 1 2 . . . n para todo n Z+ (define-se tambem 0! = 1).

    (b) limnn3 =.

    (c) limn |n| =.

    (d) limnnn =.

    (e) limn(3n+ n2) =.

    2. Seja {an}nZ+ uma sucessao de inteiros que tende a quando n . Mostre que existek0 Z+ tal que ak 1 para todo k > k0.

    3. Considere sucessoes de numeros inteiros {an}n1 e {nn}n1 tais que, an bn para todon Z+. Mostre que, se lim

    nan = entao limnbn =. Interprete este fato na reta orientada.4. Considere a sucessao de termo geral an = (1)n onde n Z+. Podemos garantir quelimnan =?5. Seja a Z tal que a > 1. Mostre que lim

    nan = , isto e, dado K Z+, existe n0 Z+ talque an > K para todo n > n0. Mostre que a hipotese a > 1 e essencial.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 49 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    Sugestao: Compare an com 2n.

    6. Mostre que limnn = . Isto e, mostre que dado K Z+ existe n0 Z+ tal que n > K para

    todo n > n0.

    7. Considere sucessoes de numeros inteiros de termo geral bn e cn com n Z+. Mostre que,se lim

    nbn = e limn cn = entao limn(bn + cn) = e limnbncn =.8. Seja k Z. Mostre que lim

    n(k n)2 =.9. Mostre que lim

    n(a+ n)k = onde a Z e k Z+.10. Seja a Z tal que a 1. Mostre que lim

    nan = , isto e, dado K Z+, existe n0 Z+ talque an > K para todo n > n0.

    11. Inspirado nas ultimas definicoes e exerccios de sentido (isto e, faca uma definicao ade-

    quada) aos itens abaixo:

    limnan = ,

    limnan =,

    limnan = .

    Alem disso, calcule limnn, limnn2 e limn(n2 n).

    12. Sejam {an}nZ e {bn}nZ sucessoes tais que limnan = e limnbn = . Mostre que

    limnanbn = .O que podemos dizer de lim

    n(an bn)?13. Sejam {an}nZ e {bn}nZ sucessoes tais que lim

    nan = e1 bn K para todo n Z+,onde K Z+ e um inteiro fixo. Mostre que lim

    nanbn =.14. Seja {an}nZ+ uma sucessao de inteiros. Mostre que, se lim

    nan =, entao:(a) lim

    n c an = quando c > 0,(b) lim

    n c an = quando c < 0

    2.8 Numeros Pares, Numeros Impares

    Definicao. Numeros pares sao os numeros da forma 2n, onde n Z. Numeros mpares sao osnumeros da forma 2n+ 1 onde n Z.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 50 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.9 Multiplo e Divisor

    Exerccios

    1. Mostre que:

    (a) 6+ 2(2n 1) e par, qualquer que seja n Z.(b) 2(n+ 1) + 3 e mpar para cada n Z.(c) a soma de dois numeros pares e um numero par.

    (d) a soma de dois numeros mpares e um numero par.

    (e) a Z e par (resp. mpar) se, e somente se, o algarismo das unidades de a e par (resp.mpar).

    2. Diga se e falso ou verdadeiro e justifique sua resposta.

    (a) Qualquer potencia natural de 7 e um numero mpar,

    (b) Qualquer potencia natural de um numero par e um numero par.

    3. Sejam a Z e k Z+. Mostre que(a) se a e par entao ak e par,

    (b) se a e mpar entao ak e mpar.

    4. Sejam a Z e k N. Mostre que an e positivo se n e par e negativo se n e mpar.

    5. Sejam a, b Z tais que a e par e b e mpar. Mostre que a b e par.

    6. Quais algarismos da unidade podem ocorrer em potencias naturais do numero 8? Idem para

    o numero 3. Idem para o numero 21. Idem para o numero 1010 + 2.

    7. Quais os algarismos da unidade dos numeros 12491, 13592, 71547.

    2.9 Multiplo e Divisor

    Iniciamos esta secao com alguns conceitos extremamente importantes.

    Definicao. Dizemos que b Z divide a Z (ou que b e um divisor de a, ou que a e divisvelpor b) e escrevemos b |a (le-se b divide a), se existe k Z tal que a = k b. Neste caso, k edito o quociente da divisao de a por b e e denotado por

    a

    b.

    Quando a = k b diremos tambem que a e um multiplo inteiro de b.

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 51 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros 2.9 Multiplo e Divisor

    A notacaoa

    b= k significa que b e nao nulo, que b divide a e que o inteiro k e o quociente

    da divisao de a por b.

    Quando b 6= 0, escrever a = k b e equivalente a escrever ab

    = k.

    Note-se que, se a, b Z, dizer que b nao divide a (escrevemos b 6 |a, por simplicidade)significa que, ou bem b = 0 ou bem a 6= k b qualquer que seja k Z.

    Cuidado! Por enquanto, conhecendo apenas o universo dos numeros inteiros, nao podemos

    sair por ai dizendo quea

    2sempre faz sentido. A notacao

    a

    2so faz sentido quando a e um inteiro

    par (i.e. um multiplo de dois). Da mesma formaa

    3so faz sentido quando a e um multiplo de 3.

    E exatamente isto o que e dito no paragrafo anterior:

    quando b 6= 0, abfaz sentido se, e somente se, a e multiplo de b.

    E de facil verificacao que para todo inteiro nao nulo b temos que

    0

    b= 0 ja que 0 = 0 b e b

    b= 1 ja que b = 1 b.

    Alem disso, para todo inteiro a temos que

    a

    1= a ja que a = 1 a.

    Dado b Z+ podemos ordenar os multiplos de b da seguinte forma:

    . . . < 4b < 3b < 2b < b < 0 < b < 2b < 3b < 4b < . . .

    Isto e feito multiplicando por b a ordenacao que construmos ao representar Z na reta orien-

    tada:

    . . . < 4 < 3 < 2 < 1 < 0 < 1 < 2 < 3 < 4 < . . .

    Esta ordenacao dos multiplos de b tera papel importante na demonstracao de um resultado

    conhecido como Algoritmo da Divisao ou Algoritmo de Euclides.

    Propriedades da divisao.

    Sejam a, b, c Z.

    (1) se c divide b e b divide a entao c divide a,

    (2) se c divide a e b entao c divide a+ b e temosa+ b

    c=a

    c+b

    c,

    J. Delgado - S. Firmo - P. Nobrega 52 Instituto de Matematica - UFF

  • Os Inteiros Exerccios

    (3) se c divide a entao c divide a e temosa

    c=

    a

    c,

    (4) se c divide a entao c divide ab e temosab

    c=a

    c b ,

    (5) se c divide a e b e se a < b entaoa

    c 0, e

    a

    c>b

    cquando c < 0.

    E consequencia facil das propriedades (2) e (3) acima que: (6) se c divide a e b entao c

    divide a b e temosa b

    c=a

    cb

    c.

    Com a introducao destes novos conceitos podemos demonstrar o lema abaixo que ja foi

    anteriormente enunciado.

    Lema 2.9.1. Sejam a, b Z. Se a b = 0 entao a = 0 ou b = 0.

    Demonstracao. Suponhamos que a e b sao nao nulos. Assim, sendo b 6= 0 podemos concluirque ca